Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 5
Na manhã seguinte…
— Mestre, quantos dias até chegarmos na Cidade Dragonark? — perguntou o rapaz.
— Como assim, garoto? Hoje mesmo estaremos lá — respondeu.
Ao escutar aquilo Pedro se questionou, afinal, essa cidade não fica há 200 km daqui? Como raios eles chegariam ainda hoje?
Claro, se corressem na velocidade mais alta seria outra história. Entretanto, o ancião disse que eles não fariam assim, mas que teriam uma viagem tranquila.
— Como nós vamos? — questionou atônito o rapaz. Eles estavam no meio de um bosque, não haviam estradas, cavalos ou qualquer outro meio de transporte ali que não fossem seus pés.
Marcus não conseguiu deixar de sorrir ao ouvir seu discípulo.
— Nós vamos ir voando, meu jovem pupilo — explicou ele.
— Voando? — questionou o rapaz quando teve uma certa ideia. — Então significa que existe magia de voo? Legal. Vai me ensinar?
Pedro se animou atoa, contudo.
— Não vá tirando conclusões precipitadas, rapaz — disse, ajeitando seus óculos garrafão. — É claro que existe magia de voo. Infelizmente, com o seu nível atual de arcana e baixo controle de mana, vai ser impossível pra eu te ensinar feitiços de levitação ou flutuação.
Marcus notou os olhos de seu discípulo perdendo o brilho. Ele realmente queria tanto voar?
— Bem, de todo modo, você vai acabar aprendendo uma hora. Vá para a Confederação Arcana quando estiver viajando. É o melhor lugar para aprender sobre feitiços — elucidou.
— Confederação Arcana? Ah… aquele lugar no Sul, né? A maioria dos livros citam esse lugar…
Ouvindo a indagação certeira do jovem ao lado, Marcus respondeu concordando:
— Sim, fica a leste da Península Mea e da Ilha Dragonark. E de fato, quase todos os melhores livros e amigos que colecionei vêm de lá. Haha!
Vendo a expressão cheia de saudades do homem de jaleco branco, Pedro não pôde deixar de concluir internamente que seu mestre teve bons momentos quando era jovem.
— Olha aqui meu jovem, a verdade é que este seu mestre é um apaixonado por piromancia e se preocupa muito pouco com as outras áreas. Vá você mesmo pra Confederação se quiser continuar o caminho da magia — elucidou o ancião.
— Eu vou mesmo, mestre — decidiu em seu coração. Esta será sua próxima aventura!
“Segundo o mestre, eu já sou praticamente imbatível na arte da autodefesa. Então não é como se eu tivesse outra escolha fora trilhar o caminho da magia…”, refletiu sem presunção.
O tempo de caminhada dos dois pela floresta foi passando assim, com conversas triviais e dicas finais por parte do homem de jaleco, até que um determinado questionamento veio à tona.
— Oh… mestre! Aqui, que parada é essa de voar sem usar magia? Tem avião aqui?? Helicóptero?
Marcus negou e então apontou para uma clareira próxima. Ao ver o que tinha lá, Pedro ficou de queixo caído. E não, aquilo sem dúvidas não era um avião. Nem um helicóptero.
— Aquilo por acaso é…
Ele balançou a cabeça concordando.
— Bem, viemos todos da Terra… é apenas natural termos alguns engenheiros bons. Você mesmo não disse que era “advogado famoso”, ou algo do tipo?
Cof… Cof…
— É-é… Eu era famoso pra caraca! Nossa… Faz sentido…
…
Naquela mesma manhã, em um grande salão oval, havia uma grande mesa de conferências. Ela tinha onze cadeiras ao todo, mas uma delas estava vazia.
— O treinamento do Quarta Geração terminou! Marcus enviou um relatório ontem com os resultados preliminares, reparem — impetrou uma voz ríspida e grave.
Era Cássio, presidente do conselho. Um homem de meia-idade robusto e com cabelo curto.
Ele apontava para uma projeção feita em uma tela, que ficava em uma parede próxima à mesa de conferências. A projeção mostrava os seguintes dados:
Atributos | |
Força: 1700 | Inteligência: 90 (+100) |
Destreza: 1300 | Sabedoria: 30 |
Constituição: 2000 | Carisma: 125 |
Vida: 5000/5000 | Estamina: 3700/3700 | Mana: 220/220 |
Ao olharem para aquela tela, os anciões ficaram malucos. Dando início a uma série de reações.
— Nossa…
— Que doideira…
— Ele já é fisicamente tão forte quanto eu! — gritou um ancião, não aguentando o que viu.
— Tão forte quanto você?! Eu sou um Mestre Espadachim, e mesmo assim, ele é pelo menos algumas centenas de casas mais forte do que eu! — respondeu outro ancião.
— Apenas, o que RAIOS aquele piromante maluco fez com o pobre garoto? Que desumano…
A discussão ficou calorosa, mas um grito furioso rapidamente os colocou na linha.
— Calem-se! Agora!
Cássio limpou a garganta com o cessar dos ruídos.
— Pra começar, todos nós já sabíamos do que Marcus era capaz. Somos da mesma geração… Então, por que raios estão tão impressionados? — perguntou retoricamente.
Ele então arregaçou as mangas de sua túnica carmesim, se preparando para dizer algo, mas foi repentinamente interrompido por uma voz doce e melodiosa.
— Mas chefinho, até eu estou impressionada! Afinal, não importa o quão monstruoso aquele homem seja, esses números seriam impossíveis sem o talento natural do Quarta Geração.
— Você tem um bom ponto, Rúlia. Mesmo assim, olha só esses atributos físicos dele. São muito maiores que os do seu discípulo, não é? — perguntou outra voz, menos melodiosa.
— Sim. Mas Tinzinho é um mago, então sua força física não importa muito! — respondeu a bela anciã de cachos loiros, fazendo beicinho.
A conversa estava indo por um rumo estranho, quando os dois foram subitamente interrompidos por um enérgico presidente do Conselho.
— Não vamos perder o foco. Por favor!
— Sim, chefe! — responderam em uníssono os anciãos.
Cof… Cof… Após a tosse forçada do mestre de túnica carmesim, um outro painel foi projetado sobre a tela. Em seu título estava escrito algo curioso…
— Muito bem. Acho que com os números atuais do Quarta Geração, todas as peças estão prontas. Agora, que tal irmos para o próximo passo? — Cássio então se levantou de seu assento e proclamou em voz alta:
— Vamos iniciar o Projeto A!
Os anciãos então se levantaram e proclamaram em uníssono:
— Pelo sangue! Pela Terra! Pelo Clã!
…
Enquanto sobrevoavam os céus, Pedro admirava as belas paisagens daquela grande ilha.
— Mestre, por que é que aqui tem tantas montanhas, mas nenhum vulcão? — perguntou.
— Garoto, esse é um dos grandes mistérios por trás das origens do Clã. Até hoje ninguém descobriu o porquê — respondeu Marcus, corrigindo seus óculos.
Ao ouvir a resposta vaga de seu professor, Pedro passou a encarar a bela paisagem montanhosa com aquele típico olhar deslumbrado. Certamente pensava mil coisas no momento.
— Ah, olha só. Estamos chegando! — avisou o ancião. Pedro então olhou para a direção apontada por ele.
Em poucos segundos, sua vista ficou coberta por um grande mar de edifícios, ruas e construções megalomaníacas de algo que parecia uma Metrópole da Terra.
— Caraca! Não sei se isso é frustrante ou legal… Essa coisa não parece porcaria nenhuma com o mundo fantasioso que eu tava esperando — comentou.
— Como eu disse, garoto. Viemos todos da Terra, então não tinha como esperar menos — explicou novamente o ancião.
— Todos as cidades desse mundo são avançadas assim?
— Não — respondeu Marcus, esticando suas pernas em um dos sofás do dirigível, antes de continuar — Isso só vale para a Ilha Dragonark. O resto do mundo continua tão atrasado quanto uma fantasia medieval normal.
— Até a tal Confederação? — perguntou um tanto ansioso.
— Sim. Apesar de terem uma tecnologia muito mais avançada do que os outros lugares. — Ele então esticou seus braços para se espreguiçar e continuou: — Bem, de qualquer modo, fomos nós quem os ajudamos a chegar nesse nível, então acho que não conta muito.
Pedro achou aquela última afirmação suspeita. — Ajudaram eles?
— Claro, demos uma mãozinha quando vimos o forte espírito científico deles. Mas não dá pra dizer que eles não nos ajudaram também. Afinal, aprendemos a essência da arcana lá…
Essa Confederação Arcana parecia ser bem incrível. Uma espécie de Inglaterra vitoriana desse mundo.
— Confederação Arcana… — murmurou, encarando o Leste pela janela do dirigível.
…
Os dois rapidamente chegaram à Cidade Dragonark. Foram recebidos por uma pequena comitiva, que os levou diretamente até o prédio onde ficava o Conselho dos Anciãos.
— Carros, motocicletas e arranha-céus. Que chato. É tudo muito avançado mesmo — disse.
— Claro! Todo o melhor para nossos cidadãos. Afinal, que tipo de líder seria eu se essa cidade fosse um pouco pior? — respondeu um homem de voz melodiosa e longos cabelos negros.
Era Timoty Dragonark, o líder dessa geração, que sorria enquanto acompanhava Pedro até o Salão Oval. Ele ficava no último andar de um grande Arranha-Céu, com vista para toda Cidade Dragonark. Aliás, Marcus já havia se separado deles.
Enquanto estavam no elevador, Timoty orientava Pedro.
— É isso. Você não precisa fazer saudações espalhafatosas como da ultima vez. Basta dizer: “me apresento ao Conselho para instrução”.
— Saquei — afirmou confiantemente o amigo, ajeitando seu manto de linho nobre.
— Aliás, aqui estão as chaves e endereço do seu apartamento. Os anciãos pediram pra construir uma casa pra você nos subúrbios, mas ainda vai demorar um pouco até ficar pronta — explicou Timoty, entregando uma chave e pedaço de papel a Pedro.
Eles os recebeu, agradecido.
— Valeu cara! Tu é responsa pra caramba, um amigo de verdade…
— Amigo… entendo. Então é assim que parece… — murmurou sem jeito o de cabelos negros.
— O que foi? Não somos? — questionou Pedro.
— Acho que podemos ser…
Os dois jovens deram uma gargalhada e então selaram a amizade com um aperto de mão. Nesse mesmo momento, o elevador chegou na cobertura do enorme prédio.
— Bem, é agora. Te desejo boa sorte! — exclamou Timoty, antes de adentrar à grande porta de madeira.
Pedro agradeceu com um aceno e logo em seguida também adentrou no luxuoso salão.
— Eu, Timoty Dragonark, 3º líder deste grandioso Clã, me dirijo aos anciãos para apresentar oficialmente o novo membro da família ao Conselho! — proclamou.
Os anciãos estavam todos em pé neste momento, do lado de suas respectivas cadeiras. E um resoluto e forte homem de cabelo curto e barba assim dirigiu sua voz à Pedro:
— Pois venha aqui e se apresente, Quarta Geração!
O rapaz logo se apressou até o centro do salão, parando bem próximo a uma grande e longa mesa de conferências.
— Eu me apresento ao Conselho para instrução! — respondeu rigidamente.
— Bom — comentou o líder, antes de proclamar: — Eu declaro iniciado o último Conselho para a apresentação de gerações! Bem vindo, nosso mais novo membro da família Dragonark.
Todos os anciãos então se assentaram, ficando apenas Pedro e Timoty em pé.
— Muito bem. Suponho que Marcus já lhe explicou a situação em que o Clã se encontra, mas vou reforçar mesmo assim — falou Cássio, antes de começar a explicação. — Quando você estiver lá fora, não poderá fazer menção às origens e nem à localização do Clã! Eu também peço para que você ouça as orientações do Conselho, quando solicitado.
Pedro concordou rápido com um aceno de cabeça.
Bom, ele também veio da Terra para começar. Além disso, via seu mestre como uma figura paterna, e acontece que ele também era membro do Conselho. Então Pedro ouviria as orientações. Agora, se iria seguir ou não já era um outro assunto…
— Ótimo! Em seguida, peço pra que despeje uma gota de seu sangue nesse broche — explicou o ancião parrudo, apontando para a mão de Timoty.
O jovem líder do Clã então passou o pequeno broche carmesim para Pedro, com todo o cuidado e zelo do mundo.
E ele o recebeu, mas antes de despejar seu sangue, olhou para o assento de Marcus. Vendo que este lhe deu um aceno positivo em resposta, ele perguntou a Cássio:
— Pra que serve isso?
— É sua identificação de membro de sangue puro. E, por consequência, é também uma amostra de seu status como membro da alta hierarquia do Clã. Vai te dar acesso à maioria dos lugares e assuntos ligados ao Clã — explicou.
— Estou convencido — respondeu ele, mordendo a ponta de seu polegar.
Ping! Uma gota de sangue foi despejada no broche carmesim e o rapaz não pôde deixar de reparar o símbolo negro que apareceu no pequeno objeto.
— Certo. Com isso, só nos resta lhe dar sua primeira missão — disse o homem de cabelos curtos, olhando para Marcus.
Este então se levantou de seu assento e disse:
— Ehr… Tudo bem, garoto. Durante suas viagens eu quero que você passe uma temporada na Confederação Arcana. Quando você chegar lá, deverá procurar por Jaime, o Elementarista, e mostrar seu broche. Ele então vai lhe dar mais detalhes sobre sua missão…
Ouvindo as orientações de seu mestre, Pedro concordou com a cabeça e perguntou:
— Quanto tempo eu tenho?
— Não tem um tempo exato, mas você deve retornar ao Clã pelo menos uma vez nos próximos cinco anos. Vá lá pelo menos uma vez antes disso! — orientou.
— Tudo bem — concordou ele.
Cássio então assumiu novamente a palavra e disse:
— A viagem está marcada pra daqui a dois dias. Apreça no hangar depois disso para a viagem até o Continente!
Pedro concordou e, logo depois disso, uma voz melodiosa e doce foi ouvida em um dos assentos da grande mesa.
— Oh, te desejo boa sorte Pedrinho! Lembre-se, qualquer coisa você pode pedir para esta bela Rúlia aqui! Hehe…
Era a anciã de cabelos loiros e seios avantajados, a mestra de Timoty.
— Ehr… Pode deixar, anciã! — respondeu um agora tímido Pedro. Mulheres boitas eram seu fraco. E bem, em sua defesa, elas eram a ainda são o ponto fraco da maioria dos homens…
Cof… Cof…
Uma tosse seca de um líder do Conselho soou pelo recinto e ele então se pronunciou:
— Com todos os assuntos resolvidos, eu declaro encerrada a reunião do Conselho! Te desejo boa sorte em sua missão, Quarta Geração!
— Obrigado, ancião!