A Ascensão do Dragão Prateado - Vol.2 Capítulo 95
Abrindo os olhos, Mari se debateu brevemente para se acostumar com a luz que o atingiu abruptamente e, quando o fez, levantou imediatamente a espada contra a pessoa ao seu lado.
Encarando a ponta da lâmina apontada para si, Kaen permaneceu indiferente.
— Quantas vezes… Você já se reconstruiu? — Fazendo sua pergunta de rotina, o jovem esperou pacientemente a resposta da espadachim que tinha uma expressão confusa no rosto.
— Uhh… Não sei?
Com essa resposta ele perdeu todo interesse em Mari, voltando seus olhos para o ambiente em que estava.
O lugar tinha paredes altas que se estendiam além do alcance da vista. Elas eram feitas de um material comum, mas algumas partes estavam cobertas por plantas, criando um padrão único.
O chão seguiu o mesmo estilo, apenas com uma parcial grama baixa nublando a visão completa do solo.
[Duplas posicionadas, seguindo com a segunda fase do torneio…]
[Para todos participantes, a pessoa ao seu lado faz parte oficialmente da sua equipe, portanto, caso ambos sejam derrotados o duo é desclassificado]
[Sintam-se livres para lutar entre si ou não estando cientes deste fato. O objetivo final é a eliminação de um certo número de duplas]
Terminando a explicação, a voz não voltou mais a falar e Mari abaixou sua espada. Eles eram aliados agora, então seria estúpido lutar contra ele.
Kaen por outro lado já havia começado a caminhar para encontrar algum oponente, encontrando um cruzamento de três caminhos diferentes dentre os quais ele escolheu sem pensar demais.
— Ei! Espere por mim!
No meio de sua corrida para alcançar o jovem, a espadachim ouviu um ‘click’ vindo do chão, e de repente as paredes se abriram revelando diversas balestras nada amigáveis apontadas para frente.
Mari imediatamente começou a correr mais rápido, sendo seguida pelos disparos das armas. Pisando com a perna direita, ela balançou sua espada partindo ao meio uma flecha vinda em sua direção antes de decisivamente se impulsionar usando a perna restante, evitando outras flechas.
Enquanto a jovem corria, Kaen marchava com sua guarda levantada, desviando de qualquer flecha que se aproximasse com facilidade.
Suor deslizou pela testa de Mari enquanto ela recuperava a respiração após todo o esforço que fez para atravessar o corredor.
— Fuu… Quem teve essa ideia? — Foi uma decisão traiçoeira colocar este tipo de armadilha abaixo da grama e, aparentemente, muito eficiente.
Levantando a cabeça, ela esperou no mínimo uma reclamação do seu aliado, mas encontrou ele a metros de distância virando outro cruzamento.
Rangendo os dentes, a garota caminhou rapidamente atrás dele olhando múltiplas vezes para o chão no caminho.
— Quantas vezes você se reconstruiu?
Seguindo atrás de Kaen, esta foi a primeira coisa que a espadachim escutou antes de se deparar com a visão do jovem frente a dois inimigos.
— Esse cara é maluco? Ei, acaba com ele!
— Por favor, não me dê ordens assim!
A dupla tinha cabelos castanhos embora fosse aparente que eles não tinham nenhum parentesco ou mesmo eram da mesma academia.
Independente de suas reclamações, o mais baixo entre eles avançou contra Kaen partindo o chakram em sua mão, para formar algo semelhante a um soco inglês.
O seu alvo apenas manteve sua posição, levantando uma guarda com a mão esquerda aberta e a direita fechada.
Tendo entrado na área de alcance de sua arma, o jovem de cabelos castanhos atacou sem pensar duas vezes.
‘Ele não é idiota o suficiente para socar uma faca’
Esse era seu pensamento ao atacar diretamente, e ele não estava totalmente errado.
Ao invés de esquivar, Kaen atirou sua palma esquerda contra o topo da mão do inimigo mudando a direção do golpe e contra-atacando com o punho direito.
Sentindo lágrimas se juntarem em seus olhos e sangue escorrendo pelo seu nariz, o jovem levou um tempo para se recuperar enquanto seu oponente apenas esperou pacientemente.
Recuperado, ele posicionou a perna esquerda a frente se movendo cautelosamente ao redor de seu inimigo
Durante a ronda, ele moveu seu corpo múltiplas vezes na direção do oponente, fintando um ataque que nunca veio.
— Dá pra terminar logo isso?! — Insatisfeito com a situação, o aliado do jovem reclamou, consequentemente quebrando a concentração do mesmo.
— Fica quieto por…! — Desviando sua atenção por um instante, ele retornou apenas para ver o punho direito do oponente se aproximar, o fazendo erguer os braços por instinto.
O tempo pareceu congelar enquanto esperava o golpe chegar ao seu antebraço, porém, o impacto sentido veio do estômago, forçando-o a se curvar para apaziguar a dor sentida.
Agarrando o cabelo do inimigo, Kaen o puxou contra seu joelho atingindo o rosto dele em cheio, fazendo sangue e fragmentos de dentes subirem ao ar.
Finalmente percebendo a situação lamentável na qual seu aliado estava, o jovem mais alto decidiu interferir e avançou sacando um machado de mão única.
Levantando a arma, ele hesitou em iniciar seu assalto pois Kaen manteve o aperto sobre o cabelo do primeiro a avançar, usando o garoto como escudo. Tal hesitação abriu uma brecha para o oponente empurrar o refém em sua direção, cruzando pelo lado oposto enquanto atirava diversos socos contra seu torso.
Um alto ‘crack’ ressoou, seguido por uma súbita pressão na parte de trás de seu joelho, forçando-o a se ajoelhar. A última visão que teve foi o rosto indiferente de Kaen, antes de voltar à própria sala individual.
Com o rosto manchado de sangue, o oponente restante uniu as partes do chakram e, junto a um grito de guerra, lançou contra o jovem antes de avançar diretamente.
Curvando o corpo para a direita, Kaen evitou a lâmina simultaneamente dando um pontapé na perna de apoio do inimigo, o qual estava desesperado demais para evitar o golpe.
— Ahh… Aah — Balbuciando palavras incompreensíveis graças a dor ou a falta de alguns dentes, o garoto de cabelos castanhos se debateu para manter o equilíbrio, como o pontapé anterior fez sua perna virar para um ângulo estranho.
Lágrimas encheram seus olhos que refletiam sua vontade de viver. Ele não iria morrer, isso era um fato, mas suas emoções superaram toda lógica que sua mente poderia processar.
Olhando uma última vez para seu ‘assassino’, ele encontrou apenas pura indiferença substituindo o desespero por raiva.
Crack!
Infelizmente a luta já havia sido decidida, e nada poderia alterar o resultado.
Kaen não poupou nem mais um segundo com o oponente caído, fazendo seu caminho dentre o labirinto seguido por Mari, quem tinha os olhos brilhando pela demonstração anterior.
— Ei, você é um [Guerreiro] também? — Não foi a primeira vez que ela fez essa pergunta, a espadachim continuou perguntando desde o incidente anterior, sendo ignorada completamente pelo jovem.
Desta vez não foi diferente mas, conforme a dupla se aproximou de uma encruzilhada ambos cessaram a caminhada e Mari apoiou a mão direita no cabo da espada. O silêncio que se instaurou fez o ombro dela se tensionar, aguardando a batalha que viria.
Um momento se passou, e a garota desembainhou a lâmina cortando contra o borrão que se aproximava. O som de aço colidindo soou e ela deu vários passos atrás com o braço ainda trêmulo pelo impacto.
— Parece que encontramos uns bem sensíveis — Do lado oposto, outro inimigo surgiu exibindo uma expressão desdenhosa.
Karen se manteve em silêncio e sua pergunta habitual não foi feita. Isso aconteceu porque ele viu no fundo dos olhos de seu oponente, uma grande semelhança com os remanescentes de sua cidade. O olhar de quem há muito desistiu de alcançar algo mais.
— Você é bem entediante, né? — Amarrando seu cabelo longo em um coque, o inimigo vestiu luvas pretas antes de continuar — Tanto faz, vai ser melhor assim.
❂❂❂
— Angelo Gonçalves — proclamou o jovem, fazendo Mari levantar uma sobrancelha antes de sorrir.
— Mari. Fumiko Mari.
Usando o tempo das apresentações para fixar sua postura, a garota observou melhor o seu adversário.
Seus cabelos eram pretos e levemente arrepiados, vestindo uma armadura pesada e empunhando uma espada de duas mãos tão do tamanho de um braço.
Comparando a vestimenta dele consigo mesma, a espadachim se sentiu meio envergonhada. Era como comparar uma pessoa indo a guerra com alguém passeando no parque.
‘Ele é bem ágil mesmo usando essa armadura mas, não é apenas a velocidade que importa, é a astúcia que faz a diferença’
Colocando os ensinamentos de Honda em prática, a jovem se preparou, não para avançar, mas para contra-atacar.
Entendendo as intenções de seu oponente, Angelo atacou primeiro com um golpe vertical colocando todo peso do corpo nele.
Reagindo ao avanço dele, a garota se preparou para aparar o corte antes de lembrar da troca anterior, movendo seu corpo para fora do caminho da lâmina.
Fragmentos do solo voaram devido a força bruta contida no ataque.
Acreditando que teria uma vantagem pela arma ter cravado no chão, mas seus instintos clamaram para que ela recuasse.
Acompanhado pelos pedaços do solo, a lâmina subiu, passando rente a Mari, que deu alguns passos atrás sem perder seu ritmo.
‘Ele é um amador’
No quesito técnica, a destruição causada pelo seu impulso e os primeiros três golpes feitos pelo oponente indicavam que ele havia usado apenas força bruta para isso.
A garota percebeu que teria até saído muito pior se o adversário tivesse treinamento formal em esgrima. Isso a deixou grata, mas também um pouco ofendida.
O choque entre as lâminas não ecoou mais, mas em vez disso, o estrondo do solo sendo despedaçado encheu o ambiente à medida que Mari e Angelo entravam em uma dança mortal.
Navegando dentre dezenas, senão centenas de golpes, um suave click trouxe a oportunidade pela qual a garota ansiava.
Assim como antes, as paredes se partiram revelando diversas balestras carregadas apontando para o centro do lugar. Avançando junto com o disparar das flechas, Mari fez o jovem preparar um corte vertical, antes de apenas cruzar até as costas dele sem tentar atacar.
Surpreso, Angelo estava prestes a segui-la quando percebeu a onda de flechas vindo em sua direção. Usando a lâmina já levantada para se defender, ele deixou sua retaguarda completamente vulnerável ao ataque da espadachim.
‘Ah! Merda!’
O inimigo percebeu isso mas, dada a periculosidade dos projéteis em sua direção, ele escolheu confiar em sua armadura.
Firmando seu passo, Mari esperou algumas flechas vindas do outro lado mas viu apenas a luta de Kaen e nada mais.
Voltando para seu oponente, seus olhos travaram nas aberturas da armadura do adversário.
— [Estilo Shura – Demônio de seis braços] — Juntando o ar em seu pulmão, Mari performou seis cortes que visavam as frestas feitas para a movimentação de Angelo.
Se recuperando das flechas, o jovem colocou sua força nos braços, balançando sua espada em uma meia lua na direção da espadachim.
Embora o movimento fez com que alguns ataques perdessem o alvo, ele não impediu o dano de ser feito em um de seus cotovelos e ambas pernas.
Consequentemente, o ataque de Angelo foi ainda mais fácil de esquivar, como o garoto também estava fazendo um grande esforço para se manter de pé.
‘Argh! Eu deveria ter escutado Borges sobre a esgrima!’
Foi uma falha que poderia ter sido remediada com treinamento e ele sabia disso mas, não importa o quanto estivesse arrependido, o tempo não voltaria.
‘Mas, mesmo assim eu não vou perder, não aqui!’
Reforçando sua resolução, o jovem permaneceu de pé por mais que seu corpo clamava para ele se ajoelhar.
— Um último avanço? — Angelo perguntou, sabendo que não duraria muito se a luta se estendesse.
— Um último avanço — Mesmo em vantagem, Mari concedeu esse pedido ao adversário.
Não teve nenhum motivo além de puro capricho. Ao seu ver uma batalha entre espadachins dizia respeito à sua honra o que demandava, no mínimo, dar uma derrota digna ao adversário.
Tum Tum!
A dupla escutou as batidas do próprio coração soando em suas orelhas, e firmando o aperto nas lâminas, eles se prepararam para dar um ponto final a batalha.
O solo se partiu quando Angelo usou toda sua força restante para avançar, balançando sua arma em uma meia lua contra a espadachim.
Mari também não perdeu tempo, seguindo logo após enquanto se preparava para usar uma de suas técnicas.
— [Estilo Shura – Demônio de oito braços] — Desta vez, performando oito golpes, a jovem visou a própria lâmina do adversário desejando vencê-lo em seu próprio jogo.
Um estrondo soou e os braços do garoto foram arrastados para trás e o rosto dele expressou decepção com seu corpo cedendo aos ferimentos anteriores.
Angelo olhou brevemente para a espada cravada a alguns metros de si. Embora desejasse poder correr e empunhá-la novamente, tanto seus braços quanto suas pernas não respondiam. Com um suspiro, ele aceitou sua derrota.
‘Se eu só tivesse treinado com a espada como Borges me disse várias vezes, teria sido eu de pé ali’
— Foi uma boa luta! — Posicionando sua espada no pescoço do oponente, Mari sorriu, encerrando a batalha.
— Eu serei o vencedor na próxima — Olhando diretamente nos olhos da espadachim ele declarou, apontando ela como seu objetivo inicial.
— Então, até a próxima.
Com um corte limpo, Mari eliminou Angelo sem hesitar.
‘Caramba, ele era realmente forte. Meus braços estão dormentes até agora’
Movendo os braços para se livrar da dormência neles, a jovem finalmente se lembrou de seu aliado e, virando o rosto ela viu que sua luta também havia sido decidida.