Pacto com a Súcubo - Capítulo 91
Mical e Jéssica entraram no templo.
Na nave, o local usado em cultos, estavam todos os camponeses, encolhidos de medo, com suas crianças envolvidas entre os braços ou escondidas debaixo dos bancos de madeira.
Eles olharam para as duas meninas com verdadeiro pavor.
— Por favor, não faça mal às nossas crianças! — disse uma mãe, aflita, abraçando uma menininha.
Mical, em choque, balançou a cabeça em negação. Deu um passo em direção a eles. Queria dizer-lhes que não faria mal algum, que na verdade os tentaria proteger, mas eles apenas se encolheram mais.
— Fique longe, bruxa! — gritou um homem.
— Não traga mais maldições ao nosso povo. Não aguentamos mais! — disse uma das noviças.
— Se tem alguma consideração por essa gente que já foi seu povo, por favor, fique longe! — disse Midiã. — Leve teu mal para longe de nós!
Mical, abalada, fez uma careta de choro, mas logo o engoliu e um olhar duro surgiu no lugar.
— Vamos, Mica — disse Jéssica, colocando a mão em seu ombro. — Precisamos achar a pedra.
— Sim. Vamos. O Renato precisa de nós.
Subiram as escadas e atravessaram rapidamente os corredores. Um soldado, que vinha em sentido contrário, tentou segurá-las.
— Ei, vocês! Parem!
Mas as duas nem olharam para ele. Jéssica atingiu um soco no queixo dele, aproveitando a força do embalo em que vinha correndo, o que o derrubou, e Mical simplesmente o pisoteou enquanto corria acompanhando sua irmã.
Quando chegaram na cobertura, viram o resultado de uma cena de guerra. Vários soldados feridos ou mortos. O muro estava em ruínas, com muitos estilhaços de pedra sobre a laje, cujo concreto estava trincado de rachaduras. E havia alguns focos de incêndio.
Elas correram até a capela que ficava ali, num dos cantos, e ao entrar, viram o Prior Reagente Isaías segurando a Pedra Fundacional nas mãos. Ela era um pouco maior que um ovo. Atrás dele, estava o altar onde a pedra costumava ficar, e o pequeno baú de chumbo que servia para guardá-la e bloquear sua radiação quando fosse necessário.
O anjo puxou Renato, arrancando-o de suas costas e o segurou. Os olhos flamejavam feito tochas.
— Pensas que podes atacar-me? Tu irás morrer agora, humano!
Mas algo cruzou o ar e atingiu o rosto de Uriel com força. O impacto foi forte e empurrou o rosto do anjo para o lado, enquanto sua pele vibrava e ondulava, e ele fazia uma careta.
Quando olhou novamente para Renato, franzindo o cenho, tentando entender o que tinha acontecido, uma gotinha de sangue escorria por sua bochecha.
Ele e Renato olharam para o alto.
E viram uma garota descendo em queda livre, com o vento intenso chacoalhando seus cabelos e ondulando sua pele. Segurava uma arma enorme. A arma parecia com um fuzil, mas a ponta do cano deveria ter a circunferência de uma lata de refrigerante.
Usava um tipo de roupa tecnológica, que lhe conferia proteção, e era possível ver várias armas presas ao seu corpo, como pistolas em coldres nas coxas e lâminas nas panturrilhas; e havia várias coisas menores presas ao colete que, devido à distância, não dava para ver.
Um cinturão de munição estava preso ao seu corpo, passando pelas costas, ombro e peito. As balas eram gigantes, do tamanho ideal para a arma que carregava.
Ela também tinha um par de óculos no rosto que protegia seus olhos cor de mel.
Fogo saiu da sola de seus sapatos, como turbinas, como se fossem jatos em miniatura, e a garota parou no ar, interrompendo a queda livre.
Os óculos se ajustaram automaticamente ao ambiente, bloqueando parte da luz intensa que emanava do anjo, ao mesmo tempo em que aproveitava o máximo de luz do ambiente escuro em volta.
Ela mirou novamente a arma gigantesca no anjo e gritou:
— Solta o meu Renato!
— Tâmara?! — O garoto não podia acreditar nos próprios olhos.
Ela engatilhou a arma e disparou novamente.
Jéssica entrou dentro da capela e apontou a pistola para Isaías.
— Entregue a pedra para mim!
Mical ficou na porta e também sacou uma pistola. Apontou a arma para os outros soldados em volta e disse:
— Ninguém chega perto! Fiquem longe! Quem se aproximar vai levar tiro!
Isaías suspirou e relaxou os ombros.
— Por quê? — disse ele. — Como? Como aquele demônio conseguiu entrar no Priorado? A Pedra Fundacional está intacta! Não faz sentido! Demônios não podem se aproximar da pedra! Qualquer coisa demoníaca é imediatamente repelida! Não faz sentido!
— O Renato não é um demônio — retrucou Jéssica.
— Mas… aquilo… só pode ser obra do demônio!
— Não é você quem exorcista demônios, oh grande exorcista?!
— Cale-se! Não vou ouvir uma pirralha!
— Me entregue a pedra ou eu vou adicionar mais um buraco a esse seu corpo imundo!
Com uma careta de desgosto, Isaías jogou a pedra para Jéssica, que a aparou no ar.
— O baú! Jogue o baú também!
Isaías hesitou.
— Anda logo! Meu dedo tá coçando pra apertar o gatilho!
Isaías abaixou o ombro, pegou o bauzinho em suas mãos e suspirou.
— Você não é mais a garota que conheci.
— Percebeu agora?! Anda! Jogue para mim.
Ele jogou.
Mical apontava a arma para os soldados que se reuniram ali em volta delas.
— Fiquem longe! Não quero matar ninguém, mas se precisar, eu vou!
Nessa hora, uma adaga veio girando no ar e sua lâmina afundou no braço de Mical. A garota gritou de dor e soltou a pistola que segurava. O sangue vermelho vivo escorreu.
Jéssica, ao ouvir o grito de sua irmã, se desesperou e correu até ela. Foi quando viu a garrafa vindo. Era de vidro e estava cheia de um líquido alaranjado, gasolina, e tinha um pano em chamas amarrado à ponta. Era um coquetel molotov. E atingiria Mical em cheio.
— Queime, bruxa! — gritou o soldado.
Jéssica, o mais rápido que pôde, empurrou sua irmã, jogando-a ao chão, e o coquetel molotov explodiu na parede logo atrás dela.
Jéssica, atingida pela explosão, com o calor do fogo queimando seu rosto e os estilhaços de vidro batendo em sua pele, foi arremessada para o lado, e enquanto tentava recuperar o equilíbrio, pisou fora da laje e caiu, despencando através dos três andares do templo até bater contra o chão de cascalho lá embaixo.
O segundo tiro atingiu o rosto do anjo, e o impacto fez o rosto dele virar violentamente para o lado, e uma gotinha de sangue escorreu de sua bochecha.
Uriel grunhiu de raiva e bateu as asas para alcançar Tamara, que estava parada no ar alguns metros acima. Mas Renato se agarrou nele e começou a golpeá-lo, dando murros e chutes.
O anjo tentou arrancar Renato de si, mas o garoto não largou.
Materializou sua Espada do Ódio e mirou no peito do anjo.
Uriel foi atingido por mais um tiro, que dessa vez bateu contra sua nuca e o deixou, por alguns segundos, um tanto atordoado.
Tentou golpear o peito do anjo com a espada, mas nada aconteceu. Aquela pele era dura feito diamante.
Então Uriel segurou o rosto de Renato e o apertou. O garoto sentiu que sua cabeça explodiria.
E o anjo jogou Renato para longe. O garoto despencou numa queda de mais de cem metros e bateu no chão do Priorado.
Onde Renato caiu, o cascalho foi afastado e uma pequena cratera se abriu.
Tâmara disparou seus tiros desesperadamente. Mas o anjo desviava, voando para o lado sem muita dificuldade. E a garota, a cada dois disparos, precisava tirar mais duas balas do cinturão e recarregar a arma.
Uriel atirou o fogo da ponta de seus punhos. Bolas de fogo cruzaram os ares e colidiram com o Renato no chão, e as chamas se ergueram, cobrindo o garoto. Ele foi completamente engolido pelas labaredas ferozes e alaranjadas, que erguiam seus tentáculos brilhantes em direção ao céu.
— Vislumbrem, humanos, as chamas de Deus que descem até vós e purificam o mundo, queimando o pecado! — disse o anjo, cheio de resplendor e um brilho celestial. — O fogo que queimou Sodoma e Gomorra volta a crepitar sobre a terra.
-
- Participe de nosso Canal no Discord: