Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 20
Cerca de dois meses depois, a alguns quilômetros de Jamor…
— MAIS RÁPIDO HOMENS! CAVEM MAIS RÁPIDO!
— SIM SENHOR, SARGENTO-MOR!
— TUDO POR MARTE!
Algumas centenas de homens armados com pás e picaretas estavam preparando o que parecia ser uma grande trincheira.
Pedro supervisionava o campo ao lado de alguns jovens vestidos com um uniforme similar ao seu, com a única exceção do símbolo em suas ombreiras, que só tinha uma estrela.
— Tenente Walter, como estão os preparativos na muralha externa? — questionou Pedro.
— Senhor, tudo foi preparado! A muralha foi reforçada com êxito, senhor!
Este homem alto, filho de um ramo secundário da casa Walter, era sobrinho-neto do atual prefeito de Jamor.
Aliás, todos os tenentes e demais oficiais que Pedro escolhesse deveriam ser filhos da nobreza de Jamor. Essa era uma condição imposta para que os nobres ajudassem no financiamento do exército.
— Ótimo! — respondeu ele, antes de se virar a um outro jovem de cabelos vermelhos e dizer:
— Tenente Fire, quero um relatório completo de nossas forças!
Aquele homem então se virou rigidamente, olhando para a pranchetinha em suas mãos enquanto respondia a seu superior.
— Reportando, senhor! Atualmente, temos quatrocentos soldados regulares e vinte e sete soldados de elite, divididos em três esquadrões. No comando deles, temos atualmente quatro oficiais, contando com o senhor, senhor!
— Ótimo, tenente!
Aparentemente, a conta de quatro oficiais para três esquadrões não batia. Entretanto…
— Tenente Barcellos, pare de esmagar formigas! Agora!
— Mas… amor…
— E não me chame de amor no quartel! — interrompeu Pedro.
A garota então o encarou sem jeito, respondendo:
— Ehr… tudo bem, sargento-mor…
Sim, o último oficial sob comando de Pedro era Rebecca. Isso também foi uma condição imposta a ele, dessa vez feita diretamente por John.
— Quero que você me atualize sobre a posição das tropas inimigas.
Ela então mudou repentinamente sua atitude avoada, ficando levemente mais séria, antes de responder:
— Senhor, o inimigo atualmente está concentrando suas tropas em Ewald, uma pequena cidade que fica entre Gloomer e Jamor. São aproximadamente três mil até o momento, a previsão do Lorde é de que pelo menos mais algumas centenas se juntem a eles.
— Tsc! Malditos aristocratas! — reclamou Pedro.
Naquele momento, um jovem soldado corria pelo campo, indo em direção ao casal.
— Senhor! — Ele reportou, fazendo a saudação. — Chegou uma carta para o senhor!
Pedro então pegou o documento. Nele estava escrito:
“Meu caro amigo,
Ontem pela manhã, um membro do Conselho Municipal veio até minha porta, acompanhado de cerca de uma centena de homens armados. Ele disse que você é um tirano e que os guardas são para minha própria proteção.
As tropas inimigas estão se reunindo em Ewald, os rumores dizem que eles estão se preparando para marchar. Já pedi a Alberto que preparasse o próximo passo.
Nossos planos estão avançando!
Att. Edward Willblood, Grão-Duque do Oeste.”
Em seguida ele guardou o documento em suas vestes.
As notícias eram boas. Por isso, Pedro não conseguiu deixar de se exaltar:
— Estou me coçando de ansiedade! Hump! Venham bastardos! Venham!
…
Algumas semanas se passaram depois daquilo. E nesse momento milhares de homens marcharam, abrindo trilhas pela grande floresta à leste de Jamor.
As outras rotas estavam bloqueadas.
Para atrasar o exército de Gloomer, Pedro ordenou a seus homens que destruíssem as estradas que levavam à cidade. O que não era muito difícil de se fazer, convenha-se.
Aquelas estradas enlameadas de terra batida já eram péssimas pra começar. E assim, com uma dezena de picaretas e uns poucos dias, os soldados de Jamor conseguiram inutilizar todas elas.
Quanto à possibilidade de o exército inimigo pegar um desvio e atacar pela retaguarda, bem, isso era impossível. No oeste de Jamor só haviam duas coisas: o mar e a República de Mea; ambos inimigos mortais dos aristocratas de Gloomer.
— Humpf! Parece que aquele estrangeiro safado não ficou apenas sentado esperando por nós…
— Sim, conde Mathius, ele fez alguns preparativos. Mas não importa quantas estradas ele derrube, isso não vai impedir a sua destruição!
Conversavam alguns velhos em mantos nobres, em cima de seus belos e robustos cavalos de guerra.
Um pouco atrás, alguns jovens de armadura os acompanhavam, conversando entre si.
— Eu ouvi que eles quase não têm algumas centenas de camponeses mal treinados. Isso vai ser um massacre! Haha! — comentou um jovem de cabelos verdes.
— Sim, Lorde Rukkie! E com seu pai no comando, aqueles pobres fazendeiros já podem ser considerados mortos antes mesmo de lutar! Haha…
— Yep! Dessa vez mesmo meu inquieto e cauteloso pai está animado! O bastardo cavou sua própria cova depois de me humilhar naquele dia! Eu nunca me esqueço! — respondeu.
— Ele só está colhendo o que plantou, Lorde Rukkie…
…
Naquela noite, Pedro caminhou com Rebecca pela cidade. Eles estavam voltando do que parecia ser um encontro e conversavam sobre os últimos eventos.
— Amor, você acha mesmo que o plano vai dar certo?
— Relaxa, minha doce jamantinha. Vai sim — confortou Pedro, usando a mão livre para afagar a cabeça da garota.
A garota então o encarou com uma expressão de dúvida. Mas cedeu, diante daquele olhar confiante e do pequeno cafuné feito pelo rapaz.
“E mesmo se não der, quem liga?! Eu posso simplesmente pegar o Beto e exterminar a cidade inteira depois! Só não fiz isso pra não chamar atenção.” pensou ele.
Os dois então caminharam de mãos dadas até uma pequena estalagem, onde Pedro estava hospedado.
Eles adentraram o lugar, ainda com as mãos juntas e subiram as escadas para o segundo andar. Pedro percebeu que as mãos de Rebecca estavam um pouco úmidas e seu rosto levemente corado.
“Que fofa…” pensou ele.
Fechando as portas do pequeno quarto, o rapaz afrouxou a gola de sua camisa, enquanto Rebecca deixava uma sacola de compras em uma pequena mesa que ficava próxima à cama.
— Bom, temos que aproveitar enquanto dá. Pelo menos por hoje eu quero que você relaxe, Rebecca…
Dizia Pedro, enquanto se aproximava da garota que agora estava sentada sobre a cama.
Ele deu a volta no móvel, ficando atrás dela. E, ajoelhado sobre o colchão, começou a massagear os pequenos ombros da garota de cabelos roxos. Estavam bem tensos.
— Cadê aquela mocinha boba e avoada que conheci? — cochichou suavemente o rapaz.
Rebecca sentiu um pequeno arrepio na parte de trás da nuca, enquanto se deliciava com o doce hálito advindo da boca do rapaz.
— E-eu… Eh…
— Olha pra cá…
Passando a palma da mão sobre o queixo fino da garota e o movendo levemente para cima, Pedro carinhosamente acabou alinhando os dois olhares.
A garota corou, enquanto o rapaz continuou com seus movimentos suaves, deslizando para outras partes daquele corpo delgado e macio.
A garota lutava consigo mesma, derrubando suas últimas barreiras psicológicas enquanto o rapaz a acariciava, ainda com as roupas.
Entretanto, quando ela estava começando a mostrar suas reações de agrado, os movimentos pararam subitamente. O rapaz retirou suas mãos.
— Ehn? Vo-você parou… — observou a garota, um tanto sem jeito e com um olhar abobado.
— Essa sim é a Rebecca que eu conheço…
Ela corou por alguns momentos e então fez uma cara emburrada, quando percebeu a injusta provocação.
— Seu… seu… bobo! — gritou Rebecca, timidamente afastando o rapaz com as mãos.
O rapaz se rendeu e aceitou pacificamente os golpes. Enquanto se divertia com as próprias gargalhadas.
— Venha, venha! Haha! — comentou o rapaz, de braços abertos — Eu vou compensar você pela ajuda com as compras hoje.
Diante daquela proposta ousada, a garota se enrubesceu um pouco. Mas caminhou timidamente em direção a Pedro.
— Vo-você já tirou a camisa?! — questionou a garota, reparando aqueles músculos torneados no peitoral do rapaz.
Pedro então puxou a garota pelas mãos e a tomou em seus braços.
— Me acompanhe — falou, aproximando seu rosto ao da garota.
O clima no pequeno quarto estava bem quente. Os dois jovens já haviam começado a tirar as roupas e estavam prestes a caminhar um passo adiante na relação, até que…
Toc! Toc!
Um forte batido veio à porta, seguido de um grito agitado.
— Sargento-Mor! Sargento-Mor!
Diante daquela situação, qualquer jovem adulto no auge de sua sexualidade só poderia ter uma reação possível.
Fúria.
— Vai embora! Droga! — Ele amaldiçoou.
Mas o apelo continuou:
Toc! Toc!
— Sargento-Mor! Notícias das linhas de frente! Gloomer está recebendo apoio do leste!
— O quê?! — gritou Pedro.
O rapaz então se ajeitou rapidamente, pôs de volta as calças e foi receber o mensageiro na porta.
— Detalhes, cabo! Quero detalhes!
— Senhor! — saudou o cabo — Um grupo de dois mil mercenários veio do leste! Eles não carregam nenhum brasão, mas as suspeitas são que vieram apoiar Gloomer, a mando de Lorde Simel!
— Maldito bastardo!
Pedro se virou rapidamente em direção a Rebecca e orientou:
— Tenente, relate a situação ao Visconde Walter. Mande-o seguir o plano! Eu estou indo para o leste!
Em seguida ele desceu rapidamente as escadas da estalagem, ainda sem camisa e com o restante das roupas amarrotadas.
“Maldito bastardo! E maldito velho-real! Tsc! Talvez eu vá diretamente ter com esse velho depois. Quero ver o que ele vai fazer quando eu destruir sua preciosa Capital!” pensou.
Chegando em instantes nos portões da cidade, Pedro pegou uma espada curta com um dos soldados de sentinela. Em seguida, ele preparou um forte impulso e iniciou uma corrida relâmpago.
Essa era uma situação inesperada.
Zuuuuuum! Vruuuuum!
…
Algumas poucas horas mais tarde, em uma montanha que separava o leste e o oeste de Mea…
Na frente de uma grande fogueira, no que parecia ser um acampamento improvisado, dois homens conversavam.
— Chefe, tem certeza que devemó interferi nessa briga de pirralhos reais? — perguntou um homem com armadura de couro.
Um outro homem que estava a seu lado, mais alto e mais forte, respondeu:
— Pirralhos reais, velhos reais, comerciantes ricos ou mendigos, quem liga? O importante é o dinheiro, Zezin! O importante é o dinheiro…
Aqueles dois eram respectivamente o primeiro e segundo no comando daquele grupo mercenário. Diferente daqueles que estavam na Vilazinha quando Pedro chegou a Mea, estes eram mais bem armados, e mais fortes também.
— O pedido é pra ajudá uns velho gananciosos a por fim em um garoto mimado. Vai ser fácil! — comentou o careca.
Ao redor daquela fogueira maior, havia várias barracas e abrigos improvisados, além de outras fogueiras de tamanho menor.
Vendo de longe, aquele local parecia de fato uma pequena vila. Tava na cara que os mercenários não se importavam nem um pouco de serem ou não notados.
— Humpf! Idiotas, espero que não reclamem depois que eu os exterminar…
Murmurou o rapaz, há alguns quilômetros de distância do acampamento mercenário.
Pedro ainda estava sem camisa e extremamente mal-humorado pela noite perdida de felicidade a dois.
— Parece que vocês gostam de fogueira, né malditos?! — comentou Pedro, observando a audácia do inimigo em território hostil.
Ele então circundou o acampamento, em busca de sentinelas à espreita. E logo encontrou um.
Zhiiiiin! Zhiiiiin!
Mas a matança não parou por aí. Cada golpe do rapaz significava um pobre sentinela a menos.
Alguns minutos foram necessários para que Pedro terminasse com todos eles.
— Esses caras são mesmo profissionais. Trinta e cinco sentinelas para uma única noite? Impressionante…
Pedro se impressiona com o nível de cuidado dos mercenários. Apesar de inicialmente demonstrarem não se importar com revelar sua posição ao inimigo, eles tinham bastante cuidado com o interior de suas linhas e com a segurança de seu perímetro.
— Tudo bem! Que se inicie o massacre! — gritou o rapaz, antes de iniciar um feitiço.
— [Muro de chamas]!
Naquele instante, uma barreira de fogo cobriu todo o acampamento. Ela era forte e intensa, de modo que ninguém além de um poderoso cavaleiro ou exímio feiticeiro conseguiria atravessá-la.
E pelo que parece nenhum dos inimigos presentes se enquadrava nessa descrição. Todos ficaram atônitos!
— O QUE TÁ ACONTECENDU AQUI?! — gritou um homem alto e forte, com uma espada pesada em mãos.
Ele sequer teve tempo suficiente para entender o caos, antes que fosse interceptado por um fio prateado.
Zhiiiiin! Zhiiiiiin!
Dois golpes consecutivos foram o suficiente para tirar a cabeça de seu dono original. Não houve tempo para a defesa.
— Você é grande mas não é dois, bastardo! — xingou Pedro, pisando no corpo robusto e sem cabeça e abrindo seu caminho para sua matança.
O restante dos cerca de 2 mil homens presentes ficou pasmo por alguns segundos, não acreditando que seu líder, um mercenário forte e renomado de Mea, pudesse morrer de forma tão ridícula. Surreal.
— RAPAZES — proclamou Pedro, em voz alta — HOJE EU LHES MOSTRAREI AS CONSEQUÊNCIAS DE EMPACAR A MINHA TRAN…
Todavia, antes que pudesse terminar sua fala, o rapaz foi cercado por mais ou menos uma centena de mercenários furiosos. Entre eles se encontrava um homem baixinho e careca, que era quem avançava mais rapidamente em sua direção.
Ele estava furioso pela morte de seu irmão de batalha.
— EU VOU TE MATÁ! SEU FILHO DA….
Shiiiiiin! Zhiiiiin!
Infelizmente, seu desespero foi em vão. Aquele sentimento de vitória escapuliu de seu corpo, junto com sua cabeça careca.
— JAMAIS OUSE FALAR DA MINHA MÃE, SEU MERDA! — gritou Pedro, furioso com o corpo já sem vida em seus pés.
Ele então pisou com força no cadáver, que explodiu junto com sua ira momentânea.
Ploft!
— Vocês querem saber de uma coisa? Bom, eu me cansei de vocês! — comentou o rapaz, antes de tomar uma posição de combate e pegar algum fôlego.
Ele então se projetou para frente daquela multidão de homens, gritando:
— Tiid KLo Ui!
Em seguida, o tempo parou.
Algumas dezenas de minutos mais tarde e todos aqueles dois mil mercenários já estavam mortos, com seus cadáveres apodrecendo em meio ao reflexo luminoso e intenso da lua.
Era um cenário cruel. A guerra começou!