A Herdeira do Gelo - Capítulo 1
Heredem, uma terra fria e coberta de neve, onde geralmente no inverno era normal de se acontecer nevascas ou coisas do tipo, a montanha de Heredem por sua vez era o lugar mais frio de todo o reino, muitos exploradores morreram tentando descobrir o que havia no topo da montanha, coisa que até então é desconhecida por todos.
Em um lugar distante, de tudo e todos, vivia uma garota no meio de um Bosque, ela desconhecia o que havia no mundo a fora além do Bosque, mal sabia ela o que o futuro lhe aguardava.
O Inverno veio mais cedo desta vez, Yara mal teve tempo para se preparar, ainda assim ela precisava sair para pegar um pouco de lenha para poder lidar com o frio que estava por vir.
Yara era uma jovem de em média 1,69 de altura, com um cabelo curto e de cor castanha que batia em suas orelhas, acompanhado de lindos pares de olhos também castanhos. Apesar de ser uma garota, ela podia ser facilmente confundida com um garoto.
— Uaaaah! — se espreguiçou a garota que acabara de se levantar da cama. — Vamos lá então, o dia já começou. Tenho muito a se fazer hoje.
Abrindo as cortinas de sua janela, uma intensa ventania fora possível se ver entrando em sua casa, o dia estava bem frio, assim como todos os outros, mas isso não era problema para quem já estava acostumada com o frio, e mais uma vez, Yara acordou pensando em sua mãe. Com um mundo tão grande, aonde ela poderia estar nesse momento?
A forte brisa batia em seus cabelos, os fazendo voar ao vento junto das cortinas de sua casa, enquanto sua mente se perdia em pensamentos. Naquele momento se lembrou dos momentos felizes da qual passara com sua avó algum dia naquele lugar, momentos que para ela nunca poderiam ser substituídos por quaisquer outros.
— Hoje fazem exatos 3 anos desde que não estamos mais juntas… Me lembro que quando pequena meu sonho era conhecer o mundo, mas agora… Agora esse lugar é tudo o que me faz lembrar de você, eu não quero ir embora daqui nunca, quero estar nesse lugar até envelhecer.
Ela abriu um pequeno sorriso no rosto.
“Vovó, por que é que não posso brincar com outras crianças como eu?”, perguntou a pequena, quando aos seus 6 anos de idade.
— Você não é como elas. É diferente, especial.
— Mas eu quero ir pra fora, quero conhecer o mundo e conhecer novas pessoas. Eu não quero viver aqui para sempre — deu os ombros, irritada.
— Seja paciente. Aquele que tiver paciência terá o que deseja.
— Paciência… Tenho pena daquela criança que ainda sonha com a sua liberdade, imagino eu se ela ainda pensaria da mesma forma nos dias de hoje — disse pensativa, se referindo ao seu eu do passado.
“É melhor eu fechar a janela antes que pegue um resfriado”, pensou, em seguida fechando a janela e se preparando para sair.
Yara pegou o seu traje de inverno e saiu para fora para colher um pouco de lenha, como geralmente fazia nos outros dias.
Logo de cara não pode deixar de notar que a neve estava muito mais intensa do que de costume, o que a fez sentir um mal pressentimento quanto a isso, talvez uma nevasca estivesse para vir e ela precisaria se preparar para o frio congelante o quanto antes.
Quando enfim começou a pegar lenha, sentiu uma sensação estranha de que algo a estivesse observando.
— Hãã…? O que? — disse a garota olhando atentamente ao seu redor. — Ah, esquece. Não deve ter sido nada.
Continuou a pegar lenha, até que… Mais uma vez pode sentir algo, porém desta vez, além da sensação de que tivesse alguém a observando, ela pode ver um arbusto a sua direita se mexendo, então a garota logo gritou:
— Ei! Quem está aí?!
Ela se aproximou cuidadosamente, desviando dos pequenos galhos de árvore que havia no chão, tentando fazer o mínimo de barulho possível.
— Eu não irei te machucar, apenas me diga o que você quer e eu poderei te ajudar. Vamos, não tenha medo.
Torcendo para que não fosse um urso, ela se aproximou do arbusto e se inclinou lentamente para ver o que havia lá, sendo surpreendida por uma pequena criatura que logo gritou assustada:
— AHHHH! — gritou o pequeno assustado, este na qual possuía uma pele azulada com orelhas grandes e pontudas, juntamente de roupas simples e desgastadas.
Como reação a garota deu um pulo para trás, também gritando em um susto repentino, dando mais outro susto na criatura.
Em seguida, eles apenas se encararam por alguns segundos. Segundos que pareceram minutos. Confuso e sem entender do porquê a garota estava gritando, a criatura se recuperando do susto deixou o seu medo de lado e então perguntou:
— Espere, por que está gritando? Você não vai me machucar? Não é isso o que os humanos fazem?
Estava em uma postura defensiva, porém quando percebeu que a garota não apresentava nenhuma ameaça, logo tomou uma postura mais segura.
— Um momento… Você fala?! Essa é a primeira vez que converso com alguém em anos! — respondeu ela, claramente empolgada.
— Eu sabia que os humanos podiam ser assustadores, mas isso já é demais pra mim…
Ainda incerta se deveria ou não estar conversando com um estranho que acabara de conhecer em um momento tão repentino, Yara correu até a árvore mais próxima e se colocou atrás dela.
— Como sei que você não é perigoso? Minha avó me disse para nunca conversar com outra pessoa!
— Eu iria dizer a mesma coisa! Mas se ainda não percebeu, já estamos a alguns segundos nos encarando e nada aconteceu. Já reparou também que você consegue ser mais assustadora do que eu?
De trás das árvores, a menina parecia um animal selvagem prestes a atacar, esperando pelo momento certo. ,
— Ora corta essa, eu não sou nem um pouco assustadora, viu? — Yara estendeu os seus braços na tentativa de que pudesse transmitir alguma confiança. — Por acaso eu tenho cara de quem iria querer te machucar?
— Sim…? Pra mim você me parece bem suspeita — respondeu ele de forma cuidadosa. — Isso é exatamente o que um humano suspeito diria.
— Por que ainda estamos nisso? Não seja bobo! Como eu posso parecer suspeita se foi você quem apareceu na minha casa de repente?!
— Ah… Tem razão, mas mesmo assim… pode me prometer que não irá me machucar? — pediu o duende, ainda querendo uma garantia de que não fosse ferido.
Era visível que o mesmo carregava muitos traumas do passado, as pessoas são realmente cruéis. Era o que sua avó dizia.
— Eu dou a minha palavra que não — prometeu, estendendo sua mão para o mesmo.
— Verdade…?
— Verdade.
Confiante, o Duende depois de muita hesitação tocou em sua mão.
— Humm… Você é um duende, não é? Estou certa? Não sabia que os duendes eram tão pequenos assim, você é a primeira pessoa que me aparece nesse bosque durante muito tempo. Bem, eu me chamo Yara, e você? Como se chama pequeno?
— A-Arak, eu me chamo Arak! — disse ele já se recuperando do susto.
— Poderia me dizer o porquê de estar me observando?
Yara o encarava como se o julgasse de dentro para fora. Não era a sua intenção o deixar assustado, mas era estranho pensar que havia alguém a observando.
— Algo muito ruim está para acontecer em nosso reino, Maíbi me pediu para me encontrar com você, segundo ela você é a única capaz de nos salvar dessa tragédia, mas eu estava com medo… nunca vi outro humano antes a não ser Maíbi e sua mãe — falou Arak cabisbaixo.
Isso explicaria a neve tão intensa. Certamente algo estava acontecendo e ela precisava descobrir o que era urgentemente.
— Os humanos podem ser assustadores às vezes, eles me tiraram tudo o que tinha uma vez, mas Maíbi me salvou… — Ele continuava.
— Não se preocupe, Arak, você está seguro comigo. Não deixarei que mal algum ocorra a você.
Estava feliz em poder conhecer outras pessoas, ainda mais alguém que não se tratava de um humano, mas com isso também vinham os medos e inseguranças. E se não pudesse cumprir suas promessas?
— Mas… Espere! Você chegou a conhecer minha mãe? Sabe me dizer onde está ela nesse momento? Me diga, por favor!… Aonde ela está?! Eu preciso saber onde ela está, eu… Eu tenho que saber! — suplicou Yara enquanto segurava Arak e o sacudia sobre seus braços.
— Ei! Eu não sei! Quer me colocar no chão, por favor? Isso está me dando enjoo — reclamou Arak.
Percebendo o que estava fazendo, ela se desculpou e o colocou de volta no chão com cuidado, imaginando que se o apertasse demais poderia o quebrar sem querer. Sua aparência era frágil e inofensiva, parecia que a qualquer momento poderia se quebrar.
— Esses humanos são tão estranhos…
Arak não conseguia os compreender, afinal, ele não conhecera muitos outros humanos.
— Mas… Como ela era?! Me fala, ela era bonita pelo menos? — Yara voltou a perguntar.
— Pra ser sincero ela era a sua cara — comentou ele, deixando vazar uma pequena risada.
— Ei!… Por que está rindo?!
— Esqueça isso. Olha, eu sinto muito, mas eu não posso responder todas as suas perguntas, se tem alguém que pode te dar respostas agora é Maíbi. Vamos, eu te levo até lá, é logo depois do rio.
Ele tomou a frente, dando passos lentos e curtos. Suas pernas não eram as melhores para caminhar.
— Onde é isso? O quão longe é? — quis saber.
— Não tão longe daqui. Não se preocupe, eu sei um atalho. Devemos chegar dentre alguns minutos.
— Calma lá, me espere! — gritou Yara, logo deixando de lado o que estava fazendo para ir atrás do duende. — Eu não sei, mas não pode ser perigoso? Minha avó me contava para nunca ir tão longe de nossa casa.
“Yara, nunca vá até tão longe do bosque. Os perigos que lhe aguardam lá fora estão além de tudo o que pode imaginar”, lembrou-se do que sua avó disse quando ainda era uma criança.
De todas as coisas que advertia, não ir tão longe para além do bosque era a principal delas. Ela sempre a lembrava todas as vezes de que ia para fora brincar.
Yara era uma garota muito teimosa e bastante curiosa, às vezes a sua curiosidade a fazia fazer coisas da qual sua avó nunca a permitira que fizesse. Certo dia, ela se afastou do bosque, e então foi atacada por um grande urso, por sorte, sua avó ouviu os seus gritos e logo foi até o local, a salvando do urso a tempo.
— Eu falei que não era para você se afastar do bosque! Por que não me ouviu? Se eu não tivesse chegado a tempo, você poderia ter se machucado! Teve sorte de não ter se ferido!
— Eu sei, mas… — tentou se explicar.
Assim que matara o grande urso, um urso menor apareceu, era um filhote, mas agora sua mãe estava morta. Ele tentou de todas as formas acordar sua mãe, porém de nada teve sucesso e ficou por ali mesmo, esperando que sua mãe ainda fosse acordar um dia.
— Agora você entende que para todas as escolhas que faz, existe uma consequência? Se não tivesse saído do bosque, nada disso teria acontecido e aquele pequeno urso ainda teria sua mãe e juntos eles viveriam uma vida feliz.
Ela entendeu a lição e aprendeu que independente da escolha que fizesse, outro poderia sofrer as consequências em seu lugar. O pequeno urso não teve culpa do que aconteceu, mas mesmo assim sofreu as consequências.
Se sentiu culpada e então começou a chorar descontroladamente, mesmo que não quisesse que tivesse acabado daquele jeito.
Às vezes sua avó era um pouco dura, mas ela entendia que era pelo seu próprio bem. A vida também é dura quando quer, e devemos estar preparados para lidar com as consequências das nossas escolhas.
Agora, tinha medo de que chegasse o dia em que iria conhecer novas pessoas e acidentalmente as fizessem sofrer também.
— E como conseguiu viver todo esse tempo sozinha aqui? Você nunca se sentiu solitária ou coisa do tipo? — Arak perguntou.
— É… Não tanto, eu costumo conversar com os pássaros, eles me fazem companhia quando estou só.
Olhando para o alto das árvores, viu-se alguns pássaros sobrevoando o bosque, estavam em formação, provavelmente migrando para um outro lugar. Talvez devido ao inverno ou quem sabe outra coisa.
— Só queria dizer que gostei de você, você é legal. Para uma humana, até que você é legal — respondeu com sinceridade.
— Obrigada, digo o mesmo de você, eu diria que você é o duende mais legal que conheci, se não fosse o único também. — Yara sorriu. — Mas… e então, como é Maíbi? Me conte sobre ela.
— Ahhh… Sobre Maíbi… Bem, apesar de ela ser meio estranha e um pouco misteriosa, eu até que gosto dela, nós nos damos bem.
Um sorriso se mostrou no rosto do mesmo.
— Entendo… Fico feliz por isso, Arak! — alegrou-se pelo duende.
— Ela me encontrou assim que eu perdi meus pais e me protegeu, me deu uma casa, uma segunda chance para viver. Eu sou muito grato por tudo que ela fez por mim — respondeu Arak contente.
Passado-se algum tempo, eles continuaram seu caminho, atravessando o rio enquanto conversavam até lá. Yara e Arak estavam se dando bem, Arak era um Duende muito tagarela e muito divertido, adorava contar piadas e dar boas risadas, por outro lado Yara era uma garota alegre e muito curiosa, sempre fazendo novas perguntas.
— Então… é aqui. Chegamos. É onde eu e Maíbi vivemos, ela está esperando por você lá dentro — disse o duende no momento em que se aproximaram da casa.
Uma pequena e simples casa de madeira era o que se encontrava a frente agora, as paredes de que sustentavam a casa estavam bem velhas e desgastadas, chegando até a se descascar em algumas partes.
De dentro, uma misteriosa luz roxa era emanada.
— Entre por favor, Yara — disse uma voz rouca e em baixo tom.
— Como sabe o meu nome? O que você sabe sobre mim? — Yara perguntou, se adentrando ao local.
— Eu estive esperando por você, fico feliz que tenha vindo — disse uma idosa que acabara de se virar para recebê-la.
A mesma estava vestida com um capuz, carregando enormes correntes em seu pescoço e anéis de todo o tipo.
A casa de Maíbi estando do lado de fora parecia uma casa normal, assim como qualquer outra casa, mas agora pelo lado de dentro, esta era bem assustadora. Nela havia vários caldeirões e estantes de jarros contendo líquidos desconhecidos, e ainda além disso ela possuía uma decoração um tanto curiosa, caveiras e esqueletos pendurados por todo o lado, coisa que Yara nunca viu parecido antes.
— Qual é a dessa decoração? Isso era pra colocar medo? — indagou Yara se esgueirando pelas paredes, na intenção de se afastar das caveiras que estavam penduradas pela casa.
— Não seja boba, isso é só decoração. Não é de verdade — disse Maíbi, não se contentando com aquilo e caindo em risos.
— Ahhh… Claro! Eu sabia! — riu-se de nervosa.
— Entre também Arak, vamos conversar.
— S-sim, minha senhora! — entrou o pequeno de maneira desajeitada, em seguida fechando a porta.
Assim como sua avó, Maíbi também tinha marcas na bochecha e na testa, marcas que ela provavelmente queria esconder e por esse motivo usava o capuz para cobrir o seu rosto. Se Yara não tivesse parado para prestar atenção quase não as teriam notado.
— Por que esconde suas marcas? Minha avó também tinha as mesmas marcas em seu rosto. Você a conheceu, não conheceu? — Ela quis saber.
— Então você as notou… Bem observadora.
Ela se virou de costas e caminhou até uma estante de livros, puxando o primeiro dos livros da prateleira e o colocando sobre o balcão.
— Não é algo que me traga boas memórias, por esse motivo prefiro escondê-las. O passado é algo que devemos esquecer, o presente é a única coisa que realmente importa, viva o hoje e esqueça o ontem. Agora, sente-se por favor, Yara.
Ela puxou a cadeira e se sentou, e antes mesmo que Maíbi falasse algo, ela suplicou:
— Por favor, me conte tudo o que sabe sobre minha mãe!
— Sinto muito, mas tudo o que posso dizer é que seu nome é Quionne, o resto você mesma descobrirá quando a encontrar.
— Como?! Como posso encontrá-la então?! Eu estive esperando por ela todos esses anos, mas ela nunca sequer apareceu…
Sua avó sempre a disse que um dia sua mãe voltaria, mas é claro que era mentira, assim como as histórias que os adultos inventam quando você é uma criança.
— Acreditei que um dia ela voltaria e então poderíamos ficar juntas, porém isso nunca aconteceu… — disse Yara, indo-se às lágrimas e chorando de frustração.
— A montanha. É pra lá que você precisa ir para encontrar as respostas que deseja, o caminho não será fácil, mas esse é um dos preços a se pagar pela verdade. Heredem corre sério risco, a natureza está mudando e algo muito ruim está para acontecer. Você é a única que pode impedir isso. Você é a escolhida, está escrito nas profecias, Yara.
— Profecia? Mas o que é essa profecia? — perguntou a garota confusa.
— A profecia trará o fim de tudo, resultando em caos e desordem. Não temos muito tempo, os primeiros sinais já estão se concretizando, como fora escrito desde o início. Suba!… Suba a montanha e encontre sua mãe, o poder dela corre em suas veias!