33: Depois de Salvarem um Mundo - Capítulo 232
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Quinquagésima Sétima Página do Diário
Ele sabia de tudo?
Aquilo me pegou de surpresa. Fazia apenas algumas poucas horas que Leonardo havia me chamado para pedir ajuda, como Long-Hua poderia ter descoberto que eu estava ajudando a proteger Van-Nee?
Na verdade, eu nem tive tempo de falar com ela, então tinha apenas a intenção de ajudar. Mas como dizem que de boas intenções o inferno está cheio, senti que minha hora estava chegando.
— Quem você acha que deu a ideia de te pedir ajuda? — O homem continuou, ignorando minhas pernas trêmulas.
— C-como assim? — gaguejei.
— Faz muito tempo que sei que aqueles dois são apaixonados, e não ligo para essas regras chatas do clã da floresta. — Ele explicou — Como eu tenho o poder, até fiz o casamento deles em segredo, mas não esperava que meu irmão de armas fosse receber a notícia tão bem quanto eu.
— Zang-Nee? — perguntei, recebendo um aceno com a cabeça como resposta.
— Aquela cara é muito conservador! Ele viveu e foi treinado a vida inteira sob as tradições do clã dele, diferente de mim, que tive um mestre diferenciado e uma companheira de treino bem louca… Com todo respeito à sua mãe, mas ela era muito esquentada na juventude.
Ele estava falando de Miraa? Lembrei que ela e Long-Hua foram alunos de Haroldo durante a juventude. Ambos haviam aprendido muito com o meu pai biológico, com quem eu tive praticamente zero contato desde que cheguei nesse mundo.
Será que eu poderia fazer ele falar um pouco sobre meu pai?
— Ah sim! — falei despretensiosamente — Você e Miraa foram treinados pelo meu pai…
— Não! — Ele me interrompeu. — Estamos falando sobre Leonardo e Van-Nee, não vou dizer uma palavra sequer sobre o seu pai!
— Eu só queria…
— Na hora certa ela vai te contar tudo, só tenha paciência.
Me pedir paciência era como pedir para um peixe não nadar.
— O que você precisa saber é que eu já resolvi parte do seu problema quanto à proteção de Van-Nee. — Long-Hua mudou de assunto, voltando para a conversa original — Ela já está com os seus amigos, enquanto isso, Leonardo está indo em direção ao Reino de Prata como uma distração.
— Zang-Nee vai seguir Leonardo e dar tempo de sairmos em segurança para o Leste? — Entendi o plano.
— Até que você não é tão tapado! — Ele deve ter imaginado que eu receberia aquilo como um elogio.
— E o que garante que Zang-Nee não vai matar Leonardo? — questionei.
— Estamos próximos à fronteira, Leonardo tem passe livre por ser herói, só precisa chegar no Reino de Prata e estará seguro.
Eu ainda estava incomodado com aquilo.
— E se ele não chegar? — insisti — E se Zang-Nee passar a fronteira?
— São muito “e se”, pense positivo uma vez na vida. — Long-Hua reclamou — Leonardo é um dos heróis mais poderosos, pode se defender sozinho. Caso meu irmão passe o limite da fronteira, teremos um problema, mas nada de mais. Só mais um motivo para estourar uma guerra, e tudo que discutimos aqui poderá ser jogado fora.
— Principalmente se ele descobrir que eu estou acobertando a filha dele…
— Cara… Você é um baita pessimista!
Ao dizer isso, o homem saiu, fazendo um sinal para que eu o seguisse.
Descemos apressadamente os degraus de madeira que pareciam ter brotado naturalmente e, enquanto eu me perguntava se aquela cidade tinha mesmo nascido espontaneamente, Long-Hua dava ordens para quem ele encontrasse no caminho.
Fiquei curioso se ele dava ordens aleatórias ou se aquelas pessoas estavam ali esperando receber suas ordens. E a forma como o homem parecia conhecer todo mundo pelo nome era incrível. Deu para compreender um pouco sobre liderança só de vê-lo em ação.
Diferente de Miraa que sempre estava calma e recebia os subordinados para repassar suas ordens, Long-hua ia até eles e dizia em poucas palavras o que tinham que fazer. Talvez pelo treinamento ou pela rotina, mas não carecia de muita explicação para que eles compreendessem.
Foi uma rápida caminhada que me valeu uma boa aula.
Ao chegar na recepção, ele me recomendou voltar para a pousada onde estava hospedado. E também disse que eu não deveria sair de lá pelos próximos dois dias, mas que alguém apareceria para me dar informações. Quanto às despesas, ele já tinha resolvido.
Achei uma baita sacanagem. As pessoas tinham feito planos que me envolviam e nem me perguntaram antes se eu concordava. Todos partiram do princípio de que eu era alguém solícito a arriscar minha vida para proteger os mais fracos.
Não que eu não fosse, pelo contrário, acredito que você que está lendo se lembra do rolê libertando escravos. Mas o que me incomodava era ser o peão, dançando conforme a música escolhida pelos outros.
Mas eu não estava no meu território e a merda já estava feita. Tinha que focar no problema que era sair do Reino do Sul com uma sacerdotisa grávida enquanto pai violento dela tentava matar o herói que a engravidou.
O pior é que eu nem podia julgar Leonardo por ter caído em tentação quando eu mesmo tinha me deitado com Zita meses antes. Só de lembrar dos nossos dias de paixão, acampando nas ruínas do Reino de Pedra, dava uma saudade e uma vontade de largar tudo e ir ao encontro dela.
Eu estava apaixonado, e podia compreender o que Leonardo estava passando, ele estava arriscando a própria vida para proteger a sua amada, e diferente de mim, uma criança estava vindo em breve para eles.
Uma criança que seria filha ou filho de um herói, eu não tinha parado para pensar, mas aquilo poderia ser um problema no futuro. Não podia nem imaginar quais desdobramentos um nascimento desse tipo poderia ter.
E já que tinham jogado a batata-quente nas minhas mãos, eu decidiria qual o rumo a ser tomado a partir dali. Achei melhor manter a gravidez em segredo.
Só então percebi que nem Zang-Nee nem Long-Hua haviam mencionado a gravidez. Um disse que Leonardo era um homem morto, outro disse que sabia de tudo e que as regras proibiam interesses amorosos.
Talvez a criança que estava sendo gerada fosse um segredo ainda maior do que eu tinha imaginado. Fiquei feliz por ter sido meio bocó e ficado perdido na conversa com Long-Hua ou poderia ter revelado a gravidez.
Talvez, com essa informação, o cenário se revertesse e fosse eu quem estaria em risco. Até parece que eu ficaria ali tempo suficiente para descobrir.
Mantendo o passo firme e o ritmo da caminhada não muito lento nem tão rápido, cheguei à hospedaria e fui direto ao meu quarto, que não era tão grande quanto o que eu tinha no Leste, mas caberia todos os órfãos do meu tempo de Rato.
Antes de abrir a porta, suspirei, sempre que ficava nervoso as lembranças do primeiro ano nesse mundo voltavam para me assombrar. Era meio que uma reação do meu cérebro, como se quisesse dizer que já estive em situação pior.
Sentindo meu coração e minha mente acalmarem, entrei no quarto, que quase não tinha espaço para mim. Brogo e Jairo estavam sentados no chão jogando pedra-papel-tesoura com Udoo, que estava sentado na cama.
Ao lado de Udoo, estava Van-Nee, a sacerdotisa, assistindo atentamente o jogo dos três. A reconheci da cerimônia da noite anterior. Mas tinha mais uma pessoa, um homem alto, encostado na parede, me olhava como se me esperasse.
— Oi, filho. Fico feliz em ver que está bem…