O Monarca do Céu - Capítulo 222
Valéria
Em algum lugar de Valéria, uma grande cidade foi erguida. Assim como o território de Ayla, ela era protegida por torres de vigia que cercavam grande parte daquele território. O ponto forte daquele lugar era o comércio, com estradas que conectavam todo sul de Valéria.
Samantha estava de braços cruzados encostada na parede de um corredor amplo com pessoas indo e vindo sem parar, a maioria servos. Ao seu lado havia uma grande porta de madeira que se abriu, e dela, saíram algumas pessoas, dentre elas estavam Leerstrom e Anton.
Nenhum dos dois havia mudado.
Anton vestia-se como um aristocrata com uma túnica de gala azulada, enquanto Leerstrom usava uma armadura de couro leve.
Acompanhado deles estava o irmão mais velho de Anton, o belo Aoth. Ele tinha longos cabelos loiros, olhos azuis como cristal e um rosto delicado. O belo rapaz trajava uma túnica escura, sapatos de couro e uma camisa avermelhada debaixo da túnica.
Aqueles três cumprimentaram outros aristocratas que seguiram seu caminho pelo corredor.
— Samantha? — indagou Leerstrom assustado. Fazia meses que ele não via a filha — Como… Onde você esteve?
— Posso conversar com vocês três? É importante.
…
De volta a sala de reunião, Samantha havia relatado tudo que aconteceu na última quinzena. Eles ficaram surpresos de ouvir o nome de Colin, e mais surpresos ainda em saber que ele estava unindo forças no Centro-Leste. Samantha comentou sobre a proposta de Colin para que juntassem forças e estabelecessem rotas de comércio entre o novo país de Colin e o povo do sul de Valéria.
— Isso é impossível. — disse Aoth sentado em sua poltrona acolchoada — Para estabelecer rotas seguras de comércio daqui até o Centro-Leste, teríamos que passar por um vasto território dominado não só pelos mercenários, mas também por um número gigantesco de monstros.
Leerstrom suspirou e assentiu.
— Aoth tem razão. Conseguimos nos reestabelecer só agora, sem falar que muitas pessoas reprovariam essa ideia, já que os carniceiros do centro-leste não têm uma boa reputação, mesmo que o líder deles seja o seu amigo. Desculpa, filha, mas isso é improvável de acontecer no momento.
Samantha ficou um pouco chateada, mas entendia o lado deles. Seria muito tempo e recurso gasto para tal ação. Sem contar que muitas pessoas seriam mortas no processo ao tentar se aventurar fora dos muros da cidade.
— Os Elfos Negros, a Diocese, e se eles resolvessem nos atacar hoje, vocês acham que conseguiríamos nos proteger? — ela indagou — Pai, na nossa cidade não há guerreiros para conter invasões grandes, eu estive no vilarejo do Colin, eu vi que ele tem soldados em abundância, são quase um ducado militar. Sem falar na mulher com quem ele vai se casar, na verdade, já devem estar casados. Pesquisei sobre ela, sei que ela é uma excelente estrategista. Eles estão a todo momento sendo atacados por demônios e mercenários, eles podem ser nossos aliados se algo acontecer conosco.
Os três se entreolharam.
Foi a vez de Anton falar.
— Você quer que os homens de Colin façam nossa proteção? Hehehe Conheço aquele bastardo, não se dá pra confiar nele. Sem ofensas, Samantha, mas você fez parte da guilda dele, é obvio que o defenderia. Mesmo depois de tudo que ele fez, você ainda continuou junto dele — Anton olhou para Leerstrom — Sinto muito, senhor, mas não dá pra confiar no julgamento da sua filha.
Samantha franziu o cenho.
— Tá bom, se a guilda dele não é confiável, então por que criou uma religião para a mulher com quem ele foi casado? Porque adorar essa mulher como divindade se está condenando o homem que ela seguia, pior, era a esposa dele!
Anton fez muxoxo e cerrou os dentes desviando o olhar.
— Isso é diferente… — Ele murmurou.
— Diferente como? Me explica, eu adoraria saber.
— Pessoal! — Aoth interveio — Se acalmem! — Ele olhou para Samantha — Não decidiremos nada por agora, mas analisaremos as opções. No momento isso é tudo que tenho a dizer. Mais alguma coisa que queira tratar, Samantha?
— Não. — Ela se ergueu e foi para a parta, saindo sem dizer nada.
Tinha algum tempo que não via suas irmãs e sua mãe parou de tratá-la com tanta frieza depois que ela começou a se impor. A residência de Samantha não era nada comparado a mansão que tinha em Ultan.
Suas irmãs, assim como sua mãe, tiveram que aprender a passar, cozinhar, lavar, já que mesmo Leerstrom fazendo parte do conselho, eles não tinham dinheiro para pagar servos. Ao menos o lote era grande.
No fundo, estava uma casa de pedra de dois andares com um belo jardim cuidado unicamente por sua mãe. Ela seguiu pelo passeio ladrilhado e parou frente a uma porta de madeira. Tirou os sapatos e os deixou sobre o tapete. Girou a maçaneta e encontrou uma residência exageradamente limpa.
— Samantha?! — Elizabeth, sua irmã mais nova, estava sentada no sofá que dava para a porta de entrada. Ela trajava um vestido amarelo comum. A garota lia um livro de receitas, mas assim que viu a irmã, o deixou de lado e partiu para abraçá-la — Por onde você andou? — Elizabeth se afastou após um abraço apertado — E o que é isso na sua bochecha, uma cicatriz?
Samantha afagou os cabelos da irmã. — Gostou? Ganhei enfrentando um Orc.
— Sério? — indagou Elizabeth empolgada. Ela sempre adorava ouvir as histórias sobre as aventuras da irmã.
— Samantha? — Charlotte apareceu no fundo, de cabelo preso e usando um avental — Pelos Deuses, você está viva!
As três se abraçaram.
— Não sou tão fácil de matar hehe.
— Humpf! — Ophelia estava no fundo, vendo a cena de cara empurrada e braços cruzados — Olha só quem voltou — Ela se aproximou de Samantha a encarando de cima a baixo naquelas vestes escuras bem justas a seu corpo — Pelo visto andou fazendo algo de útil. Ganhou até uma cicatriz no rosto, agora sim nenhum homem vai se interessar por você.
— Oi para você também, mãe. Estou exausta, então dá pra me deixar em paz?
Ophelia franziu o cenho. — Essa casa é minha e eu sou sua mãe, não pode me dizer o que fazer, entendeu, mocinha?
Samantha revirou os olhos e a ignorou subindo as escadas. As outras duas a seguiram.
— Garota atrevida! — resmungou Ophelia.
Assim que chegou em seu quarto se jogou na cama. Charlote a seguiu até o quarto e abriu as janelas deixando a brisa entrar, após isso se sentou na cama ao lado da irmã.
— Então, conta para a gente, como foi?
— Cansativo, mas foi bom. — Samantha se sentou na cama — Sabiam que matei um dragão?
As duas arregalaram os olhos.
— Um dragão? — indagaram em simultâneo. Samantha assentiu com a cabeça.
— Ele era azulado, mas não era tão grande. — Ela gesticulou como se segurasse um arco — Minhas flechas foram o suficiente para acabar com ele.
Por ser mais nova, Elizabeth via Samantha como alguém invencível, e a admirava bastante. Ela ouvia histórias da guilda de Colin quando morava em Ultan, histórias que sua mãe tentava abafar a todo custo, mas ela sempre dava um jeito de ficar a par de tudo envolvendo a irmã.
— Você enfrentou Orcs, dragão, parecia estar se divertindo bastante, conheceu… alguém? — Indagou Charlotte empolgada — Digo… Deve ter conhecido muitas pessoas, né?
Samantha abriu um sorriso de canto e assentiu.
— Reencontrei um amigo.
— Quem? — perguntaram as duas ao mesmo tempo.
— Vocês se lembram do Colin? Ele está comandando um ducado no Centro-Leste, o chamam de carniceiros do centro-leste. O nome é assustador, mas eles até que são legais.
Charlotte ficou bastante surpresa com a revelação.
— Senhor Colin está vivo? E-Ele veio com você?
— Não — Ela abanou as mãos — Ele tem um pessoal para cuidar e a essa altura deve ter se casado com uma mulher para formar alianças e juntar territórios. — Ela abriu um sorriso bobo — Colin ficou bem importante agora.
Charlotte se virou para Elizabeth.
— Pode pegar um copo d’água para Samantha?
— O quê? Por que eu?
— Porque você é a mais nova.
Elizabeth fez beicinho.
— Isso não é justo!
— A vida não é justa, agora anda logo.
Elizabeth deixou o quarto emburrada, batendo os pés.
— E então — Charlotte abaixou a voz — Você e o senhor Colin…
Samantha ergueu uma das sobrancelhas.
— O quê?
— Você sabe…
— N-Não! A gente só conversou, bebeu um pouco, mas nada, além disso. Ele é casado… Não é como se eu fosse ficar interessada por um homem casado.
Charlotte se aproximou da irmã.
— E se não fosse? — sussurrou.
Samantha franziu os lábios e desviou o olhar, ficando vermelha.
— Nem assim…
Elizabeth retornou com o copo d’água.
— Mamãe disse que o almoço está pronto.
Samantha bebeu toda água e deu um suspiro.
— Não estou com fome, só morta de sono. Dormirei por dois dias seguidos.