O Despertar Cósmico - Capítulo 66
Quando Elena chegou na garagem e viu apenas os dois carros cobertos por uma lona, quase voltou para trás, pensando haver se perdido mais uma vez naquela mansão gigantesca.
Contudo, viu a porta no fundo do cômodo e resolveu ver a onde ela levaria. Assim que entrou na sala e notou os seis monitores presos na parede, teve a comprovação de que estava no local certo.
As imagens transmitidas nos monitores era da mesma sala que Elena viu nas memórias do Zen, a diferença é que, nas imagines mostradas na tela a sala estava com a iluminação mais escura.
Uma explosão de energia azul brilhou em uma das telas, que transmitia um canto específico da sala, e logo em seguida uma explosão roxa iluminou o cômodo escuro.
Elena conseguiu ver duas silhuetas voando do meio da energia que se dissipava, mas estavam tão rápido que mal passavam de borrões transitando de um monitor ao alto — com explosões de energia os acompanhando.
Mas, mesmo não as vendo com nitidez, era impossível não reconhecer as pessoas na Sala Branca, e Elena só conseguia se perguntar se eles estavam apenas tendo uma disputa amigável ou era outra briga — o que acabava deixando ela preocupada.
Observou quando Alan encurralou Zen no canto da sala e disparou uma esfera de energia que explodiu cobrindo uma grande área, e se assustou mais ainda ao ver Zen fazer a Troca Equivalente com o garoto antes de ser atingido.
Olhou para o microfone suspenso por um braço-mecânico na sua frente, e depois para a mesa em que ele estava preso, observando o teclando em buscar de alguma dica de como usar o microfone.
Apertou algumas teclas aleatórias, fazendo surgir algumas coisas nos monitores na parede, até que finalmente o microfone finalmente emitiu um pequeno ruído em resposta.
— Cêis tão em uma sessão de treinamento a sós, que romântico — ela falou, torcendo para que o microfone estivesse funcionando, porque ela não conseguia ouvir nada dentro da Sala Branca para confirmar.
Uma última explosão de energia roxa iluminou a sala — na única tela que Elena não havia aberto uma guia aleatória sem querer — e os dois saíram voando de dentro dela.
Elena arquejou de surpresa ao ver que Zen estava segurando Alan pelo pescoço, enquanto mantinha a outra mão do garoto — que segurava uma esfera de energia azul — apontada inofensivamente para baixo.
Por um momento pensou que eles simplesmente a ignorariam e continuaram a brigar. Então Zen soltou o Alan e a esfera azul foi absorvida pela mão do garoto.
Zen atravessou a Sala Branca voando, desaparecendo do monitor por apenas meio segundo antes que a porta de aço no canto da sala se abrisse e ele passasse por ela.
— Tenho que admitir que fiquei impressionado por você ter achado esse lugar — ele falou, caminhando na direção dela com um sorriso no rosto. O rosto banhado por suor, com alguns fios negros e molhados grudados na sua testa.
— Tenho que admitir que fiquei impressionada por você estar lutando com o Alan sem arrancar os dentes dele ou quebrar alguns ossos — ela retrucou, imitando a forma de falar e o jeito de orgulhoso dele.
— Isso aí já é tiração — Alan falou, parado em frente a porta de aço com os braços cruzados. — Não foi bem isso que rolou quando a gente lutou da última vez.
Zen sorriu de forma convencida e debochada ao falar:
— Eu já tentei lembrar ele que dá última vez a única coisa que ele fez foi tremer de medo e cair na ilusão da Jess, mas acho que o orgulho do Júnior não o permite perceber isso.
— Quantas vezes cêis já lutaram, afinal? — Elena sorriu de forma divertida. — Tão falando disso como se fosse algo normal, tipo um passei no parque.
— Só se for pra mim, pra ele tá mais pra uma montanha-russa quebrada — Zen falou, parando em frente a Elena. E quando Alan o xingou, ele ignorou o garoto e perguntou: — Mas e aí? Veio brincar um pouquinho também? O que me diz?
— O quê? Eu? Lutar contigo? Lá? — Elena apontou para a Sala Branca com descrença. — Sem chance. Por que eu faria isso?
— Um bom treinamento nunca é demais.
— E tu não tá ficando enferrujada, Elena — Alan provocou enquanto se aproximava dos dois.
— Se foder. — A garota apontou o dedo do meio pra amigo, o que rendeu uma boa risada pra ele. — Além disso, eu não vim pra participar dessa disputa infantil docêis.
— Ah, é mesmo? E o que a senhorita veio fazer então?
— O Diebus me pediu pra te contar uma coisa… Uma coisa boa e uma ruim, na verdade — ela falou, e Zen não conseguiu evitar de notar como ela soava hesitante.
— Não vem coisa boa por isso.
— Bom, ele disse que é melhor eu começar pela notícia ruim primeiro, então vamos lá; ele atacou uma mulher chamada Medusa, da Jörmungandr.
Zen franziu a sobrancelha, assumindo um semblante furioso enquanto uma onda de energia bombeava adrenalina de forma inconsciente em seu corpo.
— Ele fez o quê!? — Zen questionou, com uma raiva contida queimando em cada palavra.
Elena hesitou ao ver como Zen parecia irritado, mas Mikey tinha lhe alertado que aquilo aconteceria, e disse que ela apenas deveria continuar até contar tudo, e foi o que ela decidiu fazer.
— Ele disse que não podia perdoar o que fizeram a Letícia. Também disse que cê ia saber o que isso significa, o que eu espero que seja verdade, porque eu não sei.
Zen grunhiu para conter o xingamento que quase falou sem querer. Sentiu a raiva fervendo seu sangue, e ordenou o próprio cérebro a ignorar isso — entretanto, não funcionou muito bem.
A Mão tem sequestrado pessoas aleatórias ao redor do mundo a quase dois meses, e ninguém sabia dizer qual era o objetivo deles fazendo isso. Nem mesmo o Zen tinha identificado o padrão por trás dos sequestros.
Sua única pista era uma garota chamada Letícia, irmã mais nova de outra vítima dos vilões. Zen tinha entrado em contato com a garota uma vez, e foi quando descobriu que sua irmã, Ágata, tinha dividas com uma organização que lidera o submundo, a Jörmungandr.
E depois que a irmã desapareceu, Letícia ficou responsável por pagar essa dívida — de formas que o Zen não sabia, mas podia imaginar.
Alex deveria investigar o prostíbulo onde ela trabalhava sozinho, e Zen deixou bem claro que Mikey não poderia ficar sabendo de forma alguma que a garota trabalhava em um local como aquele.
“Mas claro que tínhamos que começar a porra de uma guerra!”, ele pensou, se permitindo, ao menos em seus pensamentos, demonstrar sua raiva. “Parece que a merda da minha vida só tem ido ladeira a baixo, e quando se inicia uma subindo, e só para pegar mais impulso”.
— Ah, eu sei bem o que tá acontecendo. Meus planos estão todos dando errado, de uma vez só — ele falou, acompanhado de um suspiro frustrado. — Mas tinha outra coisa não é? O que mais deu errado?
— Não sei se é bem algo que deu errado. Ele mandou avisar que o Megaman ligou e disse que se atrasaria para o show do Linkin Park.
Um sorriso radiante desabrochou no rosto da Elena, deixando suas covinhas a mostrar enquanto ela tentava conter a risada, pelo menos até perguntar:
— O que é isso? Cê vai num show de rock? Sério?
Zen sorriu de forma contida e isso foi o suficiente para Elena cair na gargalhada, sem conseguir se segurar mais.
— Isso estranhamente combina contigo — ela falou, rindo de forma descontrolada, o que toronou o que ela disse quase indecifrável;
— Por que será que eu não tô surpreso? — Alan perguntou, com um sorriso malicioso. — O Franginha é daqueles emo que ouve rock, tá ligado? Combina demais.
— É um condigo — Zen falou, mas não conseguiu esconder o sorriso. Tinha que admitir, era um código bem idiota. — A gente criou ele quando o Marcos foi pros Estados Unidos.
— E o que quer dizer? Que ele tá vindo te visitar pra pintar as unhas e assistir filme de terro? — Alan debochou.
— Não… Significa que alguma coisa séria aconteceu e ele precisa da minha ajuda — Zen respondeu, em tom sério.
— Ah… Então não é um show de rock — Elena falou, de forma decepcionada e temerosa.
— Não. — Zen sorriu e segurou a mão da garota ao acrescentar: — Até porque, o C4 não me deixaria ir em um Show desses sem ele, e o Diebus nem me deixaria ir me Show que fosse tocar só um gênero de música.
Elena sorriu de forma contida, ainda parecendo preocupada com o motivo da ligação do Marcos, e então se lembrou de algo que deveria fazer.
Sentiu seu rosto ficar corado quando olhou para o Zen e percebeu que ele a olhava de volta, mas, mesmo sabendo que ele provavelmente acharia aquilo bobeira — o que provavelmente era — ela respirou fundo e disse:
— Acho… Acho que eu tenho que me desculpar contigo… No fim das contas, cê conhecia mesmo o Megaman.
Quando viu Zen conter uma risada, Elena quis enterrar o rosto debaixo da terra e nunca mais tirar. Sentiu seu rosto ficando cada vez mais quente, e achou que morreria de vergonha.
— Você ainda lembra disso? Não precisa se preocupar, eu já estou acostumado a estar certo e ninguém acreditar.
— Ah, cóe, se querem se pegar, por mim tudo bem, mas não precisam ficar flertando na minha frente. — Alan grunhiu enquanto revirava os olhos e passava andando pelos dois, caminhando em direção a porta que levava para a garagem.
— A gente não tá flertando! — Elena falou, o rosto ficando ainda mais vermelho, se é que isso era possível.
Zen começou a rir e ignorou completamente quando Elena pediu que ele concordasse com ela. Elena apertou a mão dele com um pouco mais de força, mas não conseguiu conter o sorriso discreto que se formou no seu rosto.
— Idiota — ela falou, morrendo de vergonha enquanto ele ria de toda a situação e, principalmente, da reação dela.
∆
Quando os três chegaram na cozinha, Ester e Alex haviam saído, e Mikey estava entregando um sanduíche para o garotinho loiro que Zen tinha visto antes.
Os olhos castanhos e frio do garoto se desviaram lentamente na direção do Zen e o garoto congelou na porta da cozinha, fazendo Elena — que segurava sua mão — parar também.
Elena olhou confusa para ele, mas quando desviou a atenção para o garoto, não conseguiu esconder sua surpresa também.
Contudo, logo tal reação foi encobertar por um sorriso gentil e amigável quando ela soltou a mão do Zen e saiu caminhando na direção da criança.
— Então cê acabou gostando do meu sanduíche, não é, Shin? Sabia! Posso não ser igual o Diebus na cozinha, mas nada supera meu Sanduba.
A criança, Shin, desviou o olhar de forma constrangida e meneou lentamente com a cabeça. Pegou o sanduíche com Mikey e saiu andando antes que alguém falasse mais alguma coisa.
Quando passou pela porta da cozinha, ele e o Zen trocaram um olhar breve antes dele sair do caminho para o garoto passar.
Zen observou o garoto loiro se afastando até que passasse por uma porta e sumisse do seu campo de visão, só então se permitiu respirar normalmente.
Não sabia dizer o que era, mas algo naquele garoto causava arrepios no Zen, e ele não estava acostumado a se sentir assim — ainda mais com uma criança.
— Quem é o guri? — Alan perguntou, abrindo a porta da geladeira e olhando em seu interior em busca de algo.
— O nome dele é Shin, tentem ser educados. — Mikey caminhou até o fogão e destampou uma panela, mexendo em seu interior com uma colher de pau.
— Ele me dá calafrios. — Zen se aproximou da geladeira e empurrou Alan pro lado, para poder abrir o congelador e pegar uma forma de gelo.
— Ele me lembra um pouco você — Elena comentou, enquanto se sentava em frente a bancada da cozinha.
Zen parou em frente ao armário, com a porta entre-aberta e prestes a pegar a garrafa de Whisky em seu interior. As palavras da Elena ecoaram na mente dele por um segundo, e então ele teve certeza.
“É isso. Ele me assusta porque me lembra de como eu era quando era criança” ele, pensou, pegando a garrafa de Whisky no armário e caminhando até a bancada.
— E, porque ele tá morando na minha casa mesmo? Só por curiosidade. — Zen colocou a garrafa sobre a bancada e voltou até o armário para pegar os copos.
O silêncio tomou conta da cozinha de forma tensa, interrompido apenas pelos paços do Zen e o som dos copos batendo uns nos outros quando ele os pegou na prateleira.
Se percebia Zen percebia a tensão a sua volta, ele não demonstrava. Parecia ignorar completamente a hesitação, apenas aguardava sua resposta enquanto continuava o que estava fazendo.
Voltou até a banca e colocou os copos sobre ela, pegando a forma de gelo e retirando algumas pedras. Havia colocado três pedras de gelo dentro de um copo quando Mikey respondeu:
— Ele é filho do Grave, eu tô cuidado dele por um tempo. Algum problema em deixar ele morar aqui com a gente?
As pedras de gelo caíram dentro do copo e o som ecoou pelo comado acompanhado do pesado suspiro do Zen. Abriu a garrafa de Whisky e começou a encher um dos copos enquanto dizia:
— Faça como quiser, mas tenha certeza de que ele não se tornara um fardo no futuro.
— Tá de boa, relaxa. — Mikey sorriu de forma tranquilizadora enquanto se aproximava do Zen. — Tava até pensando em apresentar ele pra Alice, aposto que os dois dariam um casalzinho fofo.
— Aposto que ela iria adorar — Zen falou, e percebeu que era verdade. A garota precisava de amigos da idade dela. — Mas a Aline te mataria se ouvisse isso.
Zen colocou a garrafa de Whisky sobre a bancada ao terminar de encher os copos e entregou um dele ao Mikey quando ele se aproximou. Pegou o outro copo para si mesmo, mas não bebeu de imediato, antes disso, respirou fundo e perguntou:
— Conseguiu alguma informação da Andrade antes de mata-la?
— Foi mal, mas quem é essa? — Mikey franziu as sobrancelhas, olhando para o amigo de forma confusa.
— A Medusa.
— Atá, claro… Sempre me perco quando cê não usa os codinomes dos vilões. — O semblante de Mikey foi ficando sério a medida que se silenciou para beber do seu copo.
O Whisky desceu queimando por sua garganta, o sabor amargo sendo muto bem-vindo e combinando perfeitamente com seu estado de espírito atual.
— Não parei pra perguntar nada, foi mal, eu tava puto. — Ele colocou o copo sobre a bancada e olhou no fundo dos olhos do seu amigo. — Não deveria ter ido até lá, mas depois que cê entrou no apartamento da Elena, eu fiquei sem nada pra fazer, aí fui atrás da Ester.
— Tá me dizendo que a Estelar também estava lá? — Zen perguntou, seu tom de voz soando tão frio que teria parecido intimidador, se ele não estivesse falando com seu melhor amigo.
— Tava… Não era pra tá? — Mikey questionou, já esperando pelo pior e amaldiçoando o Alex por sua estupidez.
Contudo, antes que Zen tivesse a oportunidade de responder Mikey, Alex passou pela porta, rindo de forma alegre como sempre, e avisando para a Elena que a Ester voltaria mais tarde com o pai delas, para ver com ela estava.
— Sério? Ela vai trazer meu pai? Pra cá? — Elena perguntou, de forma incrédula e insegura.
— Pode crê, né? Eu também não acho o melhor lugar pra trazer o sogrão, mas eu e os Olhos de Mel vamo ter que lidar com isso.
Quando estava na metade do caminho até as panelas no fogão Alex notou a garrafa de Whisky sobre a bancada e o copo na mão dos seus dois amigos.
Abriu um largo e animado sorriso no rosto e saiu caminhando até a bebida, quase como se o álcool o atraísse.
— Num boto fé que cêis não me esperaram pra beber. É isso aí mesmo cuzão, os de verdade eu sei que são.
Mas, quando pegou a garrafa na bancada e se virou para pegar um copo na prateleira do armário, Zen segurou a garra de Whisky em sua mão e ele teve que parar.
Desviou o olhar para o amigo com um sorriso no rosto, mas o sorriso murchou ao ver o olhar frio no rosto dele. Olhos negros e assassinos que ele não encarava há muito tempo.
Lembrou do garoto que conheceu a muitos anos atrás e da sede de sangue que ele ocultava. Se lembrou de como respeitava as ações daquele garoto, e principalmente de como temia o poder dele.
Engoliu seco diante daquele olhar cruel que há muito tempo ele não via o amigo dirigir a ele, e permaneceu em silêncio para o Imperador falar.
— Você levou sua namorada para a missão que eu te passei?
A pergunta pairou entre eles por meio segundo, deixando todos em volta tensos. Alex apertou a garrafa em sua mão com um pouco mais de força e umedeceu os lábios antes de responder:
— Levei, mas eu…
— Você tá ficando desleixado, C4.
Zen soltou a garrafa e saiu andando sem esperar por uma resposta do amigo. Alex ficou parado no lugar, piscando lentamente e sentindo como se tivesse tomado uma facada no peito.
As panelas chiaram no fogão e Mikey se afastou para verificá-las. Elena e Alan trocaram olhares constrangedores quando o amigo se sentou no banco em frente a bancada. Mas ninguém disse nada.
Apenas duas pessoas sabiam de verdade o peso que aquela conversa possuía. Não tinha sido uma bronca, Zen não estava irritada. Ele parecia desapontado, e, de certa forma, para Alex isso foi muito pior do que se o amigo tivesse gritado ou batido nele.