O Monarca do Céu - Capítulo 249
Colin dormiu poucas horas, o que já era suficiente para alguém como ele. Vestiu sua camisa escura de manga longa, e também sapatos de calça da mesma cor. Deu uma olhada em Ayla dormindo serena antes de ele deixar o quarto.
Ajeitou o cabelo e seguiu pelo corredor com as mãos enfiadas nos bolsos. Seu corpo levemente curvado e seu semblante neutro davam a ele um ar intimidador, apesar de que os servos e empregados já estavam se acostumando com seu rei.
Indagou a um dos servos onde estavam as crianças que chegaram ontem, e ele foi auxiliado a seguir para o corredor e descer as escadas em direção ao jardim.
O sol estava fraco naquela manhã, e parte do jardim coberto por uma neve fina, mas aquilo não foi o suficiente para afastar os pequenos.
Bem agasalhados, eles estavam se divertindo, vislumbrados com aquela infinidade de plantas e flores. Gerrard e o pequeno Bill estavam sentados em um banco de madeira, foliando um livro velho enquanto apontavam para as gravuras desenhadas a mão.
Melyssa, Nailah e Brey estavam paradas em frente a uma planta carnívora de boca aberta. Elas queriam ver o momento exato em que algum inseto adentrasse ali e virasse almoço.
Por último, Tobi e Meg estavam enfrentando um ao outro com adagas de madeira. O primeiro a ver Colin foi Tobi.
— Senhor Colin?
As meninas encarando a planta foram as primeiras a se virarem e correram até ele. Nailah ainda estava bem tímida, ficando para trás, as vendo de longe.
Colin ficou em cócoras e abriu os braços, abraçando Brey e Melyssa ao mesmo tempo.
— E então, se divertindo na casa nova? — ele as colocou no chão.
— Papai, olha! — Brey abriu um sorriso, mostrando que mais dentes seus haviam caído — Tia Lina disse que ele vai crescer rápido e que eu poderei voltar a comer maçã!
Colin afagou os cabelos dela.
— Pai! — ele olhou para Melyssa que retirou os óculos redondos — Olha, é novo!
Ele colocou os óculos e enxergou tudo embaçado. Os retirou e colocou em Melyssa novamente. A pequena abriu a mão pneumática que Colin havia a dado de presente. Estava mudada, maior e mais sofisticada.
— Tia Lina conseguiu com que um ferreiro consertasse pra mim, ela disse que eu tinha crescido, então minha mão de ferro também tinha que crescer, hihi! Tia Lina também disse que não posso fazer muita força, se não posso machucar alguém, hihi!
Colin ergueu uma das sobrancelhas e cerrou o punho frente a Melyssa.
— Ah, é? Bate aqui então, quero ver.
Melyssa chocou seu punho pneumático com o de Colin. O errante fez uma careta e sacudiu a mão enquanto a pequena não parava de sorrir.
— É, cuidado com essa mão, mais um pouco eu teria me machucado.
— Mentiroso! — disse Melyssa ainda sorrindo. — Tia Lina disse que o senhor consegue quebrar uma rocha desse tamanho se quiser! — ela abriu os braços, imaginando uma enorme rocha.
Colin afagou o cabelo dela.
— Tia Lina está exagerando — ele ergueu-se. — Podem ir se divertir, só não façam muita bagunça.
Ambas assentiram com um sorriso e correram até Nailah que ficou ao longe as observando.
— E vocês — disse a Bill e Gerrard. — O que estão lendo?
— Ainda não sabemos ler… — disse o envergonhado Gerrard.
Colin se sentou no meio dos dois e pegou o livro, lendo o seu título.
— Caliman, segredos e mistérios — O título foi o suficiente para que ambos achassem aquilo ainda mais incrível. — Posso ler para vocês, querem? — Com os olhos brilhando, eles assentiram. — Certo, mas não agora, que tal me procurarem mais tarde?
Ele entregou o livro aos garotos e deu uma piscadela, indo até Meg e Tobi, que ficaram sérios ao vê-lo se aproximar. Colin olhou para os dois e enfiou as mãos nos bolsos.
— Estão treinando? Observei os movimentos de vocês, estão ótimos, apesar de que não sou lá um especialista — ele abriu um sorriso. — Irei ajeitar algumas coisas, mas querem treinar comigo?
Eles cruzaram olhares.
Ambos engoliram seco, pois, pelas histórias que ouviram, sabiam que Colin era muito forte, mas eles também viram como uma oportunidade já que seu pai adotivo tinha uma grande reputação.
— Queremos! — disseram os dois em uníssono.
Colin tirou a mão do bolso, afagando o cabelo de ambos.
— Eu queria ficar, mas tem algumas coisas que tenho que resolver — ele tirou a mão da cabeça deles, as devolvendo ao bolso. — Estou orgulhoso de vocês.
Nenhum deles soube como reagir com o elogio, então olharam para o lado enquanto suas bochechas coraram. Colin olhou para trás e viu Ayla ao longe, observando-o de trás de uma pilastra.
— Bom, crianças, tenho que ir, se comportem.
— Tchau, papai! — disseram Brey e Melyssa dando tchauzinho.
Com as mãos nos bolsos, ele foi até Ayla, que estava vestida toda de preto. Sua blusa de lã era bem justa ao seu corpo, assim como sua calça. Havia um cachecol enrolado em seu pescoço e por cima da roupa usava um casaco que ia até os joelhos.
Ela estava corada enquanto o encarava se aproximar.
— Algo errado? — ele perguntou.
— Não… eu só pensei em uma coisa…
Ele ficou ao lado dela, observando as crianças.
— O quê?
— É coisa boba.
— Diz logo.
Ainda corada, Ayla levantou o cachecol na altura dos lábios e desviou o olhar.
— Imaginei a gente longe de todo caos que é cuidar de um país, então a gente moraria bem distante das pessoas, eu, você, as crianças e nossos filhos… — Colin a encarava de soslaio. — É estranho pensar nessas coisas, ainda mais porque alguma parte de mim deseja uma vida mais simples, sabe? — Ayla abanou as mãos. — E-Eu sei que isso é impossível agora, até porque um monte de pessoas depende da gente.
Colin suspirou, tirando uma das mãos dos bolsos e coçando a nuca.
— E toda aquela história de uma dinastia que dure mil anos?
— Eu sei… — ela recuperou a postura. — Enfim, vamos ver aquela mulher irritante — Ayla cruzou os braços e franziu o cenho. — Ela está com a garota que Ibras libertou.
[…]
Os regentes de Runyra seguiram pelas ruas da capital enquanto eram cumprimentados pela população com apertos de mãos e até mesmo abraços. Alguns pais pediam para os regentes segurarem seus filhos, para eles, aquilo os daria sorte.
Passado o assédio, eles seguiram para uma mansão de três andares. A mansão de arquitetura gótica de três andares se erguia imponente no final da rua. As paredes de pedra escura eram repletas de detalhes ornamentais, incluindo janelas altas e estreitas com vitrais coloridos e gárgulas ameaçadoras que adornavam os telhados.
O primeiro andar da mansão apresentava uma entrada majestosa, com uma grande porta de madeira esculpida que se abria para uma antessala espaçosa, com paredes de pedra e piso de mármore.
Os corredores do primeiro andar levavam a uma série de salas de estar, todas decoradas com móveis antigos e tapeçarias, e iluminadas por candelabros pendurados no teto alto.
Valagorn estava sentado em sua poltrona acolchoada lendo algum livro. Ele o fechou, assim que viu aqueles dois se aproximarem.
— Então você está vivo e inteiro, isso é bom — ele se ergueu, jogando o livro no sofá. — Estávamos ansiosos por sua vinda. Senhora Ayla já deve ter deixado você ciente das notícias.
Colin assentiu.
— Ela me explicou sobre Ibras e o que aconteceu com ele. A garota, ela…
— Vou chamá-la, só um instante — Valagorn retirou-se para os fundos.
— Não está ansioso? — indagou Ayla. — Finalmente irá recuperar sua mana. No seu nível atual, você já é considerado uma ameaça, caso consiga gerar mana novamente, então nossos inimigos o temerão ainda mais.
Com as mãos nos bolsos, ele deu de ombros.
— Sendo sincero, preferia continuar sem mana. Seria melhor para aproveitar uma batalha, mas sem ela seria impossível vencer meu pai ou Drez’gan.
— Entendi…
Valagorn retornou com Jane e Heilee atrás dele. Jane usava calças de couro, botas e uma camisa de lã bem justa ao corpo, protegendo-se do frio glacial. Heilee usava um vestido escuro que ia até os joelhos, calça branca e botas escuras. A garota havia tomado um banho e prendeu o seu cabelo em um rabo de cavalo. A súcubos abriu um sorriso sedutor e correu saltitante até o errante, se jogando em seus braços.
— Colinzinho! Nossa, já faz quanto tempo? — ela olhou para o lado, vendo Ayla com o semblante sisudo. — Oi, bonitinha, nem notei que você estava aí — ela se afastou de Colin, mas manteve o olhar sedutor. — Olha só como me preocupo com você, saí em uma aventura procurando um presentinho, e aqui está ele — ela apoiou o indicador frente aos lábios e deu uma piscadela. — Espero ser devidamente recompensada.
Ayla fez muxoxo, ela sabia que as provocações de Jane eram para atingi-la.
— Heilee, querida! — Jane apontou com o queixo para Colin. — Esse é o homem para quem Ibras trabalhava e também é o nosso “mestre”.
A garota o encarou nos olhos e sentiu medo, depois se lembrou que Ibras estava espionando Alexander por mando dele, e seu medo transformou-se em raiva.
— O-O senhor Ibras me contou que você ameaçou ferir a família dele! — Apesar de furiosa, ela teve que criar coragem para dizer algo naquele tom para um homem tão assustador.
Colin continuava inexpressivo.
— Sim, eu disse, e é por causa disso que você está viva, não é?
Heilee franziu os lábios e desviou o olhar.
— Me deem licença, quero ficar a sós com ela.
Eles cruzaram olhares e um suor seco escorreu pela têmpora de Heilee. Sem dizer mais nada, os outros se afastaram, indo para os fundos, deixando aqueles dois sozinhos.
— Sinto muito pelo que aconteceu com Ibras, eu não o conhecia tão bem, mas se ele deu a vida para salvar você, então ele era um bom homem — ele deu um passo à frente. — Se quer colocar a culpa de ele estar morto em mim, vá em frente, não ligo, mas não seja hipócrita e coloque a culpa de você estar bem em mim também — ele chegou mais perto. — Quem ordenou que Ibras vigiasse Alexander? Acha que Valagorn e Jane servem a quem? E esse reino, quem acha que é o rei dele?
Colin estava bem próximo, e Heilee franziu os lábios, desviando o olhar. Ela ainda estava com medo.
— E-Eu não quis… afrontar o senhor…
— Não foi o que me pareceu. Se Ibras está morto, a culpa é sua — ela o encarou nos olhos, incrédula com aquela acusação. — Você é a personificação dos poderes da grande árvore, a coisa mais poderosa da existência, e não conseguiu salvá-lo porque é fraca.
— E-Eu… — ela deu um passo atrás. — I-Isso não é verdade!
Colin segurou o braço dela.
— Ayla, Jane, Valagorn, eles obedecem a mim, acha que eles viriam ajudá-la se eu quisesse te machucar?
Heilee tentava se soltar batendo na mão de Colin.
— Me solta!
Colin a soltou e ela caiu de bunda no chão, arrastando-se para trás até encostar na parede, encarando Colin com olhos cheios de pavor.
— Não sou seu inimigo, nem fraco como Ibras — ele ficou em cócoras frente a ela. — Ibras tem uma esposa, filhos, cuidarei deles agora, mas não sei por quanto tempo. Você andou pela cidade, não andou? Você foi alimentada, foi cuidada, deram até mesmo roupas para você. Sentiu aromas diferentes, viu pessoas em suas distintas expressões, viu crianças, comerciantes, e todo tipo de gente. Todos eles são minha responsabilidade, mas isso está sendo ameaçado — ele ergueu-se. — Preciso da sua ajuda para manter tudo isso intacto — Colin estendeu a mão para ela. — Ninguém mais vai machucá-la, e você terá poder para proteger não só a família de Ibras, mas também aqueles que deram a você comida, alimento, roupas. Não quer proteger isso?
Heilee franziu os lábios e desviou o olhar.
Mesmo não gostando do homem na sua frente, ela sabia que ele tinha razão. Durante sua curta estadia na cidade, foi a primeira vez que comeu coisas gostosas, tomou um banho de espumas, usou roupas bonitas e outras pessoas além de Ibras trataram-na tão bem que ela ficava sem jeito para agradecê-los.
— Eu… não quero que isso acabe…
Colin ajudou-a a se levantar.
A garota ainda não o encarava nos olhos.
— Não precisa se preocupar, não deixarei que acabe.
— Que bom que acabou bem! — disse Jane no fundo do corredor. Ela continuava saltitante. — Que tal fazermos o contrato?
Colin e Heilee cruzaram olhares.
— Por mim tudo bem — disse ele. — E você? Não vou obrigá-la a nada.
— Acho que tudo bem também…
— Perfeito! — Jane se aproximou dos dois. — Deem as mãos, farei os preparativos do contrato!
Cruzaram olhares novamente e deram as mãos. Jane apoiou as mãos por cima da mão deles, aplicando magia.
— Vamos lá, Colinzinho, diga os seus termos.
— Certo, os termos serão iguais aos que usei com Jane e Valagorn. O ser invocado estará proibido de mentir ou omitir informações ao invocador. Caso contrário ele sentirá dor extrema. Segundo, quero submissão total do ser invocado. Por último, o invocador poderá retirar as duas clausulas quando bem entender e retorná-las quando bem entender. Porém, durante o período em que o invocador retirar as cláusulas, o ser invocado será impossibilitado de ferir o invocador ou quaisquer seres que tenham vínculo com ele.
Com o olhar sedutor, Jane encarou Heilee.
— Basta dizer que aceita, fofinha.
Heilee engoliu o seco — E-Eu aceito.
— Ótimo! Selem o acordo.
Ainda segurando sua mão, Colin levou as mãos de Heilee até seus lábios, beijando as costas da mão dela.
Ela ficou sem reação.
— Sua vez, fofinha, beije as costas da mão de Colin.
Engolindo o seco, Heilee cruzou olhares com todos os presentes. Aguardou alguns segundos e beijou as costas da mão de Colin.
O carniceiro sentiu seu antebraço formigar, ganhando a tatuagem de raízes trançadas entorno dele.
Sentiu seu interior aquecido, e soltou a mão de Heilee. Após alguns segundos, sua cabeça começou a doer e ele afastou-se um passo, cerrando os olhos.
Respirou fundo e abriu os olhos devagar.
Concentrou-se e focou mana em seus olhos. Sentia mana percorrer suas veias e ir direto para suas córneas. Enxergou o rastro de mana de todos os seus companheiros. Jane e Valagorn tinham rastros de manas que queimavam como uma pira, já a de Ayla e Heilee tinham rastros de manas mais calmos, a mana fluía por elas como um rio.
Ele nunca havia conseguido usar a análise daquela forma.
Olhou para as próprias mãos e abriu um sorriso de canto.
— Finalmente, depois de quase um ano, é hora de conferir o meu status!