Amor é Mais Complicado do que Parece - Capítulo 17
O que é morte da alma?
Visão Yuna
Me sentei, com o Izumi, em uma mesa qualquer. Depois de organizar todas as minhas coisas bagunçadas, pedimos algumas coisinhas para comer, então disse com um belo sorriso:
— Vamos dar uma olhada nisso?
— Sim.
Comecei a apresentar as coisas para ele, mas sabia o que Izumi realmente queria saber, além do mais desejava me mostrar forte, para assim sentir que não estava fugindo, mesmo que estivesse, por isso logo mudei o tópico comentando:
— Se você quer perguntar algo, pergunte.
— Êh… — Izumi olhou em volta procurando uma resposta, meio desesperado, o que foi fofo, até que ele se virou para mim, me encarou diretamente e perguntou: — Por que você chorou naquele dia?
Sorri levemente, para melhorar o clima, então respondi com naturalidade:
— Nada de mais.
— … — Izumi me olhou com desconfiança.
Olhei por instantes para ele sem dizer nada, me dei um tempo, para garantir que eu conseguisse falar com tom leve, para convencer Izumi que estava tudo bem e acabar com esse assunto para sempre.
— Aquele lugar me traz memórias, enfim, pessoas choram por muitos motivos, acontece o tempo todo, não dê muita importância.
— Sério?
— Sim, sim, sério.
— …
— Agora você quer saber porque aquele lugar é importante, né?
— Bem… Sim, se você quiser me contar.
— Não se contenha tanto para perguntar, tei! — Dei um leve peteleco na testa dele, enquanto falava.
— Ai! Mas você parecia meio desconfortável falando, então…
Não podia deixar de me perguntar quando o Izumi se tornou alguém perceptível, foi do nada, ele normalmente era tão alheio a tudo, por que de repente ele tinha que perceber esse tipo de coisa? Enfim, respondi “irritada” para o pressionar e fazer Izumi não pensar muito sobre o assunto:
— Pergunte o que quiser saber de uma vez, droga!
— Glup! Foi mal.
— Puft! Não peça desculpas por tudo, mais importante, não é como se eu pudesse fugir mesmo e são só coisas que aconteceram há muito tempo, outra coisa, seu misto quente vai esfriar se não comer ele logo.
— Verdade! Esqueci completamente que estávamos em uma lanchonete dentro biblioteca comendo. — Esquecer da comida já é estranho, mas como ele conseguiu esquecer onde estava, é algo que nunca consegui entender, de qualquer forma respondi com:
— Como sua mente funciona?
— Normalmente, ué? — Claro, claro, “normalmente”.
— Ok, acho que tenho que continuar a contar, então resumindo: eu costumava ir naquela praça com meu pai, que inclusive gostava de escrever, aí acabei me apegando ao lugar e ao hábito de escrever quando ele morreu — disse rapidamente.
— Morreu?
— Sim, sim, mas não fique tão para baixo, vai ser um problema se deixar o clima assim tão pesado.
— Mas…
— Já faz muito tempo que aconteceu, quase três anos, de qualquer jeito, sanei sua curiosidade? Mais uma coisa, me dá um pedaço, seu queijo quente parece estar muito bom. — Sorri da maneira mais brilhante que consegui.
— Se quiser pode pegar, mas por que você chorou, então?
— Porque sim, acontece o tempo todo por vários motivos, claro, depende da pessoa, eu sou chorona.
Menti, já era vergonhoso ele ter me visto enquanto chorava, admitir os motivos ou que ele foi a única pessoa que já me viu chorando, nunca! Não tinha chance de eu mostrar minhas fraquezas assim, afinal eu era uma pessoa forte…?
— Sério, não parece?
— Ok, ok, interrogatório fechado, agora seria uma boa começar a falar sobre o motivo de termos vindo aqui, até porque eu já trouxe um monte de coisas. — Apontei para todos os papéis e coisas que estavam organizadamente espalhadas pela mesa.
— De fato, para que tanto papel?
— Onde mais eu escreveria?
— Celular, computador, sei lá, pelo menos numa máquina de escrever, qualquer coisa é melhor que usar papel e caneta, em que século você vive?
— Como assim, papel e caneta são excelentes! — disse.
— Não, pense, caneta cansa mais a mão e o pulso, gasta papel e plástico sem necessidade, é pouco prático de guardar, às vezes a letra até complica o entendimento do que está escrito. Mesmo com todos esses pontos, como alguém poderia dizer que caneta e papel são melhores?
— Mas… Droga! Ok, você tem um bom ponto.
— Né?
— Mesmo assim o papel é… Já sei, papel é meio mágico!
— Não, não, o papel é basicamente um polímero misturado com uns bagulhos.
— ?
— Sabe, celulose é um polímero e tal…
— Ok, ok, vamos voltar ao tópico importante.
— Sim.
Depois de um micro silêncio, nos viramos para os papéis e fingimos que nada tinha acontecido, por que o Izumi sabia a composição química do papel? Não pergunte, não vai conseguir uma resposta.
De qualquer forma, depois disso deixei o Izumi lendo por um tempo, porque eu também precisava comer a minha comida, a qual já tinha deixado esfriar, mas acontece. Izumi, então, leu várias coisas e a primeira coisa que ele comentou foi:
— Ei! Faça mais diálogos!
— Para que?
— Porque eles são divertidos!
— Ok, mas já tem vários diálogos, olha.
— Isso não conta, é só o detetive explicando coisas.
A propósito, eu só escrevia histórias/ contos policiais.
— Claro, ele está contando o que descobriu para seu assistente, é só o normal.
— Hummm! Não, eu estava falando de diálogos divertidos, emotivos, brigas, o personagem se mostrando completamente despido para outro, revelando suas emoções mais profundas, algo do tipo.
— Nem, esse tipo de coisa é vergonhosa de escrever.
— Por que?
— Bem… Aham! Enfim, esse tipo de recurso só serve para alguma coisa, se o foco for os personagens, não faz meu estilo escrever sobre isso.
— Por que não, é o mais legal?
— Não, não, o mais divertido é planejar os crimes, pensando em todos os detalhes: como o assassino gosta de matar, trejeitos, local e mais. Feito isso, tenho que pensar em todas as possibilidades, cuidadosamente espalhar as pistas sobre quem é o culpado, reler e repensar centenas de vezes, até encontrar a fórmula de um assassinato perfeito, então quando eu encontro isso, novamente pensar por dias até achar uma falha nesse crime, por fim acabar com o criminoso pego, ou não é simplesmente… — Então percebi que tinha me empolgado um pouco e disse: — Foi mal, acho que me empolguei.
— Tudo bem, faço isso o tempo todo.
— Verdade, mas isso só significa que: droga! Acabei Izumando.
— Ei! Por que está usando meu nome como adjetivo?
— É só verdade.
— Buu! Maldosa! Além do mais, pelo menos não sou psicopata com fetiche por crime — Izumi disse brincando.
— Êh… Mas é tão divertido — disse meio envergonhada.
— Na verdade até pode ser, tipo, que tal uma história com viagem no tempo, então o assassino poderia escolher um alvo, conhecer literalmente todos os hábitos, vida, medos, personalidade, relações, tudo sobre seu alvo, então matar ele de novo e de novo, voltando no tempo sempre, até encontrar a forma mais… Sei lá, perfeita, divertida ou cruel, algo do tipo.
— Depois eu que tenho tendências cruéis.
— Êh… — Izumi olha ao redor, procurando o que dizer.
— Não leve a sério, era brincadeira!
— Sim, eu sei, estava tentando lembrar o que ia dizer, êh… lembrei! Não é ser cruel, é apenas que dessa forma você poderia explorar muito bem o personagem: vítima, por exemplo, mostrando que tipo de vida ela vivia antes de morrer, suas reações à morte, sua personalidade, isso sim parece divertido.
— Então torturá-la psicologicamente, afinal se o assassino sabe de tudo, ele pode usar as próprias fraquezas da pessoa para fazer ela desmoronar, que ideia mais sádica.
— Não coloque palavras na minha boca! Estava pensando no assassino amar a vítima e estar fazendo isso, porque, pelo ponto de vista distorcido dele, essa é a única forma que ele pode realmente entender a vítima e a ajudar.
— Por que a vítima teria um final feliz numa história de assassinato? Vítimas nesse tipo de história só servem para morrer.
— Bom ponto.
No fim, porém, a principal razão que me levava rejeitar aquele tipo de ideia, era porque eu queria fugir de escrever personagens, afinal sempre que os fazia minimamente mais complexos, via neles minhas fraquezas refletidas, o que não era uma sensação agradável.
Visão Izumi
— Por que a vítima teria um final feliz numa história de assassinato? Vítimas nesse tipo de história só servem para morrer.
— Bom ponto.
Depois que eu disse isso, por alguns instantes, vi que a Yuna parecia olhar para o nada, mas foram só alguns segundos, tipo de coisa, que se vinda de mim, seria sem dúvidas devido a eu ter visto algo aleatório em volta e começar a pensar sobre.
Olhei em volta na biblioteca, mas não consegui descobrir qual poderia ser a razão, Yuna também não me deu muito tempo para pensar sobre, afinal logo ela disse algumas coisas e começamos a conversar.
Ok, alguma coisa, não é muito preciso, mas não me lembro muito sobre o que falamos, foram várias coisas, ao mesmo tempo, senti que não saímos muito do lugar, foi literalmente jogar conversa fora. Não, literalmente é muito forte, eu não peguei o arquivo conversa e arrastei até a lixeira, mas… Ahan! Esquece.
Já lá pela final da tarde, senti que já estava chegando na hora de ir embora, por isso fiz um último comentário, sobre algo que estava realmente me deixando aflito, então disse:
— Esse seu conto vai se chamar Hilbert, né?
— Bem é o nome do protagonista.
A propósito, no momento estamos falando sobre um conto que a Yuna escreveu, era basicamente sobre um assassino, cujo fetiche/ hobby ou como quiser chamar, era apagar pessoas, e o que seria apagar uma pessoa? Então, é fazer ela não ter mais amigos, cortar relações com a família, raptá-la, então sumir com a pessoa do mapa por anos, então matá-la, por quê? Bem, para fazer ela ser esquecida, para “matar” a alma e existência da vítima.
— Colocar o nome do protagonista parece tão chato, sei lá, você bem que podia usar algo como: pessoas invisíveis, a vítima perdida, a morte da alma, o que te faz existir? Ou, o que é a morte da alma? Sei lá, esses parecem mais chamativos.
— Entendo.
— Apesar de que você faz o que quiser.
— Sim, enfim, acho que já devíamos ir.
— Verdade, já está quase de noite.
Nós levantamos, pagamos a comida, andamos até a saída da biblioteca, então Yuna perguntou:
— Você vai para que lado?
— Direita.
— Então vamos juntos.
Estamos andando, foi quando disse:
— Êh… Então, sempre que você quiser conversar com alguém, eu… êh, pode contar comigo, acho.
— Puft! Se vai dizer algo como isso, faça com mais confiança. — Yuna sorriu lindamente enquanto dizia.
— Verdade.
Dessa forma nós despedimos, eu voltei andando rápido para minha casa, afinal já estava tarde, meus pais iam ficar meio deveras putos se eu enrola-se mais sem avisar. Também corri porque estava um pouco pilhado, sei lá o porquê, só rolou do nada, fiquei que nem depois de ver anime bom.
Claro que não conseguia me livrar da sensação de que ainda não tinha entendido a Yuna, nem da sensação de que…
— Ha! Ha! Ha! Sedentários não deveriam sair correndo assim, acho que vou morrer.
Respirei fundo, naquele dia descobri que falta de fôlego aparentemente não é letal, e que minha mente pode ser um pouco problemática às vezes, afinal eu corri todo o caminho até o metrô em 10 minutos. Entenda, pela primeira vez eu tinha ido correndo e demorei 23, dessa vez tinha ido ainda mais rápido, aí você pergunta, mas você devia ser atlético, né? Não, se tem uma coisa que nunca fui é: atlético.
Entrei em casa, meus pais já estavam lá, minha mãe até perguntou:
— Onde esteve?
— Por aí, não sabia que vocês iam chegar cedo, deu fome e sai para comer, inclusive estou sem fome, por isso.
— Ok.
Depois de dar algumas explicações aleatórias, apenas fui tomar banho e passei o resto da noite vendo animes de boa, ou talvez lendo, tanto faz.