O Monarca do Céu - Capítulo 223
Viagem
Sentindo o rigoroso inverno, Colin e Leona cavalgaram pelas terras que haviam conquistado. Mesmo naquelas condições, era estranho ver tantas pessoas trabalhando para fortificar as estradas, abrir novas áreas para a construção de novas residências e dando o máximo para manter os habitantes das vilas do novo país aquecidos e as residências abastecidas no inverno.
Muitos os cumprimentavam, outros apenas davam tchauzinho. Leona estava atrás de Colin abraçada a ele. A pandoriana dormia maior parte do tempo, às vezes abria os olhos, olhava ao redor e apoiava a cabeça nas costas de Colin, dormindo novamente.
Cruzaram a fronteira de seu território e seguiram para oeste, contornando o território hostil e indo rumo ao território da antiga capital de Ultan.
Descansaram quando a noite os alcançou e, antes do sol nascer, já se apressaram para seguir viagem.
Colin queria visitar um lugar em específico.
Encontraram alguns carniçais e matilhas de cães selvagens que os seguiam por parte do caminho, mas não encontraram nenhum ser senciente, nem mesmo humanos que eram a espécie predominante no continente.
Enfim, Colin chegou onde queria.
Ainda em cima do cavalo, ele avistou o lugar que aparentava estar deserto. As casas de madeira estavam abertas e completamente saqueadas. Colin continuou cavalgando pelo lugar coberto por neve até encontrar uma capela que estava sem as portas.
— Leona, acorda.
Ela abriu os olhos lentamente, olhou ao redor e bocejou.
— Mestre… — disse com voz sonolenta — Aonde a gente tá?
— A vila da estrada. Aquele velho errante que nos levou pro Norte devia estar aqui.
Leona coçou o olho.
— Só vejo neve e escuto o som de vento.
Cobertos por capa preta, roupas grossas e cachecol, eles continuaram cavalgando pela vila. Colin avistou o pequeno riacho ao longe e virou as rédeas, indo na direção da catedral.
— Ele deve ter ido embora com todos os habitantes quando Ultan caiu, afinal, ele é um errante, consegue usar portais.
Leona continuou no cavalo enquanto Colin desceu dele. Ajeitou o cachecol, tapando melhor seu nariz e subiu as escadas da catedral. Ela estava completamente vazia. Tudo de valor havia sido saqueado.
Aquele lugar se tornou um grande salão frio, vazio e empoeirado.
Olhou para o chão e viu marcas de pegadas na densa poeira e na fina neve que cobria o soalho como carpete.
“Parecem recentes”.
Abaixou o cachecol com o indicador, deixando o nariz a mostra. Fungou o ar duas vezes e sentiu o cheiro de algo queimando. Virou a cabeça para o lado e uma flecha com a ponta em chamas foi em sua direção.
Woosh!
Esquivou inclinando a cabeça para o lado, deixando a flecha passar direto. De dentro das casas despontaram vários mercenários. Seguravam setouras, correntes, espadas, bestas e adagas. Todos vestiam roupa de couro grosso e exibiam um sorriso maligno.
— Parece que é nosso dia de sorte! — disse um homem alto com dente de ouro — Uma garota, um idiota e um cavalo. Matem apenas o grandão!
Leona continuava esfregando o olho desinteressada e Colin continuava com a mesma expressão indiferente de sempre.
— O que aconteceu com o povo da vila? — Perguntou Colin descendo as escadas da catedral.
— Por que você quer saber? Deveria estar preocupado com você, não com eles. — O mercenário rodou a corrente e jogou no braço de Colin — Sou um usuário de magia, se eu fosse você não resistiria hehehe, prometo que te darei uma morte rápida!
Colin notou que a corrente também estava entrelaçada no braço daquele homem. O errante deu um repelão na corrente, puxando o braço do mercenário junto.
Crash!
Os outros arregalaram os olhos enquanto viram seu companheiro sem um dos braços. O mercenário não entendeu o que havia acontecido, até que sentiu uma dor lacerante no braço arrancado.
Ele berrou e caiu no chão tentando parar o sangramento.
— A-Acabem com ele! — berrou outro mercenário.
Os homens maiores avançaram com o pânico tomando conta de seus corpos. Ainda com a corrente nos braços, Colin a girou, atingindo a cabeça de um dos homens que se aproximava dele, a destruindo por completo.
Os mercenários continuaram avançando e o carniceiro continuou girando as correntes, rebatendo as flechas que zuniam em sua direção.
Como se usasse um chicote, Colin atingiu todos os mercenários, matando alguns e desmembrando outros.
— F-Fuja-
Crash!
Colin não deixou que ele terminasse a frase, destruindo seu crânio com a corrente. Tudo durou menos de alguns segundos, e Colin mal havia saído do lugar. Tirou a corrente de seu braço e caminhou para perto de um mercenário que havia perdido somente uma mão.
— O que aconteceu com o povo do vilarejo?
— E-Eu não sei! Q-Quando chegamos ele já estava vazio. A-A gente apenas se escondia aqui e roubava quem passasse por p-perto, m-me poupe senhor juro que e-
Crash!
Colin transformou Claymore em uma espada e o decapitou. Após bocejar novamente, Leona deu dois tapinhas no assento do cavalo.
— Mestre, anda logo, não tem nada nesse lugar.
— Fica aqui, só vou dar uma olhada.
Ela revirou os olhos e tombou o corpo para frente, deitando em cima do cavalo.
[…]
De fato, não havia nada naquele lugar. Colin encontrou comida velha, algumas roupas esfarrapadas e nada, além disso. Mesmo com mercenários se escondendo ali, o vilarejo nada tinha de interessante.
Seguiram viajem por mais meio-dia até avistar, de um morro, as ruínas da grande capital de Ultan. Parte daquele lugar estava murado e era possível ver alguns focos de fumaça.
Apenas o centro da capital, incluindo as ruínas da universidade, haviam sido muradas, o restante continuava exposto aos perigos do lado de fora. Colin não sabia se eram inimigos hostis ou pessoas que haviam se juntado para sobreviver. Não importava que tipo de pessoa eram, ele resolveu não se aproximar, sua prioridade era chegar o mais rápido possível até onde Eilella e os Elfos da Floresta estavam refugiados.
— Vamos contornar a antiga capital.
— Sério? — Indagou Leona com certa indignação — Já está quase anoitecendo e não achamos nenhum lugar seguro para pernoitar. A gente devia ir reto, cruzar as ruínas de Ultan e lutar com qualquer um que queira lutar com a gente…
— Isso iria nos atrasar. Basta olhar para a gente, não somos nem um pouco convidativos.
Leona cruzou os braços e fez beicinho.
— Ótimo… mais tédio.
— Se está tão entediada, devia ter feito algo lá atrás.
— Com gente fraca? Isso tão tem graça.
Colin abriu um sorriso de canto e agitou as rédeas do cavalo.
[…]
Contornavam o que sobrou de Ultan em uma distância segura para não serem surpreendidos por ninguém.
O breu da noite se fazia absoluto. Eles paravam de cavalgar sempre que a lua se escondia atrás das nuvens, mas isso só atrasava ainda mais a viagem.
Enquanto passavam pelo que um dia foi a entrada da grande Ultan, agora resumida a entulhos cobertos por neve, Leona tapou o nariz e grunhiu, despertando de seu sono.
— Minha nossa, que cheiro horrível!
Colin fungou o ar e também sentiu. Era o cheiro de carne pútrida. Olhou para os dois lados e viu apenas ruínas e neve, mas seus ouvidos captaram o som de grunhidos e seres que pareciam balbuciar palavras no meio da floresta de galhos secos e retorcidos que os cercava.
O cavalo se assustou e começou a ficar agitado.
Leona abaixou as orelhas e abraçou o seu mestre.
Seu corpo todo começou a tremer.
— O que foi?
A mana que ela sentiu, aquela sensação que uma vez já foi gravada em seus ossos, ela se lembrou de uma coisa, algo que não havia como esquecer.
— M-Mestre… — Sua voz estava engrolada — I-Isso é mana do abismo!
“Mana do abismo? Aqui?”
Os galhos estalaram, e uma brisa os açoitou, fazem as árvores rangerem. Do fundo da floresta imersa no breu, despontaram zumbis, trolls, goblins, carniçais e demônios de nível inferior. Todos eles tinham olhos esverdeados e pareciam em transe, como se estivessem sendo controlados.
“É como daquela vez no Norte. São cultistas novamente? Há outro portal do abismo aberto aqui?”
Colin apoiou a mão no cabo da espada em sua bainha de costas. Ele não poderia se esquecer da vez que enfrentou um oponente bem mais forte que ele. Aquelas memórias ainda o perturbavam.
— Leona! Se recomponha! — Colin desceu do cavalo e retirou sua espada da bainha — Essas criaturas são fracas, deve ter alguém as controlando! — Ele abriu um sorriso de canto — Não era você quem estava reclamando do tédio? Essa é uma ótima oportunidade de alongar o corpo!
— C-Certo!
Assim que Leona desceu do cavalo, o animal trotou para longe. A lâmina de Colin começou a levitar ao seu lado e avançou em direção as criaturas. Rodopiando como as hélices de um helicóptero, Gram, a lâmina, retalhou centenas de criaturas, espalhando sangue negro naquele campo de batalha decadente.
Leona ficou de quatro e começou a rosnar como um cão. Suas unhas cresceram e suas três caudas começaram a serpentear sem parar. Ela avançou retalhando sem esforço aquela pele já pútrida dos inimigos.
Com Claymore em mãos, Colin somente a balançava de um lado para o outro, fatiando seus inimigos como manteiga. Nenhum deles apresentava ser um oponente habilidoso. Eram numerosos, mas apenas isto.
Crash!
Uma flecha passou por Colin e cravou na testa de um goblin. A criatura começou a pegar fogo, um fogo esverdeado, e em instantes se transformou em cinzas.
Crash! Crash! Crash!
Mais flechas começaram a ser disparadas, iluminando a escuridão com todos os corpos que queimavam. Da direção de Ultan, pessoas se vestindo como mercenários despontaram enquanto estavam montadas em cavalos.
Em grunhidos de pânico, as criaturas começaram a se afastar, sumindo na floresta seca. Aquele grupo não devia ter mais que quinze pessoas, todas mal-encaradas e de feições grosseiras.
Um dos homens, careca com parte da cabeça coberta por tatuagem tribal e de porte robusto, puxava o cavalo de Colin pelas rédeas.
— Presumo que isso seja seu. — Disse com cenho franzido.
O carniceiro pegou a lâmina Gram e a devolveu a bainha. Transformou Claymore em um anel e Leona ficou ao lado dele, limpando o sangue negro do rosto enquanto seu cenho estava franzido.
— Não devia andar pelas ruínas de Ultan de maneira tão leviana. Esse lugar costuma ser perigoso a noite. — Um homem de cabelo escuro, armadura de couro coberta por uma capa, olhos azuis e barba rala desceu do cavalo — Eu sou Leyvell, líder da ordem dos caçadores de espectros, e esses são os meus rapazes.
— Caçadores de espectros? — Colin pegou seu cavalo pelo cabresto — Nunca ouvi falar.
— Pois é, somos uma ordem nova. E você, quem é?
Colin cruzou olhares com Leona.
— Zanian, e essa é minha pandoriana, Luna.
Leyvell fez uma reverência.
— É uma honra conhecê-los. Por que não entram? Ficar aqui fora não é nem um pouco seguro.
Desconfiado, Colin olhou para cada um deles.
Eram todos homens comuns, para o carniceiro, mas para sua pandoriana que sentia mana, dois chamavam atenção além de Leyvell. Um deles era o careca que entregou as rédeas, o outro estava coberto por uma capa mais ao fundo.
— Ei, Zanian, não precisa se preocupar. Não vamos te levar para uma emboscada nem nada do tipo. Estamos trabalhando para o líder do que restou de Ultan no momento, então temos sinal verde para fazermos tudo que quisermos, e estou convidando vocês para se juntarem a nós, ao menos por hoje. Uma recompensa por fazerem metade do nosso trabalho.
Colin continuou em silêncio e Leyvell se aproximou com as mãos relaxadas sobre seu cinto.
— Se quiser, pode ficar aqui fora, mas continuará tendo problemas com aquelas criaturas a noite toda. Descanse por hoje e parta ao amanhecer. — Ele se virou de costas, subindo em seu cavalo — Vamos logo.
Dando de ombros, Colin subiu no cavalo e deu as mãos para Leona, que subiu atrás.
— O líder — sussurrou Leona em seu ouvido — O baixinho de capa no fundo, e o careca tatuado, todos esses caçadores tem uma mana considerável, mas esses três destoam dos demais, tomo cuidado com esses.
Colin assentiu com a cabeça — Entendi.