O Despertar Cósmico - Capítulo 31
Mikey estava no terraço do hospital havia um tempo. Sabia que o Zen iria querer falar com ele, por isso não tinha ido embora, mas já estava começando a ficar irritado com a demora do amigo.
Embora ele não pudesse culpá-lo.
Estava feliz pelo garoto, ele parecia mais feliz nos últimos dias, mais descontraído. Agora Mikey sabia o motivo. A Elena era o motivo.
“Eu espero que você consiga, irmão”, ele pensou, se inclinando na beirada do prédio para ver a rua e a movimentação lá embaixo. “Espero que consiga conquistar a garota. Espero que consiga se aposentar”
Quando estava prestes a se afastar da beirada Mikey viu algo que chamou a sua atenção.
Uma movimentação estranha havia tomado conta das pessoas reunidas na entrada do hospital.
A pequena multidão que se encontrava lá começou a dissipar, alguns correndo para dentro do prédio e outros para longe, e, o que mais chamou a sua atenção, duas silhuetas cresciam em sua direção, voando rumo ao topo do hospital.
Mikey se afastou alguns passos para trás, colocou as mãos no bolso do seu sobretudo e aguardou. Não demorou muito para as duas silhuetas passarem voando pelo prédio.
“Dois homens”, Mikey constatou, enquanto via os homens descrevendo um arco no céu e se aproximando do terraço. “Isso é estranho. Definitivamente não são heróis, e civis não teriam motivos para voar até aqui. Definitivamente isso é estranho.”
Assim que os homens pousaram, Mikey tirou uma das mãos do bolso e acenou para eles.
Os homens pararam de se mover no mesmo instante, trocaram olhares assustados e depois voltaram a olhar para o Mikey.
“Vilões, definitivamente”, ele concluiu. “Devo ligar para o Zen? Não. Não quero atrapalhar o momento daqueles dois. Vou resolver isso sozinho e investigar antes de passar o relatório.”
— Estão perdidos, amigos? — Mikey perguntou, avançando alguns passos para frente. Os dois recuaram um pouco para trás. — Ou será que estão exatamente onde queriam, mas não esperavam por companhia?
Mikey viu o momento exato em que eles decidiram agir. Os dois trocaram olhares e acenaram com a cabeça.
Um deles, de cabelo castanho cortado com um degradê baixinho, se posicionou na frente do companheiro e sorriu tentando transmitir confiança, mas era um sorriso tão desesperado e assustado que Mikey acabou sorrindo de volta.
— Marromeno. Só não tava pronto pra topa com o Lorde do Gelo aqui — o homem falou, flexionando os dedos das mãos.
— Ah, então não se preocupe. Meu expediente acabou tem três horas. Não estou aqui como Lorde do Gelo. Sou só o bom e velho Mikey.
— Que pena. — O homem que estava escondido atrás do companheiro sorriu de forma vitoriosa. — Eu sou um grande fã dele.
O homem com degradê saltou para o lado e no mesmo instante o companheiro dele arremessou a mão na direção do herói.
Literalmente arremessou, pois seu braço se esticou como se fosse feito de borracha e a mão atravessou a distância que havia entre os dois.
Mikey se esquivou para o lado com facilidade e desviou seus olhos para seus inimigos. O azul intenso de suas íris se intensificou e uma fina película de gelo se formou sobre a pele do seu rosto, pescoço e mãos.
O homem que se aproximava por trás dele, aproveitando da abertura que o amigo elástico dele tentou criar, estava pronto para disparar uma esfera de energia quando começou a gritar de dor.
O gelo se espalhou por suas pernas e pela cintura, subindo pelo corpo até que cobrisse seu rosto e silenciasse seu grito. Congelando até mesmo a esfera de energia em sua mão.
Os olhos azuis se desviaram na direção do vilão com poderes elásticos.
Apenas quatro metros separavam os dois, e dessa distância curta Mikey pode ver o medo e a hesitação no olhar do vilão. Ele talvez fugisse sem lutar, mas só o Niveis — o seu lado herói — aceita rendições.
E para o azar do seu inimigo quatro metros ainda não era longe o suficiente.
Quando deu um passo para trás, prestes a fugir, o gelo se espalhou por seu corpo tão rápido que ele sequer sentiu dor alguma.
Congelou na posição que estava quando decidiu tentar fugir, sem nem ao menos ter a chance de expressar alguma surpresa em seu rosto.
A batalha estava encerrada. Os inimigos derrotados. Mas Mikey ficou tenso. Sentiu um nó se formar em seu estômago e demorou um pouco para perceber que aquilo era medo.
Com seus olhos, um poder herdado de sua mãe, ele podia — além de ampliar muito sua habilidade com gelo — sentir temperaturas elevadas.
E agora, voando em sua direção do Sul, chamas verdes de energia, com uma temperatura muito elevada, se aproximavam em alta velocidade.
“Gama”, ele concluiu, pois conhecia muito bem o terror daquela energia.
A segunda mais poderosa das Energias da Destruição.
“Tenho que avisar o Zen. Com o Gama aqui e o que está acontecendo lá embaixo, seja lá o que for que estiver acontecendo lá, as coisas vão ficar agitadas. Vamos precisar do Imperador”, ele pensou, com pesar.
Mikey pegou seu celular em seu bolso e abriu a lista de contatos. Por ordem alfabética o Zen deveria ser o último, mas estava em primeiro nas ligações recentes.
Não demorou muito para o amigo atender, e, pelo tom de voz e forma de falar, ele estava acompanhado de algum membro da Justice Angels e não dá Elena, como Mikey pensou que estaria.
—Diebus, relatório. — A voz soou naquele tom frio e monótono que ele sempre usava quando estava interpretando um dos seus personagens.
— O inverno está chegando — Mikey decidiu começar com um trocadilho, além disso, ele gostava de GOT. — Vi uma agitação estranha do lado de fora do hospital, mas não tive tempo de ir verificar porque um cara que estica e seu companheiro subiram até aqui no terraço. Lidei com eles, mas agora tem outra pessoa vindo pra cá…. O Gama. As coisas vão ficar frias. Precisamos do Imperador.
Zen fez silêncio por um tempo, como se quisesse mostrar que não tinha nada a dizer, e desligou.
Mikey guardou o telefone no bolso ao mesmo tempo em que seus olhos voltavam ao normal. Olhou mais uma vez para a luz verde que se aproximava em alta velocidade, então uma explosão sacudiu o prédio.
O herói cambaleou um pouco, mas logo se recompôs. Os pés congelados no chão. Demorou um segundo para perceber que estava com os poderes dos olhos ativados novamente.
“Porra, eu estou tenso”, ele suspirou novamente, e tentou relaxar um pouco, desativando mais uma vez o poder dos seus olhos. “Não tenho chance contra o Gama. Vou descer e ajudar o Zen a levar Elena para longe daqui, talvez para o apartamento onde ela está ficando ou para alguma de nossas bases”
Mas, para o seu azar, seu celular vibrou em seu bolso e quando pegou para ver quem era, praguejou baixinho antes de atender.
— Zen, relatório.
— Um Lannister sempre paga suas dívidas.
O garoto resolveu começar com um trocadilho, mas seu tom não era nem um pouco divertido. A sua respiração estava agitada, o que significava que estava correndo enquanto conversava.
— Preciso que segure o Gama no terraço para mim. Não posso mostrar para eles que eu sou o Imperador ainda. Não posso mostrar esse lado para ela ainda.
Houve uma pequena pausa, mas quando voltou a falar ele estava decidido:
— Mas eu ainda posso lutar. Só não vou usar o meu olho esquerdo. A Elena e o Alan estão aqui, podem ajudar. Mas o Dante está entrando no quarto dela nesse momento… Vou resolver isso e subir para o terraço assim que possível, consegue segurar ele aí?
Mikey praguejou. Não fazia ideia do quão ruim era a situação de agora, mas quando perguntou ele lhe ofereceu um resumo.
Basicamente eles estavam atolados na pior situação possível até o pescoço.
A Mão estava com seus membros mais fortes no hospital, e traziam consigo dezenas dos seus seguidores e até mesmo alguns vilões de Classe Média.
E eles estavam aqui pela garota Pathykinese, e iriam matar muitas pessoas para que ninguém percebesse o sumiço dela.
Eles estão fazendo isso a um tempo, para fins diferentes. Um método sangrento que, surpreendentemente, não tem mostrado resultados aparentes.
— E aí? Consegue segurar ele?
— Consigo… mas não por muito tempo. E vamos precisar do Imperador de qualquer forma. Não seja tolo ao ponto de pensar que consegue lutar contra o Gama sem seu olho esquerdo.
— Vai dar tudo certo, eu vou ficar bem — Zen garantiu, e realmente soava confiante.
— Você vai, mas e a garota? — Mikey perguntou de forma fria.
Houve um silêncio desconfortável do outro lado da linha. Zen deve ter diminuído o ritmo em que corria, pois sua respiração se estabilizou um pouco também. Mikey aproveitou para falar:
— Ela está ferida, cansada e abalada. Não pode se envolver nisso, Zen. Suba aqui e vamos lutar contra o Gama juntos. Se você e eu nos unirmos podemo…
— Não posso, Diebus — Zen interrompeu.
Fez um silêncio absoluto. Tinha parado de correr, provavelmente não estava nem caminhando.
— Vamos subir para o terraço e vamos encontrar o Lorde do Gelo, que vai estar enfrentando um vilão muito forte. O Lorde do Gelo é meu amigo, então nós vamos ajudá-lo.
Mikey suspirou de forma lenta e resignada.
“Não tem o que fazer então”, ele pensou. Olhou mais uma vez para a energia verde se aproximando. Estava ainda mais perto.
— Tudo bem. O Lorde do Gelo vai precisar de ajuda, vê se corre para ajudar ele.
— Eu vou — Zen concordou com seriedade. Fez um longo silêncio até que finalmente disse: — Obrigado, irmão… De verdade.
Zen desligou e depois de guardar o seu celular Mikey começou a caminhar pelo prédio e, usando o poder dos seus olhos azuis, construiu paredes de gelo ao redor do prédio.
Não demorou muito para criar uma barreira em volta de todo o terraço.
As paredes tinham por volta de quatro metros de altura e quase meio metro de espessura, além de serem feitas por um gelo muito mais reforçado e resistente do que ele conseguiria fazer sem o auxílio dos olhos.
Mas por causa disso ele começou a sentir o cansaço e a fadiga resultados pelo uso excessivo dos olhos. Criou um pilar embaixo dos seus pés até chegar a quatro metros de altura, e então teve que desativá-los.
Sentiu, antes mesmo de ver, a aproximação do Gama. A distorção no ar, a pressão atmosférica no ambiente.
Quando se virou para trás e o viu voando a menos de dois metros de distância, ajeitando a gravata do seu elegante terno preto, já sabia o que lhe esperava.
A morte.
— Mikey Diebus Vasconcelos, o Lorde do Gelo. Anjo da Morte. Ceifador de Gelo. O Rei de Gelo, leal apenas ao seu Imperador. É bom revê-lo. Principalmente em uma noite bela como essa.
— Tenho a impressão que eu não vou poder concordar. — O herói ajeitou a gola do sobretudo com o dedo. — Então deixa eu matar a minha curiosidade antes da gente começar; por que veio até aqui, Gama?
— E eu preciso de um motivo melhor do que enfrentar o herói infame, o braço direito do Imperador? Não, eu não preciso. Sua fama o precede, Mikey, e eu aposto que a minha também.
“E que faminha mais filha da puta essa a minha. Nem pra me trazer garotas”, ele pensou, tentando aliviar a tensão que sentia.
— E, como você bem sabe, eu gosto de desafiar pessoas fortes. Nunca tivemos a chance de lutar um contra o outro sozinhos.
Gama abriu os braços de forma confiante. Seus gestos, no geral, eram sempre confiantes e graciosos.
Sua pele era verde, pura energia. Energia essa que era tão pura e em um estado tão único que era possível sentir o poder emanado dela.
Era possível ver o ar se distorcendo à sua volta. O cabelo negro em sua cabeça e seu terno eram as únicas coisas que não eram afetadas pela energia.
— Eis a chance perfeita.
— Vou tentar cumprir com suas expectativas, Gama, o Destruidor.
Mikey sorriu e pensou; *Vai ser divertido. Pelo menos até eu começar a perder.”