A Ascensão do Dragão Prateado - Vol.2 Capítulo 66
Uma mulher de olhos, pele, cabelos e roupas banhados no mais puro branco que muitos ainda haviam de encontrar se fazia presente em um lugar silencioso.
Com os braços abertos como se para envolver o mundo em seu abraço, somente sua presença trouxe ao local um clima mais caloroso. O sorriso em seus lábios salientou a gentileza da sua expressão com o apoio da luz que banhava seu corpo.
Pureza.
Foi como nomearam a pintura, não pelo seu autor, mas sim, pelos poucos que puderam admirá-la. Vendo em pessoa, Silver achou a obra muito melhor que a descrição expressada na novel e achou realmente uma pena poucos terem a chance de vê-la, afinal, ela estava em uma igreja no meio do nada onde ninguém se dava ao trabalho de vir.
Bem, com exceção de uma pessoa…
— Puro…
Palavra essa que o jovem acreditou ser apropriado para descrever tanto a pintura quanto a garota ajoelhada em frente a mesma. Mitis Sanctus ou a futura santa que também fez parte do ‘harém’ de Seiji. Detalhe muito criticado pelos fãs, na verdade, ela foi a única amada o suficiente pelo público para existirem críticas sobre isso.
Ademais, a jovem foi, dentre todas outras apresentadas na obra, sugerida como par romântico de Silver Crawford embora suas personalidades fossem completamente diferentes.
Enquanto o espadachim pregava pela ‘indiferença do forte’ onde ele só se incomodaria em intervir caso o lado fraco fosse um dos seus, ou melhor, parafraseando sua própria afirmação na novel, alguém que “deixaria Mari triste se acabasse ferido”.
Mitis apesar de viver em um mundo onde somente o forte era respeitado, ajudava qualquer pessoa que precisasse indiferente a força, classe ou afiliação. Esta gentileza atraiu os [Paladinos] até ela e o atual Silver pretendia deixar assim, não só pelos possíveis subordinados mas porque ele gostava da sua personalidade.
‘Me lembra muito Selena e seu código…’
A diferença entre seus ideais causou diversos conflitos entre os dois, pois ambos tinham muita confiança nas próprias crenças e não mudariam de ideia facilmente. Por mais que tais brigas não o tenham impedido de salvá-la em muitas ocasiões.
— O lugar é mais simples do que eu imaginei.
Naturalmente quando se pensa no fato da pintura ter sido descrita no livro, seria normal o lugar onde a mesma estava presente ganhar algum destaque, porém a igreja não foi. Por conta disso, a procura pela garota se estendeu demais, tendo em vista que a pintura era o único ponto de referência útil para encontrá-la.
O lugar por si só era simples, sem qualquer banco ou algo levemente semelhante a isso. As paredes foram pintadas com um azul claro e seus vitrais estavam isentos de pinturas, como se deixasse a entender que somente a pintura da mulher fosse o bastante para ele.
Havia uma pequena escadaria de não mais que três degraus a alguns metros de distância da arte, onde uma jovem admirava cada centímetro possível da obra.
Ela tinha cabelos azuis límpidos, que estavam a poucos tons do prata de Silver. Talvez os comentários do jovem tenham chamado sua atenção pois ela se virou revelando um par de olhos redondos de mesma cor, embora mais profundos que seu cabelo.
Sua pele levemente pálida somado ao olhar inocente de seu rosto tornou o clima de pureza, já presente no local, ainda mais aparente.
‘Estou começando a me sentir mal por trazê-la para o meu lado’
— Olá, eu me chamo Mitis Sanctus, e o senhor? — Seus pensamentos interrompidos pela apresentação da jovem.
— Eu sou Silver e temos a mesma idade, não precisa me chamar de senhor — respondeu o dragão prateado, se sentindo estranho pelo quão vulnerável ela estava.
Era normal ficar desconfiado ou apreensivo se encontrasse um estranho em um lugar desolado, ainda mais por ele ter afirmado saber sua idade. Porém ela só o olhou com curiosidade, sem se importar nenhum pouco com a situação geral.
— Ouvi dizer que você gosta de ajudar as pessoas — comentou o jovem.
Silver leu os relatórios entregues por Hikari e conversou com alguns habitantes da região, que ficaram desconfiados das intenções do garoto mas, um pouco de persuasão e dinheiro resolveram o problema.
‘Mais uma razão para não ser gentil com qualquer um… Gananciosos de merda’
Não que ele pudesse dizer muito, afinal, o jovem veio pelos poderes dela.
— E eu vou conheço um lugar que precisa da sua ajuda. Quer vir comigo e ver com seus próprios olhos? — Uma proposta nada tentadora para outros, mas Silver tinha confiança de que ela aceitaria.
— Claro, vamos lá! — E, como ele esperou, Mitis aceitou sem hesitação.
— Sigh, você não deveria confiar em qualquer um facilmente — aconselhou sinceramente Silver — E se eu fosse mau?
Esse conselho trouxe uma expressão curiosa ao rosto da jovem enquanto ela olhou profundamente para o dragão prateado.
— Silv é uma pessoa ruim? — perguntou a santa, colocando um dedo no queixo e inclinando a cabeça.
— Depende de para quem você pergunta.
— Eu não acho que Silv parece mau, no entanto…
Silver tinha certeza que ela estava falando sério e, segurando a vontade de suspirar, ele caminhou até a entrada antes de perceber que Mitis ainda estava parada no mesmo ponto pensando em algo.
— Você vem? — O jovem perguntou, a despertando de seus pensamentos.
Rapidamente alcançando seu mais novo… Amigo? A garota o seguiu para o lugar que precisava dela.
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Caminhando por uma rua bastante viva, duas pessoas fizeram seu caminho através de diversas construções, com várias delas estando em obras.
Ambos eram jovens, um homem de cabelos prateados e uma mulher com cabelos azuis bem próximos do prata. Durante a caminhada da dupla, eles receberam olhares fervorosos dos moradores nos quais Mitis viu imensa admiração enquanto Silver ignorou.
A garota observou curiosamente todos os lugares atravessados, perguntando e apontando para tudo que nunca viu antes, fascinada por cada pequena coisa, desde especiarias do local até construções como bares e etc.
Um sorriso subiu aos lábios do jovem sem que ele percebesse. A garota era bastante expressiva e inocente, trazendo memórias de quando Akame ainda era nova.
A situação só parou após escutarem o ronco do estômago dela, fazendo eles entrarem no café mais próximo e Silver deixá-la momentaneamente sentada em uma das mesas para falar com o cozinheiro.
Aproveitando este tempo ela observou o café. O lugar era bastante simples, cada mesa tinha quatro cadeiras e o clima era bastante acolhedor. Haviam algumas famílias sentadas aparentemente já tendo feito o próprio pedido e uma destas, parecia discutir algo relacionado a ela pois eles olhavam muitas vezes para sua direção antes de voltar a discutir.
A mulher, supostamente a mãe, chacoalhou a cabeça negando algo para sua filha, esta que se virou para o suposto pai com uma expressão penosa, fazendo o homem ceder e assentir em confirmação.
Mitis achou a interação divertida e imaginou se era assim que famílias normais agiam. No meio de seus pensamentos, ela não percebeu a criança se aproximando até que a mesma puxou levemente suas mangas.
A menina tinha cabelos e olhos castanhos e quando chamou a atenção da santa, ela estendeu uma mão fechada esperando a jovem aceitar o que havia lá.
Respondendo às expectativas da criança, a santa aceitou sem hesitação, ganhando um sorriso brilhante com alguns dos dentes faltando.
— Mamãe disse para não incomodar uma amiga do anjo, mas papai disse que se fosse um presente estaria tudo bem — Dando mais um sorriso e sem esperar a resposta de Mitis, ela se juntou aos seus pais e partiu depois de acenar para a santa.
Na palma de sua mão agora estava dois anéis feitos de flores que, embora não fosse perfeito, deixou claro por alguns detalhes o esforço colocado em sua criação.
— Anjo…?
Sem dar tempo dela pensar profundamente sobre, Silver voltou para a mesa e franziu vendo o presente.
— Eu não acabei de te falar sobre confiar em estranhos?
Era estranho para ele lidar com Mitis, especialmente quando Hana e Raymond sempre foram desconfiados de pessoas outras que ele e algumas poucas exceções.
— Silv é um anjo? — Ignorando a pergunta do dragão prateado, ela questionou ainda confusa sobre as palavras da criança.
Silver não respondeu, esperando a garota esclarecer o motivo da pergunta.
— Aquela menininha disse algo sobre um anjo, e é minha primeira vez aqui então…
O humor dele ficou meio estranho, afinal, a diferença entre ser chamado de demônio prateado e anjo era enorme. Não que ele se importasse com esses apelidos mesmo sendo incômodos, mas o contraste foi grande o suficiente para fazê-lo estranhar isso.
Ele acabou por não responder a pergunta dela e, ao invés, questionando sobre o que ela achou do lugar como um todo.
A resposta não foi longe do esperado, onde a santa achou os habitantes gentis e unidos sem nem mesmo ter interagido com alguém fora aquela criança. Talvez mesmo se ela visse como funcionava na época que Fenrir, ou melhor, Raymond reinou ela ainda acreditaria na bondade deles.
Enquanto Mitis contava entusiasmada suas experiências na cidade, o garçom trouxe o pedido que Silver fizera diretamente com o cozinheiro.
Na mesa, foram colocados um prato de panqueca e um copo de suco para a santa e uma xícara com café frente ao dragão prateado.
Por fim, o jovem assistiu a garota comer e contar histórias sobre seu tempo na igreja enquanto tomava lentamente o café e um sorriso subiu ao seu rosto.
‘Não é tão ruim assim relaxar um pouco…’
Infelizmente, seu descanso estava para terminar graças a certo dragão.