A Ordem Espiritual - 9
Ritual De Posse
Voltando para seu apartamento, Yami finalmente cessa sua agonia por ser um antissocial. Ele adentra com pressa e imediatamente corre até a sala para fechar suas cortinas, com a respiração ofegante.
— Luz… agora, até a luz me irrita! — ele reclama, enquanto a sombra negra de Azaael se desdobra a suas costas, lentamente ganhando mais forma.
— Ela te incomoda, pirralho? — pergunta, cheio de ironia, enquanto sua risada macabra é cada vez mais perceptível — é agoniante, né? Você sente sua pele formigar e então sente que está cedendo diante de algo que nem pode contra…
— Foi você? — ele pergunta, com ódio refletido em seu olhar.
— Eu? Não, qual é, pirralho, temos um contrato, não é? Mas isso aí pode ser um efeito colateral… — ele argumenta, enquanto caminha pela casa. Sua figura se perde em meio à escuridão, mas Yamasaki ouve seus passos, — Ou sei lá, um atraso na sua puberdade… — gracejou a entidade.
— Imbecil — respondeu.
Quando diz. “A criatura”, ri com mais desprezo, forçando-o a fechar ainda mais sua cara.
— Quando nos unimos, eu lhe disse sentir seus sentimentos, e de certa forma, isso se misturava. Talvez, por conter duas almas, seu corpo está com dificuldade em entender o que você é…
— Minha alma? Droga… essa merda parece complexa demais! — ele diz, atirando-se contra o sofá, exausto. Então, ele pergunta: — Será que isso vai me impedir?
— Impedir? Não seja tolo! Yamasaki! — ele responde, colocando suas mãos sobre seus ombros. Yamasaki sente como se as unhas afiadas da entidade estivessem penetrando sua carne, percebendo a palidez da pele da entidade, que já não é apenas um amontoado de trevas — sua vingança já está garantida por mim, é só aguardar!
— Aguardar? sei..
Então, quando menos esperava, as mãos da entidade o soltam, dando passos para trás até que apenas seus olhos, visíveis na escuridão, permanecem vermelhos como o fogo.
O exorcista, então, agarra o controle no sofá e liga a televisão, buscando algo que o entretenha, afastando os anseios de sua mente e o tédio do aguardo.
“Ao vivo, o representante da ordem espiritual, Kyotaka Shibata, responde às críticas do governador metropolitano, Shinzo Abe…”
— Hm… o que o velho vai dizer? — Yami se pergunta, enquanto assiste a uma comitiva passar pela tribuna.
Até que há um pequeno corte para os jornalistas que apresentam o jornal oficial, que passa por toda a Aija.
Um homem grisalho e uma jovem mulher, que indaga:
“Segundo a ordem, 78% dos casos sobrenaturais são resolvidos, o que demonstra a eficiência dos exorcistas em lidar com o mal.
No entanto, como bem apontado pelo governador, em 39% dos casos ocorrem fatalidades e em 51% deles há a destruição de um bem.
Isso traz uma sensação de insegurança e negligência, que a ordem não cobre em seus termos contratuais.
Segundo o governador, há mais mortes por mãos de exorcistas do que pelas mãos de uma entidade demoníaca…”
— Ah, velhotes, vocês se metem em cada merda… — ele comenta, levantando-se e indo até a cozinha. De lá, ele arranca do armário acima do fogão um salgadinho do sabor batata, e volta para o sofá.
O rapaz, que apresentava junto à mulher, a fita e responde:
“De fato, esse é o ponto que deve ser discutido, pois, desde que a ordem espiritual foi reconhecida pelo mundo, há mais casos de negligência do que antes…”
Enquanto Yami rasga o pacote, puxando o plástico para lados opostos e metendo a mão dentro dele, arranca metade do conteúdo e começa a devorar com impaciência, continuando a assistir.
As luzes da TV são as únicas a iluminar a sala, refletindo em seus olhos.
Até que, finalmente, ele aparece diante de todos os espectadores:
Kyotaka, o exorcista mais respeitado e longevo, sobe à tribuna, vestindo seu quimono cerimonial preto, e caminha até o púlpito do microfone.
Um senhor de barba vistosa, cabeça calva e olhar penetrante, como bom e velho caçador, que encarou o próprio inferno diante de seus olhos. Ele ostenta uma runa espiritual no meio do rosto e o crucifixo da igreja de Elum em seu pescoço, onde Niftar, o filho do criador, está gravado, símbolo imprescindível de fé por seu sacrifício.
Ele encara a multidão à sua frente com resiliência, assim como encara as câmeras voltadas para seu rosto.
Então, sua voz rouca reverbera pelo microfone:
“Senhoras e senhores, exorcistas e cidadãos.
Eu e os outros líderes do conselho tivemos uma discussão cuidadosa sobre as informações que recebemos. Reconhecemos a significativa perda de vidas e patrimônio entre nossos clientes, mas quero que entendam que exorcizar uma entidade é uma tarefa complexa. Existem diferentes tipos de entidades, cada uma exigindo uma abordagem específica.
Portanto, ao analisarem os dados, lembrem-se de que eles não refletem a realidade completa. A maioria das tragédias ocorre em casos envolvendo entidades classificadas como aterrorizações ou calamidades. Apenas 11% dos casos de obsessões e fantasmas resultam em tragédia.”
Ele fala, abrindo suas mãos e gesticulando a cada palavra, como um maestro conduzindo uma orquestra. Cada palavra é pronunciada com firmeza, como se estivesse dirigindo-se aos seus ouvintes e companheiros.
“Como líder da ordem, afirmo que cada morte e cada exorcismo são eventos significativos. Não podemos mais ignorar a insatisfação da comunidade ou a confiança depositada em nós pelo governador.
Por isso, vamos reestruturar nossos serviços. Suspenderemos atividades independentes e intensificaremos a supervisão em nossas operações. De agora em diante, exigimos a presença de dois ou mais exorcistas em cada missão para aumentar a segurança e a eficácia.
Além disso, os valores dos nossos serviços serão reajustados, com um aumento de 25% em relação aos valores anteriores. Também garantimos ao governo acesso aos registros detalhados de cada missão.
Essas mudanças são necessárias para garantir a excelência em nossas atividades e a segurança de todos os envolvidos. Agradecemos sua compreensão e apoio.”
— Merda… é sério isso? — reclama Yamasaki, tão insatisfeito que apoia o pescoço no sofá e mira o teto, desligando imediatamente, interrompendo a transmissão, — Velho broxa! Sério que terei que aguentar outra pessoa? Por quê? Por que Elum? Minha vida já é uma desgraça! Por que haveria de me castigar? — continua, como uma criança birrenta.
— Quanto drama, você não trabalhou com outros exorcistas antes? Os que eu matei? — diz Azaael, ainda ali, ele esteve o tempo todo o observando.
— Faz mais de um ano… desde então, só aguentar você já me foi suficiente, imagina ter que ceder à opinião de outra pessoa? Que horror!
— No final, eu que estou te aguentando, pirralho! Sou um rei demônio! Que vive como um ratinho em cativeiro! — ele diz irritado, e então, uma forte ventania bate contra a janela, tremulando-a enquanto o demônio o fita da escuridão, — Por falar nisso, você podia me deixar assumir um pouquinho, né? — vocifera, se desprendendo das garras das sombras lentamente.
Ele se ergue do sofá e, sem paciência, coloca as mãos nos bolsos, endireitando sua postura.
— Assumir? Lá vem… — ele murmura, vendo diante de si novamente aquela rara figura se mostrar.
O rei, Azaael, que não via desde que fizeram o maldito contrato, de cabelos até a cintura, brancos como a própria pele, pálida como a um defunto. Entre seus fios grisalhos, há dois chifres vermelhos, remetentes a seu infame apelido e sua verdadeira forma, o dragão feroz de escamas vermelhas.
Suas orelhas são pontudas e seus dentes afiados, como a de uma fera, que de forma grotesca está aberta, derramando o próprio sangue em seu corpo, parcialmente coberto por um quimono milenar datado dos primeiros ciclos da humanidade.
O sangue fervente e de tom avermelhado mancha seu corpo musculoso e todo tatuado, marcado por chamas negras ao redor de sua figura mitológica, tão demoníaca quanto essa forma.
— Isso! Eu vou até o distrito fantasma, mato uns demônios, ou quem me interessar, e então retorno… como antes — ele diz, refletindo o brilho de seus olhos como lava fervente.
— Como antes… Hm… bem, eu não planejava fazer nada, então… — dizia distraído, mas, no mesmo instante, sente um movimento imperceptível, e quando percebe, vê a mão de Azaael atravessar seu peito, o sangue caindo sob seus pés, a visão turva enquanto o som agoniante de seus gemidos ecoa, — filha da puta… não era para fazer assim… — pragueja, enquanto o seu sangue escorre de seus lábios, o demônio retira sua mão, ensanguentada.
— Ah, sério? Foi… mal, pirralho… — ironiza, com um sorriso de orelha a orelha em sua face, e então, Yamasaki tomba ali, na sala e sob seus pés, seu sangue, um vermelho tão escuro que parece negro, se espalha.
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