Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 7
Dois dias se passaram. Entretanto, Pedro e Beto ainda permaneciam naquele vilarejo. O motivo? Simples, eles não podiam sair.
— Argh! Bela hora pra fazer melhorias nas muralhas — reclamou o rapaz de robe de linho e rosto bonito.
Um outro, de cabelos ondulados e claros ao seu lado percebeu o incômodo.
— Você quer que eu destrua essas muralhas, meu senhor?
— Não, Beto, não precisa. Eu também tô curioso pra saber como é que essas muralhas vão ficar.
Pedro parou de repente quando reparou algo no final da rua.
— Ei, Beto, tu não acha muito suspeito essas muralhas serem reformadas justo agora?
— Meu senhor, o que você está sugerindo é que…
Ele confirmou.
Diante da recente sucessão de acontecimentos, um pensamento tomou conta da mente do rapaz: Afinal, qual era a verdadeira identidade daquele encapuzado? Suspeito.
— Bom, espero que dê tudo certo pra eles. Mas isso não é mais da minha conta. Vamos dar o fora aqui assim que os portões se abrirem de novo. Quero ir para a Confederação logo…
— Sim, meu senhor.
…
Mais três dias se passaram até que o primeiro portão fosse liberado. E nesse momento, os dois estavam prestes a passar por ele.
— Até que isso aqui ficou bem decente…
— De fato ficou, meu senhor.
Pedro e Beto pareciam satisfeitos com as novas mudanças, enquanto caminhavam pelo que parecia ser um esboço da rua principal. Ainda não estava asfaltada, mas foi ampliada.
— Eu ainda poderia destruí-la com algum esforço, meu senhor — comentou o de cabelos claros e ondulados.
— Eu aposto que sim, Beto. Mas não faça isso a menos que seja necessário. Okay? — Pedro estava começando a ficar preocupado com a personalidade de seu ajudante temporário.
— Como desejar, meu senhor.
Ao esperar na fila, Pedro se aproveitou para analisar a obra, julgando internamente o trabalho dos construtores. Mas algo então aconteceu.
Ele foi obstado por um estrondo. Aquilo tirou completamente sua atenção. Parecia que o ruído estava vindo da parte de cima da muralha.
Torotontontom! Torotontontom!
— Fechem os portões! Invasores ao Norte! Fechem os portões! — gritou um oficial de guarda.
— Miquinhos me mordam, Beto! Hoje não é nosso dia. — O rapaz suspirou.
— O que devemos fazer, meu senhor?
Pedro encolheu os ombros. — Não tem muito o que fazer, vamos só aguardar e ver o no que dá.
Os dois se esgueiraram até uma parte desprotegida da muralha, querendo ver de perto o desenrolar da batalha.
O grupo invasor era bem grande, uns quatrocentos ou quinhentos, todos de armadura leve e bem armados. Muito embora lhes faltasse organização. Afinal, suas fileiras estavam completamente dispersas, sem nenhuma formação.
— Mercenários?
— É o que parece, meu senhor — comentou Beto.
Vendo a desordem total e o visível despreparo da guarda local, Pedro sentiu pena dos residentes do pequeno vilarejo. Eles eram ainda mais desorganizados que os mercenários, além de estarem em número muito menor.
— É realmente uma pena. Aquele cara misterioso era claramente um novato, mas parecia ter potencial pra ser um bom líder — compadeceu-se o aristocrata estrangeiro.
Algumas dezenas de minutos já haviam se passado desde o soar dos tambores e agora o grupo mercenário já tinha cercado todas as saídas, se preparando para sitiar Vilazinha.
— Ei, meu senhor, olha lá! Alguém parece estar organizando a guarda — Beto comentou, apontando para o Sul da muralha.
Seguindo o dedo, Pedro notou um homem com barba e cabelos aparados, aparentemente da mesma idade que ele. Vestia um linho nobre de seda, com uma cota de malha simples por cima.
Em suas mãos segurava um arco longo, enquanto gritava todo tipo de ordens a seus oficiais.
— Passe minha ordem: quero dez homens para reforçar o perímetro Sul! Também quero vinte arqueiros no Norte! E trate de designar alguém para pôr ordem nos civis!
Vendo e ouvindo tudo aquilo, um pequeno sorriso se formou no rosto de Pedro.
— Talvez eles não estejam tão ferrados assim — comentou.
— Meu senhor, como assim? É uma diferença de dez para um, não há chance…
Ele deu de ombros.
— Batalhas mais difíceis foram vencidas com menos homens. E bem… nós estamos aqui, não é?
Ouvindo a última sentença, o jovem de manto escuro ficou um tanto surpreso.
— O senhor quer interferir? — perguntou.
— Mas é claro que sim — respondeu Pedro assertivamente.
Ele então começou a andar lentamente pelas muralhas, com Beto o seguindo de perto.
— Diga, você não acha muito estranho que mais de quinhentos homens bem armados venham descaradamente invadir um vilarejo pequeno como esse? — perguntou o líder.
Ver a expressão tola que Beto estava fazendo fez Pedro se sentir muito feliz, por algum motivo. Ele riu e então continuou.
— Sabe com o que isso cheira?
— Não, meu senhor. Com o quê? — perguntou o guia.
— Com uma grande e divertida conspiração! Hahaha!
Reparando a grande felicidade com a qual seu superior proferiu aquelas palavras, Beto concluiu que o caminho até Arcana teria muito mais adversidades do que pensou.
Booom! Boooom! Pah!
— O inimigo iniciou o ataque!
— Arietes na porta Sul!
— Escaladores a Oeste!
— Eles têm armas de cerco! Duas catapultas no Norte!
Boooom! Pah! Booom! Booooooom!
Em meio a estrondos e gritos, Pedro e Beto se esgueiravam por entre as brechas da muralha. Os objetivos principais eram evitar as flechas e chegar até o alto-comando local.
— Eles tão explorando aquela brecha. Não vai durar até chegarmos lá — comentou Pedro, com olhos virados para a parte Norte.
Aquele lugar era onde os ataques se concentravam. Pedro desviou com calma dos entulhos, cadáveres e cacos. As armas de cerco se mostraram muito aterrorizantes. O cheiro de excrementos se misturava com o sangue e a terra seca, criando uma atmosfera de guerra.
— Eles estão levantando a bandeira branca — Beto avisou.
Os dois então pararam para observar o que aconteceria dali.
— Cessem os ataques, estamos nos rendendo! — gritou o barbado de cabelos escuros na parte Norte da muralha.
Mas para sua surpresa os ataques dos mercenários não cessaram. Ao invés disso, eles pareciam estar ainda mais frenéticos?
— Matem todos e capturem o pirralho real!
— Ouviram o chefe! Matem todos! Kekekeke!
Por aquele breve diálogo, eles já perceberam que os mercenários não vieram com intenções amistosas. Sangue e destruição seria o destino desse humilde lugar, isso já estava decidido.
— Vamos! — ordenou Pedro.
Os dois se apressaram e, desviando agilmente de todos os guardas, chegaram perto do homem de cabelos escuros que liderava a defesa da vila.
— Eae parcero! Tá precisando de ajuda?
Ao repentinamente escutar aquela voz amigável, o jovem de cabelos escuros tomou um baita susto.
— Seu malandro, cê se disfarçou pra ouvir minhas dicas naquele dia… Éééée! Hehe… Que bom que funcionou, ou quase isso — comentou Pedro.
— V-você é aquele estrangeiro! O que faz aqui? — perguntou Ed.
— Viemos dar uma mãozinha…
O jovem líder se sentiu comovido pela ajuda oferecida naquele momento conturbado, mas…
— Eu aprecio muito sua ajuda! Infelizmente, mesmo com vocês não vai ser o suficiente. Por favor, me desculpe por colocá-los nessa situação! — O tom dele era triste e resignado.
Escutando aquilo, Pedro se aproximou do companheiro e deu um pequeno tapinha em seus ombros.
— Não pra baixo não, cara. Você mesmo não disse que teríamos uma conversa agradável na próxima vez? Vamos providenciar isso.
Ed ficou surpreso com a ousadia.
— Beto, vá lá e destrua aquelas malditas catapultas! Você consegue? — perguntou.
— Será providenciado — disse, se adiantando para saltar sobre a muralha.
Enquanto o via correr para as catapultas no norte, Pedro disse:
— Eu quero que vocês dêem cobertura pra ele, okay?
— Você acabou de mandar seu subordinado pra morte! Por quê fez isso?
Ele se manteve calmo na explicação.
— Erh?! Olha só pra ele! Cê acha mesmo que aquele psicopata vai morrer?
Os oficiais olharam para o rapaz de trajes negros que havia saltado à pouco. Foi bem à tempo de o ver sacando a arma.
Shiiiiin! Shiiiiiiin! Shiiiiiin! Shiiiiiin!
Poft! Poft! Ele cortou e girou. Depois cortou e girou de novo. Quem ficou no caminho morreu.
Constatando pessoalmente a brutalidade com a qual ele eliminou aqueles fortes oponentes, todos, incluindo o próprio Ed, não puderam deixar de engolir à seco suas próprias salivas.
— Isso é simplesmente um massacre unilateral! — comentou.
— Massacre? Isso parece mais um campo de extermínio em massa! O que esse cara é? uma besta carniceira?
Shiiiiiiiiiiin!
— Olhem só! Com um só corte ele matou mais três! — comentou outro, pasmo.
Pah! Pah! Vendo a perplexidade estampada naqueles rostos, Pedro decidiu quebrar o gelo com algumas palmas.
— Tudo bem. Eu tô indo reforçar o Leste. Por favor, dêem cobertura para a besta carniceira. Vou precisar dela mais tarde.
Vruuuuuuuum!
Ao observar a alta velocidade com a qual o rapaz de cabelos castanhos se moveu, os oficiais novamente ficaram em choque.
— Ei! O que estão esperando? A cobertura para aquele guerreiro! — ordenou Ed.
— S-sim! Sim, senhor! — responderam em uníssono os recém-despertos guardas da vila.
— Arqueiros! Atirem!
…
Alguns instantes depois…
— Essa vai ser a minha primeira luta de vida e morte em cinco anos. Que excitante! Haha! — comentou o jovem, caminhando pela parte mais externa da muralha.
Pedro havia acabado de chegar em sua atual posição e atualmente estava pensando em formas de eliminar seus oponentes da maneira mais eficiente possível.
“Se eu usar puramente a força bruta, vou chamar muita atenção. É melhor manter o perfil baixo por enquanto”, refletiu.
Entretanto, quando na ponderação, ouviu um grito horrível.
— Eles romperam as defesas! Chamem reforço…
Shiiiiiiiiiin!
Infelizmente, o aviso cessou rapidamente. Seu implorar foi em vão e ele tentava estancar o profundo corte feito em sua garganta.
— Filhos da puta! — xingou Pedro, se virando para a direção do que acabou de morrer.
Sem pensar duas vezes, se põs ao encontro dos inimigos e agiu.
— Tiid KLo Ui!
O tempo desacelerou. As espadas dos mercenários, que já eram lentas, passaram a ficar ainda mais lentas. Pelo menos três vezes mais.
Pedro viu tudo. Primeiro, tratou de emprestar a arma de um dos cadáveres e então…
Shiiiiiiiiiiin! Shiiiiiiiiin! Shiiiiiiiin! Três golpes. Cinco vidas a menos.
— Que sensação estranha… Parece que tô cortando um pernil de natal — murmurou, posicionando novamente sua espada rente ao peito.
Os inimigos em câmera lenta ainda não notaram o que acontecia. E suas vidas eram ceifadas enquanto isso.
Shiiiiiiin! Shiiiiiiin!
Balançando as mãos algumas vezes, Pedro concluiu que de fato não sentia nada matando aqueles homens. Estranho…
“Bom, não tem sentido nenhum pensar nessas coisas agora. O que foi feito já foi feito”, pensou.
Suas mãos pingavam sangue. Ele estavam se preparando para ajudar o compatriota a lidar com o restante de fora muralha, quando…
— [O anfitrião acaba de matar o primeiro inimigo! Habilidades correspondentes sendo geradas…]
A voz robótica voltou e Pedro se lembrou de algo que há muito havia esquecido.
— Essa voz… claro! A voz que saiu da herança do vovô…
Mas o que veio a seguir surpreendeu mais ainda. Do nada, um enorme fluxo de partículas mágicas tomou o lugar, se concentrando ao redor do pulso esquerdo do rapaz.
Uma pequena tatuagem começou a tomar forma sobre aquela pele branca e lustrosa.
— Uma espada e uma bandeira? — questionou, encarando fixamente a estranha tatuagem cor azeviche.
— [ Habilidade: criação de exércitos (épico); gerada com sucesso! O anfitrião agora pode capturar a alma dos inimigos mortos, convertendo-os em soldados para o seu próprio exército! ]
Ao ouvir aquela explicação, Pedro se lembrou novamente de algo.
— Ah... é mesmo, eu pedi um trem desse mesmo antes de vir pra cá…
— [ O anfitrião eliminou 12 inimigos, deseja capturar as almas vencidas? ]
“Tentar não custa nada, então…” pensou, antes de concordar.
E o que aconteceu a seguir deixou Pedro maluco!