A Herdeira do Gelo - Capítulo 11
Após a missão ter sido um completo fracasso e não terem completado seu objetivo, que era localizar e trazer o cavaleiro perdido de volta, Yara e Lynn enfrentam um inimigo bastante poderoso, na qual possuía a capacidade de ressuscitar os mortos, fazendo-os de seu exército. Entretanto a batalha resultou em um acontecimento trágico, que deixou Lynn à beira da morte.
— Ei! Aguente firme! Você vai ficar bem! — falou Yara desesperada enquanto via o corpo de Lynn ao chão, e a primeira coisa que lhe veio à mente foi checar o seu pulso.
Seu pulso parecia estável, ela ainda respirava, porém seus batimentos estavam fracos e seu corpo estava frio.
— Não irei deixar você morrer aqui, aquelas pessoas precisam de você! — Yara segurou-a e a colocou sobre seus ombros. — Por favor, não morra!
“Eu nunca tive uma amiga antes, mas agora que tenho uma, eu não a quero perder! Mesmo que eu morra congelada nesse frio, eu irei te carregar!” — pensou, se recusando a deixá-la morrer ali.
Enquanto carregava Lynn, ela percebeu o quão pesada era a sua armadura, sendo impossível a carregar nestas condições, entretanto não iria desistir tão fácil. Retirou sua armadura para que pudesse ficar mais fácil de a carregar e então viu seus ferimentos.
A primeira coisa que percebeu era que não eram tão profundos, mas a quantidade de sangue que estava perdendo era algo a se preocupar.
Colocando suas mãos em seu peito, inexplicavelmente as feridas se fecharam com uma camada de gelo que por puro instinto saíra das mãos da garota, parando com o sangramento no mesmo instante.
Embora tivesse parado seu sangramento, ela ainda se encontrava fraca e desacordada, tendo que ser carregada por Yara, que para que a mesma não morresse congelada retirou seu traje de inverno e a vestiu para a proteger do frio, não dando importância de que fazendo isso seria ela quem estaria desprotegida.
Mesmo daquela distância a fumaça da cidade ainda era visível, porém voltar de onde vieram não era mais possível, a trilha já não existe mais. Talvez se pegasse um atalho poderia chegar na cidade o quanto antes, mas seria arriscado já que não se sabe o que esperar no caminho.
“Preciso de um plano para chegar na cidade o mais rápido possível, seguindo o caminho de onde viemos eu chegaria dentro de algumas horas, mas se pegar um atalho… Não! Isso é muito arriscado, pode ser que eu encontre algo perigoso no caminho… Mas… Lynn não tem muito tempo, eu não tenho escolha, tenho que arriscar!”
Não havia tempo para pensar, o tempo estava correndo.
Carregando Lynn e sua espada, ela atravessou a floresta naquele frio congelante, estava tão determinada a completar tal objetivo, que por pouco não notou que estava sendo perseguida.
Ainda que estivesse sendo perseguida, ela não podia parar, continuaria a caminhar mesmo que suas pernas não aguentassem mais. É o que Lynn faria por ela. Após um tempo caminhando, avistou um rio, e na beira desse mesmo rio, um tronco.
Ela colocou Lynn em cima do tronco e o empurrou até o rio, o deixando ser levado pela correnteza.
— Eu irei te encontrar do outro lado do rio, me aguarde.
Uma risada aguda quase imperceptível foi ouvida vindo de cima das árvores, ficando cada vez mais alta conforme se aproximava. Podia ouvir algumas vozes murmurando entre si no meio dos risos. Não sabia de onde estava vindo, porém tinha certeza que coisa boa não era.
— Eu sei que estão me perseguindo, se revelem agora!
No momento em que falou isso, tudo ficou quieto. Até que o silêncio foi quebrado por mais risadas e no instante em que direcionou o seu olhar para cima viu que se tratavam de goblins; pequenos e verdes, de orelhas e narizes pontudos, com olhos vermelhos como sangue na qual emanava um imenso desejo de matança.
— Parece que ela nos descobriu — murmurou um deles.
— O que faremos? — sussurrou um outro.
Suas vozes começaram a se sobressair umas às outras, e devido ao som do vento batendo nas folhas das árvores não era possível ouvir nada além de murmúrios.
Um projétil pontiagudo foi atirado em sua direção, a pegando desprevenida e acertando seu braço, em seguida mais outros foram disparados e Yara correu para de trás da árvore mais próxima e se escondeu.
— Matem-na! Matem ela! Matem a humana! — as muitas vozes ecoavam pela floresta fria.
As histórias de sua avó eram verdade. Os goblins eram seres muito inteligentes se comparados a outras espécies, diferente dos trolls que usavam somente a força bruta.
Aquelas pequenas criaturas verdes sabiam usar de seu tamanho e sua mobilidade para se movimentar em lugares altos onde suas presas não as veriam e muito menos as alcançariam. Todos esperam um ataque pelas costas, mas nunca um de cima.
“Lynn está me esperando do outro lado do rio, preciso encontrá-la antes que eles a encontrem!” — se apressou Yara.
Contou até 10, respirou fundo e disparou apressada seguindo o rio, correndo em zig-zag entre as árvores na tentativa de desviar dos disparos.
— Ela está fugindo! Não a deixe fugir! Vão atrás dela!
— Droga!… Eu sabia que pegar um atalho me traria problemas. Preciso me livrar deles logo!
Os disparos continuavam, um após o outro. Yara podia ver Lynn do outro lado do rio, indefesa e exposta em cima de um tronco. Imaginando que talvez os goblins não soubessem nadar, ela teve um plano.
— Me sigam seus idiotas! Veremos se podem me acompanhar!
Tropeçando nos pequenos galhos que se encontravam no caminho, ela correu com toda a força de suas pernas. Era impressionante como aquela garota podia ter tanto fôlego e correr por tanto tempo assim sem ao menos se cansar.
Se continuasse naquele ritmo logo seus perseguidores não a conseguiriam acompanhar e ficariam para trás, entretanto fora surpreendida quando se deu de cara com mais deles sob o solo.
— Você não pode escapar de nós, humana — falou o mais próximo dos goblins, segurando uma pequena estaca de madeira, e então soltando uma leve risada.
— Para onde você irá correr agora? Hein? — zombou-se um outro goblin.
Atravessar o rio era sua única saída, considerando que não havia mais para onde correr; porém não era como se ela simplesmente pudesse sair nadando sem se congelar.
Mas se sua teoria estiver correta, assim que encostar na água seu poder a salvará, transformando a água em gelo e tornando-se possível a passagem para o outro lado.
“É agora que meu plano entra em prática, se eu estiver certa, meu poder me salvará. Como todas as outras vezes que ele me salvou. Por favor, não falhe!” — confiante de sua teoria, Yara correu para o rio e quando pisou sobre a água, um caminho de gelo fora gerado sob seus pés.
Ela correu o mais depressa possível para atravessar o rio, entretanto os goblins que a perseguiam não ficaram para trás, também atravessando a ponte de gelo e ficando por um triz de alcançar a garota.
Próxima do outro lado ela se virou e se jogou para trás, logo puxando o seu arco e atirando uma flecha contra o chão com uma mira quase que perfeita, consequentemente fazendo o gelo se romper e todos os goblins caírem na água, imediatamente se transformando em cubos de gelo.
Assim que se recompôs, os goblins desistiram de sua perseguição e deram as costas, voltando para dentro da floresta.
Yara achava enfim ter se livrado de seus problemas, mas no momento em que se virou e deu seu primeiro passo, foi tomada por uma tontura incontrolável.
“O que é isso?… Veneno? Eu… Irei morrer? Não deveria ter sido acertada naquela hora… Preciso manter a calma e retirar o veneno antes que ele se espalhe por todo o meu corpo!” — pensou, se forçando a se manter calma.
Sua avó lhe ensinara o que fazer em situações como essa, não havia motivos para se desesperar. Se dentro de 20 minutos não conseguisse retirar o veneno de seu corpo, estaria com sérios problemas. Poderia morrer ou ficar com sequelas graves.
Ela retirou o objeto pontiagudo de seu braço e sugou todo o veneno para fora, e à medida que fazia isso, um grito feminino era ecoado vindo de apenas alguns metros de distância dali, era o grito de sua amiga.
Algo estava acontecendo e Lynn mais uma vez estava em perigo. Deslocando-se com grande velocidade, se dirigiu a garota até o local para ver o que estava acontecendo, porém quando chegou, viu apenas o tronco encostado à beira do rio.
— Cheguei tarde demais… Mas… Como? Como eles a acharam? — perguntou, frustrada por não ter chegado a tempo.
Quando observou o local com mais atenção, notou que havia alguns rastros que foram deixados para trás.
Não havia dúvidas, aquelas eram pegadas de goblins.
— Goblins… — falou Yara quase que os desprezando.
Após seguir os rastros deixados pelos mesmos, ela acabou por encontrar quatro pequenos goblins que carregavam Lynn.
— Soltem ela! — ordenou ela.
Assustados ao notar sua presença, eles logo a soltaram no chão e três deles correram para dentro da floresta, ficando apenas um, quem se encontrava tão assustado que nem ao menos conseguia se mover.
— O que iriam fazer com ela? Vocês iriam machucá-la? — perguntou Yara para o goblin assustado.
— E-e-eu jamais faria uma coisa dessas! E-eu já estava até pensando em soltá-la! — gaguejou-se ele de nervoso enquanto tentava se explicar. — Por favor, não me machuque! Me deixe ir!
Diante daquele olhar assustado, ela começou a abaixar sua arma, porém sentiu sua lança pesar, como se alguém estivesse tentando tomar o seu controle. Sentiu uma estranha presença rondando o seu ser e uma voz falou em sua cabeça:
“— Ele está mentindo, não acredite em suas palavras.”
A voz foi tão clara que era difícil saber se aquilo era ou não uma alucinação. Talvez ter ficado tempo demais sozinha naquele bosque a tenha deixado paranoica e agora estava ouvindo vozes, essa era a explicação mais plausível.
— O que? Quem está falando isso?
— Isso não importa, mas você deve matá-lo — a voz continuou, soando sombria e ao mesmo tempo autoritária.
— Ele está assustado, está indefeso… Por que eu faria uma coisa dessas com alguém indefeso? Isso seria cruel demais até mesmo para alguém que poderia me ferir…
— Já se esqueceu? Ele iria machucar Lynn, e você não a quer perder como perdeu sua avó, quer? Ela está se tornando uma pessoa importante para você Yara e você sabe disso.
“…Um amigo não deve abandonar outro amigo, caso contrário, não são amigos de verdade.” — se recordou do que sua amiga lhe falara logo quando deixaram os portões da cidade.
Ainda hesitante, ela levantou sua lança contra o goblin e fechou os olhos, pronta para tirar sua vida.
— Não hesite, esmague os mais fracos! Deixe sua raiva tomar o controle, não resista contra isso, isso é mais forte do que você. Você não pode guardar sua raiva para sempre!
— Me desculpe… — disse ao goblin à sua frente.
A lança desceu em direção ao pequeno goblin, e quando estava prestes a manchar suas mãos em sangue, outra voz foi ouvida, a interrompendo no mesmo instante.
— Yara… O que está fazendo? — perguntou Lynn logo após acordar.
— Lynn! Você acordou! — exclamou Yara surpresa, consequentemente abaixando sua guarda sem querer e deixando o goblin fugir.
— Por um segundo me assustei quando vi aqueles goblins… Mas agora você está aqui, então está tudo bem, não é? — sorriu-se ela.
— Não se mexa muito! Você acha que consegue andar sozinha?
Yara checou sua temperatura, ela estava congelando de frio.
— Eu… Eu estou com frio… E minha cabeça dói… Mas o que é isso no seu braço? — perguntou Lynn enquanto trêmula.
— Não está doendo. Deixe isso pra lá, temos que seguir a… Espere! A fumaça se apagou?! Não pode ser, a fumaça era nossa única esperança para chegar à cidade!
Estava tão focada em seu objetivo que nem ao menos pensou na possibilidade de que as chamas da cidade pudessem se apagar. Agora, estavam completamente perdidas e sem guia algum.
— Eu preciso descansar… Me deixe descansar por um instante… — disse Lynn com dificuldade para se manter acordada.
Mais uma vez ela se entregou ao sono e seus olhos se fecharam sem nenhum aviso.
— Não! Você precisa ficar acordada! Fique comigo, Lynn! Lynn! — gritou Yara pelo seu nome, sua voz ecoando por toda floresta.
Enquanto gritava pelo seu nome, uma nova luz se acendeu no fim do túnel; sons de cavalgadas reverberaram seus ouvidos, a ajuda havia enfim chegado, era Kanan e Orlen.
— O que estão fazendo aqui no território dos goblins? Aqui é perigoso, deveriam ter voltado por onde vieram! — advertiu Kanan.
— O que aconteceu? E por que Lynn parece tão ferida? — preocupado perguntou Orlen — Yara, você está bem?
— Precisamos levar Lynn para a cidade, ela não tem muito tempo! Ela está ferida! — respondeu ela.
— O que?! Subam, depressa! Vamos! — falou Kanan estando com pressa.
Subiram nos cavalos e foram rumo à cidade, após a missão ter sido um completo desastre e não terem conseguido completar seu objetivo, que era trazer as pessoas desaparecidas de Valravam de volta.