A Sétima Guerreira - Capítulo 5
Um senhor que carregava uma coroa dourada reluzente em seus cabelos prateados, rodeava os seus olhos azuis sobre mim e Handgrich, que nos aproximávamos a passos lentos do trono no qual ele estava assentado. Ao pé dos pilares que sustentam aquela sala do trono, haviam elfos de armaduras de prata, segurando suas lanças. E mais um elfo com vestes eclesiásticas, próximo ao trono do rei. Ele logo direcionou seus olhos castanhos para nós.
“Quanta riqueza… Esse chão é feito de mármore e aqueles candelabros no teto, de ouro? Então quer dizer que… essa será a minha moradia?!”
Sorri interiormente e arranhei um pouco a minha cintura para não deixar a euforia que me consumia aqui dentro escapar para fora.
“Isso, Milena. Eles não podem perceber que você é uma emocionada. “
— Meu rei… — Handgrich encurvou a cabeça enquanto colocava a mão no peito. E eu também fiz o mesmo.
— Handgrich…
Ao som da voz do rei, erguemos nossos rostos.
— Onde está o guerreiro?
— Bem, meu rei, acontece que dessa vez a invocação não aconteceu como deveria ter acontecido.
— Hã? — O rei ergueu uma de suas sobrancelhas, fazendo uma expressão bem assustadora.
— Essa mulher, meu rei… — Handgrich apontou os dois braços para mim. — Ela é a sétima guerreira.
Retirei o capuz e, por algum motivo, os traços daquele rei se contorceram em uma expressão de raiva.
— O que é isso, Handgrich?
— É a sétima guerreira de Evelgrand, meu rei.
— Ficou louca?! — O rei bateu no braço do trono. — Isso não é um elfo, isso é um ser estranho e com défice de magia!
— M-Mas veja, meu rei — Handgrich segurou meu pulso e o elevou para cima. — Ela tem a marca da raça!
— Não pode ser… — O rei e os súditos ficaram boquiabertos com o que viam. Aquela era a marca dos guerreiros invocados para lutar pela nação dos elfos e essa mesma marca estava em um ser como eu, sem magia.
Bem, não os culpo por ficarem assim.
— Só pode haver um erro!
— Desde que a guerra pela sobrevivência começou, nunca antes havia acontecido a invocação de uma outra raça para lutar por outra raça!’
Esses e mais murmúrios puderam ser ouvidos pelas bocas dos guardas. Nem mesmo eles conseguiam segurar sua boca diante daquele assunto.
— Silêncio! — ordenou o rei, fazendo os guardas ficarem tão imóveis quanto uma estátua. Ele lançou aqueles seus olhos de raiva contra a Handgrich.
— Veja o que você fez, sua inútil! Eu sabia que deveria ter te entregue no lugar da Efrite, ela com certeza teria tido sucesso na invocação!
— M-Mas, meu rei, eu juro que fiz a invocação certamente!
— Calada! — O rei bateu novamente no braço do trono. — Isso é tudo culpa sua, Handgrich!
Handgrich encurvou o rosto, seus cabelos desceram juntos, enquanto eu observava aquele rei.
— Se tivesse feito certamente, não teria invocado um ser sem magia como esse!
Ele lançou o olhar sobre mim. Handgrich começou a verter lágrimas, que caiam naquele piso de mármore.
— Eu sinto muito, meu rei…
Ver e ouvir aquilo me fez querer chorar e, ao mesmo tempo, socar aquele rei, mas nada mudava que o rei tinha toda razão. Afinal, o que um ser sem magia poderia fazer por Evelgrand? Nada.
— Ei, você — gritou o rei, olhando seriamente para mim. — Fale alguma coisa!
No entanto, não sou o tipo de pessoa que leva desaforo para casa. Nesse meio tempo, eu estava organizando as melhores palavras que melhor combinavam com um rei tão estúpido quanto esse.
— Meça sua língua quando for se referir a mim, seu lixo! — franzi as sobrancelhas. — Ainda que seja um rei, não passa de um lixo que teve a sorte de ganhar poderes monárquicos através de uma linhagem de miseráveis com a sua!
Eu havia retirado essas palavras de um livro que li em que a herói plebeu confrontava um rei tão podre tal como esse que não se importava em pisar nas pessoas com a simples desculpa de “aí, um rei pode tudo”.
Aquelas palavras surtiram efeito, o rei arregalou os olhos, erguendo as sobrancelhas, perplexo com tamanha afronta. Seus súditos também compartilhavam do mesmo espanto.
Handgrich ergueu o rosto, olhando com pavor para mim enquanto segurava um dos meus ombros com sua mão tremelicante.
“O que foi? Por que essa cara? Eu disse apenas a verdade e não me arrependo disso!”
— Como ousa insultar sua majestade, ser de baixo nível?!
O elfo das vestes eclesiásticas revelou ter sido afetado pelas minhas palavras cheias de verdade.
— Matem esse ser imundo! — ordenou o rei enquanto franzia o cenho, batendo no braço do trono. — Tê-la como representante é o equivalente a nada!
“Oh, parece que eu me ferrei…”
Os soldados não tardaram em apontar suas lanças afiadas para mim, enquanto prosseguiam com o objetivo de cravá-las em meu corpo.
“Não vou negar que sinto medo da morte nesse momento e o meu coração está tão acelerado quanto as batidas de uma caixa de som, no entanto… É melhor assim…”
Arregalei os olhos, vendo Handgrich se colocar na minha frente enquanto abria suas mãos como se fosse uma águia, abrindo suas asas e ficando de frente aos predadores que tentavam caçar seus filhotes.
— Não irei permitir que matem a Milena!
Os soldados travaram, ficando confusos enquanto olhavam uns para os outros, aguardando o que o rei iria dizer.
— Handgrich, o que você está fazendo? — questionei. — Afaste-se. Se eu morrer, posso retornar ao meu mundo, já você não.
— Milena, eu sou responsável por você. Fui eu quem te invocou e não permitirei que tirem sua vida!
Arregalei os olhos.
— Handgrich, saía da frente! — ordenou o rei, franzindo ainda mais o cenho. Ainda assim, Handgrich seguiu com sua determinação em proteger uma humana fraca e frágil como eu. — Não vou repetir, saía da frente!
— Me mate então, rei Valmiris!
“Não, essa elfa é boa demais para ter um miserável quanto esse…”
Eu tinha chance de voltar ao meu mundo, mas ela não… Esse era o mundo dela e, se ela morrer aqui, terá sido tudo inútil. Mas, conhecendo-a, tudo o que eu disser não vai parar a determinação impressa na sua expressão.
— Pelo menos use sua magia para fugirmos.
— Não dá… — Ela revirou aqueles olhos cheios de lágrimas enquanto mantinha os braços abertos. — Eu gastei toda a magia para te invocar, o pouco que me resta não serviria para nada.
— Não pode ser…
— Tanto faz… — O rei mordeu seus lábios com amargor e cerrou os punhos. — … Mesmo que você seja da família real, se for para defender esse ser, morra junto com ela!
Com a ordem dada, os soldados avançaram suas lanças com um semblante triste no rosto por terem de matar aquela elfa. Eu tentei puxar a Handgrich para trás, mas ela era mais forte que eu… Não deu… Os soldados vão nos matar e é isso, que droga!
Fechei os meus olhos intensamente.
Anunciando: <<É proibido eliminar seu representante, isso resultará na extinção da raça>>
Os soldados pararam no mesmo instante em que a voz havia anunciado essas palavras. Com as mãos trêmulas, engoliam em seco, pois estavam prestes a morrer e a levar toda raça élfica para o esquecimento. O rei levantou as duas sobrancelhas enquanto arregalava os olhos, perplexo pelo que havia acontecido. Colocando a mão sobre o peito, suspirou e então ergueu os seus olhos, bradando:
— O que está acontecendo aqui? Eu nunca tive ciência de tais regras!
— M-Meu rei, o que faremos?—questionou um dos soldados enquanto tremia de pavor ao lado dos seus companheiros que seguravam aquelas lanças afiadas.
— Baixem suas lanças!
Os soldados baixaram suas lanças e retrocederam seus passos ao pé dos pilares onde se encontravam. Todos suspiravam de alívio.
— Ufa! — Eu e Handgrich suspiramos, desacelerando as fortes batidas que haviam tomado conta de nossos corações. Depois de suavizar os meus batimentos cardíacos, comecei a pensar sobre o que havia acontecido. Ao que parece, a voz do mundo salvou a minha vida, anunciando uma regra que nem o rei sabia. Bem, acho que nunca haviam tentando matar um guerreiros antes.
Mas agora… Isso quer dizer que eu era imune e a raça dos elfos não podia me tocar.
Interessante.
Um sorriso malicioso emergiu dos meus lábios.
— Handgrich, você tem uma espada consigo?
— O-O que, Milena? — indagou Handgrich com a voz toda trêmula enquanto me olhava com pavor, temendo os meus próximos passos. — O que vai fazer com uma espada?
— Acho que estou com vontade de me matar aqui e agora!
— S-Sua maldita — gritou o rei com o cenho franzido e, quando ia completar suas palavras, foi interrompido pela voz robótica. — Morr…
Anunciando: <<A perca do representante antes da guerra, resultará na eliminação da raça>>
Foi como pensei, eu detinha imunidade absoluta contra a raça dos elfos, ou seja, se um deles me assassinar, todo mundo vai junto.
— Milena, para com isso. Por favor, Milena!
Handgrich implorou, mas eu não tomei em conta as suas palavras. Eu queria é ver esse rei sofrendo!
— Oh, acho que vou bater a cabeça no chão! — Um drama clássico, eu diria. — Ou seria melhor, eu…
— Fora daqui! — gritou o rei, batendo o punho no braço de seu trono. — Não quero mais ver esse seu rosto!
— Primeiro, venha até mim rastejando de joelhos. Só depois eu saio! — Falei com audácia, pois suas vidas estavam em minhas mãos.
O rei franziu os dentes ao extremo enquanto sua cara era preenchida pelo vermelho de raiva.
— O que está esperando? — Coloquei uma das mãos no quadril enquanto apontava o dedo no chão. — Não tenho todo tempo do mundo!
— Você pode ter a proteção do guerreiro, mas nada me impede de te capturar viva!
Retirei o celular do bolso e coloquei contra o meu pescoço. Pelo menos a Gabriela ter partido o meu celular servirá de algo.
— Basta só um corte e toda raça vai para vala.
Handgrich arregalou os olhos.
Ele rangiu os dentes.
— Vai ou não?
E mordeu os seus lábios, gritando em seguida.
— Eu me recuso a fazer isso! Pouco me importa se você se suicida! Sua amiga Handgrich também perecerá!
Com isso, percebi que esse rei era tão lixo que pensava em si próprio, mas ele não deixava de ter razão sobre a Handgrich. Ela e as crianças desse reino eram as únicas razões pelas quais não iria cometer um genocídio em massa nesse exato momento.
— Tudo bem. Eu irei embora.
Virei-me e comecei a caminhar, mas Handgrich segurou meu braço.
— Milena, espera. Eu vou com você!
— Handgrich, se você for com ela, será considerada traidora do reino de Evelgrand! — O rei estava determinado a me exilar do resto de Evelgrand. Bem, ele não dependia de mim e nunca dependeu.
— Ouviu, Handgrich? — sorri levemente enquanto segurava o celular na mão. — Eu posso me virar sozinha daqui para frente.
— Não! Eu vou com você! — Ela largou o meu braço e se virou ao rei de Evelgrand com as sobrancelhas franzidas.
— Tio Valmiris Raell Evelgrand! Neste momento, eu, Handgrich, estou renunciando a tudo! Não tenho mais nada a ver com o reino de Evelgrand!
— Espera… Ele é seu tio?
Por essa eu não esperava.
— Era. Agora vamos, Milena! — Ela começou a andar no mesmo ritmo em que eu havia começado a andar.
Handgrich realmente estava brava, nunca a tinha visto assim antes. Conheço poucas pessoas que fariam o que ela fez hoje, na verdade, ninguém tem amor maior do que aquele que dá a própria vida por seus amigos.
Aquela elfa definitivamente conquistou a minha confiança.
— Tem noção do que está falando, Handgrich?
“É sério que ele tem coragem de perguntar isso a uma pessoa que ele tentou matar? Esse rei tem tudo menos parafusos na cabeça, bem, talvez seja psicopatia.”
Handgrich revirou seu olhar para o rei, dizendo:
— Tenho! Agora estou indo!
Dito isso, continuamos andando. Parece que o meu sonho de morar nesse castelo mal começou e já acabou. Enfim… É a vida. Os portões se abriram e eu, junto da Handgrich demos os nossos últimos passos para fora da sala do trono.
“Espero nunca mais ter que ver esse rei na minha vida!”
(…)
No seu trono, o rei batia o punho vezes sem contas, indignado pela afronta que tera sofrido daquela mulher de madeixas negras que carregava a marca do guerreiro escolhido em sua mão direita.
— Maldita mulher! Maldita Handgrich! — O rei cerrava os lábios amargamente. —Mais uma vez a desgraça caiu sobre o reino de Evelgrand!
— Com sua licença, meu rei… — disse o que possuía vestes eclesiásticas. Ele estava próximos aos quatro degraus que levavam ao trono do rei. — Por que não oferece a cabeça aquela mulher para a raça dos vampiros? Quem sabe assim, eles no poupem e nos deixem em paz por um tempo.
— Ficou louco, Jeneses? — O rei franziu o cenho. — Além de não podermos tocar nela, ela não valeria nada. Um inseto inútil sem magia.
— Não concretamente, meu senhor.
O rei afiou o olhar.
— Da última vez em que perdemos a guerra pela sobrevivência, o pedido para caso percamos essa guerra é que consigamos capturar um elfo negro.
— Eu sei disso. Mas você sabe que é impossível que isso aconteça. Aqueles insetos sabem se esconder muito bem.
— Não acha que aquela mulher é o mais próximo de um elfo negro? Apenas precisaríamos fazer umas pequenas modificações no corpo dela.
— Gostei da ideia, mas vale lembrar que ela possui imunidade.
— Somente para os elfos, não será um problema mandar eles caçarem e capturarem ela antes que ela tenha alguma chance de reagir.
— É por isso que eu gosto de você, Jeneses. — O rei começou a rir. — Certo, providencie a captura daquela mulher e trate de trazer a minha sobrinha rebelde de volta.
— Como desejar, vossa majestade!
Jeneses encurvou a cabeça em reverência ao rei e deu-lhe costas, caminhando com um sorriso malicioso, até a porta que fora aberta.