Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 30
Após a reunião com Mark, Pedro convocou uma reunião de emergência. Ele queria discutir assuntos sérios.
— Infelizmente, velho Mark proibiu as invasões — disse o jovem lorde.
Além dele, estavam Beto e Rebecca na sala. Ambos consternados com a notícia.
— Mas relaxem, — continuou — eu tenho um plano.
A garota ficou curiosa.
— Plano? — perguntou em voz alta, enquanto Beto murmurava em sua mente: “Quem ele quer matar agora?”
Pedro então pôs sua xícara sobre a mesa e explicou:
— Sim. Vamos levantar algum dinheiro pra continuar as reformas na vila. Mark também disse que eu preciso de uma guarda, então vou treinar uma — O garoto fez uma pequena pausa, coçando o queixo antes de falar: — Mas o mais difícil vai ser encontrar alguém pra ficar no meu lugar quando eu estiver fora.
“Rebecca é muito misteriosa, não confio nela o suficiente para construir um ‘lugar seguro’ pra mim fora do Clã. Beto, por sua vez, é uma máquina de matar ambulante que não sabe nada de administração. E os remulus… bem, eles não contam.” pensou, completando seu raciocínio com uma lamentação:
— Ahr… realmente, meu maior problema é a falta de pessoal. No futuro, tenho que dar um jeito de conseguir subordinados confiáveis.
Depois de guardar esse objetivo na mente, o rapaz continuou o discurso.
— Mas enfim, vamos deixar isso de lado por um tempo. Qualquer coisa eu só jogo isso nas costas do Ed e pronto.
— Sim — assentiram os outros dois.
Em seguida, Pedro se levantou do sofá e caminhou até a janela. Lá, olhando para o bosque que circundava a casa, ele disse:
— Outro dia, uma velhinha disse pra mim que gosta de viver aqui. Falou que nos outros lugares os nobres não ligam muito para os seus camponeses. Tenho pesquisado e pensado sobre o assunto desde então. Vocês sabem por que isso acontece?
Beto ficou calado, enquanto Rebecca se manteve pensativa. Alguns segundos se passaram assim, antes que uma resposta viesse.
— Isso é por causa do sistema de prefeituras, amor.
Pedro assentiu com a cabeça, a resposta da garota estava correta.
O que acontecia era que os nobres estavam se reunindo nas cidades e deixando os domínios para seus subordinados e vassalos menores cuidarem. Assim, longe de onde estavam, os camponeses eram vistos como uma fonte de renda para eles — e apenas isto.
Os nobres não os enxergavam como seres humanos, com necessidades e desejos, e por isso não investiam muito em cultura e diversão.
— Sim. É por isso que Ed extinguiu as prefeituras. — Apesar da notícia, a voz do rapaz era pesarosa.
— Ele foi muito precipitado nisso — completou — Agora o safado manda em tudo e tem muito mais controle sobre o ducado, okay. Contudo, isso não fez os nobres voltarem para suas terras. Na real, os safados tão ainda mais zangados e reprimindo ainda mais as culturas locais, pelo que ouvi por aí…
Rebecca sentia o pesar na voz de seu amado, isso a fez se sentir um pouco triste também.
“Apesar do temperamento explosivo, ele tem um bom coração.” Ela pensou.
Em seguida, a garota caminhou até o jovem lorde e agarrou uma de suas mãos.
— Amor, não se preocupa — disse a garota — Vai dar tudo certo, eu sei disso…
Vendo a atmosfera local se tornar colorida, Beto achou melhor se retirar dali. E assim, ele caminhou até a porta.
Entretanto, antes de sair o jovem de cabelos claros foi interrompido por Pedro.
— Ei, Beto! — gritou o aristocrata.
— O que deseja, meu senhor? — perguntou o rapaz.
— Vou precisar que você vá a alguns lugares pra mim. É parte do plano, não se preocupe. Mais tarde mando uma carta explicando tudo.
— Tudo bem, meu senhor — assentiu o subordinado, antes de se retirar de vez.
Pah!
Quando a porta foi fechada, Rebecca lançou um olhar sugestivo a Pedro. Uma mistura de desejo e perversão.
Ela parecia uma leoa encarando um pequeno coelho.
— O que foi, Rebecca? — perguntou o rapaz.
— Tá na hora de retribuir aquela massagem. Hehe…
A garota então pulou sobre sua presa, arranhando-a nas costas e rasgando suas vestes de lã.
Pedro até tentou reprimi-lá, invertendo a posição e tirando a blusa da garota. Todavia, Rebecca estava irascível.
Assim, ela segurou as mãos dele, ainda em seus seios e disse: — Não, hoje eu estou no controle. Quando voltar, eu te recompenso com… alguma coisa.
Ouvindo a proposta, o rapaz desistiu de resistir.
Em suma, a noite deles foi longa. O resumo da situação foi: a leoa devorou o coelho.
…
No dia seguinte, Pedro mandou reunir todos que queriam entrar para a guarda. Todavia, algo inédito aconteceu dessa vez.
— O lorde agora está aceitando mulheres também! — comentavam os aldeões.
Aquilo gerou uma pequena comoção na vila e muitas jovens em idade matrimonial se inscreveram para o treinamento.
E assim, o lorde de Vilazinha esperou outro dia, antes que os recrutas se reunissem no centro da vila. Lá havia um espaço aberto, parecido com uma praça, só que bem pequena.
— Devo dizer que estou impressionado, lorde Pedro. Sua estratégia deu certo — disse o velho com cavanhaque e estatura mediana.
— Ouça, Mark — retrucou o rapaz — O que você precisa entender é que eu sou pitbull treinado, cão de raça. Eu sei do que tô falando, pô…
O olhar presunçoso e a atitude descontraída de Pedro arrancou um pequeno sorriso do rosto do velho, que, voltando a encarar o grupo de pessoas à sua frente, lhe disse:
— Pelo levantamento que fiz, tem uma proporção de 1:2 entre homens e mulheres. Isso é certo mesmo, jovem lorde? Nunca vi uma guarda com mulheres antes, e a primeira que vejo já é tão…
— O que você tá querendo dizer com isso, velho? — Sem rodeios, Pedro perguntou.
Vendo que não havia se expressado muito bem, Mark forçou a garganta e se corrigiu:
— O que quero dizer é: isso não é perigoso? Como é que o lorde vai fazer para controlar a disciplina na guarda? E o treinamento?
“Entendi o que o véio tá querendo dizer. Ele tá preocupado, achando que eles vão namorar ao invés de patrulhar. Bom, tem esse risco, mas paciência ué. Foi você que não me deixou pegar o pessoal à força, lembra? Hump!” Pedro pensou.
Em seguida, o rapaz explicou:
— Nha… Não se preocupa não. Como já disse, sou pitbull treinado. Quando eu mostrar quem é que manda no bando, eles vão obedecer…
— “Bando”? Pitbull? Mas… meu lorde, eles não são cães…
Mark até tentou terminar seu argumento, mas foi ignorado pelo garoto.
— Tudo bem, seu bando de cães! — Ele gritou, chamando atenção da multidão — Quero duas filas na minha frente, agora!
Os recrutas se assustaram com o grito do lorde, mas obedeceram mesmo assim.
Em cerca de dois minutos, duas filas estavam feitas. Tinham 42 pessoas ao todo e um pouco mais da metade era composta de mulheres, bem como Mark relatou.
— Senhoras, senhores… Parabéns! Vocês serão a primeira turma de guardas a ser treinada por mim, seu lorde — Pedro avisou.
As mulheres se alegraram ao ouvir aquilo. O rapaz era muito bonito, para começar, e é certo dizer que a maioria delas veio por causa dele.
Fora isso, ainda tinha o fato que Pedro deu a elas a chance de ocupar uma posição de poder no vilarejo. Posição esta que sempre foi ocupada por homens. E mais, elas ainda receberiam o mesmo tanto que seus colegas do sexo masculino. Então é óbvio que iriam.
Isso, mais a falta de homens em idade militar, fez com que Mark presenciasse um fenômeno único. Qual seja, um grupo voluntário de jovens em idade militar compostos por maioria feminina.
— O que nós devemos fazer, lorde Pedro? — perguntou uma das aspirantes. Ela parecia ter uns dezessete e seu cabelo tinha formato tigelinha.
— Agora, vejamos… — Ele disse, pensativo — Isso! Vocês vão precisar de um codinome!
Os jovens recrutas se assustaram ao escutar aquilo. Mas então pensaram melhor e até acharam legal.
Mas que nome eles receberiam? Seria um título, como os dos soldados da guarda de Sua Alteza? — Eles estavam esperançosos.
Pedro então começou, olhando para a primeira da fila.
— Você aí, garota tigelinha! — apontou.
— E-eu? — perguntou a menina.
— Isso mesmo — confirmou o lorde — Qual o seu nome?
Mas a garota era tímida e assim respondeu com a cabeça abaixada:
— E-eu sou Nathalia, senhor.
— Nathalia, é… Bom, esqueça esse nome enquanto você estiver de serviço — Ele ordenou — Nesses momentos, você será Buldogue.
A garota até pensou em perguntar o que raios seria um Buldogue. Todavia, Pedro não lhe deu a chance de fazer isso.
Ele disparou, apontando e falando:
— Você será Husky! Já você… Labrador! Você aí, seu nome agora é Pastor!
Em um certo momento, o rapaz chegou perto de uma garota baixinha e de cabelos soltos. Ele parou na frente dela, pensou por dois segundos e disse:
— Você será Chihuahua!
Grrr…
A garota rosnou, mas não entendeu nada e por isso decidiu continuar quieta.
— E eu, senhor? — perguntou esperançoso o garoto atrás da Chihuahua.
Uma imagem então veio à mente de Pedro.
— Você será o poodle!
— O-o quê?
…
Depois de ter dado um codinome duvidoso a todos, Pedro pediu que eles voltassem para suas casas. A ordem era para preparar uma pequena mala, com roupas e pertences o suficientes para uma semana, e encontrá-lo no centro da vila pela tarde.
O tempo passou e eles fizeram conforme foi ordenado.
— Tudo bem, meus caros. Agora formem duas filas e me sigam! — disse o jovem lorde.
Desconfiando da animação dele, um dos recrutas perguntou:
— Para onde vamos, lorde Pedro?
Nesse momento, o rapaz percebeu algo importante.
— Hum? Eu não falei pra vocês?
— Não — responderam os recrutas.
— Erro meu, perdão — Ele se desculpou — Nós vamos pra minha casa.
— O-o quê?!
Algumas garotas ficaram tímidas. Já outras…
— Ain! Que demais! Estou ansiosa pra ver a mansão do lorde! — murmurou uma garota baixinha e com franja no olho, batizada por Pedro de Maltês.
— Soube que o lorde cortou as árvores para a casa com as próprias mãos…
— É-é mesmo? — perguntou o Poodle, sem esconder a admiração.
O rapaz também era baixinho e tinha cabelos claros. Tirando o corte de cabelo esquisito, sua aparencia até que era boa. Aliás, foi por isso que Pedro o apelidou daquele jeito?
De qualquer forma, o tempo passou rápido e eles logo chegaram à mansão do jovem lorde.
— Minha namorada foi visitar uma amiga e eu pedi aos meus subordinados para acompanhá-la. Por causa disso, tenho muitos quartos livres no andar de cima, apenas peguem o que quiserem e sejam felizes. Vejo vocês aqui em vinte minutos! — Ele avisou.
Os recrutas ficaram animados com aquilo. Durante a próxima semana eles teriam os próprios quartos e não precisariam dormir em barracas na neve, ao contrário do que muitos pensaram.
Se Pedro estava sendo generoso ou se apenas não tinha barracas o suficiente, isso ninguém sabia.
Mas eles nem pensaram nisso, só na generosidade do lorde.
E foram muito rápidos. Logo que chegaram ao andar de cima já formaram suas duplas e trios e se apossaram de suas moradas temporárias.
O clima na casa ficou diferente com a presença dos recrutas, Pedro não demorou a perceber isso. Ao contrário de seus subordinados de outra dimensão, esses jovens vilazininhanos eram muito alegres.
— Esses recrutas são animados demais, vou me lembrar disso durante os treinos. Hehehe!
Enquanto Pedro maquinava seus planos perversos, o rapaz foi interrompido por um batido na porta.
Toc! Toc!
— Quem é? — perguntou ele.
— Sou eu, jovem lorde. Mark! Vim acompanhar o treinamento da nova guarda.
Pedro recebeu o velho, abrindo a porta e o convidando a entrar.
“Eu quero um mordomo no futuro.” pensou, enquanto mostrava ao homem o interior da mansão.
— Como dá pra ver, meus cães fazem muito barulho — provocou o rapaz.
Mark já conhecia o espírito brincalhão do rapaz e por isso não se zangou. Na verdade ele até sorriu de volta, falando:
— Quais são os planos do jovem lorde para os novos recrutas? Se me permite saber, claro…
O tom refinado de Mark era encantador, mas contrastava muito com a aparência desleixada dele, talvez por isso Pedro o provocasse tanto.
— Ô, meu caro senhor Mark! É claro que permito-o saber sobre meus segredos confidenciais! — proclamou o rapaz, afinado de propósito a voz — Mas só se você limpar essa mancha de comida que está em sua bochecha!
— O-o quê? — questiona-se o velho, usando os dedos para esfregar entre o maxilar e os lábios.
A cena deixou Pedro muito sorridente.
— Hahahahahaha!