Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 8
- Início
- Sangue do Dragão Ancestral
- Capítulo 8 - O faro de um advogado nunca falha!
— [O anfitrião eliminou 12 inimigos, deseja capturar as almas vencidas?]
— Sim, eu desejo.
Quando falei, desencadeei uma série de acontecimentos que mudariam de vez o curso de minha vida. Na hora já sabia. Aquelas três palavras me deram um enorme poder, um muito maior do que conseguiria naturalmente.
Em minha frente, doze cadáveres começaram a se decompor numa velocidade muito alta.
No final, uma dúzia de nuvenzinhas fumacentas se formaram e começaram a vir em minha direção. Miravam minhas mãos. Na hora pensei em desviar, mas mesmo meus atos reflexos sobre-humanos falharam.
Minha sorte foi que aquela estranha tatuagem azeviche absorveu todas elas.
Mas não entendi. Eu realmente não consigo entender como é que absorver almas vai me ajudar a convocar os exércitos que eu pedi?! Por acaso virei um necromante agora?
Mesmo que isso não me consuma mana, não vai rolar. Eu realmente não quero ser um necromante… Tsc! Que voz mais caloteira…
Como se adivinhando os meus pensamentos, a estelionatária decidiu se pronunciar:
— [ Almas absorvidas com sucesso! O anfitrião agora pode trocá-las por unidades militares.]
Isso realmente soa muito com um necromante. Que indignante. Pedi uma coisa e recebi outra. Humpf! Tô sentindo que essa coisa vai ser menos usada que calcinha em bordel…
— Me pelo menos me explica ae, como é que eu deveria fazer isso?
Infelizmente, não obtive nenhuma resposta.
— Argh! Voz caloteira! Me vendeu um produto sem explicar como devo usá-lo. Isso é venda casada! Eu exijo meus direitos de consumidor!
Entretanto, para a minha infelicidade, essa pilantra não parece ligar para os meus direitos.
— Humfp! Se estivéssemos na Terra…
…
Meia hora se passou depois daquilo…
Aquela voz caloteira parou de me responder e eu fiquei muito pistola. Quase tive um treco. Mas me acalmei.
Bom, pelo menos acabei descobrindo algo interessante no final. Isto é, toda vez que eu toco a tatuagem consigo sentir quantas almas tem capturadas lá. E sim, a habilidade marcou minha pele sem a minha permissão. Mas ficou legal, então não vou processar ninguém.
Todavia, ainda não faço a mínima ideia de como ativar isso…
Droga! Fui enganado pela entidade que me trouxe a esse mundo. Eu, um advogado brilhante, sofri um baita calote. E só pra deixar claro, pra mim, nesse momento essa estelionatária safada tem a mesma credibilidade que um dentista banguelo. Pilantra! Sem vergonha! Banguela!
Tsc! Acho que tô ficando puto de novo…
— Aahr… não vai mudar nada ficar aqui choramingando. Melhor ir testando esse negocio e ir descobrindo sozinho com o tempo — suspirei, decidido a me levantar e continuar a andar.
Andando pela muralha, me lembrei de uma coisa. Eu não estou indo pra Confederação, um lugar cheio de magos e pesquisadores sinistrões, com esse negócio obscuro na mão?
Erh… Não tem como. Vou ser dissecado!
Quer dizer… como raios vou justificar se aqueles maníacos descobrirem que tenho um método trapaceiro pra roubar almas? É claro que viriam secos pra tentar descobrir como faço isso.
Fora isso, ainda tem aqueles dinossauros do Conselho, muito mais poderosos que eu. Pelo que presenciei eles não sabem desse negócio. Afinal, nunca falaram nada de uma habilidade especial que não fosse o grito dracônico.
Se isso for mesmo útil, pode ser uma carta na manga no futuro. Acho que vale a pena testar…
— Hum?! Mas o que tartarugas é aquilo? — questionei, surpreso com o que vi em minha frente.
Ora, ora… É o Beto, aquele psicopata. No momento ele mantinha sua adaga negra em punho, ou melhor, no pescoço de um homem corpulento e amordaçado em baixo de seus pés.
Impressão minha, ou ele tava prestes a degolar o que eu acho ser o líder dos mercenários? Sério mesmo? Na frente dos guardas, do Ed e dos civis da vila?
— Por todos os seus crimes, eu, o “Presságio da Escuridão” do clã Dra… ehr… quer dizer, só “Presságio da Escuridão”, o condeno à morte!
Mas o que raios aquele animal tá fazendo? Como é que nós vamos descobrir quem é o mandante do crime se ele matar o chefe dos mercenários assim?
Pah! Corri e dei um tapa pra impedir que a besta carniceira estragasse nossos planos.
— Beto, o que pensa que tá fazendo?! — questionei apressado, ainda bloqueando sua mão.
— Meu senhor, estou dando um julgamento adequado a esse homem. Ele cometeu o ultraje de colocar nossa passagem em risco e…
— Julgamento adequado? — questionei interrompendo-o — Você já interrogou ele? Descobriu quem era o mandante?
— Não, meu senhor — respondeu.
— Era isso que eu estava tentando explicar a ele — suspirou o bonitão barbado.
Parece que o Ed teve alguns problemas com esse psicopata. Melhor pôr ordem nas coisas agora.
— Ei, Bastardo! Quem foi que te mandou? Em?!! — perguntei ao imundo amarrado.
Mas ele teve a audácia de ficar calado. Como um peixinho num viveiro de tubarões, ele claramente não sabia em que situação se meteu. Tá só indo na onda. Tsc! Que otário…
— Vou falar só mais uma vez. Você tem dois segundos. Quando isso acontecer, vai abrir a boca e vomitar um nome, e é bom que seja o do maldito mandante — perguntei novamente, paciente.
Dessa vez ele foi ainda mais audacioso. Não só não me respondeu como também começou a rir.
— Você tem muita sorte, pirralho real! Encontrou uma aberração para te ajudar dessa vez! E um macaco estrangeiro com sotaque também — disse o imundo, virando sua cara feiosa pra mim.
Beto não pareceu gostar dessa afirmação audaciosa, uma vez que o atingiu com um forte chutão na cabeça. E como também não gostei, ele tomou dois, dessa vez no peito.
Pah! Pah! Sangue fresco escorreu pela boca asquerosa daquele lixo. Acho que aprendeu a lição.
Infelizmente, aquilo não foi o suficiente pra satisfazer o apetite da besta assassina. No momento seguinte ele sacou sua icônica adaga, levantou a cabeça do criminoso e usou a frieza do metal para dar ao criminoso um prelúdio fúnebre de seu futuro.
— Vou finalizá-lo agora, meu senhor — avisou com indiferença.
— Espere! — gritaram em uníssono, eu e Ed.
No último minuto, interrompeu o movimento assassino. O coração do criminoso quase parou.
A brutalidade, indiferença e a ausência de hesitação nos movimentos de Beto o assustaram muito. Ele acabou por engolir a saliva a seco, enquanto suor frio escorria por sua espinha.
— E-espera! S-se eu contar, vocês vão me liberar?
Eu parei um pouco pra analisar a súplica do bandido. E tive uma ideia um tanto maliciosa. Ora, se esse bastardo quer ser livre, então tudo bem. Que ele seja livre! Hehe…
— Beto, escute. Quando ele terminar de falar quem foi o mandante, você vai soltar, desamarrar e o liberar — ordenei.
— Mas, meu senhor…
— Ei, você não pode fazer isso! Esse homem é um criminoso e matou muitos dos meus cidadãos!
Beto e Ed expuseram suas opiniões em sucessão. Parece que não entenderam minha posição.
— Por favor, jovem nobre, reconsidere! — falou uma voz velha e rouca. Era aquele velho encapuzado de antes. Eu não o tinha visto até agora… Tsc! Esse cara é um saco.
Enfim, já que eles não entenderam, vou ter que ser um pouquinho mais resoluto.
— Escutem! — exclamei, chamando a atenção pra cá. — Eu assumo a responsabilidade. Agora, só façam como eu disse e soltem-no quando isso acabar.
Mesmo com aquilo eles ainda pareciam bem hesitantes, com exceção de Beto, que aparentemente seguiria qualquer ordem que eu lhe desse. Não sei opinar quanto a isso. Mas voltando ao assunto principal…
— Certo… vai falar quem te mandou agora?
Ouvindo o que eu havia dito, a esperança retornou aos olhos dele. Tolo… a esperança é só um alimento da nossa alma, ao qual sempre se mistura o veneno do medo.
— Aquele que me mandou foi Lorde Simel! Ele é irmão do pirralho real! — disse eufórico.
E a resposta aparentemente não causou um choque em Ed.
— Bem… Eu já imaginava isso… — Embora mantivesse uma postura altiva, seus olhos estavam sem brilho. Mero reflexo da tristeza que escondeu. Eu sei disso por que… ehr… Ele se parece um pouco comigo naquela época…
— Já posso ir agora? — perguntou o mercenário, ainda ajoelhado aos pés de Beto.
Assenti, indicando a Beto que então o libertou. Mas antes que Ed, o velho, ou qualquer outro começasse a encher meu saco, corri pra fazer meu movimento.
Pah! Fui um flash na direção do mercenário fujão e o atingi pelas costas, arrancando seu coração por trás.
Plock! O membro pulsava em minha mão. Tranquilo, eu senti suas sístole e diástoles finais.
Mas por fim apenas esmaguei aquela coisa vermelha e gordurosa. Foi quando o criminoso caiu, cuspindo suas últimas palavras antes do inferno.
— V-cê pro… me… teu…
— Sim, e cumpri minha promessa, você foi liberto — disse friamente, tentando esconder minha vontade de rir. — Mas eu nunca falei que estaria te isentando de seus crimes. Não… por sua causa muitos inocentes morreram, pra você não tem remissão.
É… Se você não conhece uma questão hermenêutica tão básica quanto essa, então não venha tentar fazer acordo com um advogado.
Eu o matei porque ele tentou me matar, simples assim. Mas o estranho era só que, neste momento, todos estavam me encarando: Ed, o velho, os guardas, os civis. Todos!
E o pior, faziam aquele olhar complicado, misto de pena, medo e repulsa. Parecia que estavam vendo um fantasma! Será que o que fiz foi tão drástico assim? Nha…
— Pera ae! Os outros eu até entendo, mas até você, Beto? Você é o psicopata aqui! Não tem direito de olhar assim pra mim! — disse inconformado.
Ora, ora… Mas que audácia desse psicopata!
…
Aquela situação desconfortável durou algum tempo e… bem, não quero falar mais sobre isso.
Cof… Cof…
Mas continuando, a batalha já terminou e todos os mercenários ou foram mortos ou presos. E no final eu fiquei com um saldo de 32 almas capturadas. E não, ainda não aceitei o fato de ser parecido com um necromante. Quer dizer… eu não sou um necromante. Ou sou?
Perturbador. Bem… neste exato momento estou em uma sala qualquer, com o Beto, o Ed, o velho e mais uns caras de armadura prateada.
— Eu sinto muito por ter envolvido vocês nisso — se desculpou Ed.
— Ah, não se preocupa não, cara. Aqueles paspalhos tentaram matar a gente também, então agimos. Vamos encerrar o assunto assim — disse, divagando um pouco para minha bebida. — Aliás, que história é essa envolvendo seu irmão?
Ed suspirou um pouco com a minha pergunta, até ajeitou a postura no sofá. Ele parecia bem menos tenso agora.
— Essa é uma longa história. Mas bom, acho que devo me apresentar corretamente primeiro…
Ele então estendeu sua mão para o sofá ao lado, em minha direção, e falou:
— Sou Edward Willblood, Grão-Duque do Oeste e herdeiro legítimo desse humilde Principado. Prazer em conhecer!
Educadamente, recebi o cumprimento com um aperto de mãos e o respondi com gentileza.
— Prazer, Edward! Já me apresentei antes, sou Pedro Rios, dono desta bela imagem em sua frente e herdeiro legítimo de um corpo esculpido.
Edward soltou um riso sem graça com o meu trocadilho, se explicando:
— Desculpa, foram motivos de segurança. Ninguém deveria saber que estavamos visitando esses vilarejos mais próximos da costa agora. — Suspirou — Bem, parece que não adiantou de nada no final…
— Um grupo de homens encapuzados andando por aí já é bem suspeito, pra começar — disse.
Ele ficou ainda mais sem graça depois do meu comentário, necessitando ser salvo pelo velho que sempre o acompanha.
— Infelizmente, não havia métodos melhores disponíveis, jovem nobre — respondeu a voz rouca.
Cof! Cof! Após quebrar o gelo com uma tosse forçada , Edward retomou a explicação.
— Sua Graça, o Príncipe, decidiu que deveria indicar quem, entre seus três filhos homens, seria o sucessor do trono. Ele então me nomeou Grão-Duque do Oeste e passou essas terras para minha proteção, mas…
— O que houve? — perguntei, percebendo a hesitação e desânimo na fala de Edward.
Mas o velho tomou seu lugar, virando seu olhar para mim.
— Dentre os outros irmãos de Lorde Edward, estão o Grão-Duque do Norte e o Grão-Duque do Sul e do Leste. O primeiro se encontra na mesma posição geopolítica que nós, governando uma área de fronteira, com a diferença de ter dentro de seus domínios cidades que são prósperas para o comércio. Mas o verdadeiro problema é o Grão-Duque do Sul e do Leste…
— Espera, esse cara tem dois títulos? — perguntei, interrompendo inconscientemente sua explanação.
— Sim.
Edward então retomou a palavra. — Meu pai sempre gostou mais do Simel, mesmo ele sendo filho de uma concubina. Entretanto, eu realmente não esperava que ele lhe daria tamanha vantagem!
— Vantagem, você diz…
— Sim. No Leste estão as cidades portuárias mais ricas do país. Dão acesso direto a Erula e a Eburove pelo mar da Península — explicou Ed, fazendo uma pequena pausa antes de continuar: — Mas não bastasse isso, ele ainda lhe deu o Sul, onde estão concentradas as cidades mais populosas e muitas das plantações.
— Sua Alteza praticamente entregou o trono a Lorde Simel! Isso foi muito desleal! — exclamou o velho, em um tom claro de resignação.
Bem, depois de tudo isso, acho que consigo entender melhor a situação. Meu faro de advogado é mesmo muito ótimo em sentir conspirações. Isso tá ficando interessante…
— Preciso provar a meu pai que sou capaz de governar! Preciso desenvolver o Oeste! — exclamou Edward, se levantando do assento.
Ele parou perto de mim, estendendo a mão em um gesto nobre.
— Não sei muito sobre suas atuais condições, lorde Pedro, e nem o que levou você e seu nobre guerreiro a estes domínios. Mas, por favor! — Curvando-se levemente, ele pediu: — Por favor, me ajude a desenvolver o Oeste! Em troca, eu lhe prometo tudo o que estiver ao meu alcance.
Hum… Vamos raciocinar…
Não vou poder ir pra Confederação antes de dominar essa minha estranha habilidade de capturar almas. Também preciso aprender a usar essas coisas macabras pra convocar soldados.
Como e quando eu vou conseguir fazer isso? Só Deus sabe…
De qualquer forma, é certo que eu vou precisar de cobaias para testar isso. E qual lugar é melhor para encontrar cobaias do que em uma guerra de sucessão? É muito simples, esse lugar não existe.
Agora, olhando por um outro ângulo…
Uma conspiração, onde o lado em que eu estou não tem nada a não ser uma terra fronteiriça pobre e subdesenvolvida. Além disso, os inimigos são muito mais poderosos e ricos e um deles até tem o apoio do governante supremo desse lugar.
Haha! Que excitante!
— Tá bom, eu aceito!
Pffffft! Beto cuspiu o chá. Tenho certeza que por essa nem ele esperava! Hehe…