Passos Arcanos - Capítulo 225
Anneton tinha Prisma, Heda e Groi ao seu lado enquanto corriam de um lado pro outro dentro de VilaVelha. A cidade tinha sido atacada novamente, duas Torres Mágicas foram destroçadas e mandadas a escombros, ferindo dezenas de Magos e aprendizes.
Era a quarta daquele mês. E todas de um jeito parecido. Fogo vindo do chão, subindo até o teto e explodindo o meio da torre, gerando explosões para todos os lados. Casas e lojas destruídas, além de centenas de civis tendo que se realocados.
Prisma levava os feridos e Heda ajudava os curandeiros como podia. Groi parou em um canto para analisar as estruturas e como ocorreu o evento. Naquela praça, a quantidade de Arche-Magos reunidos era quase semelhante em um trincheira em Archaboom.
Mais de cem, atraídos para a luz como vaga-lumes. Anneton não queria acreditar que aquilo era só coincidência, o mesmo tipo de explosão ocorrendo em quatro lugares distintos. Alguém estava por trás e queria a atenção de todos ali.
Não havia como os Sacerdotes terem se infiltrado em VilaVelha. Os portões eram energizados com uma magia passiva para detectar qualquer anomalia vinda das Artes Divinas. Se houvesse um jeito, qualquer que fosse, teria que passar pelo Conselho dos Doze, a Justiça Mágica e os Grande Magos que protegiam o Masquerati.
Além dos velhos do Conselho Negro, tão antigos quanto a cidade, e sensitivos ao ponto de sentirem qualquer instabilidade num raio quase continental.
E foi nesse pensamento que Anneton foi acordado rapidamente por um mensageiro.
– Senhor – o jovem Kevin apareceu correndo –, Jinx do Conselho Negro pediu para entregar uma mensagem urgente.
– O que é?
O rosto do garoto era de espanto.
– Uma magia de Grau Nove foi ativada na Costa Congelada, no Extremo Norte. E eles sentiram um pico de mana que ultrapassa os valores dos Orbes Centralizados de Theodoro.
– Grau Nove? – Procurou em sua mente algum Arche-Mago além de Nero ou Maverick que poderiam utilizar tal magia. Nada além de dois senhores antigos que não usariam essa jogada para algo de extrema importância. – E que magia é?
– Eles disseram que parece ser algum tipo de barreira espelhada. A Justiça Mágica foi acionada e três Justiceiros estão partindo para lá imediatamente.
Kevin esperou uma resposta. Anneton olhou mais uma vez para a torre desabada em escombros, a sujeira e também o nível de silêncio ao redor. Muitos acontecimentos de uma só vez, isso era estranho.
O Clero não faria algo tão impertinente apenas para chamar atenção do Norte. A explosão das torres e o Norte não estavam ligados.
– E quem deveria ser o inimigo?
– Ai que está, senhor Anneton. – Kevin engoliu em seco. – A mana elementar captada no orbe diz que vem de uma Sacerdote muito poderoso. O Mestre Jinx tem certeza que é o Papa Oculto.
O brilho dos olhos de Anneton desapareceram.
– E quem está fazendo a magia espelhada? – sua voz saiu rouca. – Não me diga…
– É um Baker, senhor. – Mais ainda, Kevin ficava nervoso. – Mestre Jinx solicita uma reunião urgente com o Conselho dos Doze. Todos do Conselho.
– Isso vai demorar horas para ser conseguido.
– Ele disse que arranjou tudo.
– Merda, moleque. – Anneton rapidamente começou a andar. – Devia ter dito isso desde o começo.
I
– Orion precisa de vocês, agora – Nero disse assim que encontrou Wallace e Heivor no pátio da Primeira Casa. Haviam retornado juntos da Torre Eterna, mas ficaram surpresos por não terem sido recebidos.
Cada Grande Casa estava solitária, como se todos houvessem desaparecido misteriosamente. Nem mesmo os empregados limpavam. Os cavalos sumiram e o ar parecia mais rarefeito, difícil de respirar.
E Nero surgiu da porta como um fantasma.
– Agora – continuou o Imperador –, eles estão enfrentando um grupo de Bispos.
Wallace ofegou e olhou para longe. Nero notou que era a direção onde o recente surto de mana foi sentido. Eles realmente conseguem sentir um ao outro.
– Eu vou agora. – Ele girou no eixo e seguiu adiante. – Heivor, fique e tome conta de sua família. Essa é uma batalha pessoal.
– Está subestimando minha família, Wallace Baker?
Ele parou e olhou para trás. Na porta da Segunda Casa, um imenso grupo da Tribo Mestiça já estava reunido. Nem mesmo precisou ser avisado, eles já se preparavam para a batalha, de trajes leves e armas em mãos.
Nero ficou impressionado. Jamais esperou que aquele povo que veio de outro continente fosse receber uma luta de forma tão amigável. Lealdade não se forjava com dinheiro, se formava pelo laço.
– Nós vamos com você – Heivor disse. – Como forma de pagar nossa dívida pessoal.
– Faça o que quiser. – Wallace deu um sorriso. – Só não me atrapalhe, Lobo.
Nero uniu as mãos e depois as separou, usando posições diferentes de dedos para conjurar uma magia espacial. Ele não era como Orion que podia abrir portais a qualquer momento, precisava de uma reserve mágica enorme e também de tempo.
Entretanto, recebeu dicas valiosas do Líder dos Baker, que aceleravam esse processo. Nas palavras de Orion, o espaço poderia ser deformado por qualquer mago, independente da Escola que ele pertencia.
E Nero acreditou cegamente nisso depois da primeira vez que conseguiu teleportar uma maça de uma ponta da mesa para a outra. Ele é um gênio a frente do nosso tempo.
O portal se abriu em cor azulada primeiramente, perdendo seu brilho para um transparente. Já era possível ver o outro lado. O tamanho de dois metros consumia muito de Nero. O velho Imperador já arfava com uma dor latente em seu peito.
– Vão, não vou aguentar muito tempo.
Wallace puxou seu machado e correu. Heivor e sua tribo seguiram logo atrás.
I
– Que merda foi essa? – Darius e Ramos foram puxados por Monique na mesma hora. Escaparam, por sorte, de dois movimentos mortais de espadas. Cassiano Baker e o Ancião Dest que conjurou uma lança elementar de raio e perfurou quase dez metros de puro gelo.
Monique ficou chocada demais. Aquele surto ainda ocorria, a aura misturava-se com a mana no ar, criando um imenso desconforto. Mais de cem pessoas, não, não eram pessoas normais. Eram os Baker, antiga parte de sua família.
A posição que se encontravam na história era única. Os Cães Imortais, a lenda das trincheiras, os conquistadores de terras. Agora sem as amarras que os prendiam. Ficar mais tempo naquela batalha seria desastrosa.
– Bispo Rudolf, use a Caixa Miserável e pegue Carsseral. – Ela passou por Ramos e Darius. – Não importa como, não deixem que o Dragão fuja. Para proteger o Papa.
– O que pensa que vai fazer? – Darius se levantou. – Eles são muitos.
De repente, outro portal abriu longe. Mais pessoas saíram, Monique reconheceu o grandalhão com o machado. A cada segundo, a chance de vencer diminuía. Se fosse apenas Orion Baker, a vitória já teria um custo enorme, mas a família inteira estava reunida e a Tribo Mestiça também.
No último embate do Clero, apenas um Baker foi suficiente para arrancar cem membros do Círculo de Lumos. Monique sabia o estrago que aquela família tinha capacidade de trazer. Porque, no final das contas, ela também era uma.
– Orion sempre possuiu três alicerces emocionais. – Gravou a posição de Oliver Baker. – Seu pai, que o prendeu nas amarras do Arcanismo. – Fitou Cassiano Baker. – O homem que o ensinou o caminho da espada. – E o grandalhão que corria ao seu encontro. – E aquele que nunca deixou que desistisse. Para destruir o líder dos Baker, eu só preciso matar esses três.
Ela uniu a mão e libertou sua mana. A energia presente era semelhante aos dos Baker, muito limitada por ser somente uma, mas na mesma proporção de vontade. Os Bispos recuados engoliram em seco.
Recordaram-se do que o mercenário Buck tinha lhes dito:
– Ela não é uma mulher comum.
– Mestre Rudolf – Monique o chamou bem alto. – Pegue o Dragão, eu cuido dos Baker. – Ela tocou o gelo da costa e respirou profundamente. – Jamais pensei que usaria Arcanismo Comum de novo, mas você não me deu escolha, Orion. Espero que entenda. ‘Epik: Construção do Domínio Turvo’.
Uma imensa tremedeira abalou as terras nevadas mais um vez. Monique encarou a sua frente. Blocos de concreto se ergueram em diversos pontos, mais de cem deles, ao redor da família Baker e se espalhando rapidamente.
Buracos quadriculados do tamanho de uma cabeça começaram a deformar as paredes desses prédios de pedra. Oliver e Cassiano recuaram mais para perto, chamando os Baker e conjurando uma barreira.
– Queria que isso fosse suficiente. – Monique fez outra runa e levou a mão em seu peito. – ‘Vellos: Rastro Inatingível’. – Outra runa cresceu em sua palma, mas fechada. – ‘Lyn: Efeito da Calda Elétrica’.
Ao fechar seus olhos, deixou-se ir adiante. Seu corpo passou pelo primeiro quadrado e saiu em disparada para outro. Uma sombra, foi no que se transformou. A leveza em seu corpo e condução fácil de uma ponta a outra. Entrava em um dos quadrados e saía no outro, libertando um rastro de centelhas por onde passava.
Em dez segundos no meio da magia, um milhão de fragmentos elétricos foram criados e deixados a deriva no ar. Ela subiu e pairou no ar, apontando seu dedo indicador para baixo.
– ‘Lyn: Alvo na Mira’.
Os fragmentos que giravam lentamente pararam e miraram para o chão. E se estenderam, milhares deles. Monique olhou para mais longe, onde Orion e Jaimes trocavam golpes. E depois para Carsseral, que estava adormecendo por causa do veneno das Cobras.
A vitória seria dela, de uma maneira ou de outra.
– Desçam.
Os raios foram puxados para baixo.
Cassiano encaixou sua espada na cintura. Sua espada não procurava mais por sangue desde sua aposentadoria. Ao seu lado, Oliver tinha uma espada em mãos e uma perna dobrada por causa do ferimento antigo.
Atrás dele, seus aprendizes por décadas, de quase três gerações. Além dos Anciãos.
– Uma espada que não sabe cortar. – Ele puxou a mana para seu pulso, forçando a postura mais sólida. – É só uma ferramenta sem utilidade. ‘Vellos: Ceifadora Cinzenta dos Baker.’.
Ao mesmo tempo, Orion ergueu sua atenção. Ele olhou para onde os prédios haviam tapado sua visão, sua família foi presa naquele mundo criado para uma magia de contenção. Monique apontando seu dedo no alto, e Carsseral sendo drenado.
E o sentimento em seu peito, de uma magia proibida que causava a morte. Uma espada sem lâmina que cortava o vazio e eliminava seu adversário. Algo criado por um Mestre de Espadas, nos primeiros anos da família Baker, depois de Tania.
O coração de seu portador colocado na lâmina, para que tudo que fosse considerado inimigo tivesse suas cinzas levadas para o inferno.
– Mestre, não. – Ele ergueu o Sol Negro pela pele e apontou sua mão para lá.
A sução emergiu em todo o complexo. Jaimes Harrigan, entretanto, ainda estava ali. Num soco furioso, o jogou para longe, e o empurrou contra uma placa de gelo de pé. Seu braço se tornou duas vezes maior e cheio de chamas azuladas.
– Você não pode proteger eles e a si ao mesmo tempo.
Orion ainda tinha o braço apontado para frente, visando Monique e Cassiano. E recebeu outro golpe no peito, cuspindo sangue. Depois apontou para Carsseral, que rugia docilmente, sendo carregado para dentro do Oceano Congelado mais uma vez.
Não posso perdê-los. Não agora.
Jaimes o arrebentou mais cinco socos, destruindo qualquer resistência elementar ao seu redor. Orion tentou forjar uma runa, mas o punho cheio de elementos variados e implementado com magia de força a quebrou no meio.
– Não pode fazer mais nada para se salvar, Baker. – Jaimes mostrou um sorriso ensanguentado. Ele, quem não poderia lutar por muito tempo, também tinha danos severos em seus órgãos e seu núcleo divino. – Os Baker… perderam.