Passos Arcanos - Capítulo 212
Reunidos em uma sala fria, em Itauba, Orion Baker e Oracle Bunis, atrás desse, uma dezena de associados, construtores renomados e aprendizes de Arcanismo Comum.
– O Baile foi um pouco entediante depois da saída de sua família, senhor Baker. – Oracle usava um terno negro, sem gravata, com um casaco de pele por cima do ombro. – Depois que soube do motivo, entendi porque recuaram tão rápido.
– Brigar com Anneton foi um erro da minha parte – admitiu Orion mais pra si do que para Oracle. – Deixei me levar pelo que senti na hora. Um erro de novato que não vai mais acontecer. Porém, estamos aqui para falar sobre negócios.
– Claramente. Sobre o que conversamos, existe possibilidade?
– Claro. Um navio que possa flutuar por baixo da água sem ter presença marcada pela mana é uma ferramenta inovadora, tive que pensar um pouco já que o empuxo do vento e também o sistema deveriam ser modelados, como me mostrou, mas praticamente está feito.
– Ótimo. E em quanto tempo teríamos esse projeto em mãos?
Orion deu uma risada.
– Eu me expressei mal, senhor Oracle. – Ele puxou o papiro de dentro da sacola espacial. Laçado por uma linha vermelha, com o símbolo do Cão Imortal, o papel estava selado. –Está pronto para ser implementado.
Houve silêncio. Orion não tinha motivos para forjar tempo. A amizade de Oracle era importante, ainda mais porque os Anões que criaram o sistema tinham uma influência grande na Ordem dos Magos.
Mesmo que apressado, daria a eles o que tinha em mente.
– Eu forjei um núcleo de ar rebobinado em dois planos que soprarão as velas. Remodelei também o empuxo e todo o deslize. Praticamente, se tudo o que estiver nesse papiro for seguido a risca, a profundidade de duzentos metros abaixo da água pode ser alcançada. Se não for o suficiente, algumas melhorias técnicas alcançam os quinhentos metros.
– E já foi testada? – a pergunta veio de um associado na ponta esquerda. – Como um projeto desse pode ser feito com tanta rapidez?
– O esboço é a parte mais difícil, mas fiquei agarrado nele nesses dois dias. A criação é modelada. Usei a Escola de Fogo para aquecer o ambiente, mas não estourar a bolha que reveste o navio. A Escola de Vento para guiar. A Escola de Terra fará o papel de resistência e a Escola de Água para contornar obstáculos.
– O senhor tem uma imensa criatividade para impor tantos conceitos lógicos num único papel – disse Oracle, impressionado. – E quantos planos há nesse seu projeto?
– Na criação, pensei em dez, mas seria insuficiente por causa dos canais de mana. Então, aumentei para doze planos, com seis matrizes centrais, e cerca de duzentos círculos mágicos.
A expressão de todos escureceu.
– Essa quantidade de matrizes deve gastar mais mana do que cem pessoas juntas. É inviável demais.
Oracle não esboçou essa reação. Orion sorriu e Oracle retribuiu.
– Você contornou esse problema, não foi, senhor Baker?
– Sou um homem justo. Me confiou um dos melhores projetos no qual produzi, então, deixei um pouco de lado a criação e parti para as funcionalidades da matriz. No décimo segundo plano, quando todos os conjuntos forem ativados, a runa que criei foi ‘Atrito por Impacto e Pressão’.
– E o que ela faz?
– Exatamente o que nome sugere. Quanto mais fundo estiverem, quanto mais água colidir e pressionar a barreira do navio, mais conversão de atrito para mana ela irá gerar. – Orion abriu a mão para os seus espectadores. – O custo necessário para ativar uma matriz de doze planos, senhores, é nula quando estiverem abaixo da água.
Os associados pegaram seus cadernos e começaram a anotar. Oracle foi o único que entrelaçou os dedos e se aconchegou na cadeira almofadada.
– Seu talento procede seu nome, rapaz.
– Espero que esse seja o preço pela sua lealdade, senhor Oracle.
O homem balançou a cabeça com firmeza.
– Faremos dinheiro rápido e fácil. E espero que esteja entre os meus parceiros de negócios.
A mão de Oracle veio a frente e Orion apertou com firmeza.
– Deixarei o dinheiro no Banco Central, poderá retirar por intermédio do Imperador já que ele controla os canais monetários daqui.
– Economia irá me ajudar com isso. Não se preocupe, senhor.
Oracle concluiu a reunião e saiu com um sorriso no rosto. Orion fez um importante negócio, mas que duraria pouco. A patente do ‘Navio Submerso’ estava em seu nome, e o nível de criação poderia ser considerado complexo, porém, sempre existiam copiadores.
No próximo mês, haveria mudanças radicais em Hunos. Porém, o trato que fez com Oracle foi simples.
– Nenhum navio deve ser vendido ou entregue para os Elfos.
A Travessia de Ignolio estava fechada e a venda de remédios e elixires iria começar a crescer. Por isso, chamou Lumiere para trabalhar com ele. E não poderia deixá-la esperando. Ordenou aos construtores da cidade que construíssem cerca de dez forjas, além de refinar a Primeira Casa, no qual os Anciãos dos Baker morariam.
E entregou diversas passivas, dando lugar as fazendas e colheitas na parte de trás da casa. Foi até Wallace, pedindo sua ajuda para buscar os melhores arquitetos afim de montarem mais duas plantas. Os Baker tinham que ter uma casa grande para receber, treinar e trabalhar em cima dos seus próprios interesses.
E também uma Quarta Casa, onde os Cavaleiros que seguiam Wallace, para os Magos que saíram de Magnus, e para a Tribo Mestiça, que morava nos subúrbios da cidade de Itauba, negando envolvimento com as pessoas.
Em três dias, de trabalho e mais trabalho, eles levantaram a Primeira Casa.
– Senhor Orion, não temos mãos de obra suficiente para continuar nesse ritmo.
Cassiano e ele olhavam para o grande lar que construíram. Três andares, largo e aconchegante. Tapeçaria seria colocada, quadros, a história renomada nos livros dos Baker. Um novo começo, uma nova página.
– De quantos precisa?
– Pelo menos de quinhentos homens para levantar todas as casas em uma semana. Será difícil, senhor. Itauba é uma cidade pequena.
Das mãos de Orion, uma runa de Epik, a Invocação.
– Te darei quinhentos soldados. Dê as ordens que quiser, eles possuem raciocínio.
Por detrás, vultos negros e brancos, usando armaduras completas, surgiram. Tantos, tomando o pátio e fora dele, a espreita. O construtor ficou angustiado, eram sombras, porém, com presenças humanas.
– Eles… podem me ouvir, senhor?
– Enquanto eu estiver vivo, sim. Agora, comece a construção. – Orion deu as costas. – Mestre Cassiano.
– Estou logo atrás de você, jovem mestre.
Os dois tomaram caminho para dentro da Primeira Casa. Já se via novos empregados, contratados diretamente pelos Anciãos e trazidos também das Caldeiras de Ilhotas. Itauba era frio, cheio de neve e ainda mais ao norte do que a capital do Reino Nevasca, onde residia o Imperador. As roupas pesadas e também o costume demorariam a chegar, portanto era comum ver lufadas cinzentas de ar quente saindo de suas bocas sempre que falavam.
Outros, como Wallace, sequer precisavam se acostumar. Esperando dentro do novo laboratório de alquimia, portava a armadura completa feita de ferro avermelhada, no qual fora preparado por Milan, em São Burgo.
Ao seu lado, Lumiere tampada de casacos e luvas.
– Perdão se te fiz esperar – disse Orion ao se aproximar. A mulher já mexia com os dedos nas runas passivas de umas das forjas. – O que achou? Melhor do que as outras?
– Muito superior. – Ela entrou no segundo plano, mexendo com facilidade. Em Magnus, se tornou proficiente. Uma pena não ter sido mais valorizada na época pela Academia Mágica. – Isso só me faz pensar que você não mexeu naquelas em Magnus para não serem melhores do que já eram.
– Eu apenas ajustei, mas é proibido mexer em estruturas históricas. Essa foi criada e modificada por mim. – Orion foi a forja ao lado do que Lumiere mexia e arrastou o dedo, indo camada por camada, atingindo o quinto plano. – Eu só tenho como ir até aqui por causa da pedra no qual a estrutura foi feita. Mas, o efeito redutivo de cada pílula considerada Simples está em 80%. E cada Composta e de Alto Efeito são em 70%.
Os olhos daquela mulher brilhavam, mesmo já sabendo do resultado. Em um ano ela consegue ver até mesmo o efeito geral da criação.
– Eu vou ter controle completo do lugar? – Ela o encarou, ansiosa. – Apenas eu poderei estar aqui, não é?
– Nós faremos um contrato no qual poderá forjar o que quiser em duas delas, mas as outras oito serão por benefício pessoal da família Baker. E temos planos para a Conferência Anual de VilaVelha onde você também deve ir para se mostrar a Ordem dos Magos.
– Por que eu deveria ir? O diretor Magnus dizia que era uma perda de tempo.
– Perda de tempo porque ele já recebia os materiais diretamente. Se você se mostrar uma Alquimista, poderá ter suas próprias redes de contato e também vai receber um subsidio da Ordem mensalmente para produzir, eles vão pedir apenas 10% do que for feito.
Ela assentiu. Wallace fez uma cara fechada.
– Se ela produzir cem elixires aqui, teremos que doar vinte?
– Não necessariamente – respondeu Mestre Cassiano. – Apenas elixires com materiais que foram dados por eles, mas isso não é limitante pelo que já temos. Achar grandes quantidades de matéria-prima é fácil hoje em dia, mas as fórmulas são as mais caras do mercado.
– E já cuidamos disso também. – Orion mirou o dedo para o canto do laboratório, onde um caixote largo de uma madeira antiga se escondia entre vassouras e panos. – Cerca de cinquenta Receitas Simples, vinte Compostas e três de Alto Efeito.
Esperando uma reação de choque, Lumiere apenas foi até o caixote e o abriu. Pegou um ou outro e depois encarou os nomes dos cadernos.
– Isso aqui não é uma receita. – Ficou de pé. Virou-se com um deles aberto. – É um manual de como aprimorar cada uma das que já existe e também um esboço de novas criações. – Mirou Orion, com descrença. – Como conseguiu isso?
Eu estudei quando queria achar um jeito de ter mana.
– Recebi de um dos meus patrocinadores de VilaVelha – mentiu sobriamente. – Tivemos um acordo e essa foi a recompensa. Uma semana de produção, Lumire, o quanto conseguir, mas tenha um descanso de 15 horas, pelo menos. Quando estiver descansado, Rasgun Baker vai vir coletar o que já produzido. Você pode deixar anotado o que ele deve fazer também se quiser. Ele é um antigo Mestre de Alquimia, nos tempos da guerra.
– Rasgun Baker está vivo?
Ela jogou o caderno dentro do caixote e foi até Orion, o segurou pelo ombro, desnorteada.
– Ele realmente está vivo?
– Ele é meu tio – declarou Wallace. – Depois da guerra, ele se perdeu em estudos, um dos Escolásticos de Alquimia mais incríveis que temos.
– E tentou ajudar bastante Orion quando era pequeno. – Cassiano passou a mão na cabeça de Orion, sorrindo. – Agora, ele tem um lugar pra ficar.
Lumiere passou a mão nos olhos, encheram de água. Essa mulher tinha um sentimento muito grande pela criação, como Orion bem sabia. E não esperava que fosse tão emocionante assim estar num lugar que a valorizava.
Bom, isso aconteceu quando ele ganhou a vontade de Maio e pôde conjurar magias. Houve dias onde chorava como uma criança, ainda sem acreditar. Acordava, as vezes, pensando tudo ser um sonho.
Não era. Ele podia realmente conjurar a magia. E Lumiere poderia estar com o que amava.