O Belo e a Medonha - Capítulo 7
Com seu quepe na cabeça e farto, nosso cavaleiro saiu daquela sala de interrogatório apenas querendo se deitar e esperar o próximo dia surgir. Para sua tristeza, o sol reinava ao meio dia no céu, ainda havia muito trabalho a ser feito.
Ele pensou em voltar para pensão, porém, algo muito agradável que ele havia descoberto nesse dia martelou em sua cabeça.
Algumas ruas dali, um comércio singelo e humilde se destacava na paisagem caipira. Não havia placa ou identificação, não que precisasse.
O cheiro de licor e álcool inundou as narinas do cavaleiro antes mesmo de entrar. Dentro, ele foi recebido por um singelo “Seja bem-vindo” e um toque de um sino sobre a porta.
— Capitão Tsezar, como é bom vê-lo — disse Anatol, enquanto enxugava uma caneca.
— Decidi beber um pouco.
Antes de chegar à bancada — onde o dono do lugar guardava suas garrafas — o loiro teve que cruzar por todo o estabelecimento, passando pelos dois únicos homens que “bebiam” naquele horário.
Com os braços apoiados sobre a mesa, o rapaz observava o local. Era bem iluminado, havia várias janelas deixando a luz do dia adentrar, o estilo rústico, revestido em madeira dava um ar mais singelo.
— O que o senhor vai querer?
— Tem algo semelhante a fumo aí?
Por detrás da mesa, Anatol se abaixou e pegou um pequeno pote de madeira, uma vela e uma folha amarelada.
Ele derramou um pouco de um pó preto sobre a folha e entregou ao rapaz.
Tsezar lambeu a ponta do papel e o enrolou em forma de cachimbo. Para completar ele acendeu a ponta com a vela.
Com o fumo em seus beiços, o loiro fez o ritual clássico, tragar com força e soltar uma pequena cortina de fumaça.
Enquanto fumava, Tsezar observava os homens que discutiam perto dali. A mesa que eles ocupavam estava vazia.
Ao terminar seu fumo, o rapaz se virou e perguntou: — O que tem de mais forte aí?
Sem responder, Anatol se virou e pegou atrás de si uma garrafa grande e parda que estava no topo da estante. Tsezar agarrou a bebida e seguiu até a mesa ocupada.
Cochichando, um dos homens disse: — Na próxima teremos mais sorte…
— Olá, meus colegas!
Com o barulho da garrafa batendo sobre a mesa, os dois homens se assustaram e se viraram para o rapaz.
— O que estão conversando ai?
Eram os bandidos de 2 dias atrás. O homem rechonchudo, se tremia em ver o oficial ali. O segundo, esguio, o encarava com temor, lentamente abaixando sua mão pela mesa.
— Como você nos achou!? — disse o homem rechonchudo.
— Ah, depois da bela receptividade que vocês me fizeram antes de chegar aqui, eu deveria agradecer — disse, puxando a garrafa e pedindo ao barman três copos. — Que tal um drink?
Anatol colocou os recipientes na mesa e os serviu da bebida que tinha. O líquido exalava um cheiro forte, capaz de abater um animal de pequeno porte. O barman saiu em seguida.
Perto de conseguir tirar a faca de sua bainha, o homem magro é cortado por Tsezar, que chegou perto do ouvido dele e disse baixinho, mas alto o suficiente para seu irmão ouvir.
— Melhor não tentar fugir, senão conto pro papai prefeito de vocês o que tentaram fazer comigo.
— Como você descobriu…!? — coxixou o magricelo.
— Eu só suspeitei quando vi o líder da vila, e agora vocês confirmaram.
Com a bebida a sua frente, os irmãos os encaravam cabisbaixos.
— O que você quer com a gente…? — disse o gorducho
— Informações.
Com o copo em mãos, Tsezar ia “molhando a garganta” com o licor. O rapaz engolia a seco o líquido.
— Primeiramente seus nomes.
Virando o copo, o homem esguio sentiu a força da bebida quando ela rasgou sua laringe. Após beber ele disse: — Meu nome é Oton, o dele é Haskel.
— Sobrenome.
— Wójcik — falou Haskel, engolindo um pequeno gole, ele reagiu imediatamente. — O que raios você pediu!?
— Sangue de Cervo, mata até rato.
Diferente de seu irmão, Oton reabastecia seu copo com frequência. Não que não estivesse afetando ele, era visível que seu rosto se avermelhava a cada gole.
— O que, ric, você quer?
— Vocês conhecem Jaina Zhuk?
— É óbvio! A mulher mais linda, ric, que esse lugar já viu, todo mundo aqui já teve um sonho molhado com ela.
O irmão esguio já tinha se rendido à bebida, ele era fraco perante o álcool.
Haskel se recusava a beber, ele encarava o copo com desconfiança.
— Todos não! Você! Tomou um fora dela e quer jogar a bola pros outros!
— Não se faça de santo, fracote! Você era caidinho, ric, por ela, mas não teve coragem de se declarar!
— Fracote!? — Com o copo em mãos, Haskel o virou e engoliu tudo. — Pelo menos não tomei um toco e uma surra do irmão dela!
Tsezar observava atentamente a discussão dos irmãos, por dentro ele ria sem parar.
— Casimiro Zhuk, ele é tão terrivel assim? — perguntou o oficial.
— Precisamente, ric, super protetor do cacete, desde que o velho do pai dele morreu ele só piorou.
A cada diálogo, mais a garrafa se esvaziava, fosse Tsezar ou Oton, até mesmo Haskel havia se rendido à bebedeira.
Quando os Irmãos Wójcik já estavam fora de si, o investigador começou a fazer perguntas mais comprometedoras.
— Quem vocês acham que cometeu esses crimes todos?
— Óbvio que foi aquele, ric, cachorro mutante, todos viram e todos sabem disso.
— Nem sei pra que chamar um oficial, poderíamos cuidar daquele bicho sozinhos. Meu pai sempre exagera.
Antes do gorducho terminar de falar, a garrafa já estava vazia, Anatol rapidamente retirou a velha e colocou uma nova. Os três revitalizaram seus copos.
— Por isso vocês andavam naquela floresta sem medo de serem atacados?
— Nah! Os irmãos Wójcik não temem nada!
Nesse caso, Tsezar teve que abrir uma exceção. Ele se matou de rir ao ouvir aquilo, a ironia era grande demais pra ignorar.
— Então se fosse vocês no lugar das três vítimas, vocês teriam vencido?
Os dois irmãos, mesmo bêbados, se encararam em confusão. Até que Oton tomou a frente e perguntou:
— Três? De onde você tirou isso?
— Os três mortos… Sabe, Antoni, Estanislau e Nikolai.
— Mas não tem só três, quem te disse isso?
Quando o magrelo terminou de falar, um estalo se fez na cabeça de Heiko, ele prontamente tentou impedir seu irmão de terminar. Fosse com coxixos ou com o dedo na frente dos lábios.
— …?
— Não é nada senhor oficial! Meu irmão só está muito bêbado!
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Após a bebedeira, os irmãos não se aguentavam em pé. Tsezar teve que sair, já que não tinha como tirar informações de dois homens incapazes.
Mesmo bebendo tanto, ele ainda estava consciente e sóbrio, tornando o caminho de volta simples e rápido.
A pensão estava vazia quando ele chegou, não que isso o surpreende-se. Em seu quarto, o rapaz jogou seu quepe longe e caiu na cama.
Pricyla, sua fiel escudeira, retirou do bolso do uniforme, a porção de papéis que ele havia feito pela manhã. Não antes de guardar o quepe e a papelada em cima da cômoda.
— Obrigado Pricyla…
Os minutos se passaram até Tsezar resolver levantar. A luz do pôr do sol entrava pela janela, ela deixava tudo em tom avermelhado.
Com os documentos em mãos, ele relembrava tudo que ocorreu no dia. Fosse as incongruências do relato dos irmãos Zhuk, fosse as informações passadas por dois bêbados.
— Será que eu devo confiar no que uma dupla de bêbados disse?
Ao longe, Pricyla chacoalhava a cabeça em negação.
Pelo restante da noite ele ficou encharcado de papelada. Transcrever tudo que Oton e Haskel disseram e preparar para o dia de amanhã. Ele planejava algumas coisas relativas a Jaina e Casimiro Zhuk.
Mas antes, com a ponta do lápis, o rapaz criou uma pequena bolha de sangue em seu dedo indicador.
Tocando-a sobre a palma, ela se espalhou de maneira aleatória. Aos poucos uma luz azul marinho se fez quando o rapaz disse as seguintes palavras:
— Como a luz que ilumina os nossos mares, a República virá no acolher de seu povo… surja!
Após um pequeno clarão, um corvo mensageiro surgiu. Em sua cabeça uma pequena bandana, em seu peito, uma bolsa para armazenar mensagens.
— Leve isso ao Coronel, rápido!
Com uma continência rápida, o corvo acatou a ordem e voou apressadamente pela janela.
A papelada estava pronta, livre disso, Tsezar teria que fazer algo que ele queria evitar. Sair do quarto, ir até a frente da pensão e pedir a dona algo para comer e um banho.
Uma onda de alívio tomou conta do rapaz quando ele chegou ao local desejado e viu o lugar ainda vazio.
O grande problema seria passar a noite faminto e sujo, sobrando apenas a opção de perambular pela vila a noite à procura de algum comércio.
Estranhamente, mesmo que o sol tenha se posto a pouquíssimo tempo, as ruas estavam vazias. O que mais surpreendeu o loiro, foi saber que quando ele chegou, as pessoas trafegavam em grande fluxo.
Por longos minutos ele andou e andou por estradas vazias, tendas abandonadas e negócios fechados.
Até que um grito de um pássaro chamou a atenção do rapaz.
— Gráh, loiro idiota, loiro idiota!
— Capitão Tsezar, o que faz tão tarde da noite?
Heiko e seu fiel amigo caminhavam com uma lamparina em mãos até encontrar o faminto.
— Estava querendo comer algo, mas parece que não tem nada aberto.
— He, he, não somos muito fãs da vida noturna por aqui. Por que não me acompanha? Vou jantar quando terminar de acender os postes.
Mesmo com o estômago roncando, o loiro aceitou, ele ganharia algo para comer depois de tanto tempo.
— Faltam quantos?
— Treze.
O grito interno do rapaz foi tapado por uma máscara de profissionalismo que ele deveria manter.
Por mais longos minutos, Heiko foi acendendo postes e Tsezar foi o acompanhando.
O sistema das luminárias eram extremamente modernos.
Tudo que o senhor precisava fazer era aproximar a chama da lamparina na base do poste que na parte de cima já acendia uma chama azulada constante.
— São bem eficientes esses postes, devem ter sido caros.
— Não custou nada aos nossos bolsos, essa foi a única contribuição que a república nos fez.
— Para um vilarejo tão pequeno?
— Tive que pedir a Deus e ao mundo para eles fazerem, também fiquei surpreso.
Após uma longa caminhada por metade da vila, finalmente Heiko abriu as portas do seu casarão. Ainda no quintal era possível sentir a fragrância de um banquete.
Dentro da residência, a dupla passou por poucas salas até dar de cara a origem daquele cheiro.
O rapaz se deu de cara a uma grande mesa, cheia de comidas de alta qualidade, iam de carnes a vegetais muito bem preparados.
Servindo uma larga panela de algum tipo de sopa, estava uma mulher com um cabelo castanho à altura do ombro e um óculos pardo.
Mais uma vez Jaina aparecia para o tormento de Tsezar.
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Em outro lado do vilarejo, dois bebuns se levantavam com uma dor de cabeça extrema.
— Irmão, tá acordado? — disse Oton com a mão sobre a testa.
— Infelizmente…
Por trás da dupla, Anatol surgia com um papel de bolso nas mãos.
— Boa noite rapazes, creio que isso seja seu — falou entregando a conta.
Heiko foi o azarado que teve de ler o que estava escrito.
O pagamento de todas as bebidas e o fumo de Tsezar pesou nas costas dos rapazes.
— Vinte peças de ouro!
— Sangue de cervo é a bebida mais cara que temos.