Omega Hero - Capítulo 0
Dizem que quando se está perto da morte seus pensamentos flutuam na sua frente feito balões assustados. Contudo, ouvir essas mesmas palavras da boca do inimigo? Aquilo já era um exagero!
— Que petulante, chegou todo cheio de si… e vai morrer feito um porquinho!
Mudando apenas o tom de deboche do inimigo, aquilo era exatamente o que Makoto pensava de si mesmo: “Que morreria feito um idiota, naquele beco escuro e encardido!”.
Enquanto seu carrasco falava bem ao pé do ouvido, cuspindo e se vangloriando, Makoto lutava contra um abraço irresistível que o asfixiava, apertando seu pescoço com a força de uma prensa hidráulica.
“É mesmo impossível para um homem comum vencer um usuário do Poder Ômega!”. Pensou. Em desespero, Makoto tenta arranhar com a ponta dos dedos os braços de concreto do criminoso com poderes.
Sufocando e quase desfalecendo, o garoto percebeu que ninguém viria salvá-lo. Ninguém ousaria vir! Eles estavam num local dominado pelo crime e pelo medo. Aquele era o distrito Oeste, o lugar mais perigoso da cidade de Nova Tóquio. Nem mesmo o Exército ousava botar um pé ali dentro.
Num último suspiro de vida, Makoto tenta novamente se desvencilhar do seu algoz.
Foi um último esforço inútil. Seu corpo todo machucado, respondeu com a dor latente de várias costelas quebradas. Seus dedos, em carne viva, não conseguiam mais riscar a dura pele de concreto do inimigo.
“Dessa vez, acho que é o fim… um fim tão vergonhoso que nem mesmo Eles vieram até mim?”
Mas logo, Eles viriam até ele. Só que, antes, Makoto ganharia uma ligeira sobrevida.
— Ô, Takeda, a gente não tinha combinado de que eu daria o golpe final, capiche? — O homem falava um japonês bem arrastado, com sotaque italiano.
— Desculpa, Iago, eu me emploguei enforcando o idiota… he he
Um trovão debochado cruzou saltitando pelo céu, iluminando as vielas daquele beco escuro e encardido. No mesmo instante, o capanga gordo com pele de pedra jogou Makoto violentamente contra o chão.
Após colidir com a potência de uma bomba contra um asfalto duro e desnivelado, o jovem sentiu vários ossos das mãos se quebrando e o joelho direito se partindo ao meio.
No entanto, Makoto negou a dor latejante. Tudo o que queria era encher novamente os pulmões com vida.
— Cof! Cof! — Makoto resfolegou ao respirar pesado, quase se engasgando.
— Então, assim está bom?
Segurando novamente o garoto, agora pela gola da jaqueta vermelha rasgada, Takeda alçou Makoto até a altura do queixo. Mostrava o rapaz como um troféu de guerra para o comparsa sádico.
Sem forças, Makoto não pode esboçar qualquer resistência. Iago, por outro lado, curvou para frente o corpo esguio e seco como o de uma caveira, tirando os longos cabelos verdes de cima do olho direito.
Colocou-se, enfim, numa postura de corrida.
— Sim, sim… — Iago sorriu. Logo depois, salivou os beiços com sua língua pontiaguda — Só não balance o bambino enquanto eu tomo um pouco de distância, capiche?
— Eu sei disso… — Takeda cuspiu e rosnou — Estrangeiro metido à besta!
Ao ver o mundo escurecer aos poucos até ser totalmente consumido por um piche negro, Makoto fechou os olhos com medo de vÊ-los. Tinha receio de que sua última visão fosse justamente aquilo que mais temia no mundo. Aqueles malditos totens. Até que…
— Coitadinho… o bambino está tão assustado que nem quer ver a própria morte, Takeda!
— Parem com isso, eu imploro! Já disse que farei tudo que me pedirem… mas deixem ele ir! — Gritou uma bela mulher de cabelos longos e alaranjados, presa pelas garras de um homem vestido com um kimono negro.
“Yame!”. Ao ouvir a voz trêmula e soluçando dela, não importava mais o quanto suas pálpebras pareciam pesadas feito chumbo. Makoto arregalou os olhos e mordeu o canto dos lábios. Em sua determinação, não piscou nem mesmo quando uma gota de sangue escorreu de sua testa, pintando nele a menina dos olhos com vermelho.
“Não!”. Agora, somente salvar aquela garota importava, nem que, naquele estado de total impotência, aquilo parecesse uma loucura.
Num segundo, Makoto tenta capturar forças pelo corpo. Só consegue estalar os dedos doloridos das mãos. Noutro, como o rufo de um tambor repentino, eles aparecem. Estavam todos ali, os sete totens, lhe encarando como fantasmas distantes.
Luminosos, mesmo na treva mais sombria, os vultos brancos permaneciam imóveis dentro da escuridão, de um mundo que também havia parado seus passos.
Um deles parecia zangado, em pé, olhando para longe de Makoto.
Outro, chameguento, ficou deitado aos pés de Yame.
Outro dormia, escorado sobre uma lata de lixo.
Outro, espirrava, esvoaçando os longos cabelos negros do homem de kimono preto (também paralisado no tempo).
Outro, zarolho, se pendurava de ponta cabeça, numa escada de parede.
Outro, curvado e com o aspecto de um sábio, admirava o soco em supervelocidade de Iago, se movendo em câmera lenta.
Por fim, o último, com os lábios sorridentes de um demônio, permanecia sentado. Era o único que olhava diretamente para Makoto, como se desdenhasse sua amarga derrota.
— Está rindo do que, seu cretino? — Makoto, pela primeira vez na vida, teve coragem de olhar e falar diretamente com um daqueles totens — Tu tem a minha cara, né? Significa que se eu morrer, você vai comigo… Então, para de ficar sorrindo feito idiota, e… cof cof… faz alguma coisa!
Mas sua pose de macho alfa dominante cedeu na sequência, quando Makoto não mais vislumbrou o totem risonho. Esse, num susto, apareceu como um vulto branco quase um palmo à sua frente.
Por pouco, o totem risonho não roçou o nariz branco e medonho no nariz de um Makoto apavorado.
O sorriso medonho de apenas meio rosto, como o de um coringa partido ao meio, despedaçou completamente o livre-arbítrio de Makoto, rompendo as barreiras do seu corpo.
O totem risonho pareceu entrar nele como um fantasma e se incorporar dentro da alma assustada e cambaleante do garoto.
Tudo isso aconteceu em apenas um segundo, e noutro, todos os totens — menos o Zangado — haviam sumido. O mundo em trevas, tal qual uma dimensão obscura do outro lado do espelho, se rachava e se partia em pedaços.
— Ei, senhor Zangado? Que tal olhar pra cá?
Estranhamente, Makoto perdeu qualquer medo deles. Sorrindo com apenas o lado direito do rosto, chamou pelo totem Zangado que o encarou de volta com um semblante sério e de poucos amigos.
Se sentindo atraído para junto do totem Zangado, Makoto não mais se encontrava preso pelas mãos de Takeda e ao alcance do golpe de Iago.
Quando o mundo acordou do repentino transe, Iago acertou o soco em supervelocidade destinado a Makoto, no comparsa.
Rompendo a pele de concreto de Takeda e quebrando o próprio punho, Iago tropeçou no comparsa assustado, levando-o junto consigo num voo improvisado.
Ambos colidiram dolorosamente contra uma larga parede no final do beco.
ΩΩΩ