Passos Arcanos - Capítulo 257
— Eles foram embora — anunciou Tito dos degraus. — Não causaram problemas em nada na cidade, mas viram bastante do que temos aqui. Tenho certeza que fizeram uma ronda.
Orion não descartou a ideia de que as famílias nobres procuravam por brechas, mas os Trindade tinham uma descrição bem detalhada de cada um dos membros importante de Vila Velha, e decorar seus rostos e nomes não era difícil.
— Isso é só, Tito. Obrigado.
O Arqueiro voltou a descer as escadas da ameia, o deixando com Martin Crons sozinho novamente.
— O que acha que vai acontecer daqui pra frente? — Martin perguntou. — Eles podem vir querendo uma briga. Nada contra, eu amassaria a cara deles na neve com vontade.
— Não é hora para provocá-los. Vila Velha está sob pressão constante do Clero agora que as notícias de que foram atacados vazou. — Demorou bastante, mas o Jornal Continental deu uma força. — Seu irmão se casar também é uma boa estratégia das famílias se unirem. O único problema é a Ordem dos Magos ficar exposta, isso traria bastante problemas monetários para todas as nossas empresas por lá.
Martin coçou o nariz e deu de ombros.
— Eu não ligo para nada lá. Meus irmãos sempre tiveram a benção do meu pai, que se afoguem nesses casamentos de merda. — Apontou para si, com uma cara divertida. — Sou um homem livre, e também serei o mais forte. Preciso ir atrás de oponentes mais fortes sempre para atingir o ápice.
Um desejo tão ardente, Orion o acompanhava nisso.
— Tem um lugar bem interessante que você vai gostar. Vai estar cheio de Sacerdotes e Bispos, uma imensa festa de oponentes que vão te atacar assim que pisar lá.
— Oh, isso é sério mesmo? E onde é?
— Antes, preciso te explicar a trajetória dos planos. — Orion acenou para a muralha, tomando a caminhar. A Grande Casa e o Terreno dos Trindade ficavam bem a vista dali de cima, a neve cobria seus telhados como uma manta, e podia-se ouvir as pessoas conversando das janelas e sacadas altas. — Vila Velha tendo aquele golpe bem fundo, a Ordem perdeu quase todas a moral no campo de batalha. Travamos cerca de quatro pontos principais e mais dez conflitos de interesse pequenos. Archaboom e Campanário não são interessantes para nós agora, mas a Travessia de Ignolio está sujeita a se tornar o próximo campo de batalha. O Rei Relâmpago é um título de poder e fama.
Martin bateu em sua própria mão.
— Quer que eu vá lá e destrua a ponte.
— Não, claro que não. — A resposta clara e objetiva tirava risos de Orion. — Está na hora de libertarmos a ponte. Nosso lucro pessoal com ervas já foi mais do que suficiente para deixar os Elfos cientes de que temos capacidade para superá-los em extração e eficiência nos elixires. Agora, nosso foco será os minérios da Montanha Azul que compramos.
— Você tem muitos planos, sua cabeça funciona assim sempre?
— Queria que parasse de vez em quando, mas não tenho mais tempo pra relaxar. Essa cidade inteira está nas minhas mãos, e preciso de muita ajuda para mantê-la intacta. — Via a nova feira e as comidas oferecidas para os moradores, além de um grupo de Cavaleiros cuidando também dos mais idosos. — Quero que seja o suficiente para acharem ser sortudos de viverem longe daquele monte de sangue e morte.
— Te acho mais estranho sempre que o tempo passa, sabia? — Martin foi até a beirada e apontou lá pra baixo. — Essas pessoas vivem aqui e dependem uma das outras. Você diz que quer manter todas longe da guera, mas você mesmo se enfia em cada batalha. Por quê?
— É uma boa pergunta. No começo, achava que precisava derramar sangue e dizimar corpos para chegar ao meu objetivo, mas um Mago antigo me disse que a vida vai além da guerra, da espada e da magia. — Ele ainda morava nas Caldeiras, ajudando Silena Vidian. — Aquele Mago falou que eu podia ajudar muita gente, mas precisei de mais de mil anos para entender isso.
— Mais… de mil anos? — O rosto de Martin ficou branco. — Como assim?
Numa gargalhada, Orion mudou de assunto.
— Outra hora eu conto essa história. Eu te darei Wallace e Heivor Lobo para a Travessia de Ignolio. Terá dois dias para tomar aquela ponte de volta para os Magos, isso fará sua fama se alastrar pela Ordem.
— Dois dias? Está brincando? — Esticando o braço, faíscas azuladas fluíram pela pele até a ponta dos de dedos. O olhar determinado, o que sempre estava preparado para uma batalha, surgiu envolvido em chamas. — Eu faço em um dia e sozinho.
— Acredito em você, mas não vou arriscar perder o Rei Relâmpago. Imagine se o Clero consegue te capturar, terei que destruir cada cidade deles atrás de você. — Orion balançou a cabeça o deixando voltar a sua face comum. — Será um desastre. Preciso de você bem e inteiro. Parte amanhã cedo, e deixe Wallace conversar com os Comandantes da Ordem na ponte.
O Mago de Raios cuspiu de lado, indignado.
— Politicagem não é comigo mesmo.
— Se te deixar mais animado, falarei com eles para que lute sozinho por um dia.
Ele se virou novamente com as chamas nos olhos.
— Isso, eu aceito isso.
Lidar com Martin Crons era simples e fácil. Um homem com objetivos claros e mentalidade linear, Orion tinha uma admiração por esse tipo de gente. Não porque poderia manipulá-lo, mas porque iriam aos confins do inferno pelo que ansiavam.
— Mestre Baker.
Mestre Cassiano subia os degraus das escadas da muralha. Ainda usava o roupão vermelho feito sob medido, com sua espada na cintura e uma postura ainda mais forte do que antes. Atrás dele, um outro homem que Orion reconheceu de imediato.
— Poulius. — Foi até seu encontro e abriu os braços. Os dois se abraçaram por um tempo. — Bom te ver, meu amigo.
A cara do antigo Selector estava ainda mais envelhecida, e cansada. Sua boca cortada nas laterais, o que parecia ter sido de mordidas próprias, uma típica ansiedade e estresse que se acumulou. Os cabelos perderam o brilho, não por completo, mas com algumas pontas brancas surgindo nas laterais.
Bem mais velho do que quando o encontrou da última vez.
— Foi uma viagem bem longa — disse Poulius ajeitando seu casaco escuro. — Perdi um cavalo no caminho. E um dos meus homens pegou gangrena.
— Um dos nossos Magos pode ajudá-lo. E uma perda importante, pedirei que outro cavalo seja dado a vocês.
O homem abanou a mão.
— São coisas pequenas. Sabíamos dos nossos riscos quando viemos a pé. Todos os Velhos Reis nos impediriam se viéssemos pelas correntes marinhas. — Arfou com pesar. — Tem sido bem caótico essas últimas semanas, ainda mais depois de… você sabe.
Orion segurou o ombro dele e apertou, o confortando.
— Joia estará conosco, Poulius. Sei bem disso.
— Ter ajudado na construção das pistas e caminhos foi muito importante. Eu mesmo não saberia nem por onde começar, mas todos da Ordem, incluindo Anneton, disseram que é um caso extremamente difícil.
Dar esperanças a um homem que perdeu sua filha mais de uma vez era tão difícil para a Ordem dos Magos? Orion ficava irritado só de pensar.
— O que eles te deixaram ter é apenas confiança de que ela vai voltar. Mestre Cassiano, peça para que acomodem todos na Grande Casa. Poulius ficará comigo pelo tempo que for, e diga para que preparem um ótimo banho. A roupa dele parece que foi cagada por mais de cinquenta cavalos adultos.
Martin deu uma risada. Só então Poulius reconheceu-o.
— Não esperava que estivesse aqui. O Imperador Nero não te convocou como Lança Externa, jovem?
— Eu não quis mais — respondeu Martin, cruzando os braços. — Agora estou junto com Orion, e vou tomar a Travessia de Ignolio amanhã. — Ao tomar a postura confiante, virou o rosto velozmente para cima. — Ah, eles começaram os treinos sem mim de novo. Orion, estou partindo.
Apenas acenou. Num salto para dentro da cidade, Martin se eletrificou por completo e riscou o ar para frente, na direção da Torre Mágica em seu centro. Assim que se aproximou, ele e seus raios desapareceram.
Impressionado, Poulius arqueou as sobrancelhas.
— A evolução dele foi bem diferente do que nós achávamos que ia acontecer. Amadureceu até mesmo a presença. Tinha talento, mas agora tem disciplina. — E parou de falar, apenas se tocando depois de tanto tempo. — Travessia de Ignolio, ele disse que ia tomar ela de volta? O que ele quis dizer com isso, Orion?
— Melhor conversamos debaixo de um teto. Precisa descansar — torceu o nariz em seguida. — E dar um jeito nessa sua roupa.