Se Eu Pudesse Fazer um Pedido - Capítulo 2
Após mais uma noite acordado, Satoru é irritado pelo brilho do monitor em seus olhos, com o rosto amassado tenta se levantar da escrivaninha, um pouco sonolento ainda, observa seu quarto. Um quarto que com toda certeza levaria mais de meia hora para ser limpo, muitas e muitas latas de refrigerante, sacos de salgadinhos por todos os lados, seu travesseiro e cobertores jogados pelo quarto inteiro.
— A merda, que dia é hoje? — caça Satoru o celular no chão no meio de várias embalagens
O encontra com dificuldade, tenta ligá-lo sem sucesso, bate duas vezes na tela e nada, enfurecido joga o celular na parede e logo se arrepende, dá dois cliques no mause para ver a hora e a data na tela do computador.
12/06/2021 11:27…
— Droga, acordei tarde de novo é? — se levanta devagar
Driblando os pacotes e latas com dificuldade pega o celular quebrado e sai de seu quarto, caminha pelo corredor também sujo até o banheiro. La toma um banho gelado, e se olha no espelho, abre uma gaveta debaixo da pia e retira uma caixa com alguns piercing e os coloca no rosto, dois em cada orelha um no nariz e outro no lábio de baixo.
Pega sua toalha e volta para seu quarto, remexe em algumas roupas jogadas no chão e pega o que vai vestir hoje. Uma calça jeans, uma camisa preta e uma blusa de moletom. Vai até sua escrivaninha abre uma gaveta, retira um maço de cigarros e vai até a varanda.
— Hora de respirar um pouco de ar puro — ele acende um cigarro — mais um dia preto e branco não é? Valeu Deus. — pega o celular quebrado — vou ter que levar pro concerto.
Uma senhora pendurando algumas roupas no varal à vista Satoru e acena, ele a ignora e volta pra dentro. Na escrivaninha pega seus óculos, coloca seu notebook em uma mochila, e calmamente desce as escadas, da uma olhada na cozinha, a pia está cheia de pratos sujos. Vai até o sofá, tira alguns pacotes de cima, se senta e liga a TV…
— Hoje em celebridades de verdade falaremos sobre a mundialmente famosa Emiko Kane… — a TV é desligada bruscamente por Satoru
— Vai à merda! — Ele se levanta e vai até a porta
No lado de fora o sol forte bate no rosto de Satoru, mostrando claramente suas olheiras, ele caminha pela vizinhança, quando algumas mães veem Satoru, rapidamente pegam seus filhos e correm para dentro de casa, o boato se espalhou nos últimos anos…
Já perto da assistência Satoru foi pegar mais um cigarro e percebe que acabou, avista um mercado e decide ir lá, entra normalmente e pega dois maços, vai até o caixa, mas antes decide olhar as novels que estão à venda, passando por algumas avista uma que o interessa, um romance sobre um rapaz que ajuda uma élfa vinda de outro mundo, ele vê que estão vendendo bem e pega uma, da uma olhada na contra capa e vê o nome do autor “Satoru Chiba” ele a devolve sem interesse…
— Gosta de novels? — uma mulher pergunta — essa ai é minha favorita
— É mesmo? Não sou muito fã dela — ele se vira querendo ir embora
— Não curte romances? Você já leu essa daqui? — ela se prostra para pegar uma na fileira de baixo
— Não, mas odeio mais gente curiosa — ele se vira
Ele vai até o caixa, o dono já o conhece desde criança e foi um dos únicos que não acreditou no boato.
— Então, mais cigarros? — o senhor parece desapontado
— Não venha com julgamentos velhote — ele paga e vai saindo
— Isso não vai traze-la de volta Satoru — o senhor fala e a mulher que está lendo se assusta
— Eu sei… — sussurra e sai
Satoru anda alguns metros e a mulher que estava na loja corre atrás dele…
— Espere por favor! — ela corre até ele
— O que você quer? — ele se vira
— O seu… nome… é Satoru Chiba? — ela sem fôlego tenta respirar
— E se for? Algum problema? — ele a encara
— Não é nada disso, você é o escritor de “cuidando de uma élfa”? — ela recupera o fôlego
— Não estou com paciência para fãs agora — ele se vira querendo ir embora
— Espera! — ela segura Satoru pela blusa — posso lhe fazer uma pergunta?
— Que insistência, pergunte — ele vira somente o rosto
— É… — ela parece procurar as palavras — por que parou de escrever novos romances?
— ele pensa por alguns segundos — É porque… não posso escrever sobre algo que não acredito mais. — Seu coração por algum motivo começa acelerar
Ele vai embora deixando a mulher para trás, o que ela disse o deixou pensativo e perturbado, lembranças desagradáveis vieram à tona, memórias, pesadelos, cores…. ele parou em um beco para fumar um cigarro enquanto pensava sobre oque acabou de acontecer.
— Aquela mulher… — por algum motivo ele fica furioso
Ele pega uma garrafa de vidro e vai jogá-la em uma parede, mas a garrafa explode em sua mão deixando um pedaço de vidro encravado atravessando sua mão direita.
— Aaaa droga! era só o que me faltava! — ele anda com a mão sangrando até um orelhão na rua. — Alô, Eric?
— O que aconteceu agora Satoru? — pela voz Eric parece preocupado
— Não posso ligar para um amigo de vez em quando? — ele se estressa
— Claro que pode, mas não é o caso certo? — Ele sente a raiva de Satoru
— Pode me atender? — pergunta
— Cara eu sou um veterinário não um médico — diz
— Você sabe que eu não tenho dinheiro, se eu for lá eles vão cobrar uma fortuna! — ele grita
— Deveria começar a te cobrar, afinal você é um animal mesmo — ele suspira — Vem logo, mas vai ter que me fazer um favor.
— Que seja — ele desliga com raiva
Satoru tira sua blusa e enrola em sua mão, em seu braço direito se mostra uma enorme tatuagem que vai do ombro ao pulso, algumas pessoas olham pra ele com preconceito, ele nem se importa mais.
Caminha por uma meia hora e chega em um bairro bem calmo, para na frente de uma clínica veterinária bem jeitosa, está fechada no momento por causa do horário de almoço, ele entra e a moça do balcão o reconhece.
— Bom dia Satoru — ela acena
— An? A eae tia — ele levanta o braço machucado
— Tia?! Eu tenho vinte e cin… — ela percebe o machucado — ei ei ei, esse braço está pingando sangue!
— Isso aqui? O Eric já vai resolver — Eric sai de uma sala
— Ah você chegou, entra logo pra eu ver isso — os dois entram na sala deixando a balconista falando sozinha.
— Satoru pega um cigarro, acende e se senta numa maca — então, dá uma olhada nisso aqui — ele tira a blusa da mão.
— Pelo amor, cara apaga isso aí — ele examina a mão — já tá parecendo uma chaminé.
— Não enche, tô querendo fumar faz tempo — ele o encara.
— Fez uma belo estrago dessa vez — Eric coloca duas luvas
— Eu ia tacar uma garrafa na parede, mas ela explodi-o na minha mão — Satoru traga
— Você é bem azarado hein? — ele tira o pedaço de vidro que atravessou a mão
— Percebeu isso só agora? — Satoru olha para uma mochila de criança — como vai sua filha?
— Elisa? Ela vai bem, logo logo vai fazer 5 anos, na verdade esse era o favor que eu queria lhe pedir — Eric enfaixa a mão de Satoru
— ele suspira — Que bom que ela está bem… então qual é o favor? — Satoru se levanta.
— Queria que você a buscasse na escola as três e ficasse com ela até as cinco, minha mulher não vai poder pegá-la e eu tenho um exame pras quatro. — Eric pega alguns remédios — aliás tente tomar esses remédio pra não pegar uma infecção, são de cachorro então devem fazer efeito em você.
— Isso foi cruel — ele pega os remédios — posso pegá-la sim.
— Ué não vai reclamar? — Eric se apoia em sua mesa
— Não dessa vez… — Satoru se levanta e vai até a porta — bom, já vou embora, passo na sua casa mais tarde pra devolver a criatura.
— Sua casa é no caminho, mais tarde eu a busco, vê se não se machuca de novo — ele acena.
Já na saída
— Falou tia, até algum dia — ele acena
— Eu já disse que tenho vinte e cinc..! — Ele a deixa falando sozinha
— lá fora — Acho que dá pra passar na assistência ainda — ele olha um relógio público: 13:20
Ele caminha por dez minutos e chega na assistência, o trajeto inteiro pensa na mulher da loja, por algum motivo ela não sai de sua cabeça, ele deixa seu celular na assistência e vai direto a escola da filha de Eric.
Na escola faltando dez minutos para abrirem o portão, Satoru se destaca comparado com os pais das outras crianças, algumas mães comentam umas com as outras sussurrando e alguns pais só fazem uma cara feia para Satoru que nem se importa.
O portão se abre e um bando de crianças correm até seus pais, Satoru vai entrando na escola e os professores ficam em alerta, ele procura por Elisa e a acha na porta da diretoria sentada em um banco com a mochila no colo.
— Eae baixinha, hoje eu vim te buscar — ele se agacha perto dela
— Ah! tio Satoru! — ele pula em cima dele
— Você é Satoru Chiba? — Uma mulher de uns trinta anos de óculos com uma roupa bem apertada pergunta.
— Sou, porque? — ele se levanta segurando a garota pela mochila
— O pai de Elise ligou dizendo que vinha — ela se apoia na parede e o olha de cima a baixo — hmm… por a caso… tem planos pra hoje a noite? — ela morde os lábios
— Não, e não quero fazer nada — ele se vira com a garota nos ombros e vai embora deixando-a sozinha.
Quase saindo uma mãe sussurra com uma professora que na mesma hora voa até Satoru.
— Ei , espera aí! Você tem autorização para levar essa garota?! — ela o segura pela camisa
— É claro que tenh… — é a mulher da loja — sabia que isso pode ser considerado perseguição?
— Você?! — ela quase explode, mas toma compostura — …você tem autorização?
— É claro né, se duvida pergunta pra tarada ali — ele aponta pra diretora.
Ele fica no aguardo por alguns minutos, com certeza aquela mãe sabe alguma coisa sobre seu passado, isso com toda certeza deixaria qualquer professora em pânico. Ela se aproxima e ele sente uma áurea de vergonha em sua volta.
— Me desculpe — ela se prostra
— Só não encham mais meu saco — ele começa a andar e trava, um pensamento arriscado vem em sua mente, mas a dúvida persiste igual criança querendo doce — você era fã dos meus romances, certo?
— A… sim — ela ergue a cabeça
— Eu cancelei a última obra, mas ainda tem algumas anotações jogadas lá em casa, se ainda está com dúvida para onde estou levando ela, pode nos acompanhar — ele segue andando.
— Claro! — Seu rosto parece se iluminar
Os três seguem o caminho, a garota e Satoru ficam conversando e brincando, a mulher só os observa ansiosa para chegar a casa.
— Então… qual o seu nome? — ele a encara
— Atsuko… Atsuko Suzuki — ela aperta sua pasta
— Suzuki? Eu já ouvi esse nome em algum lugar… — ele pensa
Sem demora chegam a casa, Satoru coloca Elisa no chão e pega as chaves, quando está prestes a abrir hesita um pouco…
— Bom… o que está prestes a ver será chocante em várias formas — ele se prepara
— O que? Tem prostitutas aí dentro? — ela empurra a porta e leva um susto
— Quem me dera ter prostitutas — ele entra junto com Elisa — Elisa pode atacar a geladeira vai — ele dá à ordem e a garota corre
— Sua… casa… é bonita não? — ela desvia de algumas embalagens
— ela era muito bonita… — ele vai subindo as escadas — pode assistir um pouco de TV com Elise vou procurar a caixa com os papéis
Ele sobe até seu quarto e procura em seu armário que ao invés de estar com suas roupas está cheio de caixas velhas, alguns mangás de romance, outro cheio de novels, alguns só com coisas “masculinas”, nada fora do comum, depois de muita procura uma hora e meia depois ele acha uma caixa com seus antigos trabalhos e futuros projetos, com esforço se levanta e vai até o corredor, e Atsuko está prestes a abrir o quarto de sua irmã…
— Pare! — ele pula em direção a porta deixando a caixa cair e segurando forte a mão de Atsuko — o que pensa que está fazendo?! Acha que pode simplesmente invadir a privacidade dos outros assim?
— Está apertando muito forte — ela tenta tirar a mão dele
— Me desculpe… — ele se afasta — só vai embora, ok?
— Certo… — ela corre até o andar de baixo e sai
Satoru fica extremamente irritado, quem ela pensa que é? Não se entra no quarto dos outros sem permissão, ele se arrepende amargamente de a ter trazido até sua casa, se encosta na parede por alguns minutos até que escuta a porta do quarto se abrindo…
— A professora ta demorando para me achar — Elisa sai do quarto olhando em volta
— Elisa..? oque esta fazendo ai? — ele se levanta em choque
— Eu pedi pra brincar de esconde-esconde com a professora, ela pelo jeito não queria mesmo — Elisa sai e desce as escadas.
— De novo… a culpa é minha… — ele se levanta e fica frente a frente ao espelho — de novo! — ele soca o espelho que se quebra em vários pedaços — eu… preciso fumar…
Ele vai até a varanda e acende um cigarro, fica olhando a rua por alguns minutos, toda vez que seus sentimentos se elevam costuma fumar, logo após o acidente Satoru tentou escapar da frustração experimentando várias coisas, com um pouco de consciência ele permaneceu somente no cigarro, desde aquele dia a 6 anos atrás, ele não chorou uma única vez…
“Se eu pudesse fazer um pedido…”
“Pediria perdão…”