O Despertar Cósmico - Capítulo 8
Maria Helena tinha acabado de arrumar as suas malas e estava, nesse momento, na frente da floricultura, guardando suas coisas no carro, onde Victor esperava por ela no banco do motorista.
Usando sua telecinése ela guiou todas as suas coisas para o porta-malas do carro e em seguida o fechou. Se virou para trás, onde Elena e Amanda a observavam, e sorriu.
— Bom, é isso, agora é com vocês.
— Vai ficar tudo bem — Elena garantiu. — Não é a primeira vez que eu fico sozinha cuidando da loja.
— Mas é a primeira vez que fica sozinha com ele — Maria sinalizou na direção da entrada da floricultura, onde Zen conversava em seu celular.
O garoto tinha dito que precisava fazer uma ligação, para avisar que ficaria ali, e depois se afastou.
— Mãe! — Elena falou, como se somente aquilo fosse o suficiente para demonstrar a indignação dela.
— Eu leio mentes, Elena. A sua e a dele. Não sei se gosto do que eu vejo aí dentro… — Ela deu tapinhas carinhosos na cabeça da filha, como se quisesse confirmar o que estava lendo ali.
Amanda riu, imaginando que ninguém gostaria de saber o que se passa na mente da filha quando ela tá com o garoto de quem gosta. Ela colocou a mão sobre o ombro da amiga e garantiu à Maria:
— Pode ficar tranquila, Dona Maria, ela tá comigo. Vou ficar de olho neles.
— Isso me preocupa mais do que conforta. — Maria suspirou, mas por fim sorriu, acariciou sua filha uma última vez e disse: — Vejo você amanhã a noite, não faça nada que eu não faria até lá.
Elena sorriu e revirou os olhos brincalhona, Maria acertou um tapinha na cabeça dela, que riu e disse:
— Tá bom, mãe. Tchau. Eu te amo.
— Também te amo, sua encrenqueira — Maria disse enquanto as duas se abraçavam.
Quando as duas se desvencilharam do abraço o Zen estava se aproximando, e seus olhos se encontraram com os de Maria, que ficou repentinamente séria.
— Tivemos um grande progresso, não tivemos?
Zen parou um pouco mais afastado delas, e respondeu, com um sorriso provocativo no rosto:
— É, um pouco. Eu diria que não foi uma total perda de tempo. Até que você é boa nesse seu novo trampo.
Maria encarou ele em silêncio por um bom tempo, e então a voz dela ecoou na mente de Zen, mesmo sem ela mexer os lábios:
“Espero que sim” — a voz disse. — “Mas vamos descobrir isso agora. Pare de mentir para ela, por favor.”
Zen não teve tempo de esboçar qualquer reação ao pedido Telepático da Maria, pois logo em seguida a mulher entrou no carro e fechou a porta.
Victor ligou o carro, mas não acelerou, apenas deixou o motor ligado enquanto Maria abaixava o vidro do seu lado, colocava a cabeça para a janela e dizia:
— Se cuidem, tentem não fazer nada imprudente, e Zen… cuide da minha filha.
O carro deu partida e, lentamente, começou a se afastar enquanto Elena, Amanda e Maria acenavam em despedida umas pras outras. Maria mandou vários beijinhos para filha, antes do carro fazer uma curva e ela perdê-la de vista.
Quando o carro fez a curva Zen sentiu o olhar Victor repousar sobre ele, e, mesmo sem telepatia, o garoto soube o que o homem estava pensando. Ele viu a ameaça oculta no olhar de um pai.
— Muito bem… — o Zen se virou para a Elena e a Amanda e esfregou as mãos uma na outra de forma animada — Vamos começar a festa.
∆
Mas não houve festa alguma. Pelas próximas horas eles trabalharam sem parar.
Elena ficou no balcão, atendendo os clientes, ou como ela gosta de dizer, passando raiva com eles.
E o Zen estava no balcão da área de lazer, juntando várias orquídeas para fazer um buquê quando Amanda parou ao seu lado, abrindo o caixa e colocando algumas notas lá dentro.
— Cê até que leva jeito como isso. Vai saber lidar com os negócios
O garoto olhou para a Amanda de canto de olho, sem parar de arrumar o buquê de orquídeas, e perguntou, com um sorriso no rosto:
— E o que cê quer dizer com isso?
Assim que o Zen terminou o buquê Amanda o pegou das mãos dele e entregou a uma senhora, bem velhinha, que aguardava do outro lado do balcão.
— Obrigado pela preferência e volte sempre.
Amanda sorriu amigavelmente para a velhinha, e quando ela saiu andando para pagar pelo buquê, a garota se voltou para o Zen.
— Ah, cê sabe. Tô falando de quando tu e a Elena assumirem um relacionamento sério e tu passar a ajudar ela aqui.
O garoto abriu um sorriso no rosto, mas era um sorriso triste, e quando falou parecia distante, distraído, pensativo:
— Parece uma vida normal demais para mim — Ele olhou na direção da entrada da loja, onde a velhinha pagava o buquê de orquídeas com a Elena no caixa. — Uma vida boa demais… para alguém como eu.
— Uma vida normal demais? Posso até adivinhar o resto. Tu planeja virar um herói, acertei?
— Já quis, mas agora… acho mais fácil eu me tornar um vilão — ele respondeu. — Mas e você? Eu sei que a Elena não quer ser uma heroína, mas e você? Já pensou no assunto?
— Já sim. Já pensei que o salário é um dos mais altos que eu vou conseguir sem uma formação especializada, pensei também que esse dinheiro seria perfeito para pagar a escola dos meus irmãos, mas o que eu mais pensei foi nos meus pais…
— Eles são heróis? — perguntou Zen, ainda observando, de forma distraída, a Elena no balcão.
— Eles eram… foram umas das milhares de pessoas que morreram no Dia da Libertação.
A voz da Amanda pareceu ecoar pelas paredes da floricultura de tão silencioso que Zen ficou.
Até que, lentamente, ele virou o rosto para a garota. Nesse momento ela se surpreendeu ao ver no rosto dele não pena ou uma simpatia forçada, mas sim compreensão.
O semblante triste no rosto dele era de alguém que compreendia tal dor, ou compartilhava dela. Um olhar de pesar que valia mil palavras.
— Eu sinto muito — ele disse, e Amanda percebeu que ele realmente sentia. — Seus pais foram grandes heróis por lutarem contra o Iluminus. Você deve sentir orgulho deles.
— Eu sinto falta…. — Ela murmurou baixinho.
— Sinta orgulho também.
O garoto levou a mão até a cabeça dela e, gentilmente, acariciou os seus cabelos negros.
— Eles tomaram, por livre e espontânea vontade, a decisão de sacrificar suas vidas para que a filha deles pudessem viver e tomar as próprias decisões. Livres do medo.
Zen fez uma pausa, engasgando com as palavras. Parecia que ele não voltaria a falar, mas então ele engoliu seco e deu continuidade:
— Eles ficariam felizes em ver que você está aproveitando essa oportunidade que eles lutaram para te dar. Então viva a vida, faça escolhas, se arrependa, mas, acima de tudo, se orgulhe dos pais que tem, pois é graças a eles que o mundo não é regido por um psicopata maníaco por controle.
Um sorriso involuntariamente começou a se formar no rosto da Amanda enquanto ela observava, com certo fascínio, o rosto inexpressivo do garoto na sua frente, que parecia dar o seu melhor para esboçar um sorriso simpático.
“Ele é estranho”, ela pensou, o sorriso se alargando no seu rosto. “Geralmente as pessoas ficam desconfortáveis em tocar nesse assunto, mas pra ele pareceu algo tão natural e estranhamente sincero.”
— Tu definitivamente não é normal — Ela riu, pois pensou que justamente por isso fazia um par perfeito com a Elena. — Acho que tu..
Mas antes que Amanda terminasse de falar, alguém bateu com as duas mãos no balcão em frente a eles.
Os dois se viraram para o garoto de cabelos castanhos e um olhar intimidador no rosto, que observava o Zen de forma ameaçadora, vez ou outra desviando o olhar para a mão dele, que lentamente se abaixou ao lado do corpo.
— Alan, cê demorou. Achei que não iria vir mais — Amanda falou, um pouco mais animada do que estava segundos atrás.
— Eu tava um ocupado. Receberam o meu recado? Esse deve ser o Zen, de quem tanto ouvi falar.
Zen encarou o garoto por um segundo, até que um sorriso lentamente se formou no canto de seus lábios. Um brilho de arrogância surgiu no seu olhar.
Ele olhou para o Alan de cima a baixo, como se se estivesse olhando, e analisando, um animal irracional, e então ofereceu a mão para ele apertar enquanto dizia:
— Então você é o famoso Alan.
Alan hesitou por um momento, mas por fim aceito o aperto de mão do Zen, e nesse momento o garoto acrescentou:
— O filho do herói número um, a estrelinha do papai.
O semblante de Alan se tornou sério no mesmo instante. O aperto de mão, de ambos, se tornou mais forte, como se cada um tentasse fazer o outro largar em uma disputa infantil de força.
— Parece que a Elena te manteve bem informado, Zen Snyder — Alan disparou o nome do garoto como se fosse uma espécie de xingamento.
— Quando eu estou com a Elena eu prefiro conversar sobre coisas mais… importantes. As coisas que eu sei, ou faço, é por mérito próprio — Mesmo não colocando em palavras a insinuação estava bem clara, se não nas palavras ou no tom frio, estava nítida pelo sorriso no rosto dele.
Amanda olhava de um para outro, desconfortável apenas de sentir a tensão e a hostilidade com a qual eles se encaravam.
A garota soltou um suspiro, aliviada, ao ver Elena se aproximando. Pensou que ela tinha visto o que estava acontecendo e iria acalmar os dois. Que ela iria impedir uma briga de começar.
Mas conforme a garota se aproximava Amanda percebeu, pelo sorriso no rosto dela, que estava enganada.
Elena estava ali pois viu o que estava acontecendo, mas não para impedir, e sim para pôr mais lenha na fogueira.
— Zen, vejo que você já conheceu o Alan. Era dele que eu estava falando quando disse que conhecia alguém que cê não podia derrotar — Elena falou, se aproximando, e estava rindo antes mesmo de ver a reação do garoto.
O rosto do Zen se virou na direção da Elena instantaneamente, como se fosse atraído por um ímã invisível. No rosto um olhar confuso, como se fizesse um questionamento silencioso. “Sério?! Ele?!”
— Eu até acreditaria… Mas nem você acredita nisso — Zen comentou, olhando de volta para o Alan e soltando a mão dele. — Aposto que ele nem mesmo ganha de você, Elena, quanto mais de mim.
— Tu é tão arrogante quanto ela descreveu.
— Não, Alan. Eu sou duas vezes mais — Zen corrigiu, com um olhar inexpressivo no rosto, mas os olhos estreitados, como se tentasse, em vão, ocultar um sorriso.