Pacto com a Súcubo - Capítulo 82
— Venham comigo! — disse o soldado, e agarrou Jéssica pelo pulso.
A garota, sem nem pensar, dobrou seu joelho e, antes que o homem tivesse chance de perceber o ataque, ela atingiu uma joelhada nas partes íntimas dele.
— Uh! — ele gemeu de dor.
E Mical pulou em suas costas, passando o braço direito pelo pescoço e travando-o com a mão direita, num mata-leão forte e apertado.
O soldado engasgou com o aperto em sua garganta e, se movendo freneticamente, segurou o braço de Mical, tentando libertar-se. Bateu as costas contra a parede, fazendo o impacto atingir Mical, e por um momento, a garotinha quase o soltou.
Jéssica, num movimento rápido, afundou um soco na boca do estômago dele.
As pernas do soldado bambearam e ele cerrou os dentes de dor e raiva, e levou a mão à cintura, tentando alcançar a pistola.
Mical apertou ainda mais o mata-leão. A baba escorrendo da boca do homem começou a molhar o braço dela. Era fedida e gosmenta.
Jéssica atingiu mais um soco na boca do estômago dele, e suas pernas tremeram ainda mais e quase se dobraram.
Mical apertou ainda mais o mata-leão, sentindo o braço sendo pressionado contra o Pomo de Adão do soldado. Os olhos dele estavam querendo se fechar. De sua garganta saía um gemido fraco e lamentoso. Ele, numa última tentativa de resistir, levou mais uma vez a mão à pistola no coldre, e Jéssica lhe atingiu outro soco na boca do estômago.
Após um breve gemido, suas pernas se dobraram e ele despencou no chão. Jéssica, rapidamente, tirou a pistola da cintura dele. Também encontrou um tazer elétrico preso ao cinto, objeto que ele usava para intimidar os acólitos e as noviças.
Em seguida, sem perder mais tempo, elas abriram a porta da biblioteca e entraram, arrastando consigo o homem desacordado.
Arrancaram a camiseta dele e a rasgaram, para usar como corda. Amarraram os braços para trás e as pernas dobradas, para evitar qualquer movimento, e o deixaram próximo a uma parede.
As prateleiras, dispostas em fileiras, preenchiam o espaço do grande salão; e estavam cheias dos mais diversos livros. Capas de couro com símbolos entalhados e pergaminhos enrolados, de autores esquecidos pelo tempo.
Escritos importantes para a história da cristandade. Filósofos, historiadores, matemáticos que buscavam identificar Deus nas formas geométricas da natureza. Conhecimento que apenas alguns sacerdotes escolhidos tinham o direito de acessar. A maioria das pessoas precisavam se contentar com os livros da biblioteca satélite, no andar inferior.
— Vamos procurar! — disse Jéssica.
— Eu não sinto a emanação energética! Não sinto a presença da pedra.
— Pode estar dentro do baú de chumbo.
Começaram a vasculhar tudo. As prateleiras, armários e baús, reviraram os livros e pergaminhos, e os documentos guardados dentro das gavetas do balcão e das mesas de estudo.
O homem, que tinha começado a despertar, balbuciou alguma coisa.
— Aarg… v-voc…
— Ele tá acordando! — disse Mical, em alerta.
— Vocês vão se arrepender, garotinhas! Me desamarrem logo!
— O que faremos, Jés?
— Vocês duas são muito idiotas. Eu ouvi o que estão fazendo. Estão procurando a Pedra Fundacional, não é? — ele riu. — Não está aqui, é claro.
— Ele pode tá mentindo, Jés! Não acredito nele!
O soldado riu.
— Você acreditar não faz a menor diferença. A Pedra não está aqui. E sua irmã já percebeu isso também?
Jéssica permaneceu em silêncio.
— Vamos! Me desamarrem! Talvez eu demonstre alguma misericórdia e solicite um castigo ameno.
— O caramba que vamos desamarrar! Jés! Vamos ter que matar ele!
— O quê?! — Jéssica e o homem falaram ao mesmo tempo.
— Pensa, Jés! Ele vai abrir o bico! Vai falar pros outros! Vai contar pro Prior Regente! E aí estaremos encrencadas! Vamos ter que passar ele!
— Passar ele?! Mica, onde foi que você aprendeu a falar assim?
— Ah, eu andei assistindo Tropa de Elite; mas não importa, Jés! Só pensa! Ele vai contar! É ele ou a gente!
— É… pensando desse jeito…
— Perai, garotas! O castigo nem seria tão forte assim… Vamos lá! Não precisamos chegar nesse ponto, né? Apenas me soltem e resolveremos isso da melhor forma possível.
— Precisamos sim! — disse Mical. — Sei muito bem como seria esse castigo ameno que você diz! Vamos, Jés! Vamos fazer de um jeito indolor. Ele nem vai sentir.
— Eu vou sentir sim!
— Aahhh — Jéssica, confusa, levou as mãos às têmporas e as massageou. — Eu tô ficando tonta!
— Vamos mandar ele pra conhecer Jesus! Seria um favor, não é?
— Sua lógica é muito estranha, menina! — disse o soldado, enquanto tentava, disfarçadamente, se livrar das amarras feitas com sua própria camiseta. — Estão mais imersas na escuridão do que imaginei. O mundo profano as contaminou. Me soltem e eu ajudo vocês a retornarem para Jesus.
— V-vamos desmaiar ele! E aí a gente esconde ele no banheiro do nosso quarto! — disse Jéssica, um tanto insegura.
— E depois? — perguntou Mical. — Onde vamos desovar o corpo?
— Não! Não vamos matar ele! Só vamos escondê-lo, por enquanto! Esconder ele vivo! Depois eu decido o que fazer.
— Certo… — Mical pareceu um tanto decepcionada, mas de repente, um sorriso malicioso surgiu em seu rosto, e ela ergueu o tazer elétrico. — Eu posso botar ele pra dormir, então?
Jéssica suspirou e baixou os ombros.
— Pode sim, Mical. Pode sim.
— Hehehe!
— Espera! Não! Fica longe de mim! Não se aproxime!
O homem se remexeu, tentando se soltar das amarras e, por fim, apenas tentava se afastar de Mical, rastejando no chão, mas não teve jeito.
A garota acionou o tazer, apertando o botão, e um tipo de raio em miniatura brilhou nas duas pontas que se projetavam como agulhas numa das extremidades da arma de choque e o som de eletricidade pôde ser ouvido.
Mical encontrou a arma no pescoço do soldado e ele gemeu de dor e desmaiou.
— E agora? — perguntou Mical.
— Agora voltados pro nosso quarto, e arrastamos ele com a gente. Vamos escondê-lo, por enquanto.
— E a pedra?
— Não tá aqui na biblioteca. Ainda precisamos checar a Nave.
— Certo.
Após se certificar que não tinha ninguém no corredor, elas fizeram o caminho de volta. Puxaram o homem segurando pelos braços, que ainda estavam amarrados.
— Ele é pesado — disse Jéssica, ofegante —, mas precisamos ser rápidas. Antes que chegue alguém!
— Se chegar alguém eu boto pra dormir também — respondeu Mical, acionando o tazer.
— E aí vamos ter mais uma pessoa pra carregar.
Assim que chegaram no quarto, puxaram o homem pra dentro e fecharam a porta.
— O banheiro! — disse Jéssica.
— Certo.
Deixaram ele dentro da banheira. Mical pegou alguns xampus e espalhou pela superfície branca e brilhante da banheira.
Jéssica ergueu uma sobrancelha em dúvida, então Mical deu de ombros.
— Para o caso dele acordar e tentar sair. O xampu vai fazer escorregar — disse ela e sorriu, e foi um sorriso malicioso, como o de Clara, e estufou o peito, orgulhosa. Achava que tinha tido a ideia mais genial do mundo.
Jéssica deu de ombros.
— Bom, pelo menos, fedido não vai ficar…
Foi quando alguém bateu à porta. As duas quase pularam de susto.
Era Asafe. Ele tinha um olhar afiado e parecia um pouco desconfiado.
— Vocês duas parecem um pouco agitadas.
— Ah, não… — Mical sorriu, tentando diminuir o ritmo da respiração. — A gente estava apenas se exercitando um pouco. Não tem muita coisa pra fazer aqui, sabe?
— Entendo — disse ele, e correu os olhos pelo quarto, procurando alguma coisa. — O Senhor Isaías, o atual Prior Regente, solicita a presença de vocês duas no pátio central. A cerimônia de exorcismo vai ter início.