A Ordem Espiritual - 2
Exorcismo Em Hiragana
Distrito de Hiragana, o segundo.
Às 20h, a suave luz da aurora se esvai gradualmente, transicionando de um amarelo quente para um azul frio no céu, sinalizando o fim das atividades na academia esportiva de Hiragana e a chegada da noite.
A chuva, antes leve, intensifica-se, caindo com força e ressoando no solo como uma sinfonia melancólica. Essa mudança climática é uma constante em Crea: com a chegada de Nox aos céus, a escuridão, o frio e a chuva tomam conta de todos os cantos, envolvendo tudo em sua presença pesada.
A escuridão revela o pesar humano, intensificado pelas escolhas feitas ao beberem do pecado e se banharem no mal. O peso do arrependimento paira no ar, enquanto as sombras da noite se aprofundam.
Diante disso, Yami, com uma familiaridade inabalável pelo tempo, já se encontra na entrada, fitando aquele lugar com uma expressão firme.
Ele está ali, parado na entrada, diante de uma passagem marcada por um amplo e imponente portão, ladeada por um piso de concreto onde atletas e alunos costumam se reunir antes das aulas e dos treinos. Há mesas e assentos de concreto, um ambiente que ele detesta.
Ao olhar mais adiante, Yami contempla o prédio principal, que ostenta uma arquitetura sóbria com o nome da instituição em destaque. Cores frias dominam as grades ao lado do portão metálico, agora de um preto profundo, enquanto o cinza predomina, colorindo o concreto do muro e de todo o prédio.
E ao redor dele, estendem-se duas alas destinadas aos mestres, professores e treinadores, todas ligadas por corredores ao prédio principal, formando um complexo que parece encerrar todos os segredos da arquitetura da academia.
À sua volta, os professores seguem para o estacionamento atrás do prédio, enquanto os alunos tomam o caminho oposto, saindo apressados, imersos em um clima colegial, trocando risos e fofocas. A maioria deles está na faixa etária dos 14 aos 17 anos.
Yami está imerso na multidão. As pessoas ao seu redor o observam com estranheza, e algumas até com um certo alívio. Enfrentar essas reações é uma rotina constante para ele, afinal, ser um exorcista não é exatamente bem-visto pela sociedade.
Mesmo que o sobrenatural seja real, lidar com coisas que só você vê pode ser um gatilho para a ignorância alheia.
Sem hesitar, Yami dá os primeiros passos, ultrapassando o portão metálico e adentrando pela porta dupla de vidro. Sua determinação se reflete no olhar enquanto evita encarar os olhares dos demais pelo caminho. Apesar de sua presença marcante, detesta multidões, concentrando-se em seu entorno para continuar avançando.
Ao pisar na escada que divide o prédio em dois corredores imensos, um arrepio serpenteia por sua espinha, estendendo-se do pescoço até a ponta dos dedos. Seu instinto sobrenatural está aguçado, alertando-o para algo incomum à sua volta.
“Energia negativa…
Bem, o primeiro passo é ver o velhote!”
Ignorando momentaneamente a urgência de seu próprio instinto, ele começa a subir os degraus, cada passo fluindo com precisão em direção ao segundo andar.
O trajeto até a sala do diretor se forma em sua mente, e seus passos são cuidadosos, sempre atento às salas ao longo do caminho. Embora nenhuma mostre sinais de presença, são salas comuns de um colégio, todas com as portas abertas, sugerindo que, pelo horário, a equipe de limpeza entrará em ação em breve.
Não havia possibilidade de interação social, pois todos estavam focados em seu trabalho. Para ele, isso era ótimo,já que iniciar uma conversa com alguém é mais desconfortável do que entrar em conflito com uma entidade.
Ao chegar à curva do corredor, vira sem hesitação, observando através de uma das muitas janelas à esquerda. Do lado de fora, restam apenas alguns alunos, espalhados como pingos dispersos, praticamente já esgotando o local.
“Ótimo… quanto menos gente, melhor!”
Seus olhos então se fixam à frente, avistando a porta de madeira que encerra o corredor, com uma placa indicativa colada nela.
Sala do diretor-geral.
Ele anuncia mentalmente o próximo passo enquanto se aproxima para bater três vezes na madeira da porta, deixando sua mente mergulhar na expectativa do momento. Após o gesto, ele aguarda, distraído, enquanto seus sapatos ecoam pelo piso laminado. Ele observa o entorno com uma mistura de ansiedade e curiosidade.
“Não mudou nada…”
Quando a porta se abre, o homem à frente expressa um sorriso radiante ao vê-lo, seus lábios esticados de orelha a orelha em saudação. Continua sendo um homem gordo, agora mais velho, com os cabelos escassos e vestindo um terno que mal fecha ao redor de seu corpo.
— Finalmente, Yamasaki Yami! Você não mudou nada, hein! Ainda me lembro dessa cara emburrada… — brinca, afastando-se da entrada e fitando-o com mais clareza, — Por favor, entre!
Yami solta uma risada sem graça e entra na sala, movido pela força do ódio.
— Bem, você também não mudou, né? Sr. Diretor…
— Ah, não seja modesto, a idade não me fez bem! — ele responde, dirigindo-se à sua poltrona, situada atrás de sua mesa. A sala assemelha-se a um escritório corporativo, com móveis industriais emoldurando o ambiente. E em sua estante, os prêmios conquistados ao longo do tempo graças à sua gerência e administração.
“Modesto?”
Ao ajustar suas mãos sobre a mesa, ele lança um olhar firme em direção ao exorcista e prossegue:
— Bem, tirando o bom humor de dois cavalheiros que somos, vamos falar de negócios… por favor, sente!
— Ah, claro… cavalheiro…
Yami afasta a cadeira à frente e se senta, obrigando-se a encarar o diretor diretamente nos olhos.
— Bem, sobre os negócios… por ser um trabalho para um exorcista de grau menor, dois graus ainda, obviamente que não irei cobrar o valor cheio…
Ele está prestes a continuar quando, de repente, ouve o som da gaveta se abrir. O homem retira um cheque e, miseravelmente, sacode-o entre os dedos, exibindo um sorriso ganancioso estampado em seu rosto.
— Yamasaki, por favor, eu te chamei também pela sua graduação… Eu estava ciente dos valores, veja por si.
Entrega-lhe o cheque, o valor do montante faz seus olhos brilharem.
— 55 mil ienes! Isso é sério? Ou está brincando comigo, diretor?
— Óbvio, a verdade é que eu já estava com esse problema há um tempo, mas esperei até receber a notícia de sua volta. Bem, algo que traria benefícios para a academia no futuro. Pense, quão imponente seria? Contratar um exorcista tão caro em prol de demonstrar o quão alto é o nível desta academia?
Até mesmo ele se surpreende com o que sai da boca do homem.
— Ah, é… sem dúvidas…
Yami franze a testa e desvia o olhar imediatamente. Não é do tipo que se importa com o caráter de seus contratantes, mas toda aquela conversa o desanima profundamente.
“Esse cara quase matou seus alunos por causa disso? Porra!”
Seus dedos, impacientes, deslizam pela perna, tomados por uma inquietação avassaladora que o consome por completo.
— Então, acredita que resolverá isso rapidamente? Quer dizer, vou ter que esperar até o final, certo? E a que horas posso dar o fora daqui? — Nakata o bombardeia de perguntas, ficando meio sem jeito.
Yami, imerso em seus pensamentos, fixa seus olhos no relógio que está grudado à parede, marcando 23h28.
— Yamasaki? — ele chama, percebendo sua distração, tirando-o da inquietação em que está imerso.
— Ah? Eu, bem, sim! Pelo que entendi, há duas possibilidades aqui. Se a entidade estiver espalhada por todo o lugar, será rápido. Se estiver mais concentrada, levará um pouco mais de tempo, o suficiente até eu encontrar o horizonte dos eventos sobrenaturais, que vão me levar até o centro! — ele responde com confiança, deixando o diretor com os olhos brilhantes, levantando-se instantaneamente após, — Em ambos os casos, menos de meia hora! — virando seus olhos, em direção à porta.
O jovem solta um suspiro profundo, como se estivesse pronto para escapar, enquanto o velho o aplaude, com um sorriso ganancioso em seu rosto.
Quando o exorcista se dirige à porta, o ancião faz um último comentário: — Sabia que devia ter contratado você desde o início! Bem, estarei aguardando!
— Certo… — Yami responde friamente e sai, deparando-se novamente com o corredor e fechando a porta atrás de si com grande alívio.
Ele observa uma das portas das salas se fechar à distância, acompanhada pelo suave som das trancas sendo acionadas.
“A equipe de limpeza chegou.
Bom, tenho que entender o fluxo de energia na escada; senti o fio, mas ele sumiu quando subi a esse andar, ou em algum ponto do trajeto!
Droga, não consigo discernir, isso é deplorável, mas talvez, elevando a aura, eu possa forçar uma aparição.”
Ele apoia a mão direita no queixo, deixando a esquerda afundar nos bolsos, imerso em profunda reflexão.
— Hm… no final… Fica complicado discernir se é seguro ou não sem entender as capacidades dessa coisa. Deveria ter pedido mais informações àquele oportunista! — ele sussurra, lamentando sua falta de previsão.
Frente ao escárnio, ele solta um suspiro profundo.
“Bem, posso deixar de emanar a aura e focar nas minhas habilidades de dedução.
O fato de a escadaria emanar energia já é uma pista!”
Seus ombros se curvam enquanto ele decide finalmente o seu próximo passo. Ao estender a mão, retirando-a de seu bolso, ele encontra uma bala. Com agilidade, ele a despe do papel e a joga para cima, a abocanhando no ar.
Seus movimentos são os únicos a ressoar naquele corredor.
Até quê, rompendo o silêncio, um grito feminino ecoa pelo corredor, não de surpresa ou desespero, mas um grito seguido por um silêncio mortal, agudo e estridente o suficiente para se duvidar se quem o fez continua vivo.
A energia negra flui harmoniosamente com o soar, como uma brisa que acaricia seus cabelos, apenas para desaparecer no momento em que ele a percebe, envolvendo-o em um arrepio súbito.
— Que os jogos comecem! — ele graceja, com um sorriso de lado, seus olhos fixos adiante.
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