Em Busca do Estrelato - Ato 6
Kate— Então, o que vou fazer exatamente?Repito pela terceira vez, na tentativa de fazer com que Arthur me escute em meio a pequena multidão.— Oi? Desculpa Kate, estou meio distraído.Não o culpo, estamos em um pequeno set de filmagem e desde que chegamos aqui, não o vejo parar um só instante.O ambiente pulsa com uma atividade incessante. Pessoas transitam de um lado para o outro, algumas carregando equipamentos de filmagem com aspecto imponente, enquanto outras transportaram pedaços gigantes de cenários que se reúnem no centro do espaço. Este centro se assemelha a uma ilusão arquitetônica, um cômodo falso no meio de um grande salão, onde nos encontramos. No meio desse turbilhão, me vejo levemente desorientada. As vozes se entrelaçam em conversas sobre tópicos variados, sempre envolvendo vídeo, imagem e áudio.A princípio, cogitei explorar mais de perto o funcionamento de algumas dessas máquinas incríveis, mas percebi rapidamente os olhares que me anunciavam a manter distância, lançados por aqueles dedicados ao seu trabalho. Em vez disso, decidi seguir os passos de Arthur, enquanto ele se move com confiança entre as pessoas.Então, sutilmente, uma voz familiar corta o ruído crescente, e Helena me chama com um gesto gracioso das mãos.— Ei Kate, aqui!Deixei ela cuidando dos meus irmãos por um tempo, fiquei curiosa e acabei seguindo o meu mais novo chefe para saber mais detalhes sobre o meu papel. Ao ver a quantidade avassaladora de pessoas neste local, fiquei apreensiva com a ideia de que meus irmãos poderiam se perder em meio a essa multidão. Sendo assim, não permiti que me acompanhassem.A morena esta de pé, em um dos cantos do set, acenando para mim com seu blazer azul e calça jeans. Ela se encontra diante de uma mesa repleta de doces e salgados. A princípio, questionei mentalmente sobre o paradeiro dos meus irmãos, mas minha dúvida logo desapareceu ao perceber a abundância de besteiras que tem por ali.— Aqui é uma bagunça – digo a Helena, enquanto uso minha visão periférica para localizar tanto Henry quanto Emma que estão sentados em frente a mesa, se acabando em doces.- Pode parecer assim para quem não entende muito bem o que está acontecendo – ela solta um leve sorriso e continua – mas até que estão bem organizados.— Você acha?— Tenho certeza! Os designers de produção estão a todo vapor, junto aos figurinistas que trabalham em sincronia, o diretor de arte supervisiona os ilustradores bem e o departamento de som está aparentando ser bem competente.Caramba! Eu nem sabia que existiam tantos profissionais diferentes trabalhando em um set de filmagem, me surpreendi.— Mas, tudo isso para só uma propaganda? — perguntei.— Para várias, na verdade, esse lugar faz dezenas de propagandas por dia e você vai atuar em apenas uma delasAntes que eu pudesse articular uma resposta, fui surpreendida pelo súbito silêncio que se abatia sobre o local. Um espaço que, apenas alguns minutos antes, parecia um frenesi de atividade, onde mal conseguia ouvir meus próprios pensamentos, transformou-se instantaneamente em um lugar tão silencioso quanto uma caverna isolada— Parece que chegou a hora da sua gravação – Helena conclui, colocando uma das mãos sobre meu ombro — chegamos bem na hora.— Mas ainda dá tempo de você dar uma estudada básica no roteiro — Arthur intervém, de repente.Me surpreendo um pouco com sua chegada repentina, mas o que me chamou a atenção de verdade foram suas palavras…— Como assim? Vou precisar estudar um roteiro em cima da hora?— Não se assuste tanto assim, o roteiro é muito pequeno, mal tem o que estudarEle me convida a acompanhá-lo até um dos cenários simulados, situado mais no centro da sala. Assim que chegamos, observamos diversas pessoas segurando microfones por cabos longos, enquanto outras ajustam câmeras na direção desse pequeno cenário, que consiste em um quarto com uma cadeira de madeira no centro, cercado por cômodas brancas encostadas nas paredes, ao lado de uma cama ,criando uma atmosfera confortante.— E então, sobre o que é a propaganda?— Campanha de agasalho, é basicamente um anúncio para a doação de cobertores e roupas de frio que uma empresa sem fins lucrativos está organizando – Arthur passa a cruzar os braços e então continua – Você vai ser uma jovem garota, tentado tricotar algo pela primeira vez, uma completa desastrada que está meio perdida no que fazer, mas ao imaginar o rosto feliz de quem vai receber o presente, você abre um sorriso gentil… Fácil não acha? Você pode até imaginar que está… sei lá, tricotando para o seu pai, deve ajudar a abrir um bom sorriso.— Acho que entendi — Respondo, um tanto inquieta, ele poderia ter usado de exemplo uma pessoa descente— Ótimo! — Após exclamar isso com um certo ânimo, ele chama a atenção de algumas garotas que me levam para vestir meu figurino.***Um pequeno tempo se passou e agora estou sentada na cadeira de madeira no centro do cenário, que se destaca com sua simplicidade. Estou usando uma blusa de mangas compridas em tom branco, minha saia godê, de um azul claro como o céu ao amanhecer, parece ter sido retirada de um conto de fadas junto com meus cabelos pretos caindo livremente pelos ombros. A maquiagem ressalta minha expressão, acentuando meu olhar e realçando minhas feições.Diante de mim, um par de agulhas de tricô, prontas para serem manejadas, e uma touca já tricotada até a metade, esperando ser terminada. Tudo está perfeitamente alinhado para que eu possa começar a atuar.Vejo Helena me encarar e tenho certeza de entender um “boa sorte” no seu movimento labial, Arthur fica ao lado de um homem moreno com um boné preto e óculos, que está sentado em uma cadeira de frente ao cenário.Não demorou muito até eu intender que ele é o diretor responsável por essa propaganda, todos no ambiente estão quietos, esperando as ordens daquele sujeito que finalmente começar a falar.— Som? — ele pergunta, em um tom firme.— Gravando — outra pessoa responde.— Câmera?— Foi — um dos homens por trás do equipamento de filmagem afirma.Nesse mesmo instante, vejo aquele rapaz de óculos abrir um pequeno sorriso e dizer “ação”, no mesmo momento, uma mulher fecha aquela claquete de cinema em frente a lente de uma das câmeras que ficam na minha frente, fazendo com que eu entenda de imediato que, chegou a hora de atuar.Em um movimento movido puramente por reflexo, eu comecei a tricotar como sempre, já tenho alguma prática nisso e até escutei algumas antigas colegas de trabalho dizendo ser coisa de gente velha, mas nunca me importei.O real problema veio depois, sei que o Arthur deu a ideia de pensar estar presenteando meu pai para fazer com que eu pareça feliz tricotando, mas nunca que eu iria querer presentear aquele homem.Em meio a esse pensamento, eu só abri o sorriso contagiante que mostrei para a Emma outro dia, até me surpreender com um repentino grito.— Corta!Parece que minha atuação não alcançou o resultado desejado. Logo após interromperem a filmagem, fui informado de que meu desempenho estava ruim. A equipe não buscava um sorriso alegre, mas sim uma representação “gentil”. A princípio, não compreendi completamente o que eles queriam dizer com “gentil”, nem como expressa-la da maneira que desejavam.Depois de vários esforços falhos, notei olhares impacientes se formando ao meu redor. Helena parecia preocupada, acompanhada pelos meus irmãos que observavam a situação com perplexidade. Ao mesmo tempo, Arthur permanece impassível, com os braços cruzados, sem expressar impaciência, mas com um olhar determinado.Ele se moveu lentamente, até que ficamos frente a frente.ArthurA situação esta me deixando confuso. Kate já havia falhado inúmeras vezes em um papel que, a meu ver, estava longe de ser o mais difícil que ela enfrentaria. O que me intriga ainda mais era que já vi a garota realizando coisas bem mais difíceis.Inicialmente, considerei a possibilidade de que o nervosismo diante das câmeras ou das pessoas presentes afetasse seu desempenho. No entanto, todos sabíamos que a equipa do Galaxy, em particular a sombria Alice, poderia ser bem intimidadora. Sem contar que eles também estavam registrando sua atuação.Após a quarta tentativa fracassada, fiquei convencido de que algo estava errado. O diretor havia sido claro ao especificar que queria ver uma amadora em tricô. No entanto, Kate continuou tricotando como se fosse uma especialista no assunto.Não demorou muito para que algumas pessoas se aproximassem, me questionando sobre a atriz que eu havia trazido. Eu havia afirmado que ela era excepcional e não cobrei tanto pelos seus serviços.Foi na sequência da sexta tentativa fracassada que tomei a iniciativa de me aproximar dela. Nossos olhares se voltaram, e ficaram em silêncio por alguns instantes, ambos conscientes de que era chegada a hora de abordar o problema.— Você está nervosa ou preocupada com algo? — pergunto em um tom suave.Eu não estou nervoso ou impaciente. Já sei que essa garota tem um talento incrível e também sei que ela ainda é uma novata, isso tudo é apenas um treino para desenvolver suas habilidades cada vez mais, e é completamente comum errar.— E-eu não consigo, atuar da forma que eles querem — Kate me diz isso meio cabisbaixa, apertando sua saia com as mãos.— Por que? O método de atuação que você utiliza não é aquele que se revive os sentimentos do passado no presente? Só faça isso de novo.— Eu nunca dei um presente para o meu pai e nem gostaria, sem contar que eu comecei a tricotar por curiosidade então, nunca fiz nada para ninguém, não tem onde eu buscar essas memórias.— Não importa se você não tem essa memória em específica, só se lembre da primeira vez que tentou fazer algo que nunca praticou, para alguém importante.Sorrio, colocando ambas as mãos sobre seus ombros, mantendo contato visual constante.— O que essas pessoas querem ver é o seu amor, por que não me conta uma história assim do seu passado? E tenta vivencia-la novamente nesse papel.Vejo seu olhar se tornando gradativamente mais confiante.— Entendi, vou tentar!— Ótimo. Agora mostre para essas pessoas do que você é capaz.Apesar de ainda apresentar indícios de preocupação, ela começa a me contar sua história.