Lumen Saga - Capítulo 29
A moça pressionou ainda mais o ombro de Theo. Ela era alta, um pouco maior que ele. Seus cabelos eram curtos e pretos, um pouco mais claros que os de Luanne. Os olhos adotavam uma tonalidade azul-médio. Vestia um quíton branco com uma calça preta por baixo.
— Lady Luanne, ele é frágil — comentou.
— Selina, pode soltá-lo? Por favor — pediu Luanne.
— Ele desfaleceu com um golpe. Não consegue reagir ao meu pé que lhe prende. Tem certeza que quer o treinar? — indagou Selina, ignorando as ordens de sua superiora.
Na surdina, enquanto Selina menosprezava Theo, ele criou um vórtice silencioso.
— Tudo bem, ele segurou minha flecha. Porém, isso não dá méritos para… — Os olhos da garota se arregalaram.
Theo explodiu o vórtice, lançando a garota para cima com o impulso do vento. Selina deslizou no chão e pousou ao lado de Luanne.
“Não consegui sentir o núcleo dele se preparando para o feitiço… Como ele fez isso?”
“Ela é um monstro fisicamente…” pensou Theo. “Provavelmente é uma condutora.” Tentando se recompor, ele tentou se erguer.
— Theo, esta é Selina, minha aprendiz. Selina, este é Theo, meu afilhado e sim, um homem abençoado por Alunne. Problemas quanto a isso?
— Por enquanto, sim.
— Foi por isso que escolhi você. Theo, Selina, vocês serão parceiros de combate. A Selly é uma veterana de Vagus com nove anos de experiência. Theo…
— Quero ouvir dele — interrompeu Selina. — Me juntei à senhorita Alunne para enxergar o mundo de cima. Onde os imperadores jamais chegarão. Busco o meu paraíso próprio…
— Certo, tudo bem. Eu não me importo com o que você quer ou com os seus objetivos — retrucou Theo. — Só estou me importando com o soco que me deu. E em como irei devolvê-lo.
— Vingativo, né? — brincou a caçadora.
Num simples movimento, Theo surgiu ao lado de Selina, pronto para golpeá-la: com a perna direita servindo de apoio enquanto o braço esquerdo tentava interceptar os movimentos de Selina, o punho direito estava preparado para acertar o rosto dela.
Desviando o olhar para baixo, e notando que ele estava perto de acertá-la, Selina desviou agilmente.
Utilizando seu atributo de vento, Theo impulsionou seus chutes e socos com um único objetivo em mente: acertar um único golpe nela. Mesmo que ele notasse um oceano de diferença entre os dois.
“O Theo é explosivo?” questionou a si. Luanne analisou os movimentos do seu afilhado cuidadosamente.
Por um milímetro, Theo não acertou Selina. A cada movimento que ele desferia, mais próximo ficava de acertá-la.
“Ele está ficando mais explosivo a cada golpe…” pensou Selina, se esforçando para deixar Theo golpeá-la. “Seus movimentos parecem um passe de dança. A sincronia não só com o próprio corpo, mas sim com o próprio vento… ele é tão… imprevisível!”
Theo chutou o ar com força, quase acertando sua adversária.
“Tem algo de errado aqui…” pensou Theo. “Não existe forma de desviar do próprio vento. Exceto se tiver velocidade para isso. Ela não tem, isso eu afirmo. Porém, como ela faz isso?”
Os olhos de Selina se estreitaram em desânimo. “Estou infelizmente proibida de atacá-lo…”
Pisando o pé direito no chão, Theo contra-atacou rapidamente com um chute de esquerda. Selina, por sua vez, desviou do chute e atacou a perna de apoio de Theo. Quando ela pensou ter vencido, Theo a surpreendeu com um soco veloz de última hora.
“Entendi. Ele difere de um desviante. Em vez de conjurar o elemento do próprio núcleo para criar um feitiço, ele utiliza o ar presente na atmosfera para isso. Esse garoto consegue alterar a direção e velocidade do vento com tanta eficiência que me leva a crer… que ele consegue alterar os vetores! O poder de um núcleo neutro utilizado de forma verídica, magnífico! Contudo…”
— Ainda é ineficiente — disse Selina, desviando do golpe e segurando o braço de Theo, consecutivamente, jogando-o contra o chão.
Theo suspirou em desconforto.
— Me desculpe — pediu, virando o rosto para o chão.
“O que aconteceu comigo?” refletiu.
Parecia que, por alguns segundos, o sentimento de raiva tinha controlado ele. Estresse? O que poderia ser? Liam Mason quem tinha esses surtos de raiva e atacava quem o irritava. Contudo, Theo jamais teve isso.
Foi apenas uma teoria momentânea, mas Theo pode ter assimilado parte da alma de Liam durante o processo do Nirvana, adotando alguns costumes questionáveis.
Luanne caminhou até seus aprendizes com uma expressão perplexa. “O Theo não é tudo o que me falaram… talvez eu tenha colocado muitas expectativas sobre ele…” pensou.
— Selina. Na sua opinião, qual o maior ponto fraco dele? — indagou Luanne.
— Talvez o controle de energia — retrucou. — Ele consegue manipular o vento melhor que todos que já presenciei. Porém, ele deixa explícito que atacará. A guarda sempre está baixa. Quantos anos ele tem?
— Quinze. Já está entrando na época do ápice evolutivo.
Selina liberou Theo, que se sentou no chão de pernas cruzadas. Luanne desceu o braço direito, descansando no ombro de seu afilhado.
— Acho que em uma caçada ele pode evoluir mais… — começou Luanne. — … posso contar com você para guiá-lo?
— Não quero, porém…
— Eu não irei. — Theo cortou Selina. — Não até acertar um soco nela.
— Agressão contra mulheres? — ironizou Selina.
— Não existe honra ou leis aplicadas em batalhas entre desviantes. Luta até a morte, é luta até a morte. A única lei é não se segurar.
— Olha só — riu. — O que quer, então? Tempo para treinar?
— Estudar. Preciso de três dias — retrucou, trocando olhares.
— Irá estudar o quê? — indagou, franzindo as sobrancelhas.
— Dizer o que farei só iria te deixar mais na vantagem. É igual explicar como funciona sua técnica para um inimigo.
— Estou orgulhosa — disse Luanne, com orgulho no peito e bagunçando o cabelo de Theo. — Queria que fosse rápido. Mas, como nem tudo no mundo se resume aos meus desejos… Terei que pedir permissão à diretora da sua escola. Se comporte caso for para alguma academia…
— Está falando comigo, ou com uma criança? Eu sou educado.
— Tendo a Camille como mãe? Me impressiona que você não seja formal até com seus amigos… Tudo bem. Selina, preciso da sua ajuda em uma coisa no templo.
— Claro, milady. Até mais, cachinhos dourados.
— Tchau — retrucou desanimado.
As duas mulheres se retiraram, enquanto Theo continuou sentado, encarando suas próprias mãos abertas. “Que sensação estranha é essa? Por que eu não pareço ser… eu?”
Ele suspirou profundamente, apoiando-se no chão novamente.
“O que aconteceu? Por um instante, é como se… eu tivesse perdido a razão. Continuo em conflito interno? Talvez. Porém… o que Alexander disse me afetou? Saber que foi alguém que matou todos naquele dia e não uma falha mecânica…”
Theo revirou a cabeça para cima e explodiu mentalmente. Um grito sem som foi interrompido por um suspiro genuíno. A respiração do rapaz tomou um ritmo acelerado e sem sentido, assim como seus pensamentos.
“Por que eu me sinto tão inseguro? Por que eu… sou tão inferior a mim mesmo? O que difere o novo eu do antigo eu?” refletiu. Estalando a língua, ele se levantou com uma conclusão: “Preciso entender o que significa a força…”
☽✪☾
Após descer o monte celestial, Theo perambulou por Fulmenbour sem rumo, ainda imerso em reflexões sobre si. As perguntas mais persistentes em sua mente eram: “Por que fingir que não sou quem realmente sou? Qual o sentido disso tudo? Por que eu odeio tanto Liam Mason?”
O bloqueio de potencial de Theo está vinculado a isso. Enquanto não conseguir uma resposta para todo seu ódio de si, não será capaz sequer de viver como um indivíduo. Mesmo sabendo disso, ele não consegue largar o que o atormenta.
Uma dor de cabeça poderia tê-lo derrubado por estresse, no entanto, ele encontrou seu maior calmante enquanto retornava ao hotel em que estavam hospedados: café.
Faltavam apenas alguns minutos para o entardecer, então, uma xícara de café nesse horário era suficiente para acalmar a mente de Theo por algumas horas.
“Vamos lá, Lawrence. Disciplina, disciplina. Se Amiah olhasse nos meus olhos agora, iria me dar um soco com toda certeza… E meu pai… Me cremaria vivo.”
Theo levou a xícara de café aos lábios, mas seus olhos tremeram com suas mãos. O coração palpitou forte o suficiente para causar dores agudas no peito.
A mente de Theo parecia estar sendo atacada por uma tempestade generalizada. O garoto não conseguia pensar em nada, sequer raciocinar. Até mesmo o ambiente confortável da cafeteria parecia hostil.
Nenhuma palavra saiu de sua boca, mesmo que estivesse tentando pedir ajuda. Um zunido invadiu sua audição, anulando qualquer outro som.
No entanto, esse mesmo zunido foi interrompido por uma voz doce proferindo as palavras:
— Achei você.
Uma mão gentil, mas firme, pousou em seu ombro direito. Theo virou o rosto para o lado, buscando a autora da voz, e mesmo com a visão borrada, pôde perceber os fios de cabelo dourado de uma mulher.
— Oi, irmão — disse Thays, a irmã mais velha de Theo. — Você é um homem difícil de encontrar, né?