As Sombras de um Novo Começo - Capítulo 11
É por isso que eu prefiro vir andando.
— Oh! É sério? Por que você não me contou antes? — disse, em voz alta, uma criança que estava sentada ao meu lado.
A outra, a interlocutora da mensagem, apenas riu enquanto se revirava sobre o banco.
— Esqueci de te contar. Mas você precisava ver! Foi incrível!
Suspirei fundo, deixando todo ar esvair dos meus pulmões diante da vibração aguda que a altitude de suas vozes causava em meus ouvidos.
Enquanto observava o amanhecer enviar sua luz pela cidade, pintando a atmosfera e despertando as engrenagens de mais um dia, era submetido à presença eufórica de dois garotos que pareciam ter 12 anos. Além deles, outras pessoas emanavam suas declarações pelo lugar, inclusive outros estudantes que, assim como eu, vestiam um uniforme preto detalhado em azul.
Como acabei nessa situação? É simples: hoje, por algum motivo que desconheço, acabei me atrasando além do permitido.
Eu estava cansado, mas creio que dormi dentro do horário previsto na noite anterior. Era incerto, no entanto, provável, que eu não havia dormido tarde, então, logicamente, nada explicava o meu sono profundo… A menos que eu estivesse pagando contas acumuladas.
Hoje, quando acordei das profundezas vazias da minha imaginação, fitei o horário estampado no relógio da parede e, de forma imediata, esclareci a mim mesmo a situação em que me encontrava, além, é claro, do desfecho que deveria seguir naquele momento.
Era um cenário extremo e, a menos que eu saísse correndo por aí, não chegaria a tempo. Então, em frente a um possível atraso, fui obrigado a desfrutar do transporte matinal que cortava toda a cidade pelos dias consecutivos. O principal problema não era o meio de locomoção em si, mas o desconforto em usá-lo.
— Ei — Uma mão tocou meu braço. — Eu já vi você na escola. É um aluno do último ano, não é?
O garoto sentado ao meu lado perguntou sorridente. Seu amigo, que outrora ria loucamente, agora estava me encarando com expectativa.
Considerei as duas crianças antes de responder qualquer coisa.
Eu… na verdade, não sou muito fã de crianças. Essas criaturas são energéticas demais e sempre possuem algo em mente. Geralmente, requerem algum tipo de atenção, e eu sempre fui horrível nisso, não conseguindo demonstrar muito carisma ou sequer me conectar com elas.
Não enxergava isso como um problema, pois não pensava em cultivar algo assim no futuro. Logo, não importava e eu apenas preferia manter distância.
— Sim.
— Ohhh! Viu, Davi? Eu estava certo! — O garoto ao meu lado falou orgulhosamente.
— Vocês fizeram algo especial ontem? — O outro menino, Davi, perguntou, desconsiderando as palavras presunçosas de seu amigo.
— Não.
— Vão fazer?
— Não — respondi calmamente, levantando-me para sair do bonde que acabava de parar em frente aos portões. — Não escutei direito o que foi dito. Procurem… uma menina de cabelos vermelhos da primeira turma. Sabem quem é?
Eles se entreolharam em confusão, apertaram as sobrancelhas por um momento em concentração, mas logo viraram-se para mim novamente, animados como antes.
— Sabemos!
— Muito bem. Procurem ela e insistam bastante até que consigam as respostas que procuram. No entanto, em hipótese alguma, mencionem quem lhes deram essa informação. Entenderam?
Eles me olharam com cautela, um sorriso malicioso se formando em seus rostos como se realmente compartilhássemos um segredo importante, algo semelhante a um mapa para um tesouro escondido.
— Pode confiar na gente!
Assenti em aprovação e me retirei, saindo do lugar enquanto os deixava em sussurros misteriosos sobre um possível plano para encontrarem a garota. Não planejava envolvê-la, mas foi a primeira opção a surgir em minha mente, então resolvi escolhe-la como protagonista dessa farsa.
Caminhando em meio aos fluxo de alunos que adentravam na escola, senti-me incomodo com algo: à medida que atravessava os grupos formados pelo corredor, olhares furtivos e investigadores eram lançados em minha direção, buscando, em qualquer movimento meu, uma evidência de algo que eu desconhecia.
Estou sujo e não percebi?
Incentivado pela dúvida crescente e pelas incertezas que brotavam a todo momento, investiguei sutilmente minha roupa ou qualquer parte do meu corpo que poderia ser alvo dos olhares indesejados, mas não encontrei nada de estranho.
Mas, então, o que poderia…
— Raios! — uma voz forte, carregada de irritação, entoou alguns metros atrás de mim. — Já disse, moleque. Deem o fora daqui!
— Por favor! Nos conte o que vai acontecer!
A poucos metros, a visão de três pessoas era ofuscada pelos corpos que passavam em frente à situação. Na cena, dois garotos, aqueles que havia acabado de instruir no bonde minutos atrás, interrogavam a garota ruiva.
Em uma avaliação geral, eles estavam fazendo um bom trabalho, e a mulher de olhos cintilantes era impaciente, colocando a mão sobre o rosto e suspirando forte em uma tentativa de se acalmar para não esganar aqueles que a importunavam.
— Eu já disse! Não sei de mais nada! Agora sumam ou — Seus punhos se fecharam, ficando cada vez mais vermelhos. — ou os incapacitarei de ouvirem uma nova ordem.
Diante do tom ameaçador, os dois meninos estremeceram visivelmente, abaixaram a cabeça e expressaram suas desculpas antes de saírem correndo na direção oposta.
— Francamente. — Bufou a garota, livrando-se de seus últimos resquícios de raiva.
Observei-a por alguns instantes, atentando-me a cada movimento ou careta estampada em seu rosto. Sob um primeiro olhar, ela me parecia um pouco… Insana. No entanto, logo desconsiderei sua existência; provavelmente não era uma pessoa com qual me envolveria futuramente.
Os olhares desconfiados ainda me visavam, avaliando-me de cima a baixo, mas fingindo naturalidade quando olhava em suas direções.
Era um incômodo profundo para mim. Meu corpo aquecia-se, e uma sensação de formigamento percorria minha espinha até se acumular loucamente em minha cabeça. Essa sensação perdurou por vários minutos, até finalmente encontrar conforto em meu costumeiro lugar na sala de combate.
— Está ficando famoso, Sete.
— Como assim? — perguntei, olhando para Yoshi que se sentava ao meu lado enquanto exibia seu habitual sorriso.
— Sair ontem, conversando com uma professora, não me parece uma boa opção quando se é uma pessoa passiva.
— São comentários infundados — respondi tranquilamente, dando-me conta do que se tratava. — Não possuem qualquer veracidade por trás deles.
— Verdade, mas não se importa mesmo assim?
— De fato, é algo bem desagradável. O mais lamentável é que Siris é o objeto posto nessa situação e justamente comigo.
— Então está preocupado? — questionou, recostando-se na cadeira enquanto analisava as ações de George no meio da sala.
— Não exatamente. Isso não passa de algo embaraçoso e é natural que logo caia em esquecimento.
— Ué! O que faz de volta aqui? Vai sair de novo? É por isso que não quis conversar hoje? — Elisa me perguntou quando notou meus passos pelo corredor.
Ela analisou minha roupa com um olhar curioso. Seus olhos percorreram minha calça preta até finalmente fixarem-se sobre a minha camisa branca e então subirem para encontrar os meus olhos.
— Estou voltando ao colégio. Tenho uma missão para fazer.
— Hum… Entendo perfeitamente, mas por que não me avisou antes? — questionou, levantando uma sobrancelha.
— Você acreditaria se eu dissesse que esqueci?
— Não?
— Então… considere como uma rebeldia da minha parte.
— Ohh! Como se atreve?
Retribuindo o sorriso sereno que brincava em seus lábios, aproximei-me dela e coloquei as chaves sobre o balcão a sua frente.
— Ficarei fora por uma semana. Você… poderia guardar isso para mim?
Sua expressão se iluminou como a de uma criança que havia acabado de ganhar um trabalho importante.
— Claro! Conte comigo!
— Obrigado — agradeci, tentando expressar meu alívio. — Desse modo, creio que nos veremos em alguns dias. Até lá, cuide-se.
— Você também, Sete. E… Grite, se precisar de socorro.
— Tenha a certeza de que vou — respondi suavemente em um tom irônico, já seguindo meu caminho pelo vasto e enfeitado corredor. — Afinal, como poderia esquecer da minha heroína?
Ouvi o som sutil de sua risada, mas ela não disse mais nada. Somente o silêncio marcava o primeiro interromper de um relógio.
— Sete! — Elisa gritou, demonstrando urgência como se lembrasse algo. — Posso pedir um favor?
— Bem… Pode, desde que não seja trabalhoso. — pontuei, olhando-a.
Ela revirou os olhos em desdém, abrindo a boca novamente em seguida: — Posso… Sabe, ficar no seu apartamento durante esse tempo que você estiver fora? Eu sei que é um pedido estranho, e, talvez, seja até pedir demais, mas… como você sabe, estou sofrendo para ir e vir trabalhar.
Considerei as palavras de Elisa por um tempo e acabei demorando para responder. Suas íris cinzentas encontravam e depois desviavam das minhas. E ela apenas esperou uma resposta, demonstrando, em sua expressão, ansiedade e arrependimento.
— O meu quarto é o último — respondi, arrancando um olhar surpreso da garota. — Não faça bagunça.
— C-certo!
Em meio as sombras das casas e prédios projetadas sobre a cidade, a luz ganhava mais intensidade à medida que o anoitecer estabelecia-se plenamente.
Os portões da escola, que normalmente estariam fechados a essa hora, estavam escancarados para um ambiente silencioso, e poucas pessoas eram observadas ao longe. O pátio, um lugar acalorado e barulhento, agora estava permeado de paz e somente sussurros eram perceptíveis aos meus ouvidos.
Após entrar e considerar o lugar com cuidado, acomodei-me em um canto entre o grupo de alunos que se formava em frente a estátua de Gaia. Hoje, não havia professores. Apenas alguns poucos funcionários organizavam os preparativos para um comunicado importante da diretora, a qual, inclusive, não estava presente.
— Ah! Oi, Sete — uma voz tímida, carregada de apreensão, sou ao meu lado.
Claro, eu sabia quem era e estava ciente do motivo por trás de sua eventual timidez.
— Boa tarde, Maya. Como vai? — perguntei, olhando-a de forma suave.
Maya foi primeira colega com quem construí qualquer tipo de contato e até partilhava algumas coisas em comum com ela. Por esse motivo, acreditei que nos primeiros dias, com nossa proximidade aumentando, ela já se sentiria mais confortável em conversar comigo. No entanto, nas últimas semanas, qualquer contato anterior foi esquecido, e as relações em construção foram barradas. Mantive uma simples proximidade acadêmica, e isso não foi somente entre nós, mas todos os outros.
No geral, entretanto, eu estava bem com essa situação. Na verdade, já esperava esse caminho se desenrolar pela experiência que acumulei durante anos.
— Estou bem, e você? — respondeu, evitando meu olhar enquanto observava qualquer outro lugar.
— Bem também.
Pelo canto do olho, notei seu corpo relaxar, e, então, ficamos quietos diante um do outro. O silêncio entre nós se tornava mais intenso à medida que mais alunos chegavam e, entre eles, várias pessoas da primeira turma e algumas da nossa, mas nenhum rosto realmente conhecido por mim.
Mais alguns minutos se passaram e o que parecia ser o último resquício de presença entrou pelas portas da escola.
As amigas de Maya, que haviam acabado de chegar, aproximaram-se dela e mantiveram uma conversa animada sobre coisas que não me preocupei em escutar. Emilia e Yoshi estavam igualmente agitados, e Julia apenas possuía um olhar predatório em seu rosto.
— Hum… Muito bem — a voz marcante da diretora Lilia ecoou de um corredor escuro. As luzes, como se temessem a sua autoridade, apressaram-se e demonstraram suas presenças luminosas. — Já que estão todos aqui, darei início a explicação do primeiro teste.
Os murmúrios foram cessados de imediato, e Lilia se dirigiu à frente da estátua de bronze, conversando, enquanto isso, com alguns funcionários que pareciam lhe entregar um relatório.
— Primeiramente, gostaria de pedir que prestassem atenção exclusiva a mim. Evitem perguntas durante a explicação, mas não se preocupem, pois responderei as dúvidas que permeiam seus pensamentos assim que terminar o que tenho a dizer. — Fazendo uma pausa, ela esperou que todos concordassem antes de prosseguir. — Certo. Então, como eu havia dito anteriormente, o primeiro teste se desenvolverá na Floresta Verde. Como vocês sabem, a floresta é dividida em três níveis, e a missão de vocês é conseguir algo que se encontra no segundo nível.
Suspiros surpresos e carregados de tensão escaparam da multidão à minha frente, mas ninguém ousou interromper ou comentar qualquer coisa. Todavia, a aflição era imaginável, visto que nós, alunos de todos os colégios mundiais, nunca exploramos efetivamente os níveis mais profundos de nossa flora e, portanto, mal possuímos experiência com as bestas que lá habitavam.
— O objetivo — continuou Lilia — é conseguir a pele, nem que seja um pedaço, de uma besta rank B intermediário conhecida como “urso negro”. Obviamente, essa é a única informação. Conseguir identificar ou saber o uso desse recurso, fica a cargo de vocês. — Sinalizando com as mãos, Lilia chamou um dos funcionários que estava de prontidão ao nosso lado. O rapaz, um homem moreno com cabelo curto, apressou-se em sua direção e estendeu um pequeno e prateado dispositivo esférico. — A missão deve durar uma semana, e isso significa que vocês não podem deixar os limites da mata antes do tempo necessário; fazer isso é garantia de desclassificação.
— Essa pequena esfera é um aparelho, como se fosse um rastreador, que está conectado aos dispositivos que delimitam o perímetro dos níveis. Ela possui noção de tempo e irá avisar quando vocês entrarem em um nível diferente. Além, é claro, de nos mostrar onde e quando fizeram isso. Agora — acrescentou mais animada, devolvendo o dispositivo para o ajudante — falaremos sobre os grupos. Esse é um teste em grupo, então cada sala formará quatro equipes com o mesmo número de pessoas, não sendo permitido integrantes de uma turma diferente. Os professores analisaram cada um de vocês nas últimas semanas e, como base nisso, foram escolhidos oito alunos para serem os líderes do grupo. Posteriormente, direi o nome de cada líder e cada um ganhará um aparelho esférico, bem como deverá escolher os membros de seu próprio esquadrão. Bom… acho que disse tudo. Alguma dúvida?
— Ah… — Aurélia, lembrei-me do nome, levantou a mão. — Diretora, mas e sobre os uniformes?
— Uniformes… Ah sim! Como pude esquecer? — Negando com a cabeça, Lilia suspirou fundo antes de continuar: — Assim que eu novamente terminar, pois lembrei-me de outra coisa também, cada um receberá um traje feito unicamente para esse evento. A numeração foi escolhida com base no uniforme escolar de vocês, mas foi sutilmente aumentada para permitir mais fluidez nos movimentos, então não haverá problema algum quanto ao tamanho. Outro ponto a pontuar, é sobre o tecido que incorpora uma tecnologia eficaz para evitar suor ou rasgos consequentes do esforço. Para complementar, cada membro levará consigo uma bolsa e uma espada padrão para conseguir e eventualmente trazer o recurso requisitado, mas os suprimentos serão responsabilidade de vocês.
— Por último, e definitivamente o último, tratarei sobre o que levará à desclassificação de uma equipe. À meia noite, o teste começará, então o meu conselho é que tentem dormir assim que tudo isso terminar. Vocês tem um tempo limite de 15 minutos para cruzarem a fronteira do terceiro nível, se o tempo acabar, o dispositivo que os líderes estarão carregando nos avisará e então… Vocês já sabem o desfecho. Além disso, antes da organização oficial do teste, conversei com os administradores da Guarda em nossa cidade, e eles concordaram em colaborar. O que isso significa? — Um sorriso perverso surgiu em seu rosto. — Bem, é simples: os guardas fazem a patrulha por toda cidade durante a noite e agora possuem a ordem de capturar qualquer estudante usando um uniforme preto que virem perambulando por aí. Se um de vocês forem pegos por eles, considerem, automaticamente, que o grupo inteiro está eliminado. Sobre a chegada ao terceiro nível, não é permitido que dois grupos cheguem juntos ou muito próximos, então certifiquem-se de manterem distância. E… Ah! Não caiam na besteira da individualidade. Mesmo que apenas um membro não consiga chegar antes do tempo acabar, isso resultará em uma desclassificação.
— Certo, certo — desdenhou Akime. — Mas isso é atividade colegial ou um teste para entrar na Guarda?
— Akime! Fique quieta! — advertiu Marc.
— Marc, é sério! Olhe para isso! Teremos que procurar nossa própria comida! O que faremos se não encontrarmos?
— Ah, querida, não se preocupe — Lilia a consolou em meio aos risos do grupo. — Tem muitos animaizinhos por lá.
— Diretora Lilia, você é uma pessoa cruel — retrocou a garota.
— Não… Eu sou um amor de pessoa, mas vamos retomar o foco do evento. Agora, indicarei os nomes dos líderes, e, enquanto isso, vocês receberão os recursos mencionados anteriormente, além dos colchonetes que serão dispostos para que possam descansar.
Enquanto Lilia falava, os vários funcionários que a acompanhavam começaram a se movimentar. Primeiramente, organizando os colchões logo à frente e depois passando de aluno em aluno e entregando um traje, uma bolsa e uma espada já embainhada.
Quando uma mulher magra e gentil dos olhos escuros entregou-me os objetos, senti o surgimento de um desconforto quente em meu estômago. A ansiedade e a incerteza formavam polos que atraiam a minha atenção.
O traje era semelhante ao uniforme escolar, mas a camisa era única e suas mangas eram compridas sem qualquer abertura visível. A espada era longa e estreita, sua área de corte emanava um brilho forte, marcando sua rigidez e eficiência; o cabo, por outro lado, era envolto em um couro preto macio e confortável.
— Muito bem, começarei pela turma 1. Os líderes são: Hector, Aurélia, Matheus e Bruna. Agora, os indicados da turma 2 são: Yoshi, Emilia, Victor e Marcus. Vocês, que foram mencionados, por favor, venham à frente para finalizarmos as preparações.
Seguindo o pedido da diretora, as oito pessoas formaram uma fila em frente a ela. O mesmo funcionário que havia disponibilizado o dispositivo anteriormente entregou um aparelho esférico para cada um dos selecionados e logo sinalizou para Lilia, indicando que continuasse.
— Certo. Finalizada essa parte, preciso que escolham os membros de cada grupo, e, para isso, realizaremos um sorteio para determinar quem começará escolhendo. No entanto, antes disso, peço que cada turma se separe para facilitar a formação dos grupos.
Em um breve instante, o grupo de estudantes foi dividido em dois, restando apenas nós, da segunda turma, enquanto a primeira era levada para um lugar mais distante do pátio.
— Vamos começar, então — disse Lilia, optando por dirigir o sorteio em nossa turma enquanto designava uma outra funcionária para lidar com os grupos da outra sala. Suas mãos balançaram uma pequena caixa de papelão antes de buscarem pelos papéis dentro dela — A ordem será essa: Emilia, você escolhe primeiro, depois será você, Marcus, o penúltimo é o Yoshi e o último é o Victor. Entenderam?
— Sim — responderam em uníssono.
— Muito bem, podem começar, então.
O silêncio continuou em seguida, até que finalmente Emilia considerasse sua primeira opção: — Eu… — sua voz soou indecisa. — Eu escolho a Catarine.
— Kai — disse Marcus imediatamente.
— Marc.
—Hum… Evelin. — A escolha de Victor fechou o primeiro ciclo, e logo outro se iniciou:
— Manu.
— Luna.
— Akime.
— Steve.
Essa repetição se seguiu por alguns minutos, e, então, finalmente todos os nomes foram mencionados cuidadosamente. Eu, como esperado, fui um dos últimos escolhidos. Na verdade, sendo mais exato, fui o penúltimo e acabei ficando na equipe do Yoshi junto com a Akime, Marc, Julia e Clare.
A formação dos grupos na outra turma ainda parecia longe de acabar. Cada líder demonstrava sua dúvida sobre quem escolher.
— Bom, já que vocês terminaram essa parte, podem ir ao banheiro para se trocarem. É importante que descansem o suficiente.
Em torno de uma hora, todos os aprestos para o teste estavam concluídos. Cada um de nós estava, agora, coberto com o traje leve e macio fornecido pelo colégio. Os grupos já estavam perfeitamente organizados, e alguns deles já trocavam informações entre os membros internos.
Durante todo esse tempo, após trocar furtivamente de roupa no banheiro, fiquei aqui, parado diante da imponente e bela estátua. A mulher, representada por olhos graciosos e cabelos em cachos volumosos, possuía uma expressão acolhedora, mas, ainda sim, determinada em seu rosto.
— Uma grande mulher— comentou Lilia, aproximando-se de mim enquanto analisa profundamente a estátua. — Seus feitos foram impressionantes, não é?
Olhando para ela sem entender sua aproximação repentina, só pude concordar em um breve sussurro: — Sim…
Mas, na realidade, era realmente verdade. Gaia foi uma antiga representante do primeiro distrito. Naquela época, há séculos atrás, as coisas eram muito semelhantes aos dias atuais, até porque não existiu conflito em nossa civilização, no entanto, havia uma separação visível entre os distritos, e a organização geopolítica era fragmentada.
Apesar de não ser a primeira, muito menos a última, Gaia foi, sem dúvidas, uma das maiores, se não a maior, representante. Suas ações não impactaram somente o primeiro distrito, mas o planeta inteiro. Foi ela quem criou o Conselho e estabeleceu uma união integrada entre as cidades. Além disso, foi também a pessoa que ampliou as relações interplanetárias e representou o nosso planeta em diversos debates.
Ela era uma mulher extremamente inteligente, e sua liderança promoveu um desenvolvimento sem igual ao mundo. Não é atoa que o planeta recebeu o seu nome.
— Sou uma descendente distante e… tenho orgulho de fazer parte dessa linhagem — suas palavras soaram reflexivas, como se ela relembrasse de um passado distante.
— Isso explica muita coisa.
— Oh! Sério?
— Acho que sim… Não posso garantir muita semelhança. Tudo que sei é fruto de uma leitura rasa.
— Hum… — Seus dedos tocaram seus lábios por momento. — Certo, mas esqueça isso. Meu objetivo é outro. Quero saber sobre sua experiência na nossa escola.
— Normal — respondi sem rodeios.
— Ah, garoto, não seja simplório. Realce suas observações. Conte-me os pontos positivos e negativos de tudo que observa.
— Estou sendo sincero, diretora. Não possuo opiniões significativas… Entretanto, se deseja uma avaliação, daria uma boa nota.
— Curioso… — Seus olhos repararam-me intensamente. — Tudo bem, considerarei isso como algo positivo. Agora, siga o meu conselho e descanse. Ninguém acordará vocês quando o ponteiro marcar o começo.
— Agradeço pelo aviso — balbuciei em um cochilo enquanto já partia em direção ao colchonete. — Boa noite.
— Boa noite…
Honestamente, eu já estava com sono. Não era natural, mas era compreensível. Dessa forma, não me preocupei com os olhares enigmáticos que os meus companheiros de equipe lançaram em minha direção por eu simplesmente deitar-me, sem qualquer preocupação no rosto, diante da situação que nos encontrava.
Ninguém estava cogitando acomodar-se agora, mas eu não faria o papel de alguém aflito ou animado com essa missão. Isso até poderia gerar ansiedade e desconforto, mas não curiosidade ou motivação. Por isso, eu só queria fechar os olhos e… não me importava em ser o primeiro a fazer isso.