Sangue do Dragão Ancestral - Capítulo 87
A pedido de Simel, Pedro teria que criar uma distração que possibilitasse ao grupo uma forma de procurar pelas reféns sem que as atenções dos mercenários ou dos seres estranhos estivessem focadas neles.
Para isso ele bolou uma estratégia, sua tática habitual, que era….
“Vou descer a porrada em todo mundo”, raciocinou. “O careca tá tomando um pau do Piccolo, mas até onde vai a força desse verdão? Será que serei obrigado a usar um ou dois trunfos na frente de Simel ou de Rebecca?”
Pedro queria evitar isso, mas, se não tivesse escolha, seria obrigado a se revelar ao menos um pouco. Para evitar isso, ele tentaria acabar a luta em um único golpe. Assim, aproveitando-se da distração do grão-duque e do grupo de resgate, ele sacou sua cimitarra gaudéria e desferiu um golpe supersônico em direção à criatura verde.
— Morram, vocês dois!
Foi um flash cinza. O impacto veio logo em seguida, pelo barulho, rompeu a barreira do som.
Pah!
A caverna tremeu e muita poeira foi levantada. Pedro teve os olhos cobertos por pó, mas seus músculos ainda sentiam a espada bloqueada por algo muito, muito duro.
Olhando melhor ele viu que era a palma aberta da criatura. Parou o golpe com a mão nua.
O capitão mercenário voou para trás com o impacto remanescente, apenas parando com muita dificuldade, instantes antes de atingir a parede. Seu rosto mostrava sua perplexidade.
A criatura verde também encarou com surpresa. Afinal, não sabia quem era aquele que, do nada, lhe infligiu tal poderoso ataque.
Pedro viu de relance que o grupo de resgate também havia parado com a surpresa. Possível que não esperavam que iria direto ao ataque daquele modo, mesmo sem conhecer a força do inimigo. Contudo Simel se recuperou rápido e ordenou que continuassem.
Enquanto isso, o rapaz continuava com sua função de bobo da corte, criando a distração.
— Ayvu Humak? — disse a criatura, em uma língua a qual o jovem dragonark nunca escutara antes.
Sem perder tempo, Pedro lançou outro ataque. Tirou a lâmina e usou magia para alvejar o alvo.
Várias [labaredas escarlates] voaram e a caverna úmida viu sua temperatura crescer. Foi instantâneo; segundos depois, uma nova onda supersônica voou, dessa vez ainda mais rápido e mais potente.
Paaaaaaah!
Mais poeira e uma onda de choque três vezes mais potente. Aqueles que estavam a 10 metros voaram com o poder do golpe, parando apenas com as paredes. Até mesmo os subordinados do ser misterioso tiveram seus corpos deslocados.
Felizmente, o grupo de busca já tinha saído dali. Desceram por outro declive lateral para o qual alguns mercenários desertavam. Parecia que aquele lugar tinha mais caminhos e locais desconhecidos do que originalmente pensavam, o que era bom, pois possibilitaria uma luta tranquila ao rapaz.
Quando a poeira começou a abaixar, pode-se notar que a criatura já não estava no mesmo lugar que antes. O ataque de Pedro o obrigou a recuar. Estava a quatro passos de sua posição original.
O coração do rapaz disparou. No último golpe ele usou cerca de 50% de sua força, coisa que poucas vezes teve a oportunidade de fazer após o término de seu treinamento. Isso significava que aquele de fato era um inimigo poderoso.
Em contrapartida, o capitão mercenário estava jogado no chão. Duas vezes foi arremessado como um boneco de pano pelo impacto, para lá e para cá; duas vezes fora humilhado. Seu espírito de luta começava a se quebrar.
— Dragnark? — falou a criatura, em tom audível.
Pedro se assustou. Embora não entendesse o dialeto, conhecia o morfema. Era muito similar ao usado por sua raça.
Após, a criatura continuou balbuciando palavras incompreensíveis, encarando fixo, como se estivesse esperando que o rapaz com roupas normais respondesse.
Isso não aconteceu.
Pah!
Tudo que o ser verde recebeu foi um chute lateral, seguida de um giro, uma rasteira e outro golpe de cimitarra. Recebeu tudo com um baque, que o fez recuar ainda mais.
— F-fujam! Fujam, seus imbecis. Fujam enquanto esse idiota segura a besta, espalhem-se!
A fuga descarada do capitão-mercenário fez com que a atenção de Pedro vacilasse um pouco. Não poderia deixar que escapasse assim, sem responder por seus crimes ou dizer o motivo de terem capturado suas amigas.
Entretanto estava muito ocupado com o monstro verde no momento. Sim, ele revidou o ataque.
Paaaah! Paaaah!
Punho com punho, e o vento chorou. Chorou porque foi esmagado.
“70% da minha força. Isso deve ser o suficiente pra destruir uma pequena colina, e esse cara ainda tá aí, de pé. Mas que caceta…”, pensou.
Nenhum dos dois recuou dessa vez, mas o ser verde fez uma pequena careta. Parece que enfim começou a dar sinais da verdadeira extensão de suas forças. Talvez notando isso, alguns de seus subordinados abandonaram os postos para ajudar.
Os poucos mercenários que restavam estavam em retirada, correndo feito loucos para todos os lados da caverna. Buscavam saídas, formas de manter a própria vida, mesmo que para isso alguns companheiros tivessem que morrer.
O ambiente estava fétido e repleto de sangue. Nauseante para qualquer um com estômago fraco. Na verdade, mesmo alguns homens ali, veteranos de batalha, começaram a vomitar. Alguns gritavam de pânico; outros, gemiam de dor.
Aproveitando a brecha, lanceiros inimigos começaram a mirar no jovem de cabelos longos que enfrentava seu líder. Lidariam com ele à distância, enquanto berserkers com armas pesadas iam a encontro dele.
Vendo que a retaguarda estava frágil, o rapaz se valeu de uma técnica impensada.
Lembrando-se da técnica recém-ensinada pela maga de Simel, ele guardou sua cimitarra e conjurou dois pequenos domos de luz. Depois começou a inflá-los, reunindo todas as partículas mágicas que conseguiu.
Não sabia se daria certo, contudo o princípio era similar ao aplicado para seu [dissipar partículas], que usou para parar a explosão do líder gaudério. A diferença era que agora faria o contrário.
Kaboooom!
Ainda no meio da explosão, o mundo ficou branco. Perdendo, de repente, toda a cor. Os mercenários em fuga ficaram atordoados, bem como os grandalhões de pele verde. Seu alvo sumiu.
— Tiid KLo Ui!
— Aaaaaaaa…!
O dono do berro era o líder de cara ruim. Parado no meio da fuga, teve suas defesas rompidas por completo. Todas as articulações doíam e já não sentia mais a parte de baixo do próprio corpo, ou os braços.
Quando o tempo parou, Pedro quebrou-o por inteiro, impedindo para sempre que fizesse qualquer tipo de movimento. Nem sua aura de batalha se formava mais.
Só então encerrou o grito dracônico, fazendo o relógio rodar normalmente. Estava na frente de Rukie, mas não o reconheceu, talvez pelo longo período de tempo ou então porque simplesmente não se importava o suficiente para tal.
Ele o notou, contudo.
— V-você… é… NOBRE ESTRANGEIRO!
O grito seco assustou Pedro. Aquele era o apelido que seus rivais do Oeste usavam para se referir a ele de modo pejorativo. Pelo visto, seu disfarce não adiantaria muito contra esse tipo de inimigo.
— Sim, sou eu, seu avô — disse em resposta, a impaciência irradiando do corpo. — Fica aí quietinho, quando eu terminar com o Piccolo ali a gente conversa, tá?
O mercenário entretanto não pareceu concordar.
— S-seu merda! Vou matar voc…!
Estava eufórico e queria agir, como não podia, ameaçaria. Mas o sonífero mágico na ponta dos pés de Pedro interrompeu seu ímpeto assassino, botando-o para dormir com um golpe na têmpora.
— Bom, agora é a sua vez…
A interação com o mercenário mal durou alguns segundos, o que o rapaz imaginou ser o suficiente para que os inimigos estranhos se recuperassem da explosão de luz e se reagrupassem.
Ele só não esperava que fariam mais do que isso.
Boooom! Outra explosão soou. Dessa vez mais forte e ainda mais destrutiva que as ondas de impacto anteriores.
A estrutura da caverna balançou. Pedaços de rocha e poeira começaram a cair, um indicativo claro da destruição.
Identificando a fonte do caos, o jovem dragonark viu o inacreditável. O homem verde destruiu o chão, abrindo um grande buraco com uma ferramenta estranha de perfuração. Depois pulou nele, deixando seus seguranças para trás, protegendo as beiras.
Pedro ficou perplexo, pelo visto o inimigo decidiu abandonar a luta.
— Mas que filho da…
Pah! Com um poderoso arremesso, o lanceiro de armadura pesada interrompeu o xingamento. Bem rápido seus companheiros se juntaram à luta, partindo para cima do jovem com uma formação circular.
“Querem me cercar e atacar pelas brechas, até achar um ponto fraco e me abater. Pilantras”. Não foi difícil prever o que fariam a seguir, e por isso ele atacaria antes.
— Tiid KLo Ui!
Pela segunda vez, o tempo desacelerou.
Quando as rochas voltaram a cair, e o vento voltou a ventar, todos os nove capangas estavam mortos, bem como a maioria dos mercenários nas redondezas.
“Pronto, agora, o que eu faço? Com a força daquele golpe, essa caceta vai desmoronar e soterrar todo mundo. Vou atrás do safado, ou busco Rebecca e Simel?”, pensou. E aquela era uma questão delicada. Se escolhesse errado, era possível que se arrependesse amargamente depois.
Sem hesitar ele olhou para trás, depois para o buraco, e então fez sua escolha.