Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 105
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- Capítulo 105 - Putas wexessinas e forças especiais
— Onde estamos indo, capitão?
— Buscar algo — disse o líder. O vento empurrando suas vestes e capuz.
O pôr do sol ainda iluminava a estrada de terra batida que os aventureiros pisavam. Em meio ao nada e ao verde da floresta, logo mais seriam obrigados a montar acampamento. Embora a ideia de Beto não parecesse ser esta.
Eles já caminhavam desde muito antes, pouco tempo depois de cumprir a missão. O presidente da associação fez um chamado urgente, por carta. Ao lerem, apressaram a viagem, mal recebendo os agradecimentos do Lorde Protetor da República e partindo quase que de imediato para atender à ordem de Beto.
Ele se encontrou com os aventureiros há pouco e agora lhes passava a nova tarefa. Está de grau A. Teoricamente, o mais elevado que receberam até então.
— Onde? — perguntou o rufião Quebraescudos.
— Noroeste. Para Wex.
O mais franzino, o arqueiro, mostrou certa apreensão. Quase caiu da montaria, levando o amigo parrudo junto.
— O Ducado de Wex? Do Duque Wex? — perguntou.
Beto fez que sim, não se preocupando em dar maiores explicações. Isso no entanto não parecia importante para eles, que, de súpeto, passaram de uma atmosfera de cansaço para sorrisos cheios.
— Ei, Harold. Tá pensando o mesmo que eu? — Bert sussurrou.
O que recebeu de volta foi uma cabeçada empolgada do amigo, essa sim o tirando do cavalo que compartilhavam.
— Putas wexessinas! Hahahaha!
— As melhores de toda Mea. Soube que em Wex tem um bordel em que uma delas é sobrinha do próprio duque — respondeu o amigo, ignorando o sangue no nariz e as equimoses recém-adquiridas em variadas partes do rosto e da bunda.
Lerina, claro, não pôde deixar de dar sua bufada irritada de desaprovação. Quase que de modo instantâneo, variadas combinações de fórmulas químicas e misturas de ervas invadiram a mente. Fórmulas para terapia antagonista de testosterona — ou castração química temporária, no linguajar leigo.
Lerr, o espadachim, encarava-os com o mesmo olhar de desaprovação, contudo pensava em outras técnicas de castração. Ele tocou de leva o fio do punho de sua lâmina, ainda encapada, enquanto se lembrava de algo que parecia-lhe doloroso. Memórias do passado, talvez?
Ninguém sabe. Mas é certo que dias depois o incidente marcaria por algum tempo os mexericos citadinos de um certo lugarejo em Wex, culminando em várias moedas perdidas, garotas de programa muito felizes, rostos socados, cortes, bastardia e até em morte. Mas isso é história para outra ocasião.
…
Alguns dias haviam passado desde a declaração de guerra de Eburove e, neste momento, em uma floresta pacífica no meio do nada, um grupo de jovens nada pacífico recebia instruções de um outro jovem nada pacífico.
— Muito bem, vermes! Faz tempo desde a última vez, alguns de vocês me conhecem. Àqueles que ainda não tiveram este enorme desprazer, eu repito, agarrem-se às suas almas, pois vossos corpos já me pertencem.
Eles se entreolharam com apreensão. O sargento-mor à frente parecia tão ou ainda mais jovem que eles, contudo os boatos que escutaram não diziam o mesmo sobre sua vasta experiência em massacres e atos públicos de barbaridade. Diziam que executou um homem por subtrair calcinhas na vila da qual era baronete.
Um frio percorreu as espinhas dos alunos. Talvez fosse o olhar macabro das dezenas de homens mal-humorados e carrancudos que acabaram de sair das árvores e arbustos ao entorno. Eram todos broncos e não pareciam falar muito — não em uma língua que conheciam, ao menos.
— Declaro aberto o primeiro curso de formação de forças especiais. — Olhou para os brutamontes. — Satus caedem!
O que se seguiu foi uma sessão brutal de chutes, cusparadas e tapas na cara e cotoveladas, acompanhadas por doses virulentas, porém não letais, de humilhação. Se fossem capazes de compreender o que aqueles homens falavam, a grande maioria presente teria desistido na mesma hora.
— Seus merdas! Ninguém os quer aqui! Peçam agora pra sair! — xingava o sargento. Ele mesmo golpeando um dos infelizes alunos.
— E-eu desisto! — gritou um deles, mais gordinho.
O que se seguiu foi uma comemoração bizarra dos brutamontes, que jogaram os punhos para o alto e guincharam feito gorilas, batendo no peito e pulando.
— Vocês estão fazendo o dia deste jovem instrutor muito feliz. Seus pedaços de lixo! Agora, corram! Corram! Linha reta. Se um de vocês se afastar do pelotão, o turno inteiro vai pernoitar no lago. Corram!
Ordem dada, xingamentos proferidos, bofetadas distribuídas, mais uma desistência feita e aqueles jovens começaram a correr como se suas vidas dependessem disso. E talvez até fosse verdade. Quem sabe o que aconteceria caso desagradassem o psicopata à frente?
A maioria dos candidatos fazia parte do Novo Exército de Edward. Eram a elite, pessoalmente convidados pelos superiores, alguns pelo próprio grão-duque, outros pelo coronel Fire, o comandante responsável pelo treinamento das forças em Gloomer, as mais fortes até então.
Viram na convocação uma chance de ascensão e glória. Se fossem bem, entrariam para a força de elite do grão-duque.
Alguns deles, entretanto, pertenciam a uma camada não tão quista na sociedade. Eram ladrões, assassinos e condenados no geral, que mofavam nas celas pessoais dos nobres da região, apenas esperando a condenação oficial por parte dos suseranos.
A estes fora dada duas opções: sucesso ou morte.
— Não, seu deficiente mental! Retardados! Seus retardados! Todos vocês. Pra água, agora! Vai todo mundo pra água!
Pedro se enfureceu com um deles, também acima do peso, que ficou para trás. Rios e afluentes era o que não faltava na região, então ele parou a corrida e, com a ajuda de seus remulus, empurrou todos eles para o frio e desconforto.
Seria um treinamento muito exaustivo. Ele tinha pouco tempo. A guerra já começou. Era questão de meses, se não semanas, para que os confrontos diretos iniciassem. Por isso precisava daqueles que soubessem o básico sobre carnificina e infiltração, aqueles que não se importavam com sangue e berros, e que cumpririam a missão.
Logo na primeira semana cerca de um terço desistiu ou ficou incapacitada de prosseguir no curso. Contusões e edemas passaram a ser partes de suas rotinas, mas fraturas expostas e infecções eram demasiados incapacitantes.
Na segunda semana foi a vez do outro terço. E as razões foram as mesmas. Desistência ou incapacitação. Ser tratado pior do que um animal deteriora o espírito de quase qualquer homem. Mas alguns persistiram.
— Reunir! Quero todos os senhores no pátio, agora! — Um silvo longo e gritos. Era o sinal de reunião.
O campo de treinamento era bem rústico. Todo de madeira grossa e pioneiras presas com cordas ou pregos. Claramente feito às pressas. Contudo muito completo e recheado de ferramentas de tortura e treinamento, em uma proporção de 2:1.
A tora de pregos disputava com a barra de espinhos a posição de mais desgraçada. Muitos foram incapacitados por uma delas.
— Xeeriiiife! Cadê o xerife?! O turno inteiro vai pra água hoje, xerife!
— Aqui, senhor! — apresentou-se um deles, de íris azuis e olhar fundo.
— Que demora, xerife! O que o senhor vai fazer se estiver na guerra, xerife? Vai enfiar seu turno no cú, xerife?
— Não, senhor!
— Vai foder todo mundo, xerife?! Você vai foder todo mundo, xerife!?
— Não, senhor!
— Seu turno tá em forma, xerife?!
Ele bambeou, mas assentiu, em dúvida.
— Turno, em forma! — Virou e falou: — Em forma, sim, senhor!
— O senhor tem certeza, xerife? — perguntou, encarando nos olhos o aluno.
Se o sentimento de dúvida fosse mortal, era capaz que o aluno quarenta e seis tivesse se tornado um zumbi naquele momento. Completo morto-vivo.
— S-sim, senhor!
Um soco na barriga foi o que se seguiu. De um sargento visivelmente irado.
— Seu animal! O turno tá em forma onde, seu animal?! Todo mundo pra água, agora! Pra água! Vai! Vai!
Meia hora depois, e o turno tinha um novo xerife. E um aluno a menos.
— Vinte e cinco, o senhor é o novo xerife. Parabéns!
— S-senhor. Eu desisto, senhor!
Bom, o turno tinha dois alunos a menos.