Passos Arcanos - Capítulo 223
Um dos homens mais perigosos do mundo inteiro. Jaimes Harrigan não era apenas o Papa Oculto, ele era o escudo e a espada do Clero. Agia nas sombras, protegendo os maiores interesses da sua organização, e poucas vezes aparecia em público.
Só conhecia seu nome por um único motivo; Oliver Baker.
– Nas Caldeiras de Ilhotas – disse Jaimes –, eu soube de um jovem chamado Omar Baker. Ele roubou um Tesouro Sagrado e fundou sua própria organização. Tive que enfrentá-lo algumas vezes, você deve conhecê-lo, certo?
Responda uma de suas sentenças e sua mente se vai completamente.
Orion o ignorou, virando-se.
– Carsseral, você pode se mover?
– Mais do que antes. Esse maldito Papa ainda está restringindo minha mana. – O Dragão mexia a cabeça de um lado para o outro, mas seu corpo esticado estalava pela crosta de gelo que havia se formado. – O que quer fazer?
– Volte para o Oceano Congelado. – Fitou o Papa Oculto no alto. – Vou enfrentá-lo sozinho.
– Está com essa confiança toda, Baker? – Jaimes puxou o capuz para trás, revelando seu rosto cinzento e seus cabelos brancos. – Ouvi muitos dizerem a mesma coisa e perderem.
– Assim como você não pode usar sua magia em mim, Jaimes, posso afirmar perfeitamente que não sou como esses que você enfrentou.
Uma imensa camada enegrecida adentrou o corpo de Orion ao responder. Tentavam buscar seu núcleo, irradiando uma imensa carga de dor. Paralisar o músculo e depois matar seu inimigo, assim se tornava a ‘Fala do Imperador’.
Jaimes se atentou mais ainda por não conseguir interferir naquele jovem. Seu núcleo absorvia a mana obscura, sem sucesso de travá-lo.
– Você é o portador daquela outra magia, não é? – Jaimes soltou um sorriso torto, e depois uma risada baixinha. – E achar que o antigo Homem que Conjura as Estrelas estaria aqui. – Ele olhou para seu braço. – Isso deixa ainda mais interessante as coisas. Seu corpo tem tudo o que meu irmão precisa para sobreviver, tirar sua vida sem prejudicar seu núcleo, e transplantar nele. Isso, isso.
Uma imensa presença se formou ao lado de Jaimes. Pego de surpresa, tentou girar o braço, mas algo o acertou na diagonal. Ele voou para baixo, acertando o solo. Dor, um pouco de dor se formou em seu ombro, um acerto quase em cheio.
E olhou para Orion Baker, ainda parado no lugar, apenas com seu dedo indicador esticado.
– Carsseral, vá agora – disse Orion.
O Dragão Prateado recuou seu corpo lentamente para a água, adentrando por último sua cabeça. Orion abaixou o braço e analisou o Papa Oculto, seus ombros e braços não eram firmes e seus olhos pareciam estar cheios de ansiedade.
Se o Papa quem comandava o Clero realmente precisava de sangue draconiano, ele tinha uma doença bem específica. Poderia perguntar, mas duvidava que teria a resposta. Ou poderia adentrar sua mente com a magia que Anneton tentou usar nele no Baile de Vidro.
Ler as memórias dele vai me dar uma vantagem gigante contra a Ordem e o Clero.
– O Homem que Conjura as Estrelas… – voltou a repetir Jaimes. – O poder imensurável que comandou os planos. A escritura estava realmente certa. – Olhou mais uma vez para Orion, não havia serenidade em seus olhos. – Por que você?
– Por que não?
– As histórias dizem que apenas uma criatura a cada milênios poderia ter a ferocidade e também serenidade de comandar as estrelas. Eu me preparei por décadas para recebê-lo, e não fui escolhido. – Suas mãos tremiam, mesmo sua face risonha era carregada de dor. – Escolherem um garoto, um garoto.
Jaimes desapareceu da visão de Orion e surgiu a sua esquerda. Rápido demais.
Cruzou os braços em frente ao punho, e uma imensa carga o lançou para longe, arrastando-se pelo gelo. Travou a sola e esticou os membros, suspirando. Somente um segundo, se não estivesse prestando atenção, seria superado em velocidade e força.
O Papa Oculto era conhecido por ser o homem que lidava com as maiores ameaças do Clero, mas nunca aparecia sem ter certeza da sua vitória. Ele tem mais cartas na manga, muito mais do que aparenta.
Era divertido, uma luta divertida até a morte. A sensação arrancava um sorriso sombrio de Orion. O sentimento de perder tudo o que construiu até aquele momento, de não ter mais como voltar para casa.
Se esse inimigo se mostrasse maior do que ele, seria uma morte clara. Mas, se Orion o superasse, duvidava que existia alguém no continente que pudesse rivalizar contra ele em força e mana. Jaimes Harrigan era um pico alto demais para se escalar com sobriedade.
– Você é estranho – disse o Papa Oculto. – Está sorrindo quando sabe que vai morrer.
– Gosto de pensar na possibilidade de que se eu conseguir sair daqui vivo, vou ficar ainda mais forte.
– Morto – cuspiu Jaimes. – É como vai sair daqui, garoto.
Eles entraram novamente em confronto. Os braços de Jaimes pareciam dois elásticos que escondiam o movimento até o último instante, e a palma de Orion se tornava uma rocha incapaz de ser superada.
Giraram, pularam e até mesmo usaram cabeçada, mas não se moveram do centro do gelo. Depois que Jaimes arqueou o braço e esticou dois dedos para frente, ali foi a chance de Orion. Repetir o mesmo ataque contra mim?
Mais rápido do que o Papa, Orion agarrou o pulso de Jaimes, liberou uma imensa carga de mana nas pernas, saltou na mesma posição e chutou. O impacto o arremessou longe, ainda de pé. Orion não viu sua vantagem já que teve que levantar e se preparar velozmente.
Novamente, os dois trocaram golpes. Jaimes tentou agarrar sua garganta como uma águia e errou as três vezes. Orion fechou a palma e socou o ar. Contorcendo o espaço e estando um metro dele, afastou Jaimes mais dois metros. E quando observou que ele faria uma segunda investida, abriu a palma.
– ‘Somat: Palma da Primavera’.
Incontáveis mãos surgiram no ar ao mesmo tempo. Orion conjurou Somat apenas para mantê-lo distante, e elas atravessaram o corpo de Jaimes como se não fosse nada. O Papa simplesmente passou pela sua magia.
– ‘Arte Divina: Pedra Solar’.
As veias do braço de Jaimes enrijeceram e se incendiaram. Sua pele se transformou em pedra e suas veias em fogo. Orion abriu a boca, chocado.
– ‘Hidro: Expulsão Vórtice’.
Água girou ao seu redor e o punho flamejante o acertou um segundo depois. Um brilho e fumaça se espalharam, o chão gélido trincou, porém Jaimes não recuou. Ele apareceu pela lateral mais uma vez, e seu braço ainda brilhava.
Orion abriu a boca, mais impressionado ainda.
– O senhor é incrível.
A barreira de água se desfez velozmente e Orion separou os dois braços e pernas, esperando pelo movimento. Jaimes se atentou no rapaz ainda mais. A palma dele.
Antes de aplicar o soco, trocou a posição e foi com a perna. A mana rapidamente desceu, aplicando a mesma arte divina.
– Morra, Baker. ‘Arte Divina: Perna de Apollo’.
– Venha. ‘Vellos: Explosão Muscular’.
Uma dezena de braços se formou ao redor de si. Jaimes atacou com força, mas não toda. Ainda estava estudando seu inimigo, mas ficou impressionado quando a Perna de Apollo foi segurado por aqueles dez braços.
Vellos era uma magia de velocidade, e diferente do costume, era recheado de mistérios que envolviam a mente humana. Jaimes teve sua perna agarrada pelas dez, mas no momento seguinte, elas desapareceram, sobrando apenas duas.
E num puxão giratório, ele começou a rotacionar por causa de Orion.
– Vamos deixar mais divertido, senhor. – Orion o arremessou para o alto. Jaimes girou no alto várias vezes até se estabilizar e quando olhou para o chão, avistou uma runa formada debaixo dos pés de Orion e seus ombros tremendo. – ‘Lyn: Raio do Criador’. – E o dedo indicador apontou-se para cima. – Símbolo Ferro, Implementar.
Jaimes recebeu uma marca, sentiu em seu interior. Ele ficou ainda mais impressionado, esse movimento era raro até mesmo entre Arche-Magos de Quinto Núcleo. Ele havia enfrentado Nero e Maverick, até mesmo os diretores das Academias Mágicas no passado, e jamais teve a sensação nefasta que sentiu naquele instante.
Nenhum oponente lhe passou o nervosismo.
As nuvens acima dele brilharam. E uma luz atravessou o espaço e seu corpo. Os relâmpagos produziam clarões ao passarem pelo Papa Oculto, e Orion continuou com seu dedo apontado. Quanto mais tempo passava, mais sua mana era convertida em elemento e mais sua força se esvaia.
Tenho que segurar mais um pouco. Só mais um pouco.
– Isso não vai funcionar comigo. – A voz de Jaimes penetrou o ar até ele. – Assim como sua performance de esperar Carsseral se recuperar. Assim como ele teve sua ajuda, meus subordinados também estão presentes.
Aquilo deixou Orion preocupado. Ele enviou um sinal mental, penetrou as águas congeladas e se dirigiu até o fundo do Oceano Congelado. Lá avistou uma cena surreal, cobras gigantes, de quase cem metros, enfrentavam Carsseral.
As bocas das cobras brilhavam e suas bocas soltavam um líquido esverdeado por cima da escama. Veneno de Dormência.
– Baker – a voz de Carsseral era assustada. – Eles estão me paralisando. Merda, esses humanos. Não posso me mexer. Ainda estou… fraco.
Jaimes apareceu mais uma vez como uma sombra e seus dedos esticados carregavam centelhas azuladas providas dos relâmpagos atacados. Um segundo desatento, um segundo com seu foco em dois lugares, e o Papa imaginou e criou sua chance.
– Seu corpo é meu – gritou Jaimes.
Os olhos de Orion voltaram a focá-lo.
– Nem fodendo.
Movendo seus dedos para frente, imitando o Papa, sua conversão não foi elementar, e sim muscular. A Magia da Escola de Força tinha sido ativada num ponto preciso demais, convergido para um impulso maior com área reduzida.
Os dois bateram no mesmo instante, explodindo todo o gelo numa área de quase vinte metros quadrados. Blocos de gelo se levantaram, fumaça e neve se misturaram, a água cristalina do Oceano Congelado refletiu o fraco sol que lutava contra as nuvens formadas.
A pressão chamou atenção dos Baker e dos Bispos.