O Despertar Cósmico - Capítulo 55
Elena estava impaciente, sentado na cama enquanto observava o quarto em que estava de forma inquieta. Amanda estava sentada em uma cadeira logo ao lado, tentando acalmar Alan, que andava de um muda para o outro — ainda mais inquieto e ansioso.
Zen tinha saído a quase dez minutos para tratar seus ferimentos, deixando todos esperando que ele voltasse para explicar o que iriam fazer agora.
Nenhum dos três estava disposto a ficar esperando pacientemente pela vontade dele. Contudo, a situação em que se encontravam era desconfortável demais, e nenhum criava para coragem para sair.
— Eu vou sair. — Elena disse, pondo um fim no silêncio tenso que havia entre eles.
Os amigos pararam o que estavam fazendo e olharam para ela, sendo inevitável que surgisse duvida e receio em seus olhares.
— Tem certeza disso? — Alan questionou, caminhando na direção dela lentamente. — Ele disse pra esperar, é melho…
— Vai se foder, Alan. — Elena apontou o dedo do meio para o amigo, e se divertiu ao ver as sobrancelhas dele se arqueando em surpresa. — Cê também tá querendo sair, então não vem falar do que ele mandou a gente fazer.
— O problema não é esse — Amanda falou, se virando em sua cadeira para olhar na direção da Elena. — É que cê ainda nem explicou pra gente o que tá rolando entre vocês dois. Tipo, tu perdoou ele?
— Eu falei para o Alan. — Ela gesticulou na direção do amigo, como se quisesse que ver ele defende-la, mas, logo depois, acrescentou: — A gente conversou. Ele me contou quem era de verdade… me contou tudo.
Elena olhou para a amiga de forma insegura, se lembrando da forma com Zen ficou preocupado ao considerar como Amanda se sentiria ao descobrir que o pai dele era o Iluminus.
Parecia que Zen pensavas que tudo que o pai fez era, em parte, sua culpa, e não queria causar mais sofrimento as vítimas dele. Ela sabia que nada do que Iluminus fez era culpa do Zen.
Ainda assim, também não queria que Amanda passasse por tanto sofrimento novamente. Pelo menos não agora. Ela não precisava lidar com aquilo nessa situação.
— De qualquer forma, cê sempre usa de desculpa meu namoro com o Jhonny pra me mandar lindar com ele, lembra? — Elena olhou para Alan, tentando não demonstrar que estava mudando de assunto. — Eu tá ficando com o Zen não serve de nada agora?
O silêncio pairou entre os amigos de infância por um momento, Alan e Elena se encarando sem que nenhum cedesse. Ambos sérios, como se, por algum motivo, fossem começar a discutir a qualquer momento.
— Então é isso? — Amanda perguntou, rindo de forma debochada e quebrando aquele silêncio.
Quando toda a atenção dos dois foi direcionada ela. Amanda olhou para a amiga e disse:
— O que cêis tão fazendo agora? Ficando? Tem certeza que ele vê assim? Talvez ele esteja te manipulando. Tu não tem um bom histórico com namorado, lembra? O Jhonny até te traiu com a Aqua.
Elena arregalou os olhos, o rosto fiando vermelho, talvez de raiva ou quem sabe de vergonha. Mas, quando fuzilou a melhor amiga com a sobrancelhas franzidas e um olhar furioso, ficou evidente que no fim o que se sobrepôs foi a raiva.
E Amanda se arrependeu do que falou no mesmo instante.
Uma pressão telecinética caiu sobre o quarto e o comodo estremeceu ligeiramente. Os olhos verdes da Elena brilhavam de raiva. Com uma fúria que estava sendo acumulada através de vários dias e de vários acontecimentos.
Agora, a própria atmosfera parecia sentir o peso dessa raiva. O ar ficou mais rarefeito, de modo que Alan e Amanda arfaram, sem conseguir respirar por um momento, como se até mesmo seus pulmões fossem impedidos de funcionar devido à telecinése no ar.
— Vou repetir mais uma vez — Elena falou, sua voz sendo o único som presente no comodo. — Eu vou sair.
Quando se virou e saiu andando, cada passo no piso ecoava pelas paredes do quarto. Amanda e Alan trocaram olhares, mas não ousaram dizer nada, apenas observaram a amiga sair pelo quarto.
Elena estava furiosa, e só conseguia pensar em como queria socar algo, de preferência o Jhonny ou a Samanta, já que não faria isso com a Amanda. Contudo, não teve tempo de ficar com raiva, apenas assustada.
Seus olhos arregalados observaram a jovem loira passar caminhando na frente, passando a mão pelo cabelo de forma distraída enquanto mexia no celular — parecia ter por volta da idade da Elena, vinte anos nó máximo.
Ma ela nem sequer olhou na direção da Elena, apenas continuou andando como se ela nem tivesse ali. A garota respirou fundo, percebendo só agora que estava prendendo a respiração, e se permitiu relaxar.
Entretanto, tinha uma coisa a fazer, e não iria ficar parada ali. Saiu caminhando pelo corredor, ironicamente seguindo o mesmo caminho da jovem.
Passou pelo banheiro sem ousar olhar para a porta aberta ou para o som da torneira lá dentro, e seguiu pelo corredor. Porém, quando passou pela cozinha, foi inevitável de ver a família sentada nas cadeiras.
O pai passava uma tigela com purê para o filho mais velho, que estava do outro lado da mesa, enquanto a mãe dava de comer a um bebezinho em seu colo.
A princípio eles continuaram conversando normalmente, até que a mãe repentinamente parou o que estava fazendo e olhou para a porta do corredor — onde a Elena estava.
A garota prendeu a respiração, sentindo seu coração bater aclarado em seu peito. Recuou um passo para trás e bateu com as costas na parede do corredor.
Olhou para os lados, tensa e assustada, procurando por uma fuga ou um lugar para se esconder, mas o que encontrou foi a jovem loira, que caminhava tranquilamente pelo corredor.
— Cassandra! Cade você, minha filha? O jantar vai esfriar! — a mulher gritou na cozinha.
— Eu tô aqui — a jovem respondeu, cruzando a porta da cozinha logo em seguida. — Que saco, falei que tava vindo.
— Olha a boca, menina! Se não eu levo essa sua boca com sabão! — a mãe falou, com raiva e de forma ameaçadora.
A jovem grunhiu em reprovação e se sentou a mesa, pegando uma prato e começando a se servir de comida. A mãe continuou resmungando alguma coisa, contudo, o irmão mais velho interviu e a acalmou.
Elena ficou observando a família comendo e conversando por um momento, sem saber o que fazer. Se sentindo assustada demais para ter qualquer reação.
Conseguia ver o olhar sonolento e distraído no rosto da família. Um olhar vazio de sentimentos próprios. E era inevitável a inquietação crescente em seu peito, o desconforto e o medo que aquela cena lhe proporcionava.
Respirou fundo para tentar manter a calam e voltou a caminhar pelo corredor, deixando aquela cena mórbida para trás. Seguiu reto em direção a sala, e antes mesmo de chegar no fim do corredor já podia ouvir o som da televisão ligada.
Estava no canal do jornal, e conforme Elena se aproximou do fim do corredor, conseguiu ver que transmitiam filmagens dos ataques que aconteceram na cidade.
As filmagens mostravam a destruição deixada pelas explosões e relatava que em alguns dos incêndios os heróis encontraram resistência de vilões, o que acabou resultando em uma luta que apenas gerou mais dano na cidade
Ignorando as imagens na televisão, Elena desviou a sua atenção para o sofá da sala, onde estava o Zen. Sobre a mesinha de centro havia um kit medico aberto, e do lado de fora uma garrafinha de álcool desinfetante, gazes e uma tesoura.
O garoto estava parado em frente ao sofá, tentando — com muita dificuldade — enfaixar suas costas.
Elena parou no fim do corredor e observou o garoto. Notou os músculos definidos de suas costas se contorcendo e tencionando conforme ele se movia e tentava — com muita dificuldade — fazer com que ela desse a volta nas suas costas.
Quando viu o corte profundo e largo que ele tentava enfaixar, Elena se surpreendeu por não ter visto o momento em que ele se feriu. O ferimento a bala em sua perna já havia sido tratado, e diferente do machucado nas costas, esse tinha sido bem encaixado.
— Quer ajuda?
Zen olhou para trás lentamente, um meio sorriso presunçoso em seu rosto, e revelou seu olho esquerdo brilhante. Elena revirou os olhos, desapontada, pois, tinha certeza que iria conseguir surpreende-lo.
— Na verdade, eu aceito. Isso é mais difícil do que eu imaginei.
Zen soltou a faixa, que estava completamente frouxa em suas costas, e a esticou na direção da Elena. A garota se aproximou e pegou ela nas mãos dele, mas ficou travada de surpresa quando ele se virou de frente.
Seus músculos eram definidos, com um abdômen tanquinho e o peitoral largo, mas a surpresa de verdade foram as cicatrizes. Dezenas delas, talvez centenas.
Haviam desde cicatrizes pequenas, de cortes ou armas-de-fogo, até mesmo queimaduras mal cicatrizadas. Uma cicatriz em particular prendeu a atenção da garota. Uma que estava na lateral do seu corpo, deixando sua pele retorcida de forma grotesca.
— Presente do Gama — Zen falou, notando como ela o olhava.
Elena ergueu o olhar, se sentindo sem-graça, e quando encontrou o rosto do Zen, viu a expressão desolada que tomava conta de suas feições.
— É o ferimento daquela luta, não é? — Elena perguntou, de forma hesitante e insegura. — Daquela memória que eu vi. A primeira luta de vocês.
— É…
— Deve ter doído… — Elena lentamente abaixou a mão e tocou na pele retorcida, sentindo a estranheza que a pele provocava em seus dedos.
— Muito.
Os dedos da Elena começaram deslizar pela lateral do corpo dele, seguindo a pele retorcida até chegar no abdômen, onde ela começou a traçar um caminho pelas cicatrizes que encontrou lá.
Zen observava em silêncio, enquanto Elena tocava em suas cicatrizes, uma por uma. Parecia prender a respiração a cada toque recebido, contudo, aguardou pacientemente.
— Onde conseguiu essa? — Ela parou com a mão sobre o peito dele, em uma cicatriz na horizontal que chegava até o seu ombro.
— Fumus — Zen respondeu, e Elena ergueu o olhar para fita-lo e ouvir atentamente a história. — Eu tinha dezoito. Foi quando tivemos nossa base principal atacada pela primeira vez.
— Primeira vez? Isso acontece muito? Cêis serem atacado? — Elena perguntou, sinalizando para que ele se sentasse no sofá.
— Mais ou menos. — Zen obedientemente se sentou, deixando que ela começasse a enrolar a faixa molhada de álcool em seu corpo. — As coisas ficaram mais complicadas depois que uma Telepata entrou na minha vida.
— Ah, então é assim? — Elena olhou para o garoto fazendo cara de brava, mas sorriu ao ver o olhar provocativa que ele lhe lançou.
— Agora falando sério, não é comum a gente ser atacado. A Justice Angels sempre foi um grupo grande demais para a Mão se envolver sem um bom motivo. A diferença é que dessa vez…
— Dessa vez eu sou o motivo deles atacarem.
Zen não concordou, mas também não discordou. Apenas ficou olhando para as imagens que passavam na televisão enquanto Elena voltava a enrolar a faixa nas suas costas.
Entretanto, não era necessário ter uma resposta, Elena sabia que estava certa.
Ainda não tinha tido coragem de falar sobre isso com ninguém, mas sabia que só estavam naquela situação por sua culpa. Se não tivesse ido até à casa do Alan, eles não teriam sido atacados e o prédio destruído.
Se bem que, se tivesse ficado em casa, provavelmente teria sido enquanto estava sozinha — o que muito provavelmente teria resultado em sua morte.
Quando deu a última volta com a faixa, usou a tesoura para cortar o tecido, fazendo um nó apertado logo em seguida. Avisou que terminou e soltou um longo suspiro.
Zen se levantou e começou mexer os braços, se alongando e fazendo movimentos exagerados — testando como estava sua mobilidade com a faixa.
Levou a mão aos ombros, sentidos os duros e tensos. Também sentia a exaustão de usar o olho por tanto tempo, então o desativou, sentindo-se aliviado e decepcionado ao mesmo tempo.
— Vamos voltar pro quarto. Tenho uma ideia do que fazer agora, mas preciso do Alan para fazer isso. — Zen pegou uma blusa em cima do sofá e começou a vesti-la.
— Ah, mas isso é um grande avanço pra relação docêis. — Elena se levantou, um sorriso brincalhão no rosto. — Vai ver cêis até vira amigo.
— Atá, claro. — Quando terminou de vestir a blusa, caminhou até a garota e parou bem próximo a ela. — Já que estou revelando tudo sobre mim para você, vale contar que o pai dele me odeia.
Zen pegou as mãos da Elena de forma carinhosa, como se fosse conforta-la, e disse:
— Mas não se preocupe, seu amigo não vai ficar órfão. Se eu matasse todo mundo que me odeio, a população ia acabar diminuindo drasticamente.
Elena esboçou um sorriso pequeno, mas sabia o motivo do Alan não gostar do pai, por isso não conseguia achar a piada tão engraçada quanto ele.
Entretanto, foi pensar por esse lado que fez ela ter uma ideia. Uma ideia que talvez pudesse fazer com que o Alan e o Zen se dessem bem.
— Cê não devia pegar tanto no pé dele, principalmente quando o assunto é o pai. Já parou pra pensar no que aconteceu entre eles?
— Não, mas consigo imaginar. Riquinho mimado que sente falta do pai e da mãe divorciados. Não precisei pesquisar para entender aquele cara.
Elena hesitou por um momento, sem saber se podia ou não tocar nesse assunto delicado. Contudo, queria que Zen entendesse um pouco o lado do seu amigo.
— Quando ele tinha dezesseis a família dele sofreu um ataque enquanto estavam em um restaurante. O Edgar lutou contra os vilões, mas a mulher dele e o Alan ficaram gravemente feridos, e, no fim, os vilões conseguiram escapar.
Zen arregalou os olhos, deixando sua surpresa transparecer por um momento, antes de vestir aquela máscara de inexpressividade novamente.
Entretanto, aquilo fora o suficiente para Elena quase deixar transparecer um sorriso satisfeito. Também se sentiu um pouco culpada por abordar esse assunto com segundos, mas depois do tanto que Zen mentiu para ela, ele teria que perdoa-la dessa vez.
— Eu nunca ouvi falar disso… — ele murmurou, ainda surpreso demais para dizer qualquer outra coisa sem deixar transparecer isso.
— Quase ninguém. Só eu e a Amanda, eu acho. O Edgar prendeu os vilões alguns dias depois, mas eles foram soltos no ano passado, por bom comportamento.
— E a mãe do Alan?
— Em coma. — A voz da Elena falhou por um momento, sentindo um nó se formar na sua garganta, e ela teve que se forçar para continuar: — Ela nunca se recuperou por completo, e por algum motivo não acordou depois daquilo.
— E o Alan não perdoou o pai por não ter conseguido prender os vilões novamente.
Zen parecia pensativo, se esforçando para deduzir o que tinha acontecido. Seus olhos brilhavam de curiosidade.
— Provavelmente os vilões ficaram na surdina depois que saíram da cadeia. Ninguém é idiota de, logo após sair da prisão, fazer algo que possa te levar pra lá de volta.
— A questão… é que o Edgar nem tentou. Foi isso que chateou o Alan, eu acho.
— Então o garoto maravilha tem um passado obscuro — Zen comentou, mas seu tom não parecia de pesar ou pena, parecia mais que estava interessado e animado com a nova informação.
— Não conta pra ele que eu falei isso pra tu. Ele me mata se souber que…
A garota parou de falar quando ouviu os passos no corredor, e congelou de medo ao ver o homem parado na porta da sala, olhando na direção com as sobrancelhas franzidas.
Instintivamente se aproximou mais do Zen, abraçando ele como se aquilo pudesse proteger ela daquela bizarrice, mesmo que ele fosse o responsável por ela.
O coração dela batia acelerado em seu peito, de forma que ela supos que até mesmo Zen conseguia sentir, devido ao abraço. Mas mesmo assim arriscou um olhar na direção do homem, para ver se ele avançava na direção deles ou não.
Contudo, o homem continuava parado no mesmo lugar, os olhos vasculhando o comodo de forma distraída, até que, por fim, ela gritou:
— Cassandra! O que esse kit-médico tá fazendo aqui na sala!?
Alguém gritou de volta para ele em algum lugar da casa, mas estava longe demais para que Elena pudesse distinguir a resposta.
Mas o homem ouviu, e provavelmente não gostou, porque saiu andando pela sala com passos pesados enquanto remugava. Elena abraçou Zen ainda mais forte, e o garoto lentamente repousou a mão sobre sua cabeça.
Quando ergueu o olhar, Elena ficou furiosa ao ver o sorriso no rosto dele, como se estivesse achando o medo dela divertida.
— Não precisa se preocupar. Ele não pode ver a gente.
Como se para comprovar o que o garoto disse, o homem passou direto pelos dois e pegou o kit-médico sobre a mesa de centro.
Quando se virou para ir embora, seus olhos se recaíram sobre a Elena por meio segundo, antes de desviarem como se não tivessem visto nada.
— Ninguém na casa pode ver ou ouvir a gente. Foi uma série de ordens simples, que no fim tornaram tudo complexo demais. Mas, basicamente, eu ordenei que eles ignorassem completamente a nossa existência e tudo que a gente fizer.
O homem entrou no corredor e gritou pela filha novamente, mas agora estava fora do campo de visão da Elena, o que permitiu a garota respirar de forma aliviada novamente.
— Eu não tô com medo deles ver a gente, Zen. Eu tô com medo deles. Isso é estranho, e bizarro.
— Eu sei, mas é prático. Ninguém vai falar onde a gente tá, e a chance de nos encontrarem aquele é quase nula.
— Ainda assim… A gente tá invadindo a casa de uma família e fazendo lavem cerebral neles…
Zen deixou escapar um grunhido que interrompeu a Elena, e essa foi a forma que ele encontrou para encerrar o assunto antes que o nome do Iluminus fosse mencionado ou pior, seus atos fossem comparados aos dele.
— Vamos discutir isso depois, quase esse método salvar a gente. Agora vamos voltar pro quarto, aposto que o Júnior tá ficando impaciente.