33: Depois de Salvarem um Mundo - Capítulo 208
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Quadragésima Oitava Página do Diário
Já se perguntou como um artista marcial consegue reagir tão rápido a um ataque? É claro que o treino pesado consegue diminuir muito o tempo de reação, porém, tem um detalhe que muitas pessoas desconhecem.
A postura inicial indica qual o tipo de ataque será aplicado pelo oponente. Pequenas tensões musculares e até movimentos dos olhos também seguem determinados padrões que, para um guerreiro experiente, pode descrever exatamente o que ele ou ela precisa saber sobre o seu ataque e se defender a tempo.
Eu já tinha ouvido falar, e até mesmo estava começando a pegar o jeito, conseguia prever se seria atacado com um chute, soco ou arma, ou ainda se o golpe viria da direita ou da esquerda. Mas também sabia que de nada adianta saber o que vai te atingir se não for capaz de bloquear ou desviar.
Foi o que aconteceu quando eu ataquei Yobaa e perdi meu braço direito, ele viu exatamente o que eu planejava e contra-atacou mais rápido. Se eu não tivesse tão atordoado, teria sido capaz de, pelo menos, salvar meu braço.
Por que eu estou explicando isso?
Bom, imagine que uma pessoa se especialize em assassinatos rápidos, ela precisa romper qualquer possibilidade de defesa do alvo, certo? Digamos que essa pessoa fosse Shiduu, e ela estivesse a ponto de fazer uma coisa muito difícil: mudar o ataque para evitar ser pega no contra-ataque.
E foi isso que ela fez!
Enquanto fingia um ataque direto na garganta de Yobaa, ela cruzou toda a distância entre os dois em pouquíssimos passos e sem emitir som algum. Yobaa viu o ataque, protegeu a garganta e contra-atacou com um golpe diagonal da sua espada de cavalaria.
O golpe deveria ter sido fatal a ponto de parti-la ao meio, mas não foi o que aconteceu. No milésimo de segundo que Yobaa piscou enquanto movia sua lâmina, Shiduu mudou a direção para algo mais rasteiro, o acertando na perna, enquanto deslizava pelo chão e pegava o meu braço caído.
Senti a mão dela se fechar ao redor do meu braço decepado e soube que era a minha vez. Com Yobaa confuso e ferido, além de sua guarda aberta, era a única oportunidade que Shiduu havia mencionado.
Encostei meu pé na parede atrás de mim e usei o Rancor para criar uma impulsão para a frente. Meu corpo voou tão rápido que só senti atingir alguma coisa com o ombro e cair. Levantei o mais rápido que consegui e vi Yobaa tentando se levantar também.
Shiduu foi rápida e arrastou nossos outros irmãos para longe da briga, isso significava que eu teria que segurar Yobaa até que ela voltasse. Não seria fácil, mas eu estava mesmo com uma baita vontade de espancar ele. E vendo como Miraa não parecia interessada em interferir, essa poderia ser a minha única oportunidade.
Desde a primeira vez que treinei com Yobaa, sempre sonhei no dia em que poderia enfrentá-lo sem que ninguém interferisse. De todas as pessoas que eu conheci e queria encher de porrada, ele estava entre os cinco primeiros da lista.
Enfrentar meu irmão mais velho não seria tarefa fácil, eu sabia, então considerei minhas vantagens e fraquezas. Uma armadura poderia me proteger bem, mas reduziria minha velocidade, ao mesmo tempo, eu poderia criar uma infinidade de armas.
Ter apenas um braço dificultaria as coisas, no entanto, diferente de Yobaa, eu conseguia fazer as armas atacarem se precisar segurá-las. E essa seria minha primeira estratégia, e mesmo que não fosse tão eficaz, eu só precisava de uma abertura para dar um golpe certeiro.
Yobaa era especialista em espadas, lanças e machados, ele teria a vantagem se eu usasse essas. Seria necessário usar a minha criatividade ao máximo, por mais que ele estivesse meio abilolado das ideias, ainda não era motivo para subestimar alguém que fora treinado por Miraa.
Primeiro criei um par de manoplas, por mais que meu braço direito não estivesse mais no lugar, consegui fazer direitinho. Normalmente esse tipo de arma era usado para combate corpo a corpo, mas arremessei. Foi estranhamente eficaz, talvez por ele não esperar receber um punho voador feito de névoa escura condensada, mas o esquerdo acertou no meio da cara, enquanto o direito pegou o ombro de raspão.
Yobaa ignorou o punho voador e correu em minha direção com a espada de cavalaria erguida, mirando meu pescoço. Criei um jogo de correntes como uma teia de aranha entre nós dois, isso reduziu seu avanço, mas por poucos segundos, Yobaa partiu a teia de correntes em um golpe só.
Mais dois passos e ele estaria próximo de mim o suficiente para arrancar meu outro braço. O que ele não considerou foi que eu poderia reutilizar a névoa das correntes, então não estava totalmente indefeso.
Fiz a névoa de Rancor que ficara para trás de Yobaa formar uma lança e vir em nossa direção mirando o meio das costas dele. Em uma demonstração de percepção e agilidade, Yobaa desviou do ataque, o que o impediu também de me atacar. Isso me deixou com uma lança afiada vindo em alta velocidade em direção a mim.
É claro que seria muita burrice ser atingido por meu próprio poder. Yobaa podia até achar que não, mas eu já tinha imaginado esse tipo de situação e treinado mentalmente para não suicidar. Desde que criei a lança, nunca achei que realmente conseguiria matar ele com aquilo.
A quantidade de Rancor que eu criava era limitada em volume e tempo de criação, então eu não poderia desperdiçar a névoa. Tudo que fiz foi trazer para mais perto de mim. E assim que estava para tocar meu corpo, a lança se desfez como fumaça, e circundou meu corpo.
A esse ponto estávamos tão perto, que a arma de Yobaa poderia me fatiar se eu não fosse cuidadoso. E quando ele fez um corte reto para cima, tudo que eu consegui foi rolar para longe, mas não o suficiente.
Mal me pus de joelhos e ele já estava mais uma vez tentando separar minha cabeça do resto do corpo, o que eu consegui impedir com outro punho voador, dessa vez meio completo apenas. Não foi suficiente para derrubar ele, mas pelo menos me salvei.
O cotoco do meu braço decepado estava doendo demais, sem contar a falta de equilíbrio que a perda de um membro causava. Como se não bastasse isso, Yobaa estava concentrando a maioria dos seus ataques no meu lado direito.
É claro que eu faria o mesmo!
Na verdade, se estivesse lutando contra um oponente com certa desvantagem física, forçaria tanto isso, que ele teria que ele teria que concentrar suas defesas naquele local. Yobaa parecia pensar exatamente assim, pois estava mirando sua espada nas minhas costelas ou no pescoço sempre pela direita.
Se não fosse pela minha capacidade de me proteger com Rancor, criando placas de armadura e punhos voadores de várias direções, desviando a espada do alvo — meu corpo— já teria virado presunto fatiado.
Então me deu um estalo!
O que eu faria se meu oponente conseguisse bloquear todos os meus ataques no seu lado deficiente? A resposta mais óbvia era fazer uma finta e atacar seu lado eficiente, porém, descuidado.
Esse pensamento me ocorreu tardiamente. Via a espada de cavalaria nas mãos de Yobaa girar no ar e vir de encontro ao meu lado esquerdo, que estava desprotegido. Eu demorei demais a perceber a intenção demais e deixei a diferença de experiência habilidade ser revelada.
Meu cérebro trabalhou em uma velocidade absurda, fazendo com que tudo parecesse tão devagar que até lembrei daquelas cenas de futebol em câmera lenta, quando assistia jogos com meu pai. Infelizmente, de nada servia ver o ataque chegando e não poder revidar.
Meu corpo não estava tão rápido quanto a minha mente. Desejei ter o braço direito, assim poderia pelo menos acertar Yobaa e cairíamos juntos. Da forma como sua guarda estava aberta, eu o nocautearia com toda certeza.
Então vi um punho fechado acertar o queixo dele.
Esperei ver o rosto de Shiduu aparecer na outra extremidade do braço que segurava o punho. Mas não havia nada.
Era somente o meu braço decepado que, de alguma forma, evitou que aquele fosse meu último suspiro.