O Herói das Chamas - Capítulo 4
Aquela coisa era enorme, e, com toda a certeza, não era humano.
Uma flor gigante, de praticamente dez metros, estava bem na nossa frente, porém não havia algo agradável naquilo.
De suas pétalas saía sangue, que formava poças no chão. O que deixava o cheiro cada vez mais insuportável.
— O que é isso, Sapphire? — Tentei me aproximar um pouco.
Ela esticou sua mão para trás. — Não se mexa! Ela pode ver tudo!
Automaticamente parei de me mexer. Se fosse realmente verdade, qualquer tipo de movimento seria capaz de matar todos nós.
No entanto, todos os meus instintos diziam para sair correndo pela minha vida, até me preparei para correr.
— Ei! — Ela chamou minha atenção. — É só ficar parado! Se ficar desse jeito aí, só vai matar todo mundo!
Eu já sabia o que iria acontecer, mas não conseguia parar de pensar em fugir.
Do que adiantaria fingir ser alguém forte se estaria morto? Somente aquela aura já deixava minhas pernas tremendo.
Tentei fugir, mas todo o chão tremeu, o que me fez parar bem na hora.
Após alguns segundos de terremoto, do solo saíram várias raízes. Elas viram exatamente na minha direção.
Não tinha jeito, a morte era certeira. Só pude aceitar.
Por quê? Por que, logo no momento em que tudo parecia dar certo, tudo deu errado daquela forma?
Fechei meus olhos e esperei pelo impacto.
Passou algum tempo e nada aconteceu. Estava intacto! Nem eu acreditei.
Porém, antes que pudesse ser acertado, todo o chão se abriu em uma enorme fenda, criando uma espécie de trincheira.
As raízes, que antes vinham atrás dele, caíram no chão, as pontas foram cortadas. O que sobrou acabou voltando para o solo.
Olhei para frente, procurando meu salvador, mas não esperava o que veria: Sapphire estava de pé, com adagas nas mãos.
— Boa! — comemorei, afinal quem não comemoraria por estar vivo? — Agora a planta ficou com medo!
Porém, mesmo que todos estivessem bem, a garota não esboçava reações, só caiu lentamente no chão.
Meu único reflexo foi correr até ela. Assim que cheguei, tentei chamá-la, mas não respondia de jeito algum.
Sapphire estava de lado, então a virei e apoiei sua cabeça no meu braço.
Porém, sentia algo estranho. Instintivamente olhei para minha mão. Estava na minha frente, mas não queria acreditar.
— Droga! Droga! Droga! — gritei.
— O que aconteceu? — O condutor perguntou, correndo até nós.
No momento em que viu aquela situação, ele ficou mais horrorizado do que eu. Realmente não era para qualquer um.
Havia cortes por todo o corpo de Sapphire, o que fazia muito sangue escorrer e transbordar.
Se continuasse a sangrar daquela forma, ela acabaria morrendo rapidamente.
— Olha ali! — falou o homem. — Parece que ela vai atacar de novo!
A flor demoníaca estava inquieta, balançava-se para todos os lados, enquanto o chão tremia mais uma vez.
Só pude ficar ainda mais assustado. De todas as coisas que poderiam aparecer, por que logo aquela coisa?
Mesmo com o sacrifício de Sapphire, a planta se regenerou, jogando tudo o que ela fez no lixo.
Não podia deixar tudo terminar naquele lugar. Segurei minha companheira o mais forte que podia e fugi.
Virei para o homem. — Vamos embora! Não dá para lutar com aquela coisa!
Corri o máximo que pude, mas minha velocidade estava bem reduzida por carregar alguém.
Só que não poderia parar. Pelo som, conseguia saber que a coisa já chegava perto de nós dois.
Na hora h, pulei para o lado, de costas viradas para o chão. Desta forma Sapphire não se machucaria na queda.
O ataque passou muito perto, passou raspando por mim.
“Droga… não vai dar de fugir carregando ela.”
Seria bem mais fácil deixar os dois ali, sendo atacados pela planta, mas, de alguma forma, não conseguia.
Estávamos a muitos quilômetros de qualquer cidade, então ninguém sabia de nossa presença.
Não significava apenas que estávamos sozinhos, mas também que ninguém iria me julgar caso deixasse os dois para trás.
A única pessoa que era forte o suficiente para me impedir, Sapphire, estava desacordada, e o outro cara era mais medroso que eu.
Várias coisas passaram pela minha cabeça, não dava para ignorar, afinal a decisão mais inteligente era deixar o peso para trás.
Ainda assim, algo no fundo me dizia para não fazer isso. Deveria preservar meu título, não dava para recuar logo naquele momento.
“É isso! Eu vou lutar! Talvez morra, mas não importa”, pensei, determinado a acabar com aquilo. Se fosse para morrer, que morresse com um pingo de dignidade.
Levantei do chão com dificuldades.
As raízes da planta voltaram para o solo novamente, talvez esperassem o momento correto para atacar.
Bastou alguns segundos encarando aquele bicho para que entendesse que não teria como enfrentar só com as mãos.
De acordo com o que vi, ele poderia se regenerar de forma quase instantânea, então dar uns murros não adiantaria.
Teria que cortar o mal pela raiz, literalmente.
“Mas onde vou encontrar alguma coisa cortante aqui?”, indaguei a mim mesmo.
Encontrei a resposta de imediato.
— O que está fazendo? Vai deixar a garota sangrando? — perguntou o condutor ao me ver correndo até a carruagem.
— É verdade! — Retirei minha túnica e a joguei para ele. — Estanca o sangramento com isso aí. Qualquer ajuda já vai melhorar.
Corri até a carruagem, procurando algo que tinha escutado a Sapphire falar.
— Achei! — gritei por estar certo.
A espada que ela tinha falado ainda estava lá, eu não acreditava — mesmo que fosse difícil que criasse pernas e fugisse.
Peguei-a e fui em direção ao monstro.
— O que pretende fazer com isso? A menina disse que essa espada era do Herói das Chamas, não é? Não dá para você usar!
— Amigo… — Retirei a espada da bainha. — Você não sabe quem sou…
Ele não tinha entendido, e nem precisava. A única coisa que precisava saber era que tudo ficaria bem a partir dali.
Segurei o cabo com as duas mãos. Elas estavam tremendo, assim como todo o meu corpo, mas fiz força para que parassem.
Coloquei-a à frente do meu corpo, perpendicular ao chão, aproximando-me do monstro.
Assim que cheguei em sua frente, o chão começou a vibrar novamente. Mais um ataque viria.
Respirei fundo e ergui a espada acima da cabeça, esperava o ataque dele.
Uma de suas raízes se revelou ao sair do solo e veio em minha direção, mirando no abdômen.
Em resposta, rapidamente abaixei a espada e defendi o ataque com a parte lateral da espada, mas estava sendo jogado para trás, então pulei para o lado.
Antes que pudesse comemorar, outro ataque veio, desta vez na cabeça. Abaixei de lado e fiz um corte da esquerda para a direita.
A planta começou a gritar de dor e recuou seu ataque.
“Droga, até que tô bem por não ter morrido ainda, mas se continuar só na defensiva, vou morrer de qualquer forma.”
Só conseguia me mover daquela forma porque, tempos antes, pratiquei Kenjutsu, a arte de combate com espadas, mas, como não paguei a mensalidade, só tive uma aula, então só aprendi a segurar uma espada.
Atacar, que deveria ser o foco nessa situação que estava metido, definitivamente seria um problema.
Mais uma vez fui atacado, mas desta vez não pude defender.
Acabei sendo perfurado entre o ombro e o braço direito, logo o dominante. Com certeza aquilo não era só uma flor.
Para, no meio da luta, identificar o estilo e determinar a mão dominante, era preciso, no mínimo, ter algum tipo de consciência.
Não tinha mais força no braço, então soltei a espada, que caiu no chão.
— Arf… Arf… Maldita… Foi por pouco… — falei sorrindo. Alguns momentos depois, caí no chão.
Será que nunca aprenderia a lição? Sentir-se o mais forte definitivamente não te torna o mais forte, eu sabia disso, mas ainda assim continuava com o mesmo erro.
Não consegui segurar as lágrimas. Estava muito frustrado.
A planta carnívora tremia bastante, parecia que alcançaria uma nova transformação, pois ainda havia um de pé.
— Levanta! Não quero morrer! Me salve, por favor — O cocheiro gritou para mim.
Só pude tapar o rosto com a mão esquerda. Que tipo de herói choraria diante àquela situação? Patético.
Ele continuava a gritar, implorando por algum tipo de ajuda, mas eu não podia fazer isso, pois ainda estava no chão.
Consegui escutar seus passos vindo em minha direção.
Quando chegou, colocou as mãos no meu ferimento, e uma luz saiu delas.
— O que está fazendo? Foge enquanto ainda dá! — falei, sem entender o que acontecia.
— Tudo o que posso: uma cura básica. Com isso, você vai conseguir segurar a espada. — Após terminar, segurou a minha mão. — Por favor, nos salve…
Ele se preparava para sair, mas tive uma dúvida.
— Antes de ir, me diz… — Havia pensado em algo. — Como você usa a magia?
Ele pareceu confuso, mas logo deu sua resposta: — Só imagino o poder saindo das minhas mãos.
Assim que falou aquilo, saiu correndo, pegou a Sapphire nos braços e fugiu, como eu havia dito.
“Que merda… Acho que só tenho uma escolha agora”, pensei, levantando-me com dificuldades.
Juntei a lâmina do chão. Estava pronto para lutar.
Entrei em posição de combate novamente, mas desta vez tinha um plano mais ou menos concreto.
Com o pouco que vi, deu pra perceber que não adiantaria cortar, então achei uma forma de ganhar aquela luta.
Teria que queimar aquela coisa.