Renascidos - Capítulo 5
Recadinho do Autor:
Bom, pessoal! Eu voltei recentemente a escrever já que ando com problemas no trabalho! Sempre que puderem, comentem! Adoro ler os comentários nos capítulos e isso me dá uma forcinha para continuar, muito obrigado!
Meu corpo parecia um saco de tijolos. Assim que acordei, notei estar dentro de uma cela de concreto com um gradeado simples. Estava sozinho, obviamente, e percebi que as feridas no meu corpo tinham sido tratadas. Embora houvesse luz nos corredores, as celas eram completamente mergulhadas em escuridão.
Tentei usar meu poder para levitar uma pequena pedrinha dentro da cela, ela voou até minha mão como se não fosse nada. Eu não era capaz de fazer aquilo tão bem antes. Algo mudou dentro de mim e soube desde o inicio que não foi para melhor. Tentei repetir o que fiz no restaurante. A pedrinha cruzou todo o espaço do meu controle e avançou como se fosse uma bala de rifle, estourando na parede.
— Que…? — eu me perguntei em voz alta — O meu poder fazia isso o tempo todo?
O silêncio me engoliu novamente. Fiquei assim pela próxima hora, perdido em meus próximos pensamentos. Pensei em Ângela, em Matias, nos meus pais, em Livia. Pensei em mim mesmo lutando como um monstro para salvar os importantes para mim e tive medo daquilo que eu me tornei.
Era como se eu estivesse me divertindo enquanto matava. Aquele pensamento me trouxe um calafrio na espinha. Como eu, um estudante universitário, poderia chegar naquele estado de frenesi em sã consciência? Era como se eu já não fosse mais aquele garoto que só queria estudar.
Escutei os passos de alguém se aproximando e me levantei da cama. Por algum motivo, eu sabia muito bem que só tinha eu naquele bloco. Conseguia escutar plenamente tudo nos arredores, com exceção do que se passava fora do ambiente, através das grades. Toda vez que tentava perceber o mundo lá fora, escutava tudo embaralhado com os sons dos carros e do comércio local. Já ia amanhecer em algum momento e eu me pegava pensando como tinha tanta certeza disso.
Comecei a contar quantos pares de pés eram. Três. Quatro. Fiquei preocupado que poderia ser morto a qualquer momento, já que tinha assassinado três indivíduos (os criminosos) pelo menos. A culpa transbordava dentro de mim e pensei nas vidas que interrompi e as famílias que baguncei naqueles atos, mesmo que eles fossem realizar uma atrocidade. Embora não entendesse muito bem como fiz para matá-los. Os passos se aproximaram o suficiente e as luzes da cela se acenderam.
Havia um guarda magro na frente como uma lanterna, mexendo nos disjuntores do lugar. Ao lado dele, uma mulher com vestes de oficial da polícia local estava de braços cruzados, me encarando. Ela usava muita maquiagem, mas seria bonita com ou sem. Os outros dois indivíduos eram chamativos, um era um rapaz com barba rala e cabelo coberto de gel para trás, de cor preta. Ele sorriu ao me ver, diferente do homem atrás dele, um homenzarrão de pelo menos dois metros e puro músculo, ele tinha cicatrizes nos enormes braços e não tinha cabelo.
A mulher tomou a dianteira.
— Lucas Hiro, você foi acusado de assassinato triplo dos três invasores do restaurante, porém, em legítima defesa — ela disse — O público tem medo de você nas ruas agora, pois a história chegou na televisão local, embora ao meu ver tinha sido necessário.
— É, bem, era eles ou o jovem Lucas — disse o grandão, que soava bem mais simpático do que aparentava.
— Sim, eu concordo — o mais baixo, barbado, sorriu para mim e piscou o olho.
— Então, nós da polícia temos três opções. Você seria extraditado para a ilha de isolamento, onde renascidos perigosos ficariam ou você ficaria preso em condicional, porém iria trabalhar na prisão daqui, sem chance de interações com o mundo lá fora, além de sua própria casa por dez anos.
As duas opções eram horríveis.
— E a última?
O barbudo se empolgou e abraçou o grandão com um dos braços.
— É aí que nós entramos — ele disse — Nossa guilda está interessada em você.
Guildas. As Guildas são lugares em que Renascidos com licença para atuar na segurança pública e combater criminosos dentro e fora da ilha se integram rotineiramente. Cada vez mais eu me vi longe desses locais no último mês, mas agora uma oportunidade dessas me apareceu só por causa de uma noite.
— Nós da Virtuos lutamos para proteger os Renascidos que querem viver uma vida comum — complementou o gigante — E você seria perfeito para nos ajudar.
— Mesmo depois de eu ter matado outras pessoas?
— Eles não eram pessoas — ele disse, ficando muito sério, ação que me deu um calafrio profundo — Planejavam usar vocês como catalisador para melhorar suas habilidades.
Meu coração bateu descompassado. Aquilo existia?
— E você protegeu as pessoas naquele lugar — a oficial disse, me surpreendendo. Eu achava que ela seria contra tudo isso — Nenhum deles teve outra opinião que não fosse a de você ter sido um herói, pois afinal você lutou para salvá-los.
Não consegui esconder meu sorriso.
— Nós manteremos você na linha, garoto — o barbudo disse — Meu nome é Otto e o grandão aqui é o Roberto.
— É um prazer — respondi, ainda tímido.
— Bem, vou pedir a liberação dele, podem conversar numa boa — ela disse — Mario, pode abrir a cela.
O Guarda concordou e abriu a cela para que Roberto e Otto entrassem. Eles me explicaram mais sobre a Guilda. Descobri que era uma espécie de lugar específico para pessoas que se meteram em problemas e tinham boas intenções. Além disso, aquela organização era de alto Rank, o Rank A, algo que eu nunca imaginei entrar em contato e que prezava pelo treinamento de novos Renascidos dentro dela.
— Bem, sua habilidade parecia inútil nos registros — Otto falou, sem medo de me magoar — Porém, quando eu vi as fotos da cena, eu percebi que não era um poder qualquer.
— Sim, seu poder se baseia em algo raramente visto — Roberto complementou.
— Tipo o que?
— Bem — Otto tirou um papel do bolso e olhou para o amigo — me vê uma caneta aí?
— Quanto despreparo — Roberto disse, cômico. Não consegui segurar a risada. Otto pegou a caneta e começou a desenhar.
— Você tem o poder de tomar o controle de objetos pequenos dentro de uma pequena área, provavelmente, não é?
— É isso mesmo — fiquei assustado com o rápido pensamento.
— Pois bem, você não só os manipula, mas pode acelerá-los e vetorizá-los.
Não entendi muito bem as explicações, pois não era muito bom em física. Em resumo, eu era plenamente capaz de tornar pequenos objetos em projéteis e também usá-los como armas sem ao menos empunhá-los. Ficamos um tempo conversando até o guarda me liberar.
— Bem, a má notícia, é que você deve evitar ficar muito em casa. — citou Roberto.
— Por que?
— De certa forma, as pessoas dos direitos humanos vão ficar em cima de você e fazer de tudo para você ser preso, vão encher o saco — Otto respondeu. Ele tirou um suco de caixinha do bolso — Mas fica tranquilo, você vai ficar de boa.
— Inclusive, uma garota veio aqui mais cedo, uma tal de Ângela — o guarda finalmente falou — Ela deixou um colar pra você e disse que queria te ver quando saísse.
Eu não parei de sorrir. Otto percebeu e me deu uns tapinhas nas costas.
— Vamos lá, garanhão, primeiro você vai pra Guilda, depois você vai ver sua “amiga”.
Os dois riram de mim, mas eu não me importei. Eu finalmente me senti incluído em algum lugar e fiquei ansioso para me integrar no meu novo trabalho, já que não poderia trabalhar mais no restaurante. Fiquei me perguntando o que me aguardaria lá?
——-
Roberto dirigiu o carro, uma van preta com o símbolo da Guilda: Uma águia circulada com lâminas desenhadas. Cruzamos a cidade por uns vinte minutos até subirmos uma ponte que atravessava o rio, passamos por uma área bem pobre, mas que os renascidos viviam com calma e tranquilidade. Chegamos em uma colina e paramos o carro. Vi um pequeno prédio muito bonito e bem iluminado com o símbolo da guilda. Havia um funcionário trabalhando nos arredores e ele acenou para Roberto quando ele saiu do carro.
— Recruta novo? — o velho funcionário me encarou. Os olhos dele brilharam forte, em uma cor verde não natural — Ele parece interessante, sua aura é de alguém que passou por muita coisa em pouco tempo.
— Ele é desses — disse Roberto. Ele olhou para mim, percebendo minha curiosidade — o velho Cain é o nosso sistema de segurança, seus olhos captam auras malignas quilômetros de distância.
— Ele enxerga isso? — olho pra ela impressionado — Parece um poder divertido.
— Não muito, é desconfortável ter que ver de tudo toda hora — ele riu. Otto foi o primeiro a passar pelo portão para acessar o prédio — Podemos conversar uma hora ou outra, garoto, e eu te conto pelo que eu já por conta desses olhos
— Bem, não temos tanto tempo, vai amanhecer daqui a pouco e o garoto precisa assinar os papéis. — Roberto parecia apressado.
— Papéis?
— Sim, para entrar na Guilda, é melhor fazermos isso agora antes que o povo do direitos humanos te encontre — essa frase me deixou bem preocupado.
— É isso, garoto! Bem vindo ao nosso grupo de desajustados — o velho completou e voltou a fazer sua ronda.
Entro no quartel general junto de Roberto. Parecia um lugar comum e tranquilo. Eu passei pelos jardins com Roberto e chegamos na entrada de porta automática. Passamos por um lindo hall de piso de granito branco e chegamos em um elevador. Ele apertou o botão do sétimo andar, de um total de onze. Ao olhar para mim, ele sorriu e esperou que eu entrasse naquele espaço confinado.
Esperei chegarmos até o objetivo mergulhados em um silêncio constrangedor. Andamos pelos corredores acarpetados e fomos direto para a última sala do andar, onde Roberto bateu na porta dupla de mogno. Fomos atendidos por Otto que abriu para que entrássemos. Aquela sala era extremamente decorada com quadrados bonitos e tinha dois sofás de couro posicionados de frente para uma mesa enorme de madeira, em frente a uma janela fechada com persianas com detalhes de lâminas.
Otto tomou a palavra, ficando ao lado da cadeira atrás da mesa. A poltrona enorme girou e percebi que uma senhorinha, vestida com um terninho preto e prendendo o cabelo branco em um coque, estava sentada ali, numa paz invejável. Não tardei a perceber que a senhora é cega.
Ela pigarrou e pegou algo da gaveta. Deixou alguns papéis em cima da mesa sem dificuldade alguma. Ela sorriu para mim e eu senti uma sensação parecida com a que me engoliu dentro do restaurante, como se algo muito maior do que eu estivesse na minha frente. Instintivamente eu me abaixei para ajoelhar, porém Roberto não deixou, me indicando para sentar no sofá. Otto trouxe a papelada enquanto me sentei, como se estivesse com a pressão baixa.
Respirei fundo, observando a senhora.
— Você é um bom garoto — ela disse — E sua habilidade vai nos ajudar bastante ainda.
— Ajudar como?
— Você tem um dever e um destino específicos que te levam a impedir o fim de outras pessoas, você é alguém que deve se dedicar ao bem alheio, assim como nós — ela disse, suas palavras me alcançaram como uma flecha diretamente no meu peito — Então, queremos que você se una a nós e nos ajude a fazer essa cidade melhor para nós, Renascidos que desejam viver uma vida comum.
Olhei para os papéis e Roberto me deu a caneta dele. Assinei sem pestanejar, como se minha vida toda tivesse sido direcionada para aquele momento, depois de assinar, a senhora se ergueu e andou até mim, como se soubesse exatamente onde tudo estava. Ela sorriu e esticou as mãos para pegar os papéis, que eu entreguei prontamente.
— É um prazer ter você conosco, Lucas Hiro — ela sabia meu nome e olhava diretamente para mim mesmo sem enxergar, como se encarasse a minha alma e soubesse todos os meus pecados — Meu nome é Ieda e sou a líder da Virtuos, iremos trabalhar para que a cidade se torne segura para aqueles que não conseguem se defender e não podem contar com a polícia.
Concordei com a cabeça e Roberto se levantou, me apontando a saída. Eu o segui apressado e finalmente saímos depois de nos despedir de Ieda.
— Ela é assustadora — falei assim que entramos no elevador — Ela parece muito…
— Forte, não é?
— Sim, mesmo sendo cega.
— Não julgue pela aparência, dentre todas as guildas, a nossa líder é a mais temida e poderosa, por isso respeite ela.
Engoli em seco e segui Roberto até o carro, para que pudesse voltar à minha casa. A partir daquele dia, eu me tornaria um dos membros da Virtuos, organização que, no futuro, poderia ser responsável por encontrar a paz em Alfa. Mas ainda estava muito longe e eu estava muito imaturo para perceber onde me meti e o que teria de fazer para alcançar o sucesso dessa missão impossível.