O Monarca do Céu - Capítulo 253
Runas.
Sentindo uma dor aguda no abdômen, Brighid despertou.
Ela estava confusa, desorientada e com o rosto sujo de terra. Apoiou a mão no abdômen e olhou ao redor, vendo árvores carbonizadas, escombros e sentindo um cheio quase insuportável de queimado.
Foi então que ela se lembrou do que havia acontecido na noite passada.
Sem seus filhos, sem o marido e agora sem um lar.
Ela queria ficar ali e lamentar, chorar ainda mais pelo que aconteceu, mas não era hora para isso.
À medida que ela tentava se levantar, sentia tonturas, mas não demorou para que ficasse de pé.
Seu longo cabelo escuro estava bagunçado, e seu vestido branco manchado de sangue no abdômen. Com o corpo curvado e suando em demasia, Brighid olhou para um morro e para lá seguiu a passos vagarosos, tomando cuidado para que não se estatelasse no chão.
A dor em seu abdômen se intensificou à medida que ela se movia, deixando-a fraca e exausta, no entanto, ela sabia que precisava continuar.
Alcançou o morro depois de quase meia hora caminhando e finalmente encontrou o que procurava.
Seu cristal que deixou absorvendo mana da natureza brilhava em um brilho intenso.
“Então funcionou?”
Caminhou até a pedra e agachou com cuidado, pegando-a do pequeno altar que estava.
“Calma, Brighid, isso vai funcionar, tem que ser aqui e agora!”
Fazia algum tempo que ela estava criando algum objeto capaz de absorver mana como Claymore, e no anel de casamento que Colin a presentou, ela marcou as mesmas runas que percorriam todo cristal.
Seu objetivo era fazer a mana ser transferida para o anel e assim curar o ferimento em seu abdômen.
“Se concentra!”
Ela concentrou sua atenção no anel, visualizando as inscrições brilhando em seu dedo.
Sentiu uma sensação de calor e energia fluindo da pedra para o anel e do anel para o seu corpo. A mana começou a preencher suas células, curando seus ferimentos e aumentando sua força e vitalidade.
Brighid respirou profundamente, sentindo a energia da mana em cada inspiração, permitindo que ela se sentisse mais forte, mais confortável, uma sensação que se espalhava por seu corpo, como se estivesse sendo envolvida em um abraço reconfortante.
Ela sentiu suas feridas cicatrizando rapidamente, enquanto sua energia era restaurada.
Mesmo passado alguns minutos, Brighid continuava a se concentrar em sua respiração, permitindo que a energia da mana fluísse livremente pelo seu corpo.
Scrash!
A pedra de runa estilhaçou-se como vidro, mas ela já havia cumprido o seu papel.
Brighid levantou sem nenhuma dor.
Olhou para seu anel de casamento e ergueu o punho direito, fechando os olhos e respirando profundamente.
Concentrando-se, ela manifestou parte da mana que absorveu na mão direita e lentamente a abriu.
Uma luz esverdeada brilhante surgiu, aumentando em intensidade até se tornar uma luz ofuscante.
Quando a luz finalmente se dissipou, uma Katana reluzente e imponente estava em sua mão.
Era a mesma Katana que ela havia pego de Le Jun, a caçadora de Monarcas quando a derrotou.
A lâmina da katana tinha uma curvatura suave e elegante, com uma largura uniforme até o seu ponto mais estreito, onde se afilava para uma ponta afiada.
Ela era feita de um metal prateado reluzente que parecia capturar a luz e refleti-la em todas as direções.
A guarda da katana era circular e ornada com intricados desenhos dourados que pareciam brilhar em contraste com o metal prateado da lâmina.
A empunhadura era envolta em um couro preto com fios dourados que se entrelaçavam em padrões elaborados, proporcionando uma aderência firme e, ao mesmo tempo, confortável.
— Certo, agora preciso conferir se sobrou alguém nessa ilha.
Com a lâmina em mãos, ela desceu correndo o morro, passou por sua casa e parou, lembrando que o corpo de Ellie ainda estava lá dentro.
“Sinto muito…”
Descalça, com o cabelo atrapalhado e o vestido manchado de sangue, Brighid disparou em direção a floresta de carvão.
[…]
À medida que corria, Brighid começou a perceber que estava sozinha na ilha, cercada pelo caos e a destruição.
Não havia sinal de vida mística ou animal.
Ouvia-se apenas o som do vento soprando pelas ruínas e o som de sua respiração ofegante.
O vilarejo onde estava sua mãe residia estava vazio e destruído, mas não havia um único corpo.
“Elas devem ter se escondido, mas não tenho tempo para procurar pela ilha toda, isso levará quase três dias.”
Com a espada, Brighid começou a marcar as paredes de uma casa próxima, avisando sua mãe ou a quem encontrasse que ela estava viva e bem.
Era hora de voltar para a casa destruída.
Enquanto voltava, só conseguia pensar nos seus filhos e em como faria Coen pagar por isso, mas suas crianças eram prioridades.
O continente era enorme e elas poderiam estar em qualquer lugar, se tudo que Coen disse for verdade, então Colin havia se tornado rei.
Ela não tinha ideia de que Colin encontraria, mas tinha certeza que, independente de qual Colin fosse, ela conseguiria colocar algum juízo na cabeça dele.
Entrou pela casa através do buraco na parede e foi direto para o guarda-roupa. Apoiou a katana na cama e imediatamente despiu-se.
Trajou uma simples camisa branca de botão, uma calça escura bem justa a suas belas pernas e após limpar os pés, calçou um par de botas escuras de cano alto que iam até os joelhos e combinavam perfeitamente com a calça.
As botas eram ajustadas e possuíam um salto alto, o que ajudava a alongar sua silhueta.
Por último, pegou um casaco longo e justo que atingia seus joelhos. O casaco era preto com um colarinho alto e mangas compridas que se ajustavam firmemente aos braços dela.
Apesar do seu cabelo estar um caos, ela o trançou habilmente.
A trança começava no topo da cabeça e descia por seu ombro, perfeitamente alinhada com as linhas do casaco preto ajustado que ela vestia.
Jogando suas roupas no chão, ela pegou todas aquelas feitas de couro.
Em seguida, as cortou em pedaços mais longos e finos, fazendo assim, tiras de couro.
Com as tiras de couro em mãos, Brighid começou a trançá-las em torno do cabo da katana.
Primeiro, ela envolveu uma tira de couro ao redor do cabo na base e, em seguida, começou a trançar as outras tiras de couro ao redor do primeiro pedaço de couro.
Brighid apertava firmemente cada volta do couro ao redor do cabo, puxando as tiras com firmeza e mantendo uma tensão uniforme em toda a alça. A cada volta, ela empurrava as tiras para baixo com os dedos para garantir que ficassem justas e firmes no cabo.
Depois de todas as tiras de couro estarem trançadas ao redor do cabo, Brighid amarrou as pontas das tiras de couro firmemente no final da alça, passando a alça por seu ombro.
Pegou uma mochila feita de couro de vaca e colocou parte de sua comida ali, isso, com o corpo de Ellie ainda no cômodo ao lado.
Após tudo pronto, ela foi para fora, e encarou o jardim que cuidou com tanto esmero completamente destruído.
Pegou uma de suas pás e fez uma cova rasa.
Colocou Ellie na cova com o mesmo esmero que cuidava de suas flores. Brighid queria dar a ela um funeral digno usando a milenar tradição funerária das fadas, mas ela não tinha tempo.
Antes de partir, adentrou a casa e pegou algumas roupinhas de bebê que ela mesma bordou. Ainda era inverno, e se encontrasse suas crianças, elas poderiam precisar.
Deu uma última olhada para a casa que viveu tempos mais tranquilos da sua vida, a mesma casa que desejava morar com toda sua família.
Desceu toda colina e alcançou a praia.
As pequenas casas de fadas também estavam vazias. Arrombou uma das portas e abaixou-se para não bater com a cabeça. Vasculhou o local a procura de um mapa, e lá estava ele em meio a livros, o mapa do continente.
Olhou no armário e achou um cachecol. Não era tão grande, mas serviria para proteger-se da brisa fria do mar. Amarrou o cachecol no pescoço e tapou o nariz, deixando somente os olhos de fora.
Fitou seu reflexo no espelho e viu uma meche esverdeada próxima a sua orelha.
“Minha mana já está voltando?”
Dando de ombros, ela foi para fora, jogou suas coisas no barco a remo e o empurrou em direção ao mar.
Já no barco, ela abriu o mapa rústico, vendo a ilha das fadas representada em um mapa. Com os olhos buscou os pontos de referência e imediatamente se localizou.
“Certo, tenho que seguir para noroeste, alcanço o Império do Sul e sigo para o Norte até alcançar o Centro-Leste.”
Após um suspiro, ela guardou o mapa na mochila e começou a remar.
Havia um longo caminho até o Centro-Leste, e o continente estava bem mais perigoso do que um ano atrás, mas Brighid sabia que mesmo naquele estado ela ainda era mais habilidosa que a maioria das pessoas.
Seria uma empreitada e tanto.
[…]
Na sacada de seu escritório, Ayla observava silenciosamente a neve cair sobre sua cidade em progresso.
Deixou Colin treinando sozinho, já que tinha trabalhos da corte para fazer.
Ela estava envolta em um vestido escuro e pesado, que a protegia do frio e do vento, mas não conseguia proteger seu coração dos sentimentos que a invadiam naquele momento.
Olhava fixamente para a cidade, enquanto a neve cobria as ruas e os telhados das casas, transformando tudo em um mar de branco. A beleza da neve era inegável, mas para a rainha, ela era também um lembrete do futuro incerto.
Apesar do inverno rigoroso, a população continuava empenhada, trabalhando incansavelmente para dar uma condição melhor aos seus. A maioria da população de Runyra nunca havia visto tempos tão prósperos.
Entretanto, havia algo que deixava Ayla cada vez mais preocupada, além do futuro do reino, era também tudo que envolvia seu marido. Semanas atrás, ela não dava a devida importância ao fato de Colin estar com seus dias contados, mas agora era diferente.
Seus olhos haviam ganho uma nova perspectiva.
Com a notícia recente da gravidez e com uma guerra prestes a estourar, ela estava começando a imaginar uma vida sem Colin, seu principal suporte em tudo aquilo.
Aqueles pensamentos negativos acabavam deixando-a com peso enorme sobre seus ombros, principalmente em relação ao filho que esperava no ventre.
Pela primeira vez em muito tempo passou a sentir um medo constante, uma preocupação intensa sobre como cuidaria de tudo sem a ajuda de seu amado esposo.
Olhando para baixo, ela viu as pessoas caminhando nas ruas, indo e vindo com sorrisos nos rostos. Ayla atribuía a maré de boa sorte a Colin, já que foi somente ele aparecer que o progresso chegou e transformou à vida de todos eles.
Ela perguntou-se se conseguiria liderar o reino sem o apoio de seu marido, que era um líder forte e respeitado. Ficou em dúvida se conseguiria cuidar dos filhos sozinha enquanto estava cercada de abutres, até mesmo na própria corte.
Aquele medo e a ansiedade a sufocavam, e ela não sabia a quem recorrer. Se fosse meses atrás, ela teria lidado com aquele sentimento sozinha como fez tantas outras vezes, mas agora tudo estava diferente.
Não havia somente o povo no qual merecia sua atenção, em breve o seu filho tomaria ainda mais tempo dela.
Ayla ficou com medo que ambas atividades a sobrecarregassem e que ela fizesse um trabalho medíocre tanto como rainha quanto como mãe.
Foi então que outro desejo invadiu sua mente, o desejo de ser zelada pelo marido.
Ela sentia-se mais vulnerável e sensível do que o normal, e as mudanças em seu corpo e hormônios ainda nem haviam começado.
Ouviu-se três batidas na porta e ela abriu-se.
— Senhora, o sacerdote está aqui — disse Tuly.
— Mande-o entrar.
O Elfo da neve adentrou, usando uma túnica que representava a pureza e santidade. Usava também uma estola branca em torno do pescoço, que era um símbolo do sacerdócio.
Em suas costas usava a casula, uma capa solene usada sobre a túnica. A casula era branca com detalhes em dourado, com desenhos simbolizando a luz divina.
De olhos azuis, cabelo branco e um rosto gentil, o Elfo ficou há alguns metros de Ayla.
Ela virou-se encarando o sacerdote.
— Espero não estar atrapalhando o senhor com suas atividades sacras.
Ele abanou uma das mãos.
— De maneira alguma, a senhora já fez muito por nós, mandou até mesmo fazer uma catedral para que os fiéis se reunissem.
— Minha mãe foi batizada na religião da Deusa da Neve — ela desviou o olhar. — Não conheci minha mãe, ela se foi um pouco após meu nascimento, e tenho poucas memórias com o meu pai. Nunca fui religiosa, nunca dei importância a isso. Que diferença faria? Só me era necessário somente uma espada e uma missão, fui criada assim.
Ayla caminhou até sua poltrona e sentou-se, oferecendo o sofá para o sacerdote que fez o mesmo.
— Me conte sobre sua religião, sacerdote. Sou batizada nela, assim como meu marido foi antes do nosso matrimônio, mas não sei quase nada sobre ela.
Ele assentiu com um sorriso.
— Com todo prazer, mas posso fazer uma pergunta? Por que a senhora se interessou, aproximar do povo?
Ayla fez que não com a cabeça.
— Estou grávida, sacerdote, na verdade, os sintomas devem começar em breve.
— Meus parabéns, majestade, que essa criança seja abençoada!
— Por isso, passei a pensar em outras coisas, rever algumas atitudes… sabe, os meus soldados são filhos de alguém. Num futuro próximo, mandarei esses jovens para a morte… eles morrerão longe de casa, isolados, cercados pelos corpos dos seus companheiros… eu só… não queria matar os filhos dos pais da minha nação — cabisbaixa, ela afastou uma mecha de cabelo e desviou o olhar. — Mas fugir ou nos rendermos não é uma opção. Eles não lutarão por um monte de pedra e concreto, lutarão por seus pais, seus filhos, seus amigos…
— Tenho certeza que eles entendem isso e são agradecidos por terem a senhora como Rainha e seu marido como Rei. Se a cidade fosse atacada, até mesmo eu a defenderia. Uma bela comunidade cresceu aqui, e tudo está tão próspero que seria impossível não lutar por isso.
Sentindo-se reconfortada, Ayla abriu um sorriso de canto.
— E então, não vai me falar sobre a Deusa da Neve que cultuamos?
— Claro! Que tal começarmos do começo?