33: Depois de Salvarem um Mundo - Capítulo 212
Mito da Criação – parte 2
SOBRE DEUSES E REIS
Ele sempre foi o Guardião do Mundo. Um Deus supremo que guardava e protegia os humanos enquanto esses lentamente evoluíram e construíam suas sociedades e culturas.
Desde a evolução dos primatas, passando pelos homens das cavernas e a descoberta do fogo. Ele viu a criação das primeiras armas de bronze e as roupas de tecido vegetal. As primeiras plantações serem cultivadas e os animais serem domesticados.
Aos poucos ele viu cidades se erguerem e reinos desenharem suas fronteiras. Reis e soldados traçavam estratégias de guerras, religiões surgiam para controlar os mais desesperados, e os sábios registravam a história em pedras, pergaminhos e livros.
Décadas, séculos e milênios se passaram da mesma forma. Mesmo com a lenta e constante evolução da tecnologia, as únicas coisas constantes eram a guerra e a insistência humana de sobreviver. Sociedades surgiam, dominavam umas às outras e caíam sob a pressão de novas e mais evoluídas Sociedades que estavam surgindo.
O desejo maligno do ser humano pela conquista, esquecendo das necessidades dos seus semelhantes, abandonando todas as formas de empatia, deixaram o guardião triste. Nas poucas vezes que ele interveio, acabou eliminando totalmente grupos sociais que estavam em desacordo com o que ele definia ser o essencial para os humanos.
Alguns pouquíssimos humanos possuíam um real desejo de consertar as coisas, de colocá-las no rumo certo, de ajudar os seus semelhantes independente de origem e outras limitações impostas por definições que os próprios humanos haviam inventado.
Alimentado pelo desejo de fazer os seres humanos se tornarem bons e sábios, o Guardião decidiu que compartilharia seu poder com aqueles que mostrassem ser dignos. E por séculos ele esperou, até que apareceu alguém que chamou a sua atenção. Um cavaleiro que defendia seu reino a custo da própria vida.
O Guardião deu a ele, então, o poder da defesa absoluta, um escudo que era tão forte quanto a vontade do cavaleiro de proteger o reino ao qual servia, e ele ficou conhecido como Jaffah, o primeiro herói.
Por anos aquele cavaleiro usou seu poder para o bem, o que agradou o Guardião, que decidiu que era uma boa ideia compartilhar seu poder com os humanos. Desse modo, ele escolheu 27 pessoas e deu a cada uma um poder de acordo com a personalidade de cada. Depois criou com suas mãos mais quatro para carregarem os quatro poderes elementos.
E por um século o mundo viveu em paz.
O que o Guardião acreditava ser a paz verdadeira era apenas medo. Os 31 heróis que ele havia criado agora usavam seus poderes para decidir quem poderia viver e governar, e quem deveria se ajoelhar e servir. Não eram mais heróis, agora exigiam serem chamados de deuses.
O poder havia subido às suas cabeças e envenenado seus pensamentos detalhes modo que nem mesmo reconheciam o Guardião como seu superior, e pareciam achar que haviam criado o mundo e os humanos.
Só então o Guardião percebeu que uma coisa estava muito errada: ele havia criado 31 heróis, mas agora existiam 32. E por mais que tentasse entender, era como se uma força externa o impedisse, como se a cada vez que ele descobrisse quem estava sobrando, no segundo seguinte esquecesse.
Com medo de estar perdendo para seu próprio poder depois de dividi-lo com tantos humanos, o guardião parou de pensar a respeito e entrou em um sono profundo. Nesse período, os deuses continuaram a mandar e desmandar no mundo.
O Continente Central, onde viviam mais da metade dos humanos do mundo, foi dividido em sete reinos. Os dois outros continentes foram divididos em pequenos feudos, sendo ambos negligenciados pelos autointitulados deuses, que acabaram por extingui-los na guerra que devastou metade do mundo, como será contado no próximo capítulo.
Mesmo com suas vidas prolongadas graças aos poderes divinos recebidos, a idade estava lentamente chegando e cada um deles sentis. Assim, aproveitando-se do sono do Guardião, os deuses decidiram roubar a imortalidade para se tornarem deuses de verdade.
Nem todos foram a favor, e isso terminou envolvendo os reinos humanos em uma grande guerra. A magia dos deuses foi compartilhada com mais humanos, que foram chamados de magos, feiticeiros e sacerdotes. Estes não eram tão poderosos quanto os deuses, mas faziam uma grande diferença nos campos de batalha.
O Guardião, coberto de fúria, para se vingar dos Reis que apoiaram os deuses na traição, amaldiçoou cada um dos sete tronos com uma praga, mas que em comum tinha o final dedicado aos que nestes sentavam:
“Qualquer um que sentar-se em um dos sete tronos terá uma morte dolorosa. E somente quando os sete escolhidos estiverem em seus respectivos tronos, a maldição será retirada”.
Não havia pistas sobre quem eram os tais escolhidos, onde estavam ou mesmo quando chegariam. Desta forma, a maldição foi esquecida, e por mais alguns séculos, reis e rainhas criaram linhagens e tiveram seus respectivos fins de formas trágicas e dolorosas, sem nunca ninguém perceber que era culpa da maldição.
Alguns reinados eram breves, outros, duravam décadas. Por esse motivo, sempre se passava um bom intervalo de tempo entre a morte de um governante e a de seu sucessor.
Até que o sétimo escolhido pisou no mundo. Seu destino estava em aberto, não foi um Deus ou o Guardião que o escolheu, tampouco a Existência. Ele simplesmente se escolheu para ser um líder, e isso fez o trono o considerar digno.
O homem que moveu um reino, literalmente. Que marcou uma era e viveu mais do que qualquer outro. Aquele que enganou os deuses e roubou para si a joia da imortalidade. O único humano digno de ser chamado de rei naquela era.
Mesmo assim, ele rejeitou o trono e obteve uma morte dolorosa, deixando ao seu herdeiro a missão de acabar com a maldição e libertar os reinos.
Diferente do Guardião, Haroldo não acreditava que “poder” era a única forma de resolver as coisas. Ele considerava que coragem, empatia e astúcia, quando combinadas, poderiam vencer qualquer coisa.
Ao morrer, Haroldo deixou para André a missão que o destino lhe delegou, e como sempre, ele fez o próprio caminho, sem aceitar o que os outros o impunham.