Isekai Corrupt - Capítulo 58
27º Dia do Oitavo Mês do Ano – 13:45
Como Zerafine e eu já nos conhecíamos, pedi para que ficássemos no mesmo quarto. Não houve tantos problemas quanto a isso.
— Essas camas são confortáveis… Ah… — suspirei, acomodando-me.
— Me arrastando para um quarto… — sussurrou Zerafine, de forma quase inaudível.
— O quê? Disse alguma coisa, Zerafine? — perguntei, encarando-a.
— Me fala, Mero. O que a gente está fazendo numa academia como essa? — Ela me olhou com uma sobrancelha arqueada.
— Eu vim aqui por vários motivos, mas também quis visitar um conhecido. Ele vive neste reino, então pensei em dar um oi. Essa academia acabou entrando nos planos.
Na verdade, estava mentindo.
Erick estava estudando na academia e queria encontrá-lo. Também decidi que ninguém da Corrupt saberia minha verdadeira identidade. Pelo menos, não por enquanto.
— E você? O que está fazendo aqui, se isso só entrou nos planos?
— Vamos fazer o seguinte — respondi, mudando o tom. — Vamos fingir que viemos aqui em busca de conhecimento. Como você era mercenária, se puxarem sua ficha, isso pode até ajudar. Uma mercenária querer aprender mais sobre relíquias detalhadas não é tão estranho assim.
— E no seu caso?
— Zero é o meu nome dentro da Corrupt. Eu assumo várias personalidades, se for preciso. No momento, sou Mero, um jovem curioso que gosta de aprender coisas que lhe interessam.
— Então, Zero não é você de verdade?
— Não. Ele é um alter ego que uso para esconder meu verdadeiro eu. Talvez eu até odeie a mim mesmo. Por isso gosto de fingir ser outras pessoas. Kukuku.
Zerafine ficou visivelmente abatida com meu comentário.
— Então quer dizer que eu não conheço você de verdade?
— Bem, você conhece o Zero.
— Mas ele é você de verdade? Eu… nunca vou conhecer quem você realmente é?
Suspirei, olhando para o teto.
— Não tenho certeza. Não acho que meu verdadeiro eu seja interessante para você… ou para ninguém, na verdade.
Minha mente vagou.
Quando vivia no meu antigo mundo, nunca fiz nada que valesse a pena lembrar. Minha vida era monótona e sem graça. Esforçava-me em casa para ajudar nas tarefas domésticas e tirava boas notas no colégio, mas não porque era inteligente. Eu me matava de estudar.
Dormia, às vezes, cinco horas por semana. Nunca tive um sonho real, algo que me empolgasse de verdade. No fim, a única coisa que realmente valia a pena para mim era minha família.
— Eu… vou comprar algo para comermos — disse Zerafine, quebrando o silêncio.
— Tudo bem, Zerafine.
Ela percebeu que eu havia ficado pensativo e decidiu me dar um tempo. Quando chegou à porta, hesitou. Com a mão na maçaneta, ainda de costas para mim, começou a falar.
— Sabe, o meu verdadeiro eu é essa pessoa ansiosa, que vive se preocupando com o irmão… — Sua voz tremia levemente. — Eu não posso dizer que me amo, mas gosto de quem sou agora, de quem sou hoje. E… acho que gosto de saber que você conhece quem eu realmente sou.
Ela se virou rapidamente, encarando-me diretamente. Suas bochechas estavam vermelhas de vergonha.
— E-eu… eu quero saber como você é de verdade…
Mesmo usando máscara, naquele momento parecia que eu estava completamente exposto. Era como se estivesse falando com ela não como Mero, nem como Zero, mas como o verdadeiro eu que tanto desprezo: Ivan.
Zerafine fez uma careta, claramente constrangida.
— Eu vou indo. Depois volto! — E saiu batendo a porta.
Deitei-me na cama, encarando o teto.
Comecei a me lembrar de tudo que havia acontecido até ali. Fazia mais de dois meses que não chorava pela minha família. Não porque havia superado, mas porque havia me acostumado com a dor. Felizmente, encontrei pessoas que ajudaram a preencher o vazio em meu peito.
Solus, por exemplo. No início, não dava muito por ele. Mas nas noites em que ficava acordado ouvindo-o falar sobre seus sonhos de ficar com Aria e o esforço que fazia para alcançá-los, acabei criando uma admiração por ele que nunca imaginei ter.
Douglas… aquele urso foi meu primeiro oponente. Salvou-me de me tornar alguém arrogante por ter uma habilidade única incrível. Ele me mostrou o outro lado da moeda, ajudou-me a despertar para essa nova realidade. Ele é incrível. Quando penso na palavra “guerreiro”, penso nele.
Zerafine e Elzer… os dois irmãos que contratei para me ajudar contra Joy. No início, eram apenas reforços, ferramentas para garantir que Joy fosse derrotado com um golpe certeiro de três pessoas. Olhando agora, percebo o quanto fui injusto com eles.
Zerafine, em especial, mudou a maneira como a enxergo. Ela me fez ver mais do que apenas uma aliada.
Talvez eu devesse confiar mais nas pessoas, pensei. Antes que pudesse concluir meu raciocínio, senti a familiar presença de Md surgindo em minha mente.
— Olá.
Engasguei com a surpresa.
— Md! Você… você estava ouvindo?
— Não se preocupe — respondeu ela, com um leve tom de divertimento. — Faz um bom tempo que parei de ler sua mente.
Suspirei, aliviado.
— Obrigado… É tão bom ter minha privacidade de volta.
— Nesse caso, posso te dizer que você parece um pouco abatido.
— Abatido? Talvez… mas, de qualquer forma, é bom que você esteja aqui.
— Claro, o que você faria sem mim? — Md soltou uma risada curta. — Kukuku.
— Você também não ajuda muito, Md.
Ela fez uma pausa, como se estivesse refletindo.
— Claris.
— Hm? Claris? — repeti, confuso.
— Sim, é o nome que escolhi para mim.
— Ah! Que nome bonito!
— Obrigada. Fico feliz que tenha gostado.
Curioso, decidi perguntar:
— Se me permite, por que escolheu esse nome?
Houve um instante de silêncio antes de sua resposta, e seu tom tornou-se mais suave.
— Ele me lembra minha irmã.
— Sua irmã? — hesitei. — Desculpe, às vezes esqueço que você tem um corpo físico.
— Kukuku, tudo bem. Minha irmã… ela não existe mais. Esse nome me faz lembrar dela.
Senti uma pontada de tristeza em suas palavras.
— Não existe mais? O que aconteceu?
— Quando somos enviados para a mente de um ser humano, nosso corpo físico permanece protegido e intacto. Quando voltamos, é como se nunca tivéssemos saído. Mas o que está em sua mente é apenas nossa consciência.
Ela fez uma pausa, como se reunir forças para continuar.
— E o que acontece quando uma anomalia corrosiva devora uma dimensão?
Senti meu corpo enrijecer.
— Você está dizendo que a anomalia destruiu a dimensão onde sua irmã estava?
— Sim — respondeu ela com uma melancolia cortante. — Sua consciência deixou de existir junto com aquela dimensão. Já faz muito tempo, mas a dor… ainda é tão forte. Quando você sugeriu que eu escolhesse um nome, pensei nela.
Claris respirou fundo, antes de continuar:
— Ela adorava dar nomes a tudo o que possuía. Uma vez, ela me chamou assim… Claris. Ela dizia que podia nomear tudo o que era dela. Como eu era sua irmã, automaticamente eu era dela.
— Sua irmã parecia ser uma pessoa incrível — comentei, tocado pela história.
— Ela era maravilhosa — Md respondeu, com uma risada suave. — Apesar de ser fechada e séria, eu a amava profundamente.
— Detalhando assim, ela me lembra a irmã da Aria — observei, tentando suavizar o momento.
— Kukuku, é mesmo? Concordo com você. Elas têm algo em comum.
— Seu nome é lindo, Claris.
— Obrigada — respondeu ela, de volta ao tom animado. — Agora chega de sentimentalismo! Deixa eu te contar as novidades!
— Novidades? Algo interessante?
— Você não vai acreditar!
Enquanto ela falava, observei-a com um sorriso. Momentos como esse faziam-me pensar em como seria se ela tivesse um corpo físico. Algo passou pela minha mente, mas logo apaguei.
— O quê?! Solus vai ter um filho?! — exclamei, surpreso.
⧫⧫⧫
28º Dia do Oitavo Mês do Ano – 07:25
Hoje era o segundo dia dentro da academia. Zerafine estava sentada à minha frente, numa mesa no refeitório, comendo uma porção qualquer. Eu, usando máscara como sempre, apenas fazia companhia. Era um tanto estressante lidar com os olhares das pessoas, tanto de alunos quanto de funcionários.
Os olhares pareciam inevitáveis.
Aparentemente, de alguma forma, Zerafine e eu havíamos ficado conhecidos por ali. Ontem, Claris me contou coisas interessantes.
Em contrapartida, eu precisava começar a plantar algumas sementes, algo que no futuro pudesse dar frutos. Mas como fazer isso?
Que saco… Primeiro, preciso fazer uma lista de pessoas talentosas que possam vir a ser futuros membros da Corrupt. O complicado é fazer essas pessoas adentrarem na organização. Vou ter que ser seletivo.
Minha concentração foi interrompida por Zerafine, que percebeu minha expressão pensativa.
— Você está bem, Mero?
Levantei o olhar, percebendo a preocupação dela. Antes de responder, notei algo diferente.
— Você cortou o cabelo?
— Ah! — Ela saltou na cadeira, ficando visivelmente vermelha. Levou a mão à boca e tentou disfarçar com uma tosse. — Cof, cof… S-sim, cortei ontem à noite. O que você achou?
— Sendo sincero, prefiro ele como estava.
Assim que terminei de falar, ela fez uma expressão estranha, como se tivesse acabado de perder em um jogo. Ao perceber que ela não responderia, decidi continuar:
— Mas não está feio. É só meu gosto pessoal.
— B-bom… Pelo menos não está feio, né…
Ela parecia satisfeita, embora eu quase não tivesse notado a mudança. Foi quando uma voz alta quebrou o momento:
— Eduardo!
Olhei na direção do grito. Era uma garota, visivelmente irritada, gritando com um cara de cabelos ruivos em uma mesa próxima. Ele, por sua vez, sorria, enquanto ela parecia bufar de raiva.
— O que você quer, linda? — disse o ruivo, estalando os dedos e cruzando as pernas. — Ah, já sei! Talvez finalmente queira declarar seus profundos sentimentos por mim?
— Que merda você tá falando? Acha que sou uma das suas vagabundas?
Eduardo se levantou, segurando o queixo da garota e aproximando o rosto como se fosse beijá-la. Parou a poucos centímetros, com um sorriso provocador.
— Nossa, essa sua raiva me deixa muito atiçado.
A garota reagiu rapidamente, afastando a mão dele com um golpe no braço.
— Seu merda! O que acha que tá fazendo?!
— Só estou te dando atenção. Não é isso que você quer? Se quiser, pode fazer uma visita ao meu quarto hoje à noite… Só eu e você. Que tal?
— Vai se fuder, Eduardo!
Ele riu baixo, uma risada irritante. A garota fechou o punho, pronta para desferir um golpe. As pessoas ao redor vibravam com a cena.
Ela vai bater nele…
— Isso pode ser útil. Vai ser interessante.
Virei para Zerafine.
— Zerafine, vá até lá com tudo.
Sem tirar os olhos da confusão, ela respondeu:
— Certo.
Quando a garota lançou o soco, Zerafine surgiu entre os dois, interceptando o golpe com uma única mão.
— Hoo!! — As pessoas ao redor vibraram em uníssono.
— O quê?! — exclamou a garota, surpresa.
Zerafine manteve a postura séria, sem soltar o punho dela.
— Bater nele aqui não vai mudar nada. Se contenham.
Levantei-me e caminhei até onde ela estava.
Zerafine havia atravessado o espaço entre as mesas em um piscar de olhos, usando toda sua velocidade.
Observando as reações ao redor, notei algo interessante: sete pessoas no total haviam conseguido acompanhar os movimentos dela. Isso já me ajudava a identificar algumas pessoa
— Ela está certa, melhor parar com isso. — Falei, caminhando para mais perto.
A garota, que até então parecia no controle da situação, virou o olhar para mim e ficou visivelmente tensa.
— Você… por acaso é aquele novato mascarado de quem todos falam? — Perguntou, a voz carregada de desconfiança.
— Ah, sim, sou eu mesmo. — Respondi, com um tom despreocupado. — Mas, por ora, talvez fosse mais sensato você agradecer a Zerafine por impedir sua ação impulsiva.
Ela me encarou por um momento, o olhar transbordando fúria, antes de avançar até mim. Sem hesitar, agarrou minha gola com as duas mãos, os dedos crispados.
— O que você sabe sobre isso, hein? — rosnou, sua voz cheia de hostilidade.
— Olha, eu não conheço toda a história, mas posso afirmar que esmurrar esse idiota aí não vai resolver nada. — Respondi calmamente, apontando para Eduardo com um leve aceno. — Este lugar não tem regras?
— Cala sua boca, seu desgraçado! — ela gritou, ainda mais irritada. — Se continuar falando essas porcarias…
De repente, uma mão pousou suavemente em seu ombro.
A garota congelou no mesmo instante. Zerafine estava atrás dela, e seu olhar cortava o ambiente como uma lâmina afiada. Por um breve momento, o ar pareceu ficar mais pesado.
— Tire suas mãos dele. Agora. — A voz de Zerafine era baixa, mas carregada de uma intenção assassina que eu raramente via. Era algo palpável, quase sufocante.
A garota começou a suar frio.
Seus olhos, antes agressivos, agora estavam arregalados de puro medo. Zerafine raramente demonstrava esse lado, mas quando fazia, ninguém ficava indiferente.
— Q-quem… é você? — perguntou a garota, tremendo.
— A pessoa que vai quebrar seu braço se não soltar ele agora. — Zerafine respondeu, cada palavra saindo como um peso que parecia esmagar a garota.
A tensão foi cortada pela voz de Eduardo, que finalmente se manifestou.
— Ei, eu não quero interromper a briguinha de vocês, mas… de que merda você me chamou mesmo? — Ele cruzou os braços e deu um passo à frente, me encarando com os olhos estreitos.
— Ficou ofendido? Não precisa levar tão a sério. — Respondi, me virando para ele, tentando evitar que o clima ficasse ainda mais tenso.
— Eu não levo desaforo pra casa. — Ele deu um passo mais próximo, a pose de superioridade transbordando. — Mal chegou aqui e já tá querendo arranjar encrenca? Você não me conhece, então é melhor saber o seu lugar.
Soltei um suspiro, levantando uma sobrancelha.
— Ah, entendi. Você é algum tipo de rei e eu não percebi? Sinceramente, você não me parece tão impressionante assim. Por que eu deveria te respeitar? Ou, melhor ainda, por que eu deveria te dar ouvidos?
Eduardo estreitou os olhos, irritado.
— Não sabe por que? Então que tal eu te mostrar? — Um sorriso carregado de provocação surgiu no rosto dele. — Duelo. Eu e você na arena, hoje.
— Duelo? — Repeti, arqueando uma sobrancelha.
— Parece que você não está familiarizado com as regras daqui. — Ele deu uma risada curta. — Todos os conflitos internos entre alunos são resolvidos por meio de competições mutuamente acordadas. Chamamos isso de duelo. A modalidade é decidida pelos dois lados.
— E o que eu ganho com isso? Parece uma baita perda de tempo. — Disse, cruzando os braços.
— Você pode colocar o que quiser em jogo. Dinheiro, favores, qualquer coisa que esteja disposto a arriscar.
Isso chamou minha atenção. Inclinei levemente a cabeça, curioso.
— Hm, interessante. E o que você quer?
Eduardo sorriu, com os olhos brilhando de satisfação.
— Quando eu te vencer, quero que você saia da academia.
— Sair? — Questionei, tentando entender onde ele queria chegar.
— Sim. Eu prefiro manter este lugar sob controle. Até porque, um dia, eu vou herdar essa academia. — Ele falou com arrogância.
— Herdar? — Perguntei, confuso.
A garota que antes me atacava decidiu interferir.
— Esse cara é o filho do dono da academia. — Ela explicou, ainda um pouco hesitante.
— Ah, entendi. Agora faz sentido toda essa pose. — Dei um meio risada fraca, tentando provocá-lo ainda mais.
— Tsc! Não preciso do cargo para te expulsar daqui. — Eduardo esbravejou, cerrando os punhos. — Vamos resolver isso como homens. Prefiro combate corpo a corpo. O que me diz?
Por um momento, permaneci em silêncio. Claris, minha companheira mental, entrou em ação.
— Claris, analise as habilidades físicas desse cara pra mim. — Pedi em minha mente.
— Certo. — Ela respondeu, com sua habitual calma.
Eduardo pareceu se irritar com minha falta de resposta imediata.
— E então? Vai fugir? — Ele provocou, claramente tentando mexer comigo.
— Fugir? — Sorri de lado. — Não mesmo. Vamos ver do que você é capaz.s com potencial.
A tensão no ar era palpável. Eduardo me encarava com uma mistura de raiva e determinação, como se minha simples existência fosse um insulto a ele. Respirei fundo, mantendo a calma.
— Se eu vencer, você vai ter que recusar sua herança. — Falei de forma direta, minha voz soando firme como aço.
— O quê? — Eduardo praticamente cuspiu as palavras, os olhos arregalados em choque.
— Não entendeu? Vai ter que abrir mão de ser o herdeiro do seu pai. Parece que isso significa muito para você, não é? Se está tão confiante assim, por que não aceita? — Cruzei os braços, olhando para ele de forma desafiadora.
— Seu merda… — Ele rangeu os dentes, o rosto contorcido de fúria. — Tudo bem. É isso o que você quer? Então é assim que vai ser. Domingo, na arena. Não me decepcione. — Ele se virou, saindo com passos duros, claramente tentando manter a pose de superioridade.
Eu o observei se afastar.
Essa é a chance perfeita, pensei. Se eu vencer, atraio a atenção de pessoas influentes. Isso pode ser o começo de algo muito maior.
Do meu lado, a garota ainda parecia incrédula com o que acabara de acontecer. Zerafine, no entanto, mantinha sua postura imponente, os olhos fixos em mim.
— Me larga! — Gritou ela, tirando as mãos de Zerafine de seu ombro. A tensão entre elas ainda não tinha se dissipado completamente.
Zerafine me olhou com um sorriso frio, que enviava arrepios até em mim.
— Mero, esse cara… quer que eu acabe com ele?
— Não, Zerafine. Você já fez muito por hoje. — Respondi, balançando a cabeça. — Acho que vou lidar com isso sozinho.
A menina, no entanto, não parecia disposta a deixar as coisas seguirem tão calmamente. Ela deu um passo à frente, apontando o dedo na nossa direção.
— Vocês dois são loucos ou o quê? Ele é o filho do dono da academia! Vocês sabem o que estão fazendo!?
— E daí? As regras não se aplicam a ele? — Questionei, inclinando levemente a cabeça. — Se ele perder e não cumprir o combinado, isso vai afetar não só ele, mas a moral do pai dele e da própria academia. Ele sabe disso. Por isso ficou tão nervoso quando fiz minha proposta. — Cruzei os braços e a encarei. — E você? Por que estava fazendo um escândalo antes?
— Eu não estava fazendo um escândalo! — Ela retrucou, indignada. — E, para começar, eu tenho nome! Meu nome é Gloria.
Zerafine riu de canto, olhando para ela com desdém.
— Se não era um escândalo, então o que exatamente você estava fazendo, Gloria?
Ela hesitou, as palavras parecendo pesadas demais para sair. Finalmente, ela respirou fundo, encarando o chão.
— Meu pai… ele é um nobre. Amigo antigo do pai desse idiota. Desde que eu era pequena, antes mesmo de nascer, fui prometida a Eduardo como esposa. Esse babaca sabe disso. Todos na academia sabem disso. Mesmo assim, ele não tem escrúpulos!
Eu franzi o cenho.
— Do que você está falando?
— Ele dorme com várias mulheres! E vive criando confusões. Isso afeta a moral da minha família. Meu pai não pode cancelar o trato… é algo feito há muito tempo. Estou presa a esse contrato de casamento ridículo.
Zerafine não parecia impressionada.
— Presa? Por que você não foge?
— Fugir? Para onde? — Gloria respondeu com a voz embargada. — Se eu fugir, isso vai refletir na minha família! Minha mãe e meu pai perderiam toda a reputação.
— Tsc.
Zerafine virou o rosto, como se estivesse impaciente com aquela resposta.
Eu cruzei os braços, tentando entender a situação.
— Então, você estava tentando falar com Eduardo para ele tomar jeito?
— Sim! Ser vista como uma idiota que deixa seu futuro marido fazer o que bem entende é insuportável! Mas o que eu posso fazer? Não tenho poder para resolver isso!
As palavras dela ficaram no ar por um momento, até que algo começou a tomar forma na minha mente.
Um favor de um nobre poderia ser algo extremamente útil…
Olhei para Gloria e sorri.
— Daqui a pouco a aula vai começar. Gloria, certo? Estava pensando… gostaria de fazer um trato comigo?