O Herói das Chamas - Capítulo 3
Antes que eu pudesse falar algo, ele sumiu, digo, tudo ao meu redor sumiu. Simplesmente o cenário, que antes era o santuário daquele cara, virou um centro comercial.
“Definitivamente ele não respeita as leis da física, então acho que não é exagero se chamar de Deus…”, pensei ao ver a multidão que caminhava pelas ruas.
A primeira coisa que pude perceber foi o céu. Quando desmaiei, era final da tarde, porém, assim que fui teletransportado para aquela cidade, estava de manhã.
Não deveria estranhar passar mais de um dia desacordado, então praticamente ignorei o fato.
— Olha isso! — Alguém falou abismado atrás de mim.
Nada naquele mundo poderia surpreender a minha pessoa, afinal me tornei herói e visitei Deus dias atrás.
— Caraca! A recompensa dele aumentou para mil moedas de ouro! — Outra pessoa completou.
Rapidamente me virei para prestar mais atenção no que estavam falando. Não entendia de economia, mas “mil” era um número bem intuitivo.
— Do que vocês estão falando? — Tentei puxar conversa.
— Olha aqui. — O homem me entregou uma folha. — Antes estava só quinhentas, mas agora está valendo mil. O governo quer mesmo pegar ele.
Olhei para o que estava no papel. Nele havia o rosto de um cara estampado, além de estar escrito “Ben Drago, procurado vivo ou morto”.
O preço falado antes também estava lá. Neste momento, o hype invadiu meu corpo. Mal podia imaginar o que faria com tanto dinheiro.
Primeiramente, compraria equipamentos que facilitariam minha jornada, assim matar monstros seria bem mais fácil.
Estava determinado a caçar aquele homem. Com o serviço finalizado, ganharia apenas dinheiro, mas também fama, afinal um preço tão caro significava alguém bem forte.
Não podia perder tempo, precisava correr para que pudesse pegar ele antes de outros. Quanto mais cedo começasse, melhor.
Porém havia um problema: não tinha roupas para batalhar pela vida.
Ainda estava com a calça jeans e a camisa social da balada, os dois eram uma combinação ridiculamente ruim. Minha movimentação era muito prejudicada.
De acordo com os RPG’s que jogava, deveria ir até um comerciante e comprar um traje bem bonito e que me ajudasse.
Entrei na primeira loja que vi e já dei sorte, realmente havia vários equipamentos maneiros — como era leigo, só prestava atenção na beleza.
Cumprimentei o vendedor e logo fui ver as opções. Fiquei impressionado com todas, mas uma em específico me chamou.
Logo pedi para experimentar. Dentro do provador, havia um espelho um pouco maior que eu, lá poderia ver o traje.
Coloquei as calças escuras, calcei as botas de couro e vesti o manto preto, com tecido vermelho, que descia até o joelho.
Ajeitei os cruzados do peito e o cinto, que era o responsável por levar todos os equipamentos.
Para finalizar, coloquei o capuz. Assim que olhei o resultado final, não pude resistir, tive certeza logo de cara.
— Vai ser essa — falei, voltando ao balcão.
— Custa 100 moedas de bronze.
O juízo pesou na minha mente. Como compraria algo sem dinheiro?
Era praticamente o ciclo da vida. Eu precisava de dinheiro para comprar equipamentos e de equipamentos para ganhar dinheiro.
Mas logo pensei em uma solução. Corri até as roupas que estava vestido antes e peguei meu celular no bolso da calça.
Por estar sem sinal e com a bateria quase acabando, decidi entregar para o lojista, talvez ele ficasse entretido pelos próximos vinte minutos.
Assim foi feito. Ele aceitou, e eu levei a roupa. Naquele momento, só faltava alguma arma para conseguir bater de frente com os monstros.
— Muito bem! — Comemorei ao dar um soquinho no ar. — Agora eu tenho que ir até um ferr…
Antes que eu pudesse terminar a frase, alguém esbarrou em mim, fazendo nós dois cairmos no chão.
— Ei! Olha por onde anda! — falei, sem paciência.
Porém, assim que vi seu rosto, fiquei arrependido de falar aquilo. Era uma garota! E das lindas!
Ela usava um capuz, mas, por causa da queda, ele saiu, revelando seu belo rosto e o cabelo loiro e resplandecente.
Sua roupa era praticamente toda azul, assim como seus olhos.
“Que mulher perfeita!”, pensei de primeira.
Levantei-me, pedindo perdão. — Foi mal, cê tava com pressa, não tem o que fazer. — Estendi a mão para ela e sorri de forma mais madura que consegui.
A garota, em um instante, colocou o capuz de volta e também ficou de pé. Assim que fez isso, seu olhar se encontrou com o meu.
Olhando no fundo de seus olhos, pude perceber o ódio que ela sentia, as veias saltando de sua testa praticamente diziam: “Eu vou te matar”.
Sem mais nem menos, ela segurou a gola da minha camisa recém-comprada e me puxou para um beco.
Assim que chegamos, me jogou em uma parede de modo violento.
— Calma aí! Eu sei que posso ter olhado estranho, mas não é pra tant… — Não pude terminar minha frase, pois ela me interrompeu.
— Você é maluco? Estou carregando um artefato super perigoso comigo. E se ele explodisse?
“Era suposto eu saber dessa informação? E eu também não quero mais saber de explosões.”
— Relaxa, eu esbarrei sem querer, não vai acontecer de novo.
— Espero mesmo. Estou com pressa — falou, dando as costas e saindo.
Senti-me péssimo, como ao ver uma joia fugir das minhas mãos, tirando o fato de que a garota nunca esteve comigo.
Porém, no momento em que estava indo embora, pude ver algo cair de sua mão. Ela percebeu e correu para pegá-lo, mas, por causa do vento, ele veio até meus pés.
Normalmente eu não leria o que estava escrito, mas, como a menina me olhava com ainda mais ódio, não pude segurar a curiosidade.
— Ah, é só o cartaz de procurado daquela cara lá — falei, decepcionado. — Você também está procurando por ele? Boa sorte. — Entreguei o papel e dei as costas, fazendo um tchauzinho com a mão.
Por fora, estava mais tranquilo do que nunca, mas, por dentro, fiquei desesperado ao pensar que fazia sentido ter tanta gente atrás dele, logo eu ficaria para trás facilmente.
No entanto, tinha que parecer confiante, senão seria engolido por aqueles que realmente eram fortes.
Quando já tinha desistido, o anjo me salvou. — Você quer formar uma parceria?
Senti como se uma flecha atingisse meu coração, mas ela não me machucou, pois foi uma flechada de amor.
Voltei meu olhar para ela, tentando segurar as lágrimas de felicidade.
A garota ficou bem vermelha. — Não pense em nada! É só que os aventureiros se matam por causa de recompensas, então seria legal me juntar com alguém que não fizesse isso…
— Não se preocupe. Está tudo bem querer isso, afinal o cara é bem forte, mas eu sou bem mais — falei, com a maior confiança do mundo.
O olhar dela começou a brilhar como nunca, parecia que finalmente minha lábia tinha pegado alguém.
Com um sorriso no rosto, falou: — Então vamos logo para o reino de Anfang, ele foi visto lá dias atrás.
Rapidamente assenti e seguimos para sair da cidade.
— Aliás… — Ela parecia um pouco envergonhada. — Qual o seu nome? O meu é Sapphire.
Aquela garota realmente acreditava que eu era alguém forte e confiante, e isso me deixava um pouco mal.
Será que seria justo com ela mentir ao dizer que era um Herói? O enigma tomou conta da minha mente.
— Me chamo Théo. É um prazer. — Só consegui dizer a verdade.
— Muito bem, Théo. — Sapphire abriu um mapa e colocou o dedo em uma cidade. — Como o lugar que nós vamos é muito longe, acho melhor pegarmos uma carruagem. O que acha?
“Não faço ideia. Nem conheço o lugar.”
— Acho uma boa, mas você que sabe. — Joguei a decisão de volta.
— Tudo bem, vamos fazer assim, então.
Ela deu um pequeno sorriso, e seguimos até pegarmos a carruagem.
***
Nós andamos bastante, de acordo com Sapphire, a distância de um reino para o outro era bastante.
Então, o trajeto que normalmente levaria 1 hora dirigindo um carro, levaria quase 4 ao pegar a carruagem.
As coisas pioraram ainda mais porque, durante 2 horas, nenhum dos dois puxou assunto, nem mesmo o cocheiro falou algo.
Ela era uma pessoa facilmente decifrável. Só de observar seu jeito era o suficiente para descobrir o que estava pensando, então descobri que ela me odiava a cada segundo que passava.
Sinto muito se minha única interação com alguma mulher foi em visual novels, onde o objetivo principal era conquistar uma namorada, mas isso não era minha culpa, mas sim da sociedade.
No entanto, ainda não tinha desistido e tentei falar algo. — E então? Sobre o artefato… o que ele é?
— Tsc. Eu não te disse para não falar disso? — Ela puxou uma bainha que carregava uma espada enorme.
Eu não era alguém observador, mas não notar aquele armamento absurdo foi o ápice da miopia.
— Essa é a Roxium, ela foi a espada de um antigo membro do meu clã. Estava indo até Anfang para devolver — Ela completou.
Se não era para eu saber, por que está me contando?
— Interessante. Ele é famoso? — Estava curioso. Se fosse um artefato tão perigoso, o dono dele deveria ser ainda mais.
— Sim, ele é o Herói das Chamas.
Maldição! Como tudo na minha vida girava em torno daquele cara? Todas as pessoas tinham algum tipo de ligação afetiva com ele?
Não consegui esconder a cara de surpresa, logo ela percebeu. — Por que está tão tenso?
— Não, é que… eu sou o…
Antes de conseguir completar a frase, a carruagem parou de uma só vez, jogando-me para frente.
— Desculpe, senhor e senhorita — disse o condutor —, mas vocês precisam ver isso.
Sapphire, em um piscar de olhos, abriu a porta e foi logo conferir a situação, enquanto eu fiquei olhando pela janela.
— Não é possível… — disse ela, levando a mão à boca.
Quando também desci para ter um campo de visão melhor, vi aquilo que nos aguardava.
Definitivamente era um monstro.