33: Depois de Salvarem um Mundo - Capítulo 239
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- Capítulo 239 - Sexagésima Quarta Página do Diário
Sexagésima Quarta Página do Diário
Nunca acreditei no potencial de Leonardo, e mesmo não o subestimando, não esperava que ele fosse tão forte. Naquele dia eu mudei completamente de ideia sobre a real força dele.
Se o herói dos raios não fosse mais forte do que eu, ficaria empatado comigo em termos de poder. Talvez não em habilidade como um todo, mas em poder ele se igualava. Por sorte, dessa vez ele não queria me matar de verdade, ou eu teria ido de saco preto.
Me protegi com uma esquiva misturada com cambalhota e queda. Ao mesmo tempo levantei a névoa de Rancor no campo inteiro, deixando todos sem visão, inclusive eu mesmo.
Contei com a inteligência dos inimigos em não atacar às cegas para não causarem fogo-amigo, seria burrice. Manter a minha posição também não seria inteligente, então corri na direção do cadáver de Zang-Nee.
Enquanto corri, desfiz as correntes de Kawã, para fazer ele chamar atenção, mas as coisas não saíram como o planejado, e ele não fez nada. Imaginei que o herói animal tinha recuperado sua consciência.
Nem tudo poderia sair de acordo com o plano, eu já estava acostumado com isso. Foquei apenas em chegar no próximo ponto, e para isso precisei passar pelos cavaleiros, o que foi uma tarefa mortal e burra.
Assim que saí da nuvem de Rancor, juntei toda a névoa que consegui em torno dos meus braços e improvisei um par de manoplas. Antes que eu terminasse de criar as coberturas para minhas mãos, uma lança raspou minhas costelas e outra passou a centímetros do meu nariz.
Eu fui atingido, mesmo que de raspão. Era o indício final de que eu havia chegado ao limite da minha capacidade de luta. Até poderia continuar se deixasse o Rancor me dominar, mas jurei a mim mesmo que nunca mais perderia o controle outra vez.
Se tivesse que morrer, seria com a minha consciência comandando meu corpo.
Mais lanças vieram em minha direção. Mantive o passo rápido e os movimentos em zigue zague, mesmo assim senti uma dor na coxa esquerda. Outra lança me pegou de raspão, dessa vez cortando mais fundo.
Senti a cabeça rodar por um segundo, a tontura era sinal do cansaço extremo. Se não conseguisse sair dali o mais rápido possível, terminaria com o corpo e a cabeça separados. Ou pior, seria capturado por Jonas, e eu preferia morrer do que ser preso de novo pelo Reino de Prata.
Senti a perna fraquejar e me joguei para o lado, rolando e torcendo para não ser atingido. Achei que acabaram as lanças, porque nada veio em minha direção, e infelizmente eu estava errado outra vez. Havia deixado a guarda baixa e, enquanto me preocupava com as lanças, fui preso em um cubo translúcido.
— Finalmente, eu te peguei! — A voz de Jonas veio do lado de fora.
— Eu acho que essas barreiras não contam como método de captura.
Eu estava cansado demais para dizer qualquer coisa que desse a ele a sensação de poder que tanto desejava, então decidi partir para a batalha psicológica. Meu corpo não se mexia mais, meu poder tinha esgotado pela segunda vez, e o que me restava era a mente.
Também tinha a lança curta de Leonardo, a que ele usou para destruir metade do acampamento horas antes, o problema era que eu não fazia ideia de como usar.
Minha única saída era conseguir enrolar Jonas por alguns minutos enquanto recuperava um pouco do Rancor e descansava. Contei com a burrice dele e a proteção da barreira que me prendia e ao mesmo tempo me protegia dos cavaleiros que agora me cercavam.
Se a barreira fosse desfeita eu correria pela minha vida, enquanto ela estivesse funcional, eu estaria protegido. Ganhar tempo era essencial para a minha sobrevivência.
A névoa de Rancor tinha se desfeito por completo, Kawã estava mais controlado, Leonardo estava recebendo cuidados médicos e Jonas caminhava lentamente em minha direção com aquela cara redonda e cheia de deboche.
Como dependia da lentidão dele, então esmurrei com força as barreiras que fechavam o cubo transparente que me prendia. Isso fez Jonas parar, apreciando a cena, me dando mais uns segundos de recuperação.
É claro que tive cuidado de não me desgastar muito ou de ter o perigo de romper as barreiras por engano. Enquanto eu estivesse preso, os cavaleiros não dariam um passo sequer, exceto o Cavaleiro de Prata.
O infeliz enlatado estava lutando com meu pai a tanto tempo que eu não entendia como eles conseguiam ainda se manter de pé. Então me passou a ideia de que meu pai pudesse saber como usar a lança curta que peguei de Leonardo. Ele era muito inteligente e tinha uns objetos mágicos bem complexos.
Decidi que recuperaria meus poderes o suficiente para fugir e entregar a lança curta a Haroldo. Continuando com meu teatro — a quem sou agradecido pelas aulas que Miraa me fez frequentar contra minha vontade — xinguei Jonas com todos os palavrões que eu conhecia e ainda inventei alguns.
— Ah, André… — Jonas estava genuinamente feliz em me capturar — Eu jamais esperei te encontrar aqui. Mas o destino é maravilhoso, não é?
— Foda-se você, o destino e quem mais se meter comigo! — rosnei entredentes, e dessa vez nem foi teatro — Me tira daqui e quero ver se não acabo com você sem precisar de poder nenhum… ou não é homem o suficiente para me enfrentar?
Essa última parte foi pura bravata, eu sabia que Jonas era muito covarde para sair na mão pura comigo.
— Trocar socos é coisa de selvagens, André! — Jonas respondeu com um sorrisinho presunçoso — Acha que eu, um homem civilizado, ficaria correndo e suando para provar que sou melhor quando posso apenas te capturar e fazer a barreira reduzir de tamanho até te esmagar?
Essa parte eu não sabia que era possível?
— Acha mesmo que vai conseguir recuperar seu poder e descansar enquanto me entretém com esse showzinho de bizarrice? — Ele continuou — Não quero te capturar, e sim matar.
Eu realmente havia subestimado a inteligência dele. Por mais que Jonas fosse burro, não era estúpido.
— Agora, tchau! — Jonas estendeu a mão direita aberta em minha direção e fechou rapidamente.
Senti a pressão do ar dentro da barreira se intensificando rapidamente, e mais uma vez o meu cérebro pareceu funcionar cem vezes mais rápido, fazendo o mundo parecer em câmera lenta. Vi então as paredes da barreira chegando cada vez mais perto do meu corpo enquanto o pouco de Rancor que havia retornado, se tornando uma fina armadura em torno de mim.
Pela velocidade que a barreira diminuía e a armadura crescia, eu me tornaria purê antes que a mão de Jonas se fechasse completamente. Só consegui fechar os olhos e focar completamente na criação da armadura de uma peça, à prova de pressão, e torcer para que fosse mais resistente que a barreira.
Senti uma dor forte na cabeça e a minha respiração ficou pesada, meu cérebro tinha voltado à velocidade normal e uma tontura me dominava. Senti que a armadura tinha sido desfeita em névoa, e de alguma forma eu havia sobrevivido.
Quando abri os olhos, vi primeiro Jonas caído no chão com olhar de terror; ao lado dele o Cavaleiro de Prata apoiado em um joelho, com vários amassados na armadura; e ao meu lado, Haroldo, meu pai, ensanguentado e sorrindo.