A Ascensão do Dragão Prateado - Vol. 2 Capítulo 120
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- Vol. 2 Capítulo 120 - Orgulho Ferido: Revanche Marcada
— Fuuuh…
O simples ato de respirar trouxe uma sensação de queimação insuportável que começou através de suas costelas. A fonte dessa dor foi uma shinai colada no seu torso, a qual antes estava coberta de chamas prateadas. Ela poderia ter desviado do golpe se isso não colocasse sua sobrinha em perigo.
Seus olhos banhados em um preto profundo se encontraram com os dourados de seu oponente, os quais cintilavam constantemente em um prata e a mulher entendeu que ele pensou o mesmo.
Silver estava irritado.
Não com a interferência de Nikkō, mas com o fato de que isso deveria ter sido levado em conta quando criou esse plano.
A garota foi lançada abruptamente para o meio do nada, podendo apenas escutar sons de conflito vindos de seu lar, então o desespero dela em acabar com essa situação era compreensível.
‘Um aviso não teria feito o truque mas, eu no mínimo deveria ter pensado em uma forma de mantê-la longe por muito mais tempo’
E esse erro lhe custou uma batalha digna. Uma que não poderia ser terminada sem colocar a protegida de seu braço direito em risco.
Sangue deslizou pelo antebraço de Silver, fazendo o jovem se sentir desconfortável. A fonte foi a lâmina de Natsumi, que perfurou sua carne e parou apenas em seu osso. Pouco à frente de seu braço estava Nikkō, deixando evidente que ela estaria com sérios problemas se ele não tivesse interferido.
Suas costas também foram perfuradas pelos projéteis atirados pelo Yoru, os quais não se cravaram tão profundamente quanto a katana.
— Pode tirar essa coisa do meu braço? Tá começando a ficar desconfortável. — Um sorriso tomou o rosto do dragão prateado, enquanto ele dizia em um tom de sarcasmo.
— Vou tirar o meu quando você tirar o seu. — retrucou a mulher, apontando para a shinai com os olhos.
— No três? — Silver ofereceu, recebendo um aceno em resposta. — Um…
Como se fosse combinado, ambos não esperaram o fim da contagem, arrancando suas armas do corpo do oponente rapidamente. Ao mesmo tempo, a dupla recuou um passo, dando espaço para Nikkō, quem estava entre eles respirar.
Uma leve ardência se espalhou pelo corte no antebraço do jovem, enquanto sangue escorria da ferida. Soltando sua espada, ele pressionou a lesão, parando o sangramento com sua palma.
Similarmente, Natsumi apoiou a mão na área onde a shinai esteve um momento atrás. Não para estancar, afinal, o golpe causou uma queimadura mais do que qualquer outra coisa, mas ela fez isso para apaziguar a dor.
— Acredito que você já concluiu sua missão aqui. — O Yoru tentou manter o tom neutro de sempre, mas sua voz vacilou e um pouco de raiva surgiu nele.
— Acredita? Eu ‘acredito’ ter encontrado uma nova razão para continuar. — Silver alternou seu olhar entre o líder da vila e a mulher.
Essa frase fez a dupla tensionar novamente, se preparando para reiniciar o combate. Porém, antes de qualquer um deles responder, Nikkō se colocou entre o trio, levantando os punhos.
— S-se você quiser continuar, v-vai ter que passar por mim. — A garota gaguejou bastante, não por medo do da luta, mas pela possibilidade de lutar com um amigo.
Um longo suspiro escapou dos lábios de Silver e ele desistiu de seguir com a batalha. Mas isso não queria dizer que a luta foi perdida.
— Vamos resolver isso outra hora. — Olhando diretamente para Natsumi, o jovem proclamou.
— Com certeza! — Sem perder um segundo, a mulher concordou.
Se tornou uma questão de orgulho para ambos, dar um final digno para essa batalha. No entanto, da próxima vez, seria um duelo ao invés de dois contra um.
Com a ‘revanche’ marcada, o dragão prateado deu apenas um breve olhar na direção do Yoru antes de virar as costas e caminhar na direção da floresta.
E essa ação levantou uma pergunta: o que lhe deu coragem para virar as costas na frente do inimigo?
A primeira coisa que pesou em sua decisão foi justamente o orgulho de Natsumi. Embora fosse uma kunoichi, a mulher odiava esse tipo de ataque traiçoeiro e fazia isso apenas em último caso.
A segunda era que, no caso disso acontecer, Nikkō com certeza se colocaria no meio como acabara de fazer.
Esses fatos descartaram a interferência de Natsumi e, em relação ao Yoru, o segundo fato também entrou em jogo.
— Você não vem se despedir de Hikari e Iris? — Depois de dar alguns passos, Silver olhou por cima de seu ombro e perguntou para a pequena kunoichi.
Lançando um olhar hesitante na direção de sua tia, a garota recebeu um aceno, e suas pernas se moveram na direção do dragão prateado.
Enquanto a dupla desaparecia dentre as árvores, a mulher finalmente relaxou, embainhando sua katana e observando os arredores do quintal.
Chamar a situação atual do lugar de destruída era um eufemismo. Foi como se um desastre natural tivesse passado, deixando apenas resquícios do que o local já foi.
Haviam diversas crateras no solo criadas pelo ‘encontro’ entre Silver e Natsumi, as quais espalharam rachaduras em torno de si próprias, deixando até mesmo as áreas onde eles não batalharam destruídas.
Um leve cheiro de carne queimada alcançou seu nariz, e ela entendeu que vinha dela mesma.
‘Vai deixar uma marca… Tch!’
Os curandeiros da vila poderiam lidar com isso facilmente, mas eles com certeza cobrariam um preço absurdo.
‘Esses desgraçados gananciosos!’
Por serem os únicos proficientes nessa área, esse grupo abusou desse privilégio tanto quanto conseguiam e, apenas com ordens diretas do Yoru, isentavam o pagamento de alguns clientes.
Colocando isso de lado por enquanto, Natsumi se focou no seu líder, ou melhor, em sua irmã.
— O que você achou dele?
Ciente de que estavam sozinhas nesse momento, a figura do líder da vila se distorceu, retornando ao seu ‘eu’ natural.
O que tomou o lugar da aparência infantil anterior, foi a de uma mulher incrivelmente semelhante à própria Natsumi. A única grande diferença eram os fios brancos presentes em seus cabelos.
— Um oponente incrivelmente irritante. — ‘O’ Yoru comentou, com um leve tinge de raiva escapando em seu tom.
— Wow, isso é rico vindo de você. Para onde foi toda a coisa de ‘eu não tenho emoções’? — A espadachim brincou, recebendo um olhar vazio de sua gêmea. — De qualquer forma, você não deveria guardar rancor do seu futuro genro.
Os olhos de sua irmã se arregalaram ao escutar o comentário, e sua boca se abriu e fechou múltiplas vezes sem que ela dissesse nada.
— Impossível… — Descrença banhou suas palavras, e a mão da mulher foi levada ao queixo, como se buscasse se lembrar de algo.
— Não precisa pensar com tanta força, é muito possível. — Os lábios de Natsumi se curvaram, antes dela continuar — Isso aconteceu. O que me faz pensar, será que eu deveria começar a procurar minha cara metade.
O silêncio tomou o local e, após os primeiros segundos disso, a espadachim começou a brincar com os dedos.
— Você… Não vai tentar matar ele né? — Entrelaçando os dedos e reproduzindo a melhor expressão de uma criança mimada, ela seguiu — Eu ainda preciso lutar com ele.
— Não. Tentar matá-lo assim seria estúpido. — O rosto do Yoru retornou a neutralidade, enquanto sua figura voltava a ser a de um homem de meia idade.
— Preciso que você colete informações sobre ele.
— Informações do tipo? — Natsumi levantou uma sobrancelha por conta deste pedido abrupto.
— Tudo que conseguir.
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Os passos de duas pessoas ecoaram nitidamente na atmosfera silenciosa no local. Raios de luz iluminaram algumas áreas da floresta, esquentando um pouco o clima úmido no lugar.
— Você sabe para onde está indo? — perguntou Nikkō, finalmente encontrando as palavras para quebrar o gelo.
Efetivamente, quem estava liderando sua caminhada era Silver e, considerando as poucas vezes que ele veio para essa região, foi uma boa pergunta.
— Quando chegamos aqui já era tarde e o sol estava pendendo para a direção que estávamos caminhando… — Silver começou, enquanto avançavam pelos emaranhados de árvores e arbustos.
Entendendo que isso se tratava de uma lição para ela, a pequena kunoichi focou sua atenção.
— Se o sol se põe no oeste, isso quer dizer que…
— A cidade fica na direção oposta, a este. — A garota completou.
A lógica foi simples e qualquer um poderia pensar nisso mas, na maioria das vezes, as pessoas não prestavam tanta atenção a esse tipo de detalhe.
Porém, no caso de Nikkō, ser capaz de perceber esses detalhes era essencial.
— Dê atenção aos detalhes Nik, eles fazem a diferença no seu ramo.
— Nik? — O apelido foi uma surpresa para ela, não exatamente uma ruim mas, ainda uma surpresa.
— Você me chama de Silv, então eu te chamo de Nik. Não gostou? — Inclinando a cabeça, Silver perguntou curiosamente.
A garota foi rápida em negar a possibilidade, repetindo o apelido algumas vezes enquanto sorria.
— Aproveitando o entusiasmo, será que você pode tirar isso de mim? — Virando um pouco o corpo, o dragão prateado mostrou suas costas, na qual haviam algumas kunais presas.
Os olhos de Nikkō se arregalaram e, após Silver se sentar, ela começou a retirar cuidadosamente cada um dos projéteis.
Um ar gelado soprou no local escovando os cabelos pretos da garota, que se concentrou completamente na tarefa à sua frente. Suas sobrancelhas se juntaram enquanto ela removia outra lâmina e, para não perder o fio que havia puxado antes, seus lábios se partiram novamente.
— Por que vocês fizeram isso? — Não havia raiva alguma em seu tom, apenas uma vontade genuína de entender o motivo, somado a uma leve melancolia por ter sido deixada no escuro.
Nesse momento, o jovem hesitou em responder. Se isso fosse criar desconfiança dela em relação a vila ou não era irrelevante para ele mas, ao seu ver, era Hikari quem deveria fazer essa revelação.
‘Eu sou meio que o irmão legal, más notícias não são comigo’
Olhando por cima de seu ombro, Silver pôde ver a tristeza no rosto da garota, algo que amoleceu ele.
— Mutsuri te ameaçou. — No fim, ele acabou dizendo — Eu te mostraria a carta se não tivesse queimado ela.
Parando para pensar, ele destruiu a única evidência que poderia apoiar suas palavras. Mas Hikari talvez houvesse guardado a dela.
— Provavelmente era um blefe. Quer dizer, ele com certeza era estupido, mas acho que insanidade não fazia parte da mistura.
Silver não estava tentando consolá-lá, foram apenas fatos. Se Mutsuri realmente ferisse Nikkō, Natsumi teria sua cabeça em uma bandeja antes mesmo dele ou Hikari chegarem aqui.
— Blefe ou não, você tem que apoiar o que fala. Ele falou o que quis e pagou com a língua.
Isso era muito impiedoso? Não para o tipo de vida que eles viviam, aquele idiota implorou para morrer e conseguiu o que queria.
A floresta foi afogada em silêncio novamente, talvez por estar concentrada, Nikkō não falou de novo e Silver também não a apressou.
Sentindo o vento gelado, o jovem apreciou a floresta banhada por alguns escassos raios de luz e o farfalhar das árvores foi o único som que preencheu o ambiente, formando um contraste entre o breu assustador criado pelo dossel durante a noite, e o clima caloroso gerado pelo sol da manhã.
‘Acho que Hikari pode esperar um pouco, pelo menos até eu não ter nenhuma faca presa nas minhas costas’