O Despertar Cósmico - Capítulo 1
Elena estava sentada em sua mesa, no canto da sala de aula. Ao fundo ouvia sua professora lendo algo em seu livro, mas não estava prestando atenção, observava de forma distraída a janela ao seu lado.
Pela localização do prédio, a vista poderia ser bonita; não muito longe dali estava o centro da cidade e a área mais rica. Infelizmente, daquela sala não era possível ver nada além da área industrial da cidade espalhando uma fumaça densa pelo céu.
Ela deixou escapar um longo suspiro enquanto passava o olhar pela sala de forma desanimada. Em seu fone de ouvido não estava tocando mais nada, sua playlist havia repetido diversas vezes e ela já estava cansada.
Quando o sinal tocou, ela foi a primeira a guardar as suas coisas e sair da sala.
Algumas alunas a pararam, chamando para sair depois da aula, mas ela já tinha planos e recusou amigavelmente.
Assim que ela chegou no corredor da escola viu o caos habitual.
Os alunos corriam de um lado para o outro, apressados para irem embora — alguns até mesmo usavam seus poderes para se esquivar dos outros alunos no caminho — e a gritaria escoava pelo corredor.
Alguns alunos estavam parados, observando uma discussão, mas Elena não conseguia ver o que estava acontecendo.
Até que um aluno foi arremessado na parede ao seu lado, batendo com as costas com tanta força que a parede trincou.
Do outro lado do corredor, Elena viu Vitor, também conhecido como Volt — devido ao seu poder de controlar a eletricidade — avançando com ódio na direção do mesmo garoto.
— Que merda você pensa que está fazendo, Volt? — questionou Elena.
Volt parou e olhou para ela abruptamente, e por um momento ele ficou surpreso demais para ter qualquer reação, mas então um sorriso debochado lentamente surgiu no seu rosto quando disse:
— Oh, queira me desculpar, Rainha! Não vi que a realeza tava passando aqui. Não precisa se preocupar, estou apenas dando uma lição nesse Classe Baixa.
Elena desviou o olhar para o garoto que tinha sido arremessado na parede. Ele ainda estava consciente, mas se contorcia no chão, parecendo sentir muita dor.
— Quer saber de uma coisa? Eu vou me preocupar com isso, sim! Pode deixar que a sua Rainha vai assumir daqui para frente. — Elena se virou para Volt novamente e o fitou com seriedade, o desafiando a se opor a ela.
Volt encarou os olhos verdes da garota e hesitou. Uma gota de suor frio escorreu pela lateral do seu rosto, e por um momento ele reconsiderou.
Ele sabia da fama da garota; A pessoa mais forte da escola.
Aquela que o próprio Rei disse não conseguir derrotar, por isso foi apelidada de Rainha.
Mas Volt não recuaria — ele não podia. Conseguia sentir os olhares dos outros alunos focados nele, e sabia que não podia demonstrar fraqueza.
A eletricidade percorreu seu braço esquerdo, os raios amarelo esbranquiçado arrepiando os cabelos do seu corpo com a estática antes de serem absorvidos pela sua pele novamente.
— Você vai se arrepender disso, garota. — Volt parecia estar tentando soar confiante, mas falhou miseravelmente e tudo que transmitiu foi insegurança e medo.
— Veremos.
As pontas do cabelo castanho da garota flutuavam no ar. A força psicocinética exercida por ela fez uma pressão se espalhar pelo corredor.
Os alunos em volta recuaram um passo para trás — assustados, temerosos — mas não conseguiram evitar de parar e observar a cena, curiosos e fascinados. Volt apontou a mão esquerda para a Elena, o rosto tenso e ansioso.
As descargas elétricas percorreram seu braço até a ponta de seus dedos e depois dispararam para frente.
Os raios se moveram em extrema velocidade, estalando no ar — suas faíscas iluminando o corredor — mas, quando faltava um metro para atingir Elena, os raios bateram em uma parede invisível e explodiram em uma onda elétrica, liberando um clarão ofuscante que engoliu todo o corredor momentaneamente.
Volt ergueu as mãos para bloquear a luz, surpreso demais para ter qualquer outra reação. Mas Elena não perdeu tempo. Se projetou para frente com sua telecinése e manteve seu corpo flutuando a centímetros do chão enquanto avançava.
Quando o garoto viu a Rainha se aproximando já era tarde demais. O punho da Elena atingiu o peito dele e um som semelhante a de uma arma disparando ecoou pelo corredor pouco antes do Volt ser jogado contra o chão.
O piso rachou com o impacto das costas do garoto, e todo o prédio pareceu estremecer.
Volt ficou com o corpo praticamente afundado no chão, e se contorceu uma última vez, gemendo de dor, antes de ficar inconsciente.
Elena abriu e fechou a mão, alongando os dedos, enquanto observava o Volt caído na sua frente. Sentiu o formigamento percorrer seus dedos, e ela odiava aquela sensação.
Tudo relacionado aquelas lutas e violência gratuita que dominavam a escola só causavam repulsa na garota. Não conseguia entender porque os alunos faziam aquilo.
Elena olhou ao redor e viu os alunos sorrindo e comemorando a vitória dela, como se aquilo fosse uma competição.
“Aposto que estavam se divertindo do mesmo jeito quando era o Vitor batendo naquele pobre coitado. Por que alguém iria ficar feliz com isso!? Por quê ninguém tentou separar?”, pensou ela, mas nada disse. As escolas sempre foram daquele jeito.
Desde que o sistema de hierarquia foi criado, as pessoas lutam para provar sua superioridade.
A violência continua desorganizada e gratuita, mas agora chamam isso de competição e contratam pessoas com poderes de cura de alto nível, e então fingem que está tudo bem.
“Não está tudo bem. Algumas pessoas não querem participar dessa idiotice da hierarquia. Algumas pessoas simplesmente querem viver uma vida normal. Mas não temos escolha, ou lutamos por uma posição alta o suficiente para que ninguém implique com a gente ou nos tornamos alvos constantes dos Nobres”, a garota refletiu, se sentindo cada vez mais irritada com a situação.
Elena respirou fundo, tentando se acalmar e manter a mente clara.
Sempre que tinha que se envolver em uma briga, seja em uma disputa de Classes ou para defender alguém, ela acabava se irritando com esse sistema ridículo de Hierarquia.
Quando se virou para trás, procurando o garoto que ela estava defendendo, ficou surpresa ao perceber que ele não estava mais ali.
Em algum momento durante a briga ele deve ter aproveitado para fugir.
“Que ingrato! Eu não recebo nem mesmo um obrigado, hein?”, pensou ela, mas não o culpava, ele provavelmente estava apavorado.
Naquele momento, Elena decidiu que estava farta de ficar ali. Ajeitou a sua bolsa e em seguida saiu andando. Os alunos em volta abriram espaço para ela passar, alguns até a elogiando, embora Elena não sentisse a menor necessidade disso.
No portão da escola ela se encontrou com a sua melhor amiga, Amanda, uma garota da sua idade, de pele morena, cabelo preto e olhos de um castanho-claro.
— Por que você demorou? Aconteceu alguma coisa? — perguntou Amanda, quando Elena se aproximou.
— Não foi nada, eu só tive que separar uma briga — respondeu Elena, despreocupadamente. — O Alan ainda não chegou?
— Na verdade ele foi na frente, disse que encontraria a gente no caminho — Amanda respondeu, enquanto as duas começavam a caminhar. — Acho que ele tava tentando ligar para o hospital onde mãe dele tá.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não, ele só disse que tinha uma visita pra hoje, então foi na frente. Enfim, mudando de assunto, cê ficou sabendo que o herói Niveis vai vir à nossa escola?
— Níveis? — Elena franziu as sobrancelhas confusa.
— Niveis, não Níveis. É o Lorde do Gelo. Lorde é só o título, seu nome de herói é Niveis.
— Ah, não sabia… É um nome bem ruim.
— É latim, não é ruim — Amanda defendeu com um fervor que fez Elena rir.
— Tá, tudo bem. — Elena agitou a mão no ar e se forçou a interromper a risada. — Voltando ao assunto, eu não ouvi nada sobre essa visita.
— Achei que o Alan tinha te contado. A gente tava no Conselho Estudantil quando a diretora veio avisar isso. Ainda não tem um dia certo, é pra gente organizar essa parte.
— Hmm… Não sei se isso é uma coisa boa. — Elena refletiu por um momento. — Ele não estava envolvido com aquele grupo de vilões?
— Isso é apenas um boato, Elena. O Niveis nunca se envolveria com os Babacas da Justiça.
Elena não disse mais nada, não queria começar uma discussão com a amiga, mas ainda assim ela não conseguia confiar em uma pessoa que pode estar envolvida com o Imperador.
As duas garotas caminharam tranquilamente pelas ruas da cidade, realizaram uma parada na sorveteria e outra para ver duas pessoas que passavam voando no céu acima delas, provavelmente apostando uma corrida.
Quando estavam chegando na casa da Elena, Amanda se despediu da amiga e foi na outra direção.
Assim, Elena seguiu sozinha a partir dali, pegou seu celular e colocou uma música em seu fone. Ao longe, ela viu a floricultura da qual seus pais eram donos.
A casa dela ficava no segundo e terceiro andar da floricultura. Sua mãe abriu a loja assim que largou o serviço como heroína profissional. Elena gostava de morar ali, amava viver cercada por flores.
Era agradável e pacifico.
Elena estava tão distraída ouvindo a música enquanto caminhava que quase não notou o garoto parado ao lado de uma árvore.
Ele tinha olhos castanhos, assim como o cabelo — que tinha sido cortado com um degradê bem feito nas laterais. Usava uma blusa de frio roxa, e seu rosto era bonito e possuía um porte de atleta. Parecia transmitir uma aura amigável quando se aproximou dela com um sorriso.
Por isso a garota o reconheceu assim que o viu.
— Alan? O que tá fazendo aqui? — Elena perguntou enquanto se aproximava dele.
— Tava te marcando. Preciso falar com tu — respondeu ele, enquanto começava a caminhar na direção dela. — Cê ficou sabendo que o Lorde do Gelo vai fazer uma visita na escola?
— Fiquei, a Amanda contou.
— Então…
Logo após um momento de hesitação, no qual ficou olhando em volta como se temesse que alguém o escutasse, Alan, por fim, deu continuidade ao que dizia:
— Querem convidar o Star também, preciso que vote em não chamar ele. Vou conversar com a Amanda também, com o voto das duas e o meu, se pá a gente consegue cancelar o convite dele.
Elena olhou pensativa para Alan antes de responder. Não precisava perguntar o motivo desse pedido, ela sabia muito bem qual era. E era justamente por isso que ela se sentia mal por ele.
— Eu vou ver o que eu posso fazer, mas o Johnny ainda controla quase todo o Conselho Estudantil, se as pessoas seguirem ele, pode ser que meu voto não sirva de nada.
— É por isso que eu tô pedindo para tu fazer isso! — disse o garoto. — Quem melhor para enfrentar o Johnny se não tu, a Rainha da nossa escola?
— Não sei… Quem sabe o Rei? — Ela fez questão de colocar ênfase no título que Alan odiava quase tanto quanto ela própria odiava falar sobre o Jhonny ou o seu próprio título de Rainha.
— Até poderia ser verdade… Mas eu não namorei o Johnny, tu quem fez isso — Alan retrucou.
Elena não respondeu de imediato, apenas franziu as sobrancelhas e fuzilou Alan com o um olhar irritado enquanto cruzava os braços na frente do corpo, e só depois de um segundo que ela finalmente disse:
— Isso é golpe baixo, Alan.
— Qual é, Elena? Querendo ou não, o seu namoro com ele foi algo que rolou. Na boa, você conhece ele melhor que eu, melhor que qualquer um! Além disso, é óbvio que ele ainda tá caidinho por tu.
— Alan, eu ficaria surpresa se em algum momento ele realmente tivesse gostado de mim.
— Isso é um não? — perguntou ele, em um tom desanimado.
Elena suspirou, pensando consigo mesma que nunca conseguia negar um pedido de ajuda, independente de quem seja, mas principalmente quando são dos seus amigos.
— Claro que eu vou te ajudar.
Alan sorriu animado e deu um abraço apertado na amiga enquanto agradecia sem parar. A força do abraço foi o suficiente para deixar a garota sem ar, mesmo ela tendo uma super-força, e por consequência uma super-resistência.
Os dois se despediram depois disso, Alan disse que ainda tinha que ir até a casa da Amanda, pedir para ela votar contra o herói também, e em seguida o garoto saiu voando em direção ao céu azul.
Elena deixou escapar um suspiro, olhando com inveja para o garoto voando, e depois começou a caminhar em direção a sua casa.
Seria complicado impedir o Conselho Estudantil de chamar o Star, afinal, ele era o maior herói do país.
Mas Elena entendia muito bem o porquê do pedido do amigo, e por isso tinha que se esforçar para conseguir ajuda-lo.
Estava perdida em pensamentos, fritando seu cérebro tentando descobrir uma maneira de convencer os membros do Conselho, ainda assim ela viu um garoto sair de dentro da floricultura de forma ligeiramente peculiar.
No mesmo instante ela começou a andar mais rápido, com um pequeno sorriso se formando no rosto.
Poderia resolver os problemas do Alan mais tarde, agora tinha que dar uma bronca em alguém, e não importa que desculpa ele inventasse dessa vez, Zen Snyder não escaparia dela.