A Ascensão do Dragão Prateado - Vol. 2 Capítulo 117
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- Vol. 2 Capítulo 117 - A última dança na escuridão
Uma escuridão profunda banhou a floresta, algo nada incomum para esta região. Porém estas trevas foram atravessadas pelos raios de luz prateados vindos da lua, que se pôs orgulhosamente no centro do céu estrelado.
Um longo suspiro escapou dos lábios de Hikari, enquanto ela se erguia e encarava friamente a pessoa presente do lado oposto.
‘Esse truque levou muito mais [Energia espiritual] do que pensei’
O [Caminhar das sombras] era uma das habilidades que ela mais usou durante suas missões de assassinato.
Sua função foi bastante literal, permitindo o uso de qualquer sombra ao redor para um movimento semelhante a um teletransporte. Foi isso que a kunoichi utilizou para transportar todos os convidados do banquete, incluindo Freud e Iris. O problema é que ela negligenciou diversas variáveis.
Para trazer Mutsuri consigo, a jovem precisou analisar a estrutura de todos na sua sombra, até encontrar uma compatível com seu alvo.
Isso sem contar a separação dos locais para o transporte deles.
‘Foi um experimento bem sucedido, mas isso cansa’
— Sentiu tanta saudade de mim que me trouxe para um lugar isolado na floresta? Que ousado. — A voz de Mutsuri sair de forma robótica fez o comentário soar estranhamente, mas sua intenção foi transmitida.
— Está personificando Silver agora? É algum sintoma estranho do seu TEPT? — questionou a kunoichi, com seus lábios se curvando enquanto ela levava uma mão até a bochecha — Patético.
Foram palavras simples, porém o tom presente nelas atingiu um nervo do homem. Seu corpo estremeceu violentamente como se estivesse no polo norte e suas pupilas dilataram.
Lamentável.
A voz de Silver ressoou novamente, e Mutsuri levou as mãos trêmulas até a máscara de metal, segurando as bordas do objeto como se fosse arrancá-lo. O rosto dele se contorceu e seus olhos demonstraram a pura agonia que sentiu.
‘Dói, isso queima!’
Foi como se ele tivesse retornado para aquele dia, a sensação de cada fibra de seu rosto abaixo do nariz fervendo.
— Silver… Silver… — Curvando seu corpo enquanto se contorcia, murmurando o nome do seu nêmesis sucessivamente.
As sobrancelhas de Hikari afundaram, presenciando uma reação tão intensa do homem.
‘Isso é muito mais do que um simples trauma’
Não era estranho, Mutsuri quase morreu durante o último encontro com o dragão prateado essa situação afetou ele.
De repente toda a tremedeira cessou, afogada em um mar de silêncio. Os braços do homem despencaram, antes dele ajustar sua postura.
‘Acho que prefiro o resmungo ominoso’
Kunais surgiram nas mãos do mascarado, e ele iniciou uma corrida na direção da garota.
Suas lâminas colidiram no centro e os olhos azuis-gelo vislumbraram o abismo presente nos olhos do inimigo.
A troca durou alguns meros segundos antes de ambos recuarem, levando as mãos até a cintura para iniciar a próxima rodada.
Clang!
Diversos projéteis se chocaram, preenchendo o silêncio da floresta com uma cacofonia ensurdecedora.
Curvando a cabeça, Mutsuri evitou uma estocada de Hikari, revidando na mesma moeda. A palma da kunoichi atingiu o pulso dele, catapultando seu braço para trás.
Utilizando o momentum causado pelo recuo, o homem lançou um chute crescente que empurrou a inimiga alguns passos atrás após ser bloqueado.
Impulsionando sua perna restante ele subiu ao ar, aproveitando de um movimento giratório para atacar a garota.
Dobrando os joelhos, Hikari esquivou do golpe esticando a mão e agarrando as roupas do homem. A jovem colocou força no braço, balançando o oponente como um martelo contra o chão.
A posição dele era perigosa, se ele colidisse com o chão assim no mínimo sua espinha poderia quebrar.
‘Só um segundo’
A kunoichi não iria manter o aperto em suas roupas até que Mutsuri alcançasse o chão, pois isso potencialmente prejudicaria ela também.
E assim a garota fez, sentindo o aperto dela se esvaindo, o homem esticou os braços cravando seus dedos na terra úmida e rotacionando seu corpo para atirar outro chute na direção da garota.
— Você… Era perfeita! — A voz furiosa dele atravessou a máscara, sentindo o golpe se conectar com a cintura da jovem.
Fixando sua postura, Hikari observou a posição animalesca de Mutsuri cuja expressão estava se contorcendo em pura fúria.
A face da jovem permaneceu fria, como se essa frase não fosse sobre ela.
— É tudo culpa dele… — As mãos do homem se arrastaram no solo, retirando uma grande quantidade de terra — Se ele não tivesse aparecido… TUDO ESTARIA COMO DEVERIA!
Para ele, Silver não só quase o matou, mas também destruiu seu sonho de utopia ao ‘manchar’ o Yoru perfeito.
— Mantenha suas desilusões para si! — As sobrancelhas da garota afundaram, enquanto ela dizia estas palavras com raiva fluindo em seu tom.
‘Mesmo longe dele ela mostra essa “sujeira”’
O Yoru não deveria expressar qualquer emoção, e era exatamente assim que Hikari agia quando ele a encontrou pela primeira vez. E isso também foi verdade nas próximas vezes.
Até Silver aparecer em um jantar.
Como ele ousa se aproximar do próximo Yoru? Mutsuri tinha esta frase na mente até o momento que teve a oportunidade de eliminar aquela sujeira de uma vez por todas.
Mas ele falhou.
Cessando seus pensamentos, o homem avançou outra vez na direção da kunoichi, recebendo um chute no rosto como boas vindas. Dobrando os joelhos, ele evitou o golpe, mirando na perna de apoio da jovem para levá-la ao chão.
Porém seu alvo já havia desaparecido, e o peso em suas costas mostrou onde estava.
Usando Mutsuri como apoio, Hikari saltou e simultaneamente atirou alguns projéteis na área desprotegida do inimigo.
O som de metais colidindo soou outra vez na floresta, e os rasgos na roupa do homem revelaram a armadura que usava por baixo do traje formal. Pisando com a perna esquerda, ele deslizou para parar sua investida.
— Por que tinha que ser você? — Ajustando seu corpo, Mutsuri tirou a roupa rasgada enquanto perguntava.
— O Yoru não deveria ser alguém silencioso? Não pode ficar quieto um segundo? — As sombras ao redor se contorceram, envolvendo completamente a figura da kunoichi.
Quando elas se retraíram, a jovem estava vestida em sua [Armadura real]. Um cachecol preto envolvia o pescoço da garota, combinando com sua roupa escura e acentuando os pontos frágeis da armadura com toques de roxo-escuro.
Exceto pelo cachecol, Mitsuri vestiu uma roupa de combate semelhante, no entanto a sua foi mergulhada no tema padrão de todos habitantes do vilarejo, o piche puro.
— Porque eu não sou digno de ser o Yoru. — Estas palavras saíram sem hesitação, como se fosse um fato inegável.
Você nunca vai se comparar a ‘ele’.
Foi o que o avô do homem disse quando sua versão de dez anos de idade expressou seu sonho de alcançar este posto. Desde aquele dia, essa ideia seguiu com ele e por isso seus ideais mudaram.
Se não puder me tornar o Yoru, vou servir o próximo sucessor perfeitamente.
Sentindo seu pulso sendo agarrado por Hikari após um golpe falhar, o homem teve o queixo golpeado pelo cotovelo da jovem, algo que não causou tanto dano além de empurrar sua cabeça.
Sem deixá-lo recuar, a garota socou o rosto dele diversas vezes com seu punho vibrando a cada contato com a máscara de metal.
O mundo girou diante dos olhos de Mutsuri, e ele segurou por instinto o punho da kunoichi quebrando a sequência de ataques. Recuperando o fôlego, o braço da jovem foi puxado para a esquerda enquanto o homem posicionou a mão restante no pescoço dela, dando uma joelhada na costela da inimiga.
Hikari se curvou inconscientemente em resposta à dor, mas não era hora de focar nisso. Usando a totalidade de seu braço para manter a perna do oponente suspensa, ela utilizou uma rasteira para derrubá-lo no chão.
O pisão que veio em seguida fez a nuca do oponente colidir forçadamente com o solo, e rachaduras se formaram como consequência.
Prestes a seguir com o ataque, ela pausou subitamente vendo o objeto que Mutsuri tinha na mão.
— Essa coisa inútil é importante para você? — Balançando a coroa que Hikari recebeu de presente, o homem perguntou com desdém.
A kunoichi franziu observando a ação, coisa que estava fazendo frequentemente desde o início deste confronto.
‘Ele recebeu aqueles golpes para pegar a coroa? Não isso seria estúpido’
Mas foi o que ele fez. E o motivo para isso era simples, Silver usava uma igual no banquete e o homem não gostou disso.
Antes dela dizer algo, o objeto já fora lançado ao ar. Seguindo a trajetória da coroa com os olhos, Hikari se concentrou em mover as sombras para amaciar a queda.
Infelizmente o inimigo não esperou ela fazê-lo, encaixando um soco no estômago dela, seguido de outro no rosto. No terceiro a jovem finalmente reagiu bloqueando com o pulso e defletindo o seguinte.
Mantendo a iniciativa, Mutsuri foi capaz de pressioná-la em uma disputa corpo-a-corpo.
Ambos tinham o mesmo estilo como base, o qual foi ensinado para todos combatentes da vila e isso deveria facilitar para Mutsuri, no entanto, a semelhança se limitava apenas a raiz.
Desviando um soco do oponente com a palma de sua mão, a kunoichi deu um passo atrás evitando uma kunai.
A lâmina passou alguns centímetros dos olhos de Hikari, e quando o homem percebeu que não havia a atingido, ele usou o mesmo braço fazendo o caminho inverso.
Um estalo soou quando a jovem segurou o pulso do oponente, com sua palma atingindo seu ombro com força.
O rosto de Mutsuri se contorceu sentindo seu osso se deslocando, ignorando a dor ele alcançou a bolsa em sua cintura, tirando uma lâmina e a balançando para afastar Hikari.
Com uma distância considerável entre eles, o homem respirou fundo antes de colocar seu ombro no lugar.
Enquanto isso, a kunoichi traçou o canto de seus lábios com o dedo, vendo algum sangue nele.
‘Estou ficando mole… E culpo Silver por isso’
Suas emoções estavam aparecendo muito mais durante as batalhas, completamente diferente da forma com a qual ela sempre lidou quando realizava as missões de assassinato entregues pelo Yoru.
Claro que, embora houvesse usado a palavra ‘culpar’ Hikari não odiava isso, pelo contrário, a jovem se sentiu muito mais livre agora comparado ao seu passado.
‘De qualquer forma, mesmo para alguém como ele, lidar com Natsumi e o ‘líder’ simultaneamente deve ser difícil. Então vamos terminar com isso logo’
Sombras se reuniram nas palmas da kunoichi, formando duas lâminas de pura escuridão. Somado a isso, a expressão e o corpo da jovem relaxaram, se concentrando totalmente no oponente.
Se Mutsuri fosse descrever a aparência atual de Hikari, ele diria ‘perfeito’.
A luz na floresta era escassa e, enquanto havia a iluminação da lua, esta não foi o suficiente para cobrir a figura da jovem. Assim sendo, as sombras obscureceram a imagem dela, dando visão apenas aos olhos azuis gelados que o encaravam como se ele não fosse nada.
O silêncio reinou no local, antes da figura de Hikari afundar nas sombras, desaparecendo completamente da vista de Mutsuri.
O desaparecimento da jovem fez alarmes soarem na mente do homem e, levando uma mão até a cintura, balançando a lâmina contra o espaço em suas costas.
Esta que encontrou apenas ar, antes de uma dor enorme se espalhar nas pernas dele. Os tendões de sua perna direita haviam sido cortados, o forçando a ajustar seu centro de gravidade.
Utilizando a perna restante, ele saltou o mais alto possível, rotacionando o corpo e lançando um chute machado na direção de algumas sombras que se moveram estranhamente.
Infelizmente para ele, o que saiu de lá não foi Hikari, mas sim um espinho, o qual atravessou sua panturrilha sem resistência.
Embora tivesse muitos motivos para tal, Mutsuri não gritou.
Com a perna ainda empalada, o homem se contorceu, tentando evitar os novos espinhos que surgiram do solo.
Muitas áreas de seu corpo foram perfuradas, mas seus esforços não foram em vão. Caso ele houvesse ficado parado, a morte era certa, no entanto, por mais que estivesse gravemente ferido, ainda estava vivo.
‘Ainda não… Não posso morrer antes de ver uma última vez…’
Todos os espinhos além daquele em sua perna se desfizeram, e antes do torso dele descer o espinho restante se moveu, lançando-o contra uma árvore próxima.
Seu sangue jorrou agora que estava livre dos objetos os quais o mantinham dentro de si. O corpo inteiro de Mutsuri agonizava em dor, mas ele se esforçou para manter uma expressão calma enquanto a figura de Hikari surgia à sua frente.
‘É isso! Essa é a última visão que eu tanto almejei’
A atmosfera da floresta estava mergulhada em escuridão, criada pelo dossel das árvores que permitia apenas alguns traços da luz da lua banharem o local. Em uma das áreas escuras, a kunoichi jazia de pé, olhando para a aparência ferida de seu oponente.
Seu rosto era frio, e não havia nenhum pingo de simpatia em seus olhos. Esticando a lâmina em sua mão, ela repousou a arma sobre o pescoço de Mutsuri, ameaçando tirar sua vida a qualquer instante.
Encarando a morte de frente, ele não sentiu medo. Pelo contrário, o homem estava feliz por estar perante a imagem mais próxima do ídolo o qual sempre admirou.
No entanto, o sorriso que tomou sua face despencou poucos segundos após.
‘Não! Não, não…’
Deixando a expressão congelada de lado, os lábios de Hikari se curvaram enquanto seus olhos expressavam o desdém que ela sentiu em relação ao oponente caído.
— Patético. — Repetindo a mesma palavra que havia dito no início da luta, a jovem prosseguiu, cortando o pescoço do inimigo sem nenhum remorso.
Diversas emoções foram refletidas nas pupilas de Mutsuri, mas nenhuma delas era a alegria que sentia a poucos segundos atrás.
Inapto a expressar sua angústia, ele pôde apenas olhar para Hikari enquanto sua vida lentamente se esvaía.
— Realmente achou que eu realizaria seu desejo estranho? Quão estúpido.
Os passos da kunoichi foi o único som restante na floresta, gradualmente desaparecendo na imensidão da floresta e deixando apenas o corpo sem vida de Mutsuri como prova de sua passagem no local.