Os Contos de Anima - Capítulo 22
Lucet sentiu como se seu corpo estivesse flutuando enquanto era transportado, o processo foi extremamente rápido a ponto de que em poucos segundos ele já tinha chegado ao seu destino e quase tropeçou ao sair do portal. Ele olhou ao seu redor e viu uma arena muito familiar a daquela que esteve dentro do espaço independente de Maximilian. Ele não sabia se os dois espaços eram relacionados de qualquer maneira, mas, a coincidência certamente era intrigante.
Um caminho feito de setas luminosas no chão arenoso apontava para o centro da arena, piscando alternadamente, indicando para que ele fosse até o centro. Lucet que não tinha idéia de como seria este teste, por isso, apenas obedeceu às indicações, já preparando seu corpo e movimentando sua mana internamente para caso precisasse escapar de qualquer surpresa.
Ao adentrar o círculo luminoso, um badalar ecoou pela arena e uma voz feminina se manifestou no espaço.
— Bem-vindo ao seu teste de admissão para o Ninho, candidato — ela disse — Ficamos felizes pelo seu interesse na organização e lhe desejamos toda sorte possível para que possa se juntar a nós e crescer o poder e os lucros da organização. Agora, lhe explicaremos as regras de seu teste de admissão.
Um quadro luminoso flutuante surgiu em frente aos olhos de Lucet, que começou a acompanhar a explicação da voz com o material exposto à frente de si.
— Um Corvo competente detém um certo aglomerado de qualidades, estas quais serão avaliadas através deste teste. Os critérios serão “Inteligência Informacional”, “Criatividade”, “Potencial” e “Habilidade Combativa”. Dois destes critérios serão avaliados em exames e os outros dois serão avaliados em um teste de combate. Os critérios serão pontuados de zero a cem, sendo a nota mínima para aprovação setenta pontos. O uso de qualquer item de amplificação mágica durante os exames será respondido com eliminação imediata do processo. O uso de autômatos ou itens de amplificação mágica ou fisica, como poções e extratos, durante o teste de combate também resultará na anulação do teste e a eliminação imediata do processo. O uso de máscaras que tenha o uso exclusivo de resguarda de identidade serão permitidos durante o todos os exames. Caso tenha alguma dúvida, mencione-a agora e prontamente sanaremos suas dúvidas, caso contrário, utilize sua mana das sombras na ponta de um dedo de sua escolha e pressione o botão “Prosseguir” no painel para continuarmos com sua avaliação.
Quando a voz terminou a explicação, um botão negro com a palavra prosseguir escrito com letras douradas apareceu no quadro de luz sólida. Lucet olhou o botão,e posicionou seu dedo em frente a ele antes de perguntar.
— E quanto a armamento? Posso utilizar meu próprio equipamento e minha arma?
A voz prontamente o respondeu.
— Contanto que tal armamento e arma não possuam qualquer encantamento sobre eles, o uso é permitido. Armamento encantado não faz parte da habilidade pessoal, portanto, o uso do mesmo é considerado trapaça para os propósitos deste exame.
— Entendi — Lucet respondeu sorrindo.
Ele apertou o botão de letras douradas utilizando um dedo coberto de mana das sombras. Um badalar ressoou no espaço e o quadro luminoso, junto com as setas no chão, desapareceu. Lucet então retirou seu manto, suas manoplas, armadura e botas e os guardou em seu cinto dimensional deixando apenas o medalhão que sempre carregava consigo, o colar que Kaella o tinha dado mais cedo, e sua máscara em seu rosto em seu corpo. Ele então retirou de dentro do cinto sua garra e a afixou em seu cinto para usar no combate.
Seus pés tocavam o chão arenoso do lugar. Era uma sensação, que apesar de ter afinidade com a mana elemental da terra, ele não costumava experimentar muito já que na floresta que circundava Elysium existiam muitos insetos e outros animais venenosos que certamente iriam adorar lhe dar uma dose de suas especialidades se avistassem seus pés desprotegidos. O chão era frio e um tanto escorregadio. Ele saltou algumas vezes e tentou correr em círculos para testar a tração que seus movimentos eram capazes de gerar e notou que sua velocidade usual tinha diminuído um pouco. Ele suspirou mentalmente “Isso pode ser um problema”.
Alguns momentos se passaram e então o círculo onde estava começou a reluzir, a voz novamente soou no espaço.
— Primeiro Exame — ela anunciou — Critério: Inteligência Informacional. Você receberá uma ficha de exame onde constarão cinquenta questões de conhecimentos gerais que todo corvo bem preparado deve saber. Cada questão tem o valor de dois pontos e a nota mínima deste critério é setenta pontos. O uso de itens externos, tal como livros ou enciclopédias, para consultar informações não será permitido. Após o término, suas respostas serão analisadas pela comissão de avaliação e sua pontuação será anunciada. Para evitar fraudes com itens mágicos, solicitamos que utilize sua mana das sombrar para escrever as respostas.
O círculo brilhou e então um quadro luminoso surgiu em frente a Lucet. As questões tratavam de diversos assuntos, que graças ao excelente ensino de Kaella e sua imensa coleção pessoal de livros, ele já havia estudado. Ele acumulou um pouco de mana em seu dedo indicador e começou a responder às questões. Ele encontrou diversos assuntos, desde cenários sobre o uso das habilidades inerentes a mana das sombras até a identificação de venenos e a produção de antídotos. Apesar da natureza séria da avaliação, Lucet achou a coisa extremamente divertida. Ele respondia todas as questões com o máximo de detalhes que conseguia, lembrando das vezes que Kaella pacientemente o ensinara sobre os assuntos, o que o fez sentir uma tinge de carinho que fez um sorriso brotar em seu rosto. Meia hora depois ele finalizou suas respostas, O quadro luminoso se desfez e, após alguns minutos, a voz anunciou.
— Primeiro Exame — ela disse — Critério: Inteligência Informacional. Pontuação: 100/100. Prosseguindo para o segundo exame.
Lucet, apesar de extremamente feliz com o resultado, não estava surpreso. Nos quatro anos de treinamento que teve com Kaella ele aprendera coisas que qualquer um de sua idade, mesmo em Elysium, nem sequer sonharia em ver, e tais ensinamentos o davam uma confiança absoluta em seu conhecimento.
Em outro lugar do ninho, numa sala isolada, a comissão de avaliação ainda relia as respostas de Lucet, seus rostos, apesar de escondidos sob máscaras, todos demonstrando óbvio choque. Todos eles eram capazes de responder qualquer uma dessas perguntas, mas mesmo eles não eram capazes de responder com tamanho detalhamento e qualidade, mas, seu choque não era apenas em relação a isso.
Eles eram três corvos de rank ouro, o que na organização era um rank relativamente alto e carregava consigo uma medida de prestígio e renome, e por isso, o trio possuía um certo grau de orgulho e arrogância. Porém, quando contactaram a recepção para inquirir sobre a identidade do participante e foram imediatamente negados, eles protestaram.
— Como assim não podemos saber quem é o participante, tem noção de nossos ranks? Somos rank ouro entende? Ouro! Uma mera recepcionista de rank bronze não pode nos negar respostas.
A recepcionista, como se já previsse a reação os respondeu calmamente com apenas uma frase.
— Não estou autorizada a divulgar informações pela autoridade de nível A6.
Os três furiosos continuaram.
— Como assim A6!? Você quer nos dizer que esse participante tem o rank de obsidiana!? Acha que eu nasci ontem!?
A recepcionista deu um leve risinho antes de responder.
— Ele não, mas a mestra dele tem.
Ainda incrédulos, eles insistiram em questionar.
— E quem é essa “grandiosa” mestra? É alguém que existe por acaso? — perguntaram com vozes ricas em zombaria e irônia.
A resposta que veio a seguir, porém, foi algo tão inesperado e assustador que eles quase caíram de suas cadeiras, ficando instantaneamente silencioso, falando em voz baixa apenas depois de vários momentos.
— Seu título é “Corvo de Tinta”, soa familiar? — Ela respondeu calmamente.
— A “Corvo de Tinta”?
— Exatamente, gostariam de questioná-la? — A recepcionista respondeu aos risos.
Questioná-la!? Como teriam coragem de fazer isso? Alguém do rank Platina já poderia lhes dar imensos problemas na organização, quem dirá alguém do rank Obsidiana? Se desagradassem um corvo desse rank, era bem possível que fossem expulsos do ninho. Comprar briga com alguém desse nível? De jeito nenhum!
— N..Não, obrigado pela prestatividade — responderam timidamente antes de retornar a suas funções.
Enquanto essa conversa ocorria, Lucet já havia iniciado o segundo exame. A voz feminina soou no espaço novamente anunciando os detalhes do teste.
— Segundo Exame — ela falou — Critério: Potencial. Iremos coletar amostras do seu sangue e da sua mana para a análise do seu potencial. Todas as informações serão guardadas sobre confidencialidade absoluta, sendo avaliadas por um membro de autoridade A6 ou superior que estiver mais próximo. Ao aparecerem os equipamentos de coleta, siga as instruções e aguarde a avaliação de seus resultados.
O círculo no chão brilhou novamente. Quando a luz se dissipou, um pedestal apareceu em frente a Lucet contendo sobre uma pequena lâmina, uma cumbuca de madeira e um globo de cristal postos cuidadosamente sobre uma bandeja de prata. A voz soou novamente.
— Utilize a lâmina para realizar um corte numa região de sua escolha e despeje o sangue sobre o recipiente de coleta até que o mesmo seja preenchido até a metade. Após isso, canalize sua mana e a deposite na esfera de contenção. Lembre-se que a esfera de contenção apenas comporta uma quantidade de mana limitada, portanto, não exagere na amostra, do contrário o globo explodirá e você terá que pagar por um novo, e, caso queira saber o preço de mercado, uma nova esfera de contenção lhe custará de cem peças de ouro.
“CEM PEÇAS DE OURO POR UMA COISINHA DESSAS!?”Lucet reclamou em sua mente, mas logo, prontamente obedeceu. Ele pegou a pequena lâmina, fazendo um corte na palma de sua mão e sentiu a pontada de dor e um calor na ferida, mas, antes que o sangue começasse a escorrer para o chão, ele ignorou a sensação e posicionou a mão sobre a cumbuca. Depois disso, ele fechou a mão em formato de punho e forçou o sangue a fluir mais rápido para fora e, após alguns instantes, o sangue atingiu a marca desejada. O círculo de luz no chão brilhou por um instante e uma luz branca envolveu sua mão ferida, instantaneamente curando a ferida.
Lucet ficou um tanto surpreso. Até onde sabia, magia assim só era proveniente de magos que utilizam mana da luz, os serafins, e eles, são bem conhecidos por terem uma inimizade declarada contra todos os corvos. Como exatamente teriam feito um deles aceitar trabalhar dentro do ninho? Ele considerou a idéia por mais alguns momentos, porém, logo desistiu de questionar e continuou com o teste.
Ele então cobriu sua mão com mana e se lembrou da sensação dos cristais de mana condensada que usou durante seu treino. Ele se concentrou na sensação de esvaziá-los e preenchê-los com tal intensidade que se distraiu e preencheu o globo de cristal com tanta mana que ele brilhou e começou a chacoalhar, mostrando sinais de que estava chegando em seu limite. “Ah! Droga!Para,para,para,PARA!” ele exclamou em sua mente antes de desesperadamente cessar o fluxo de mana. Um badalar soou, o círculo de luz no chão brilhou e instantaneamente os equipamentos desapareceram.
Neste instante, na sala da recepção onde Kaella se encontrava sentada calmamente folheando seu livro, uma tela luminosa surgiu em frente da Alfae. O item mostrava uma solicitação da administração do ninho para avaliar as amostras de Lucet, que ela prontamente aceitou. Apesar de não gostar de usar os privilégios de seu rank, ela abriu uma exceção, pois, mesmo querendo que Lucet fosse capaz de utilizar os recursos do ninho, ainda assim, ela pensava que era arriscado demais deixar que as informações de sua identidade caíssem em quaisquer mãos que não fossem as suas.
Uma nuvem de fumaça negra se ergueu em volta de Kaella. Dentro dela, as amostras apareceram e ela começou avaliá-las com muita seriedade, usando até instrumentos muito mais precisos que da primeira vez que avaliou o sangue do garoto. Ela sempre teve um certo receio de analisar profundamente, pois, com as técnicas e equipamentos que possuía certamente seria capaz de não apenas verificar a origem precisa do garoto, como também, caso tivesse uma amostra do sangue deles em sua reserva sanguínea, descobrir quem eram os parentes do garoto.
Primeiro, ela analisou a amostra de mana no globo de contenção. Com os anos que passou treinando o garoto tinha bastante confiança na qualidade da mana, portanto, quando viu os resultados de sua análise, ficou, apesar de satisfeita, tranquila pois as margens de resultado estavam dentro do esperado.
A afinidade do garoto tinha aumentado a taxa de regularidade de setenta e dois pontos para oitenta pontos, o que era um grande progresso, já seu limite de afinidade havia aumentado de oitenta e dois para oitenta e cinco, que apesar de conter apenas três pontos de diferença, já era um imenso progresso quando se considerava a dificuldade aumentar a afinidade de qualquer indivíduo com a mana. A tela luminosa exigiu uma resposta para algumas métricas de avaliação, onde ela preencheu e deu a nota máxima, garantindo assim cinquenta pontos.
Após isso, ela se voltou para a amostra sanguínea. Ela então sacou de sua bolsa dimensional uma caixa vermelha com linhas douradas e quatro pontos negros em cima e um quinto ponto negro sobre o fecho da caixa. As pontas de seus dedos se iluminaram com sua mana azulada que ela prontamente pressionou contra os pontos da caixa fazendo com que, após a energia dos seus dedos preencherem os cinco pontos, um clique ressoasse e a caixa se abrisse revelando sobre uma almofada de seda um cristal muito similar em estilo a lágrima de Mimir, que foi o instrumento originalmente utilizado para avaliar o sangue do garoto, porém, desta vez, o cristal era negro e continha uma bifurcação que dividia o cristal em duas câmaras.
— Apesar de eu já ter uma idéia da sua linhagem sanguínea, ainda assim, é melhor ter certeza — Kaella comentou enquanto preparava o dispositivo.
Ela então apontou a ponta do cristal para a amostra de sangue. O cristal brilhou por um instante antes de acumular toda sua luz na ponta e disparar um feixe luminoso na direção da amostra. Por alguns momentos o feixe continuou atingindo o sangue sem efeito algum, porém, eventualmente o sangue começou brilhar e, em alguns instantes, se transformar em partículas de luz que foram então prontamente sugadas pela ponta do cristal.
“Qual seria a sua reação se ele soubesse que estou usando uma “Presa Xuanwu” para analisar o sangue dele?” Ela pensou enquanto aguardava os resultados.