Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 83
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- Capítulo 83 - Primeiro contato, primeiro confronto
— Você?
Pedro ficou surpreso. O homem atrás do escudo de partículas mágicas era ninguém menos que Simel Wilblood, o Grão-Duque do Sul e do Leste. Mesmo em trajes simples, a imagem era inconfundível.
O mais notório eram seus olhos cor violeta, marca dos Willblood. Ele só não tinha o cabelo preto do dos irmãos. Pelo contrário, o ruivo-carmesim o destacava.
O alazão que cavalgava relinchou alto com os ataques. Contudo um comando seu o parou.
Naquele momento o cavaleiro que fora salvo correu, dando meia-volta e ficando à frente de uma outra figura. Esta tinha cabelos negros como a noite e usava roupas folgadas de mago.
Pedro sabia que dela vieram os feitiços, pois a mana se reunia naquelas mãos finas e esbranquiçadas, fluindo pelo corpo e pelo ar.
“Esse homem consegue lançar feitiços, tem um rosto fino e com boas feições, altura mediana e cabelo longo. Todas as características batem, exceto a cor do cabelo. Será um outro mago?”, pensou Simel, levantando sua mão para que Milla não atacasse.
— Você, identifique-se!
Ignorando a ordem, o rapaz com roupas simples e cimitarra avançou com passos lentos.
Três cavaleiros o interceptaram, mirando suas espadas e lanças em partes vitais. Pedro, entretanto, os ignorou.
“Eu deveria matá-lo aqui e agora. Tenho certeza que se o executasse, ou pelo menos capturasse esse safado, então Ed venceria a guerra”, raciocinou, soltando um pequeno suspiro em seguida. “Mas ele pode ser o pai de Sofia. Não, provavelmente é mesmo o pai dela. Não posso matar ele”.
Pedro estava consternado. Ligando os fatos, ele chegou àquela conclusão. Amélia lhe tinha dito que amava um homem nobre, mas que eles não podiam se casar devido a questões familiares.
Ora, acontece que ele mesmo havia visto pelos arredores casos de homens nobres menores que se casavam com plebéias, camponesas ou servas, como o barão Caring, senhor de Carimg.
Em regra, os casamentos entre casas nobres aconteciam por questões políticas ou porque os filhos e filhas de famílias maiores, que normalmente moram em grandes cidades, frequentavam os mesmos espaços, facilitando que formassem um laço amoroso.
Esse não parecia ser o tipo de coisa que acontecia com nobres menores, cujos filhos viviam cercados pelos plebeus das vilas e aldeias que controlavam. Portanto Pedro concluiu que o amante dela fosse um nobre de alto escalão.
O cabelo dele também era muito parecido com o de Sofia, a única diferença eram os olhos. O da menina tinha o azul de Amélia, pelo que Pedro sabia.
Mas o fato crucial ainda continuava sendo a confissão de Linn.
Ele chamou o rapaz de nobre estrangeiro, a peça que seus inimigos colocaram. O que significava que o reconheceu e que eles já se viram antes. Pedro se lembrou no mesmo instante do cavaleiro loiro, refletindo com calma depois, durante a conversa com Rebecca.
E, se o cavaleiro loiro protegia Sofia e Amélia, então apenas Simel poderia ser o tal amante.
— Estou procurando duas amigas minhas. Uma garotinha e sua mãe — disse o rapaz, fingindo normalidade. — Não se intrometam e não atacarei.
Simel cerrou as sobrancelhas.
— Duas amigas, você diz… Como elas são, mago? E o que sabe sobre o paradeiro delas?
Pedro notou que o tom do nobre vacilou um pouco. Muito possivelmente reflexos do cansaço e da ansiedade.
“Será que ele sabe que elas foram sequestradas e veio pessoalmente procurar?”, pensou, rapidamente descartando a ideia. Mal faziam dois dias que elas se foram, notícias não deveriam chegar a Kirgton tão depressa.
O mais provável era que fosse tudo uma enorme coincidência. Fato este que fez a mente de Pedro funcionar, tentando encontrar os motivos de Simel para estar ali.
Mas descartou esses pensamentos como um flash. Não ajudariam em nada agora.
— A garota tem cabelos vermelhos curtos, olho azul e usa tapa-olhos. A mãe tem cabelos cacheados e os mesmos olhos azuis, além de ser bem alta — disse. — Te lembra algo?
Sem vacilar, o ruivo fez um sinal com as mãos. Logo em seguida todos os cavaleiros correram para cercar o mago. A acompanhante encapuzada de Simel sibilou palavras estranhas em uma língua desconhecida, enquanto reunia toda mana que conseguia dos arredores.
Pedro notou que provavelmente seria atacado.
Assim, empunhou a cimitarra e trocou sinais com Rebecca, que até então permanecia escondida no alto das árvores. Era instintivo, um plano perfeito: ele bloquearia o primeiro golpe e ela pegaria os inimigos desprevenidos.
O cerco foi feito, mas, quando a maga estava para soltar o feitiço, Simel mandou que parasse.
— Você disse que é amigo delas.
O rapaz concordou, fazendo com a cabeça que sim.
— Explique-se.
Pedro achou curioso, mas decidiu manter-se no personagem e acenar de leve para Rebecca para que não atacasse.
— E por que deveria?
O Grão-Duque arqueou as sobrancelhas. Pelo que parecia aquele jovem com a espada curvada e roupas simples não tinha medo dos cavaleiros de sua guarda pessoal, nem da maga e seus feitiços.
Pedro piscou, e quando abriu os olhos notou uma enorme estaca de gelo vindo em sua direção.
Foi simplesmente muito rápido, de modo que não teve tempo para conjurar qualquer feitiço. As duas únicas opções eram desviar ou então tentar quebrar o gelo com a força bruta. Por instinto, ele escolheu a segunda.
Shiiiiin! Um golpe ligeiro, de baixo para cima. Quebrou o gelo em dois e impediu que o acertasse. O corte deixou pequenos rastros brancos pelo ar, que refletiam com o luar.
Em seguida foi para trás, tentando ganhar espaço, só para ser surpreendido por um outro cavaleiro que lá já estava.
“Tsc! Maldita formação circular”, pensou o rapaz, se preparando para desviar e pegar o golpe do oponente. Ele daria um pulo e cairia bem atrás do pescoço do homem, capturando sua alma.
Rebecca, contudo, foi mais rápida.
Do alto da grande árvore, a garota não esperou seu amado ser surpreendido para agir. Decidiu ela mesma surpreender os adversários com um ataque letal. Um vulto que, como a tempestade no verão, surgiu do nada e foi embora sem deixar uma palavra.
Apenas um corpo caído ficou, aparentemente sem vida.
Mesmo com a queda do companheiro, os outros não se mexeram. Não deram um passo para além da formação, apenas esperando a ordem de seu comandante.
— O que foi isso? — perguntou a maga, surpresa. Ela até conferiu o nível de partículas mágicas na área, para ver se não era um feitiço, mas não encontrou nada.
Como se nada houvesse acontecido, Pedro continuou o trajeto até o nobre em cima do alazão.
Pressentindo o perigo, todos os cavaleiros saíram da antiga formação para fazer uma fila à frente de Simel. Era uma espécie de barreira com duas filas de homens.
A maga ia conjurando um novo feitiço, quando Pedro falou:
— Satisfeito? Essa é minha força, e agora também sei qual é a sua. Agora podemos parar com essa palhada, ou vou ter que te matar de verdade?
Não havia qualquer vibração na voz do jovem ao fazer a ameaça. Reparando mais, notava-se que seus olhos perderam o brilho, restando apenas uma frieza abissal. As palavras atingiram-os como uma bigorna de ferro, era o peso de uma ameaça verdadeira apoiada pela força.
Simel olhou de volta, também sem emoção, e eles se encararam por alguns segundos.
A tensão aumentou exponencialmente. O suor de alguns dos guardas era visível, escorrendo das testas e bochechas.
Foi então que o nobre em cima do cavalo deu o primeiro passo desde que chegara ali. Sim, ele desceu do animal e andou na direção de Pedro, ficando cara a cara com o nobre estrangeiro.
Milla cerrou de leve os lábios, como se pressentisse que aquilo era perigoso. Contudo não faria nada sem uma ordem, como a todos os outros ali.
— De acordo.
Ao obter a resposta que queria, Pedro embainhou a espada gaudéria. Naquele mesmo momento toda a atmosfera do ambiente retornou ao estado anterior. Era como se a pressão atmosférica houvesse diminuído por dez ou vinte atm.
Alguns guardas quase soltaram um suspiro. A tez do jovem de cabelos escuros mudou do avesso, de ameaçador para amigável.
— Então jaé — disse, lembrando-se de algo que o fez soltar uma pequena risada.
Os dois então conversaram e daí diversas informações ficaram claras. A primeira delas foi o que Simel estava fazendo e como chegou ali.
Ele não quis dizer muito a Pedro, mas contou que estavam fazendo pesquisas no Oeste e, já que ele era um homem relativamente famoso e odiado por aquelas bandas, precisava de cautela. De qualquer forma, externamente o rapaz não demonstrou muito interesse no assunto, embora internamente tenha ficado curioso. Com certeza alertaria a Edward depois.
Continuando, foi a vez de Pedro contar o que fazia. Inventou que era um mago e comerciante itinerante e que estava em lua de mel com a recém-adquirida esposa.
Milla perguntou se ele veio de Arcana e ele disse que não, que havia aprendido com seu mestre e que estava indo para lá. Em parte era verdade.
O rapaz então contou que conheceu Amélia e Sofia durante sua jornada e que ficaram amigos.
Infelizmente, eles se afastaram e o desastre aconteceu. Quando soube, Pedro imediatamente deu meia-volta para ajudar as garotas.
— Foi algo parecido conosco — revelou Simel.
Alguns minutos se passaram e todos já estavam de volta ao rastro dos gaudérios. Dessa vez juntos. Rebecca inclusa, que até saiu das sombras. E o homem caído também.
Pelo que parecia, a garota tinha lido a situação e presumido que os dois estavam apenas testando suas forças antes do diálogo. Afinal já havia visto Pedro sério antes e sabia que ele não daria tantas aberturas e espaços para o inimigo atacar.
Momentos de caminhada e um certo som fez com que o grupo parasse subitamente.
— O que passarinhos foi agora?