Perseguidos Pelo Tempo - Capítulo 26
— Em posição! Se preparem para lutar, agora!
Gritei e de imediato uma sombra surgiu do meio da floresta. Kitsu estava preparado para lançar uma magia de atordoamento na entidade que vinha correndo.
Só que percebemos que era apenas uma garota assustada, correndo como se sua vida dependesse daquilo.
E antes mesmo de falar algo, Nozomi já tinha a pegado bem a tempo de escapar dos seus perseguidores.
Quando saíram da escuridão da floresta, conseguimos ver seus rostos. Ogros da floresta, com musgo verde cobrindo suas costas e marretas de madeira em suas mãos, quatro deles.
— Daisuke! — gritou Nozomi e o enorme lobo já estava ao seu lado pronto para lutar. — Cuide dela, não deixe que ninguém a machuque!
— Vamos! Emi e Kitsu! — gritava enquanto os dois estavam bem atrás de mim.
Três dos enormes monstros vieram ao nosso encontro. Com apenas um olhar, os dois já sabiam o que fazer. Nos separamos, cada um para um lado e os ogros nos seguiram como esperado. Emi lançou suas facas nos braços da criatura e as puxou fazendo-as dividir os braços do monstro em pedaços.
E lançando somente uma novamente, a cabeça dele já estava no chão. Kitsu com sua agilidade, desviou do primeiro golpe e antes que o ogro pudesse desferir outro, o rapaz lançou um vento tão forte que fatiou o monstro em três.
Nozomi saltou nas costas de seu oponente e rapidamente fez um buraco em seu crânio com a lança. Uma guerreira nata não precisa de mais de um golpe para derrotar uma simples criatura.
O meu oponente foi um tanto mais astuto, lancei Mjonir e mesmo com uma velocidade incrível, conseguiu desviar da arma, mas não precisei me mexer, levantei meu braço e minha arma voltou fazendo um enorme buraco no peito da criatura.
— Ahaa! Isso sim é uma luta boa! — Kitsu gritou na hora que os corpos caíram no chão. — Nada de dragões ou caras com as forças de um gigante!
— Realmente, é a primeira luta que não quebrei nada, chega ser até um alívio. — Balancei Mjonir para tirar o sangue.
— Ei! Ainda não acabou, precisamos falar com a garota — avisou Emi.
— Ah, é verdade. — Me aproximei de Daisuke que a cobria. — Deixe a gente vê-lá, garoto.
O enorme lobo pulou, revelando a garota que causou toda essa confusão. Uma jovem de pelo menos 15 anos, seu braço estava quebrado e pelas roupas, parecia ser do vilarejo que saímos agora pouco.
Tentei ajudá-la, mas ela recuou assustada para perto de uma árvore. Todos tentaram e receberam o mesmo tratamento, até que Kitsu, um pouco atrasado, tentou falar com ela.
— Então garotinha, sabia que ficar em silêncio, depois de ser salva por um grupo bem desajustado, em alguns países é uma ofensa? — O seu rabo balançando a confortou um pouco.
Um pouco calma agora e corada pelo que Kitsu disse, finalmente falou: — Sou Alice, moro na… Vila dos Ossos.
— Vila dos Ossos? — Me abaixei devagar. — Você está falando da Vila de Adão?
— Não a chamam assim há muitos anos, hoje é conhecida como Vila dos Ossos. — disse Alice.
Deixo Kitsu conversando com ela, reunindo Emi e Nozomi perto da carroça, falei: — Não queria voltar para lá, mas é necessário, o que acham?
— Parece ser a nossa única opção e… queria saber um pouco mais sobre a cidade. — Emi sentou-se.
— Li os jornais, quero saber se aquela cidade representa esse reino, se não, temos que dar o fora. — falou Nozomi.
— Também estou curioso e Kitsu não deve reclamar.
Decidimos voltar à vila, o costume de fugir ainda estava ativo, então mesmo curioso quando a gente passou pelo lugar, queria sair dali o mais rápido possível. Era estranho, a terra estava muito boa para plantio, a vila era grande, o que significava que um dia foi próspera, o que aconteceu para que chegassem àquele estado?
Uma invasão? Uma guerra civil? Por que o rei não fez nada enquanto o seu povo morria de fome? Agora estou no meio disso e vou descobrir até o último desfecho.
Na carroça, agora voltando para a estrada, Alice estava cada vez mais calma e disposta a responder nossas perguntas. Por estar bem fraca, demos comida e água para que recuperasse suas forças.
— Ok, nós te alimentamos, agora precisamos de respostas. Primeiro, porque estava sozinha no meio de uma floresta como aquela? Segundo, seus pais sabem que você tinha saído sozinha? E terceiro, como sua vila chegou naquele estado?
Falei e logo percebi que fui rápido demais, então me afastei um pouco deixando Kitsu fazer as perguntas.
— Meu amigo fez as perguntas, agora é saber se você quer respondê-las, vai colaborar? — Kitsu sentou-se ao lado dela.
— Eu vim atrás de comida para meu irmão mais novo, meus pais não fazem ideia de que estava aqui.
— Ok, já é meio caminho andado, agora poderia nos dizer como se encontrou com os ogros?
— Ouvi alguns barulhos e achei uma pequena tribo, tinham tanta comida que não resisti, roubei algumas frutas, mas eles me viram.
— Certo e a sua vila? Dizem por aí que esse reino é rico e próspero, só que não está parecendo.
— Meus pais… podem explicar tudo.
Kitsu continuou conversando com ela e todos ficamos observando os dois. Até que Emi comentou:
— Kitsu é bem… perspicaz.
— E muito forte, acho que é um dos unicos que conseguiria me matar em uma disputa um vs um. Tive muita sorte dele ter me ajudado — comentei.
— Tem vezes que não consigo entendê-lo. — Nozomi continuava a guiar Daisuke. — É diferente do resto tribo, nosso líder diz que ele ainda não liberou todo o seu potencial, talvez no futuro e isso depende do que vamos enfrentar.
Continuamos por alguns minutos até chegar novamente na vila e aquele sentimento ruim voltou. Deixamos a garota nos guiar até sua casa, que não era diferente do resto da cidade.
Lama em volta, paredes de pedra prestes a cair com um empurrão, o telhado de palha que praticamente não tinha palha e um portão que caiu só de chegarmos perto.
A menina correu para dentro da casa e a acompanhamos até a porta. Entrou em um quarto onde ficava a cozinha e dois adultos estavam sentados de mãos dadas.
— Pai! Mãe! — Pulou nos dois abraçando-os bem forte.
— Alice? Alice! — A mulher respondeu o abraço. O homem a pegou e a rodopiou no ar, até tossir um pouco de sangue.
— Pai?! O senhor está bem?! — Sentou-se em uma cadeira e limpou a boca com um pano.
— Estou bem, só me mexi demais, é muito bom saber que não foi vendida ou morta, mas onde estava?! Ficamos preocupados, não queremos que aconteça nada com você!
—Fui… na floresta tentar arranjar algo para comermos…
— Na floresta?! — exclamou sua mãe. — Nós já falamos que não tem comida na floresta, só temos o que seu pai conseguiu semana retrasada.
— T-tudo bem! Um grupo de pessoas boas me ajudou a voltar para vila, alias, esqueci de convidá-los para entrar. — Seu pai hesitou um pouco e quis para-lá antes que deixasse pessoas estranhas entrarem dentro de casa, só que a garota já estava arrastando Kitsu e nós para dentro.
Quando o homem nos viu ficou branco, tremia como máquina-de-lavar centrifugando e segurou sua bengala com força.
— B-bem vindos! M-me desculpem a bagunça, querida, por favor, traga a eles um pouco de á-água. — O senhor não queria nos provocar, ficamos com cicatrizes pelo corpo todo e ainda tínhamos algumas feridas enfeixadas, era claro que sabíamos lutar.
Deixamos Daisuke de guarda da carroça para proteger nossas armas e comida. O homem nos ofereceu comida e lugar para sentarmos, os pratos estavam praticamente vazios e sujos. Olhei para o grupo e tomei a fala.
— Me desculpe, mas já que trouxemos sua filha de volta, poderia nos fazer um favor? — falei com calma e sem fazer movimentos bruscos, só que o homem entrou em desespero.
— Não temos dinheiro! Eu juro! Não queremos confusão, desculpe minha filha causar tantos problemas para vocês! — O senhor se colocou de joelhos pedindo para que não fizéssemos nada contra sua família.
Olhei novamente para todos e não sabíamos o que fazer. — Então… não queremos dinheiro, nós precisamos de informação do que aconteceu com a vila e se o reino está em ruínas.
— Informação…? Só querem informações? — Contamos para onde estávamos indo e o que lemos no jornal. — Ah! me desculpem o meu desespero, não é todo dia que se encontra com forasteiros e sempre que alguém novo chega, não é nada bom.
Nozomi vem a frente. — O que aconteceu com esse lugar? Houve uma guerra? Porque tudo está destruído desse jeito?
— Bom, como essas ruínas mostram, a Vila de Adão já foi uma cidade próspera e rica. No tempo de meu pai vivíamos sem fome e todos tinham o que comer, éramos um ponto comercial muito rico. Mas quando o nosso lorde morreu, tudo foi de mal a pior. — Ficamos focados nas palavras dele. — O novo dono das terras recebeu uma proposta tentadora. Já que a cidade se tornou um ponto comercial, algumas cidades no reino de Mists começaram a perder muito dinheiro.
— O reino de Mists, é? Dizem que o seu rei é ganancioso e sem piedade. — Disfarcei e bebi um pouco de água enquanto olhava para a janela.
— Pois estão certos, o Rei de Mists fechou um acordo com o nosso lorde. Enquanto a cidade estiver fora de funcionamento, receberia montanhas de dinheiro. Então o acordo foi feito e tudo começou. — Bebeu um gole d’água e continuou: — Soltaram centenas de monstros pela floresta e bandidos começaram a saquear tudo. Nossos guardas não aguentaram e logo desistiram. Os monstros não permitiam novos mercadores de entrar na cidade e pouco a pouco tudo ruiu.