Projeto Karma - Capítulo 7
— Não entendo o motivo do espanto, pode não ser o local mais lucrativo. Mas nem tudo nessa vida são lucros diretos — ela passou por mim.
— Ainda temos que conversar, mas esse também não é o lugar mais adequado. Sábado está livre? — Ela se virou para mim.
— Sim. Qual será o local de encontro? — Inclinei levemente minha cabeça para o lado.
— Vai me deixar escolher. Interessante, vejamos que tal aqui mesmo — seus dedos tocaram seus lábios. Depois da resposta ela se virou e deixou o local.
— Ufa… — Suspirei.
— Realmente mulheres como ela, são perigosas.
Continuei a minha rotina normal. Alguns de seus aspectos me lembravam os de Gisel, sua forma de decidir as coisas e ser tão lógica em alguns momentos.
— Então quando conheceu Sophie? — uma das meninas da recepção me perguntou no horário do jantar. Eu estava sentado na cadeira olhando o tabuleiro de xadrez, com um livro de estudo na mão.
— Ontem, diria que foi um encontro estranho, na verdade — olhei para a recepcionista.
Seu nome era Veronika, cabelos castanhos médios e tinham cachos nas pontas. Seus olhos castanhos claros combinavam com sua pele com leve bronzeado.
Ela não era magra, mas seu corpo tinha curvas, suas roupas eram justas para demonstrar suas linhas naturais.
Seus óculos bege claros diferiam, o uniforme feminino caía bem nela. Sua altura de 1,75 m deixava sua imagem bastante equilibrada.
— Sua família é bastante rica na cidade. Talvez não seja impressionante para você que veio da cidade grande, mas ela estudou durante um bom tempo na capital de São Paulo. Parece ter se formado em uma faculdade federal por lá — Veronika comentou.
— Oh? Não parece tão impressionante. Todos podemos fazer algo assim, talvez alguns anos de estudo ou um cursinho bom, posso conseguir algo assim para você — comentei e continuei fazendo os meus movimentos.
— Você não parece a pessoa que se esforça para fazer algo assim — ela se aproximou da mesa.
— A vida não se resume a que faculdade você fez, de onde você partiu. Mas o que fez com isso, temos muitos doutores tolos. Sabedoria e conhecimento são coisas diferentes — fiz um movimento de xeque seguindo o livro.
— Algo mudou. Quero dizer, essa resposta não é algo que viria de você — ela estreitou os olhos.
— As pessoas são como os eventos na vida, elas mudam a cada situação. Suas escolhas decidem seus futuros, o que difere de boas e más escolhas são apenas os pontos de vista. Devemos aprender com o vento, se não podemos enfrentar algo, podemos apenas seguir seu fluxo e desviar — o movimento de xeque se encerrou com a queda da rainha, deixando meu lado do jogo frágil.
— Isso é bastante parecido com ditados sufistas. Tem lido coisas assim recentemente? — ela me olhou surpresa.
— Os livros podem nos ensinar muitas coisas, porém apenas vivência torna algumas coisas reais — derrubei meu rei, os movimentos seguintes me levariam para uma baixa possibilidade de vitória e uma grande chance de derrota. Minhas torres estavam presas, perdi meus dois cavalos e o bispo sobrevivente estava na linha de defesa do meu rei.
— Maron? — ela me olhou de uma maneira surpresa.
Olhei em uma determinada direção, diversas memórias da minha infância passaram rapidamente pela minha cabeça, todas elas estavam fragmentadas e misturas.
Até cessarem em apenas uma cena, uma jovem garota de cabelos curtos, bastante parecida com Sophie, estávamos correndo pela floresta quando vimos uma bela vista de um penhasco. As memórias nesse momento pareciam desacelerar e minha visão voltou ao normal.
— Desculpe… — olhei para o relógio da sala.
— Nossa, olha que horas já são!! — levantei da cadeira e vesti um avental bordo por cima da minha roupa social. Minha área hoje seria a catalogação de livros doados.
Tinha uma quantidade imensa de livros nessa área, muitos deles foram doados por outras cidades ou pessoas que viveram na cidade, mas após sua morte doaram todos os seus livros para cá.
Era um trabalho longo, tínhamos que catalogar e depois avaliar o estado dos livros. Quando estavam em um mau estado, dependia da importância do livro ser restaurado ou não.
A área de catalogação era grande, havia muitos livros pelas prateleiras e seus números se mantinham constantes. Quando tínhamos muitos livros repetidos, doamos eles para instituições de caridade ou ensino, caso elas também já os tenham.
Doamos para outra cidade e esse ciclo se repete bastante ao longo do ano.Mas o mais interessante dessa área é o acesso aos livros arquivados.
Lá estão todos os livros raros, importantes ou assinados por pessoas célebres. Até o momento, nunca pude entrar nesse lugar da biblioteca, mas tenho certa curiosidade para ver como é lá.
O final do dia finalmente chegou, troquei de roupa e me sentei no banco externo da biblioteca. O vento passava pelo meu corpo, estava tentando relaxar, meu corpo estava dolorido, devido às muitas pilhas de livros que tive que carregar e mover.
— Cof… cof… cof. — passei a mão pela minha garganta.
— Não posso ficar gripado — coloquei a mochila nas costas e me levantei andando até deixar a biblioteca.
Os dias se passaram devagar, depois de alguns dias meu corpo finalmente se acostumou a acordar cedo e a minha rotina de exercícios.
Contudo, estava cansado, então aproveitei o sábado para tomar um banho gelado com a poção de regeneração, criada por Tristan. Segui o processo e percebi que depois de um tempo a água se tornou um pouco verde, mergulhei meu corpo na banheira e relaxei por trinta minutos.
Meu corpo saiu do banho renovado, não sentia tantas dores como antes. Meu cansaço acumulado parecia ter diminuído também, me enxuguei e fui ao quarto. Coloquei roupas casuais e fui para a biblioteca me encontrar com Sophie.
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— Então, você realmente veio — seu olhar parecia calmo. Estava frio, ela usava uma camiseta longa preta com echarpe branco com detalhes em azul. Calças azul-escuro e uma bota branca combinando com sua bolsa pequena com detalhes em dourado. Seus lábios estavam brilhantes e seus rímeis bastante delineados.
— Sim, então o que tem a dizer? — Observei suas roupas.
Meu cabelo estava levemente bagunçado, usava calças jeans cinzas, camiseta preta com estampa e uma blusa cinza com detalhes em laranjas. Meus sapatos eram pretos e bastante comuns.
— Você é bem incisivo. Vamos me siga e é mais fácil demonstrar do que dizer. — ela abriu a biblioteca e não acendeu as luzes.
A luz de fora deixava um ar único, na parte interna, como retornar a época vitoriana, ainda mais vividos com os móveis antigos.
— Para onde estamos indo? — Seguimos para debaixo da escada da biblioteca e uma porta estofada preta, estava atrás dela.
— Não olhe desse jeito. Também me surpreendi quando Otto me mostrou essa porta. Era algo que apenas ele e o dono do local sabiam — a porta se abriu e entramos em um lugar conhecido por mim e desconhecido para Sophie.
Uma sala ampla com fundo branco, uma mesa que se estendia por quase todo local com muitas anotações pela parede. Entre papéis, livros, revistas e citações.
— Você não parece tão surpreso. — ela me olhou.
— Entende o que significa tudo isso? — Ela passou a mão por alguns livros.
— Sim, não… quero dizer… — Respirei fundo e me acalmei.
— Já estive aqui, mas foi há muito tempo… eu era pequeno e tinha apenas fragmentos. — Abri um dos livros e percebi a estranha língua.
— Parece chocado, também estou. Muitos desses livros estão em umas línguas mortas, não conseguimos decifrar esses idiomas locais e esquecidos — ela trouxe mais livros para perto.
— Porque alguém teria tantos livros como esse? — vasculhei alguns livros com Sophie até parar em um específico.
Era um livro que conseguia entender, era uma mistura de francês com algumas palavras norueguesas. O início do que seria chamado inglês.
— Nem tudo é como parece, nem tudo parece como é. Peças e charadas não são bobagens, apenas o intérprete não entende. Leia de trás para frente, de um lado para outro, de cima para baixo. Talvez assim tenha um momento de lucidez — essas palavras pareciam estranhas, monologuei.
— Traga um papel, talvez seja um código.
— Como você consegue ler isso?— ela me olhou e trouxe um papel e caneta.
— É difícil de explicar, olhei para as palavras e consegui entender. Talvez meu avô tenha me ensinado quando pequeno — menti descaradamente.
— Esse texto, me parece algum código ou instrução para algo — passei o olho para recordar as palavras lidas.
— A sala!! — levantei da cadeira e me abaixei olhando para debaixo da mesa. — Havia muitos rabiscos talhados na madeira.
— Era dessa maneira que ele anotava as informações — toquei os sinais entalhados percebendo sua forma.
— Bastante rústico diria — ela ajoelhou e olhou para outros entalhes.
— Podemos passar tinta na peça e colocar papéis brancos por cima — ela se levantou e me olhou.
— Como… quero dizer? Como, entendeu a charada? — Sophie inclinou a cabeça para o lado.
— Nem tudo é o que parece, é tudo parece como é. As coisas não são o que são, pois elas podem ser utilizadas para outras coisas. Ele fala sobre perspectivas, o estilete que salva alguém pode ser o mesmo que o assassino utilizou para tirar uma vida — passei a mão pelo texto.
— Peças e charadas não são bobagens, apenas o intérprete não entende. Ele afirma a primeira parte e implementa como nosso ambiente pode determinar nossas ações — meus dedos chegaram no final da página.
— Leia de trás para frente, de um lado para outro, de cima para baixo. Talvez assim tenha um momento de lucidez. Refere o quão próximo pode estar daquilo que deseja — fechei o livro.
— Mas, em que momento isso nos leva à mesa? — Ela deu dois passos para frente e se aproximou de mim.
— Próximo e óbvio. Apenas uma mudança de perspectiva é obterá a resposta, onde mais seria senão fosse a mesa? — toquei seu ombro e passei por ela.
— Talvez o que descubra, não seja exatamente o que deseja — fechei a porta e deixei a biblioteca.
O sol estava mais baixo e o calor do dia estava diminuindo, me sentei no banco na frente da biblioteca e olhei para as árvores próximas. Elas farfalhavam com o vento um cheiro de chuva parecia se aproximar.
— O fundo daquela mesa estava em completo amarelo — Monologue.
— O que amarelo significa exatamente? — respirei e tirei esse pensamento da minha cabeça.
— Nem todas as respostas são úteis Maron — coloquei minha mão sobre o sol.
— Meu avô diria algo desse tipo — sorri e me levantei.
— As respostas exteriores, apontam apenas as direções — monologuei e continuei andando em direção ao ponto de ônibus.
Havia um homem de máscara quebrada, apenas um de seus olhos eram visíveis e era cinza. Sua máscara era negra com detalhes elétricos envolta de seus olhos. Utilizava um sobretudo negro e vestia botas militares.
— Você… eu… nós — ele gargalhou.
— Então encontrou? — ele se levantou e correu na minha direção.
— Você ainda não sabe? — seus pés se moveram rápido e ele evadiu do meu corpo como um assassino profissional.
— Espero que entenda… — ele estalou os dedos.
Uma chuva torrencial começou a descer do céu, conseguia ver apenas as gotículas e uma névoa branca rodeou o lugar.
Minhas roupas ficaram ensopadas, me sentei no ponto de ônibus e tirei meus sapatos torcendo minhas meias. Demorou alguns minutos até finalmente a chuva diminuir a intensidade.
O ônibus se aproximou e seus vidros estavam todos embaçados. Coloquei meus sapatos e subi no ônibus. Era apenas eu e o motorista, sentei no último banco e olhei para a janela. Esse dia estava ficando estranho…
Coloquei minha mão no espelho, estiquei meu corpo para trás e respirei fundo. Desde aquele dia, nada foi igual às imagens da paisagem se passaram lentamente.
Meu corpo estava esquentando a roupa gelada, enquanto o meu sono parecia aumentar ao longo da viagem.
— Maron? — Alguém empurrou meu ombro e abri meus olhos.
— Veronika. O que está fazendo aqui? — bocejei e ajeitei meu corpo.
— Estou indo visitar meus parentes da cidade próxima. O dia parece ter sido longo para você — ela olhou minhas roupas e cobriu seu riso baixo.
— A chuva apenas decidiu que eu seria sua vítima — sorri e me levantei.
— Até a próxima oportunidade — Dei o sinal e desci do ônibus.
Nota do autor: “Para fortalecer a obra deixe seu comentário, ele é muito importante para nós autores!”
Desculpe o atraso, quase esqueci de postar o capítulo (Salvo pelo lembrete no celular)